Crime de rixa e a responsabilidade penal objetiva do agente[1]

 

Ecio Fonseca Costa e David Costa Alves[2]

Gabriel Ahid Costa[3]

 

Sumário: 1. Introdução; 2. Crime de rixa; 2.1. Do conceito e características; 3. Formas do crime de rixa; 3.1. Rixa simples; 3.2. Rixa qualificada; 3.2.1. Divergências doutrinárias no crime de rixa qualificada; 4. As responsabilidades dos agentes; 4.1. Autor e partícipe; 4.2. Das responsabilidades subjetiva e objetiva no crime de rixa; 5. Considerações finais; Referências.

 

RESUMO

O Código Penal Brasileiro visa assegurar uma segurança para a sociedade, diante disso criminalizaram-se as agressões múltiplas ocorridas entre vários agentes envolvidos, tornando assim um delito autônomo denominado: crime de rixa. Crime este que traz em seu bojo algumas características peculiares como a sua forma qualificada que tem servido de fulcro para vários debates em torno da responsabilidade penal objetiva e também da punibilidade desta qualificadora em concurso material com os crimes de homicídio e lesão corporal grave como sendo uma causa de bis in idem.

 

Palavras-chaves: Crime de rixa, responsabilidade subjetiva e objetiva, qualificadora.

 

ABSTRACT

The Brazilian Penal Code aims to ensure safety for society, given that criminalized the multiple assaults occurred between the various actors involved, thus making it an autonomous offense called: crime feud. Crime that this brings with it some unique characteristics as its qualified form which has served as the fulcrum for various debates surrounding the objective criminal liability and also the punishment of this stuff on qualifying competition with the crimes of murder and grievous bodily harm as a because bis in idem.

 

Keywords: Crime brawl, subjective and objective responsibility, qualifying.

 

INTRODUÇÃO

                   As missões do direito penal, isto é, suas finalidades, suas metas, são as consequências queridas ou procuradas oficialmente pelo sistema (proteção de bens jurídicos, diminuição da violência estatal, diminuição da violência individual etc.). (Gomes, 2007, p.20). Nesse prisma entende-se que a força a qual o direito penal desempenha na sociedade, é visando controlar de forma firme as condutas indesejadas no seio da comunidade.

O Direito Penal também se manifesta como “uma ordem de paz pública e de tutela (proteção) das relações sociais, cuja missão é proteger a convivência humana, assegurando, por meio da coação estatal, a ordem jurídica”. (Prado, 2010, p.56).

Diante disso verifica-se através de uma análise crítica o crime de rixa que está tipificado no art. 137 do Código Penal; tal tipicidade do caso concreto visa assegurar de forma clara a segurança pública em uma sociedade de direito, pois busca criminalizar de forma subjetiva os seus agentes.

Nesse diapasão uma mera participação em um tumulto seguido de brigas, agressões recíprocas entre várias pessoas gera a subsunção da norma ao caso concreto, caracterizado como crime de rixa. O crime de rixa foi criado pelo atual Código Penal, pois os Códigos anteriores não mencionavam esse fato típico, sendo assim com o passar dos anos surge esse tipo penal o qual passou a ser autônomo desvinculado do crime de homicídio e de lesão corporal.

Assim observa-se que o Direito Penal institui de forma axiológica condutas desejáveis e indesejáveis no interior da sociedade, “ao prescrever e castigar qualquer lesão aos deveres ético-sociais, o Direito Penal acaba por exercer uma função de formação do juízo ético dos cidadãos, que passam a ter bem delineado quais os valores essenciais para o convívio do homem em sociedade”. (Capez, 2011, p.20).

 

2. - Crime de rixa

O tipo legal do crime de rixa tem a sua fundamentação no art. 137, CP: “Participar de rixa, salvo para separar os contendores: Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa. Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos” [4].

 

2.1 - Do conceito e características           

Trata-se de uma briga generalizada envolvendo no mínimo três pessoas, agindo cada uma por sua conta e risco, sem se ter uma vítima específica, acompanhado de vias de fato ou violência recíproca. Como diz Capez: “É a luta, a contenda entre três ou mais pessoas; briga esta que envolva vias de fato ou violências físicas recíprocas, praticadas por cada um dos contendores (rixosos, rixentos) contra os demais, generalizadamente”. (Capez, 2012, p. 265).

Queiroz de Morais define o crime de rixa de forma mais completa e clara quando diz que:

“o conflito que, surgindo de improviso entre três ou mais pessoas, cria para estas uma situação de perigo imediato à integridade corporal ou a saúde. Existe a situação de perigo mencionada, quando os rixantes lutam confusamente entre si, empregando vias de fato, ou outros meios quaisquer, como pedradas, tiros etc., que ponham em risco a integridade corporal ou a saúde tanto dos contendores como de outras pessoas que se encontrem no local ou longe, mas ao alcance dos instrumentos usados. Caracteriza-se a confusão pelo tumulto que se verifica e é demonstrada pela impossibilidade ou dificuldade de conhecer-se bem a ação de todos partícipes”. (Moraes, 1944 apud Greco, 2008, p.395-396).

 

Segundo Hungria, a rixa é conceituada como: “uma briga entre mais de duas pessoas, acompanhada de vias de fato ou violências recíprocas, pouco importando que se forme ex improviso ou ex propósito”. (Hungria apud Greco, 2008, p.395).

Mediante esse conceito supracitado é analisado a consumação e a tentativa no crime de rixa, pelo que para alguns doutrinadores a tentativa é admissível na hipótese de rixa ex proposito ou preordenada, isto é, a rixa previamente planejada, uma vez que nela há um iter criminis a ser fracionado. (Jesus apud Capez, 2000, p.270). Para outros a rixa se consuma instantaneamente com o ingresso dos contendores. Não sendo possível a sua tentativa. (Cabette, 2012, p.88).

Enfim, na rixa ex improviso é impossível a tentativa. No entanto, na rixa ex proposito, naquela que é previamente combinada, em tese, até se pode admitir a tentativa, ainda que, seja de difícil configuração. (Bitencourt, 2011, p.769). Nisso entende-se que na forma preordenada se admite a tentativa, mas na forma que acontece sem planejamento, subitamente, não.

O Bem jurídico tutelado é a integridade física e mental da pessoa humana bem como a ordem pública. Bitencourt fala que “apesar de a rixa ameaçar e perturbar a ordem e a paz pública, não são esses os bens jurídicos protegidos ou, pelo menos, não são predominantes na fundamentação da criação do crime de rixa” (Bitencourt, 2012. p.759), pois visa-se proteger também a saúde fisiopsiquíca.  

A vida e a incolumidade física e mental, bem como, de forma mediata, a ordem pública. É o que diz a Exposição de Motivos do Código Penal “a ratio essendi da incriminação é dupla: a rixa concretiza um perigo à incolumidade pessoal (e nisto se assemelha aos ‘crimes de perigo contra a vida e a saúde’) e é uma perturbação da ordem e disciplina da convivência civil”. (Capez, 2012, p.267).

 

Tutelam-se a incolumidade da pessoa e a ordem pública por via indireta. “É importante salientar que o crime de rixa tem certo caráter subsidiário, isso no sentido de evitar a impunidade em casos nos quais fique difícil determinar a autoria das lesões em meio a uma confusão, evitando com o dispositivo a total impunidade”. (Cabette, 2012, p.87).

O sujeito ativo torna-se também o sujeito passivo, pois a partir do momento em que ele agride, ele também é agredido. Pode, ainda, ocorrer de um terceiro ser sujeito passivo, pois o tal pode ser atingido no momento em que passa pelo local da briga. O crime de rixa trata-se, ainda, de um crime de concurso necessário ou plurissubjetivo, pelo que é caracterizado com a necessária participação de no mínimo três pessoas na briga independe de ser menor de idade ou não.

Os participantes da rixa são ao mesmo tempo sujeitos ativos e passivos, uns em relação aos outros: rixa é crime plurissubjetivo, recíproco, que exige a participação de, no mínimo, três contendores, no Direito pátrio, ainda que alguns sejam menores.

No entanto, ninguém pode ser, ao mesmo tempo, sujeito ativo e passivo do crime de sua própria conduta. Na realidade, o rixoso é sujeito ativo da conduta que pratica em relação aos demais e sujeito passivo das condutas praticadas pelos demais rixosos. Os rixosos agem uns contra os outros; por isso esse misto de sujeito ativo-passivo do mesmo crime. (Bitencourt, 2012, p.760).

 

Seguindo esse paradigma de conceituação e caracterização do crime de rixa Greco realiza de uma forma bem sintetizada algumas contribuições que são bastante relevantes para um entendimento mais claro no que diz respeito ao crime de rixa:

Crime comum com relação ao sujeito ativo, bem como quanto ao sujeito passivo; de perigo concreto (pois que a participação na rixa importa numa efetiva criação de risco para a vida e para a saúde das pessoas); doloso; de forma livre; comissivo e, caso o agente goze do status de garantidor, também omissivo impróprio; instantâneo; plurissubjetivo, havendo necessidade, para fins de sua configuração, da presença de, pelo menos, três pessoas, sendo que as condutas são consideradas contrapostas, vale dizer, umas contras as outras; plurissubsistente (uma vez que se pode fracionar o iter criminis); não transeunte, como regra, pois que as lesões corporais sofridas pelos contendores podem ser comprovadas mediante exame pericial. (Greco, 2008, p.398).

                   No que diz respeito à legítima defesa entende-se pela maioria da doutrina que é possível, pois o sujeito pode não está envolvido nesse crime, nessa briga, entretanto realiza atos para se defender de algumas possíveis agressões que venham a lesar sua integridade física:

Igualmente pode alegar legítima defesa quem estava no local no momento em que a luta se iniciou e nela não adentrou, porém, teve de se defender no instante em que os briguentos dela se aproximaram desferindo chutes e socos. É evidente que quem entra na luta apenas para separar os contendores e acaba se defendendo de um ou outro gesto agressivo está em situação de legítima defesa. (Gonçalves, 2011, p.228).

 

A ação penal é pública incondicionada sendo desnecessária qualquer condição de procedibilidade para instaurá-la ou, no caso da autoridade policial, para iniciar as investigações, de competência do Juizado Especial Criminal, mesmo na modalidade qualificada[5].  

“No caso de rixa qualificada pelo evento morte, a competência ainda é do juízo singular e não do Tribunal Popular do Júri. Caso, entretanto, determinada a autoria da morte dolosa, a competência será do Tribunal Popular do Júri que julgará a rixa (simples ou qualificada) como também o crime doloso contra a vida” [6].

Aparentemente o crime de rixa em seu caso concreto pode parecer raro, o que, entretanto, não é verdade, pelo que há inúmeros casos de condenação em nosso sistema judiciário.

São esclarecedores os seguintes julgados: “Conceitua-se a rixa como sendo lutas que surgem inopinadamente envolvendo várias pessoas que, voluntariamente, adentram no palco dos acontecimentos para o que der e vier, figurando como agressoras e agredidas ao mesmo tempo” (Tacrim-SP — Rel. Silva Pinto — Jutacrim 87/434); “O delito de rixa caracteriza-se pela confusão ou tumulto e pela participação de vários contendores, sem que se possa saber a atuação hostil de cada participante.

“Assim, encontrando-se determinada a posição de cada agente, não há falar-se na infração” (Tacrim — Rel. Castro Duarte — Jutacrim 52/266); “Tipifica o delito de rixa a participação no conflito sem o objetivo de separar os contendores, sendo irrelevante que não tenha sido definida exatamente a autoria das lesões” (Tacrim-SP — Rel. Manoel Pedro — Jutacrim 13/373) (Gonçalves, 2011, p.227).

 

3.- Formas do crime de rixa

 

3.1- Rixa simples

 

A rixa simples é aquela prevista no caput do art. 137 do CP, cuja pena é de quinze dias a dois meses ou multa, ou seja, a mera agressão desenvolvida entre os rixosos, desde que não haja lesões corporais de natureza grave ou morte. Assim com o simples fato de participar o agente já está enquadrado em uma prática delituosa, pois a ação nuclear do tipo penal salienta sobre a participação, ou seja, “participar”, seja no início das agressões ou até mesmo quando adentra no final destas, isso não importa o que é o caracterizador é a ação verbal, participar.

O crime de rixa é um crime de menor potencial ofensivo, pelo que a pena para a rixa simples também é caracterizada por pena alternativa podendo ir de quinze dias a dois meses ou multa.

 

3.2 – Rixa qualificada

 

A rixa qualificada está prevista no parágrafo único do art. 137 do CP, com cominação de pena de seis meses a dois anos. Quando, de tais agressões, resultar lesão corporal grave ou morte será qualificado o crime de rixa. Como relata Bittencourt: “Na verdade, há uma duplicidade subjetiva do agente, isto é, age com duplo dolo, qual seja, o de participar na rixa e o de causar a lesão grave ou a morte de alguém”. (Bittencourt, 2011, p.765). Daí que se resultar lesão corporal de natureza grave todos envolvidos responderão pela qualificadora do crime, até mesmo o que foi lesionado gravemente. Se for identificado o autor da lesão de natureza grave, este responderá pelo crime de rixa qualificado e pelo crime de lesão corporal de natureza grave ou se resultar morte, homicídio.

Em tese, eventuais delitos praticados durante uma rixa constituem crimes autônomos, ocorrendo concurso material. Evidentemente, a imputação subjetiva da morte apenas pode ser feita ao autor, se este estiver identificado. Se, além de ter participado em uma rixa, foi identificado como o autor do homicídio, está caracterizado o desdobramento volitivo do agente, sendo caso de concurso material (MIRABETE, 1998, p 151).

 

Diante dessas afirmações surgem algumas teorias que discutem as consequências da rixa qualificada, como a: Teoria da Solidariedade Absoluta que relata que todos os agressores que participaram da rixa a qual resultou em uma lesão corporal de natureza grave ou morte, responderão por lesão grave ou homicídio, não importando se se chegar a quem foi o autor dessa conduta típica.

Teoria da Cumplicidade Correspectiva: quando não é possível se chegar ao autor do resultado que originou a lesão grave ou a morte, todos os rixosos responderão pela rixa qualificada, diferenciando apenas na cominação de pena, pena inferior a do autor e inferior a que caberia ao partícipe do evento mais grave.

Teoria da autonomia: a rixa é um crime autônomo, independente do resultado. O resultado mais grave servirá para qualificar tal conduta. Sendo o causador da lesão grave ou morte, se identificado, responderá pelos crimes de rixa qualificada e lesão corporal grave/ homicídio. O atual Código Penal não recepcionou as teorias da solidariedade absoluta e da cumplicidade correspectiva, mas adotou a teoria da autonomia.

 

3.2.1. Divergências doutrinárias no crime de rixa qualificada

Nessa perspectiva desenvolveram-se duas correntes de maneira opostas em suas interpretações referentes à qualificadora e o concurso de crimes de lesão corporal grave e morte. A primeira corrente, diz que: se A, B, C e D estão em uma rixa e ocorre morte de um dos envolvidos e “C” é o autor, “C” responderá por rixa qualificada em concurso material com o crime de homicídio. A segunda corrente, diz: “C” responderá por rixa simples em concurso material com homicídio, pelo que se evitará “bis in idem”.

A primeira corrente argumenta que haverá concurso material entre a participação em rixa na forma qualificada com o delito de homicídio ou de lesão corporal grave, em razão de que não há bis in idem, pois o agente, pela participação no crime em sua forma qualificada, responde pela participação e não pelo resultado provocado (Bitencourt, 2003: 319, 323; Mirabete, 1998: 150; Bruno, 1979: 260, Capez, 2005: 226)[7].

Seguindo mais a frente, ainda há questionamentos no que diz respeito ao momento do ingresso e saída do participante da rixa e os resultados decorrentes dessas ações:

a) Se um indivíduo participa de uma rixa e em dado momento vai embora, sendo que após sua saída ocorre lesão grave ou morte de alguém, ele responde pela qualificadora?

A resposta é positiva, pois sua participação teve alguma contribuição, ainda que indireta, no resultado.

b) E no caso do indivíduo que ingressa numa rixa depois de ocorridos os resultados lesão grave ou morte, não havendo outros a partir de seu ingresso?

Neste caso ele responde por rixa simples, vez que não há nexo causal entre a sua atuação e tais eventos gravosos.

No caso das qualificadoras não importa se ocorre apenas uma morte ou lesão grave ou várias. Há apenas uma rixa qualificada, devendo-se analisar essas circunstâncias na dosimetria da pena nos termos do art. 59, CP.

Ainda que a morte ou lesão grave tenha resultado de atuação em legítima defesa, por exemplo, de alguém que apenas passava pelo local e foi colhido pelo entrevero ou de alguém que somente separava os contendores, a rixa é qualificada. (Cabette, 2012, p.89).

 

4. – As responsabilidades dos agentes

                                              

4.1. Autor e partícipe

 

A conduta é tipificada pelo simples fato do sujeito participar da rixa, praticando agressões físicas contra outras pessoas. Não importando se tal pessoa chegou depois de iniciada à confusão ou se deixou a mesma bem antes de terminar o tumulto. O que é caracterizado é a participação, participou mesmo que com atos considerados pequenos, já cometeu o crime de rixa.

O código penal isenta aquele que ingressa na rixa para separar os rixosos, este não responde pelo crime de rixa, pois entrou na briga para conter os ânimos. Mas, se o indivíduo que ingressa em uma briga generalizada para separar os agressores e posteriormente acaba participando das agressões, responde naturalmente pelo crime. Essa Participação na rixa implica em ação física, mas não necessariamente em contato físico entre as pessoas, pelo que as mesmas podem se agredir com pedradas, garrafadas, pauladas ou com outros tantos objetos que podem ser utilizados para atingir alguém nesse tipo de crime.

Já o partícipe é identificado pelo que Prado coloca: “o sujeito não tem a finalidade característica do autor, restringindo-se a colaborar, contribuir, com atividades secundárias e complementares na conduta delitiva do autor” (Prado, 2010, p.181).

“A velha doutrina, por vezes, procurava distinguir “participação na rixa” e “participação no crime de rixa”: na primeira hipótese, há interferência pessoal na rixa, o ingresso efetivo no conflito; na segunda, há o concurso, material ou moral para a rixa, sem, contudo, a intervenção direta nesta”. (Hungria apud Bittencourt. 764).

 

Heleno Fragoso segue nessa mesma linha, pois distingue entre “participar da rixa (autor do crime de rixa) e participar do crime de rixa (partícipe do crime de rixa)”. (Fragoso, 1977, p. 191 apud Cabette, 2012, p. 87). Em qualquer hipótese a responsabilização penal é a mesma descrita no art. 137 do código penal.

A participação do crime de rixa pode ser material, quando o agente se envolve na luta, de forma que auxilia alguém, fornecendo armas ou qualquer outro objeto que possa ser utilizado por um dos rixosos ou moral quando o agente não é parte na luta, entretanto induz ou instiga outros a participarem do crime.

O crime de rixa é um crime de concurso necessário, ou seja, a norma incriminadora, no seu preceito primário, reclama como conditio sine qua non do tipo a existência de pelo menos três autores. A coautoria é obrigatória, podendo haver ou não a participação de terceiros. Assim, tal espécie de concurso reclama sempre a coautoria, mas a participação pode ou não ocorrer, sendo, portanto, eventual. Na rixa, dessa forma, além dos três agentes, ou mais, pode ainda terceiro concorrer para o crime, na qualidade de partícipe, criando intrigas, alimentando animosidades entre os rixentos ou fornecendo-lhes armas para a refrega. (Capez, 2012, p.268).

 

                   Seguindo essa linha de raciocínio Gonçalves coloca de maneira bem precisa as condutas típicas de cada agente nesse crime:

A conduta típica é “participar de rixa”, que significa tomar parte na troca de agressões desferindo chutes, socos, pauladas etc.

A doutrina costuma fazer uma distinção, esclarecendo que a participação pode ser:

a) Material — por parte daqueles que realmente integram a luta. Estes são autores do crime. Na rixa devem existir pelo menos três pessoas nessa situação.

b) Moral — por parte daqueles que incentivam os demais a tomarem parte no evento por meio de induzimento, instigação ou qualquer outra forma de estímulo. O partícipe moral, todavia, deve ser, no mínimo, a quarta pessoa, já que a tipificação do crime exige pelo menos três na efetiva troca de agressões.

Na primeira hipótese, o agente é chamado de partícipe da rixa e, na segunda, de partícipe do crime de rixa. (Gonçalves, 2011, p.227-228).

 

4.2. – Da responsabilidade subjetiva e objetiva no crime de rixa

Rixa simples, art. 137, caput, CP, é caracterizada pelo seu elemento subjetivo, pelo que seu delito é punido por dolo, pois está presente o animus rixandi, ou seja, a vontade de participar da rixa. Seguindo, assim, nesse paradigma há a convergência para a regra do Código Penal que no seu art. 19 consagra a responsabilidade penal subjetiva. A responsabilidade penal subjetiva está baseada no princípio da culpabilidade, este um dos principais princípios do Direito Penal, pois salienta que não há crime sem culpa, ou seja, para que haja crime é necessário que o agente aja com dolo ou culpa (negligência, imperícia ou imprudência).

O elemento subjetivo desse crime é o dolo, representado pela vontade e consciência de participar da rixa, isto é, consiste no conhecimento de que se trata de uma rixa e na vontade consciente de participar dela. A rixa simulada não constitui crime, pela ausência do animus rixandi, ainda que dessa simulação sobrevenha lesão corporal grave ou a morte de alguém. Nessa hipótese, os autores deverão responder por lesões corporais ou homicídio, conforme o caso, na modalidade culposa. (Bitencourt, 2011, p.767).

 

Nesse crime o tipo subjetivo é caracterizado pelo chamado dolo de perigo. Pouco importa o motivo pelo qual se chegou à rixa. Não há rixa culposa, pelo que por isso não se configura tipo penal a chamada rixa simulada, pois não há uma vontade de agredir e sim o chamado animus jocandi.

Entretanto, existem doutrinadores que entendem que há no crime de rixa em sua forma qualificada, a responsabilidade penal objetiva:

Nos casos em que alguém seja punido sem ter atuado com dolo, ou pelo menos com culpa, ou sem culpabilidade, tem-se a denominada responsabilidade objetiva, para a qual basta a simples ocorrência de um fato ou resultado perturbador ou lesivo a bens jurídicos para que se responsabilize o agente causador. (Capez, 2011, p. 327).

 

Alguns entendem que quando é analisado o crime de rixa na sua forma qualificadora ocorre a chamada responsabilidade penal objetiva, pois todos os participantes das agressões responderão pela qualificadora independente se identificada a autoria ou não do homicídio ou da lesão corporal grave, mesmo que algum dos rixosos tenha saído da briga antes de ocorrer uma morte ou uma lesão corporal de natureza grave, ainda assim, responderá pelo crime de rixa qualificado.

Diante do que está colocado questiona-se a respeito dessa qualificadora em detrimento da responsabilidade penal objetiva, pelo que alguns doutrinadores afirmam que a rixa qualificada aplicada dessa forma nada mais é do que um resquício de responsabilidade penal objetiva, sendo assim, será inconstitucional.

Nesse diapasão Cabette contribui para o entendimento, pois nos diz que: “Ainda que a morte ou lesão grave tenha resultado de atuação em legítima defesa, por exemplo, de alguém que apenas passava pelo local e foi colhido pelo entrevero ou de alguém que somente separava os contendores, a rixa é qualificada”. (Cabette, 2012, p.89).

Isso porque todos os rixosos, pelo simples fato de participar da rixa, serão enquadrados na qualificadora quando ocorrer lesão grave ou morte, pouco importando qual deles foi o responsável pelo resultado qualificador.

Entretanto, há vários questionamentos em relação ao assunto exposto surgindo vários debates que de alguma forma contribuem de maneira positiva para a evolução do Direito Penal.  Dessa forma a pergunta continua, tal imputação constituiria responsabilidade penal objetiva? Nélson Hungria nos fala que não, pois:

“todos os participantes quiseram a rixa, isto é, o fato que, segundo id quod plerumque accidit, podia ser, como realmente foi, causa de crimes de sangue. Cada um dos corrixantes incorre na pena especialmente majorada porque contribuiu para criar e fomentar a situação de perigo, de que era previsível resultasse o evento morte ou lesão corporal grave. Nenhum deles, portanto, responde pelas consequências que não produziu, mas pelas consequências não imprevisíveis de uma situação ilícita, a que consciente e voluntariamente prestou sua cota de causalidade. (Hungria apud Capez, 2011, p.272).

 

Assim, nesse panorama entende-se que a responsabilidade penal que é atribuída ao crime de rixa não é a responsabilidade penal objetiva, onde esta não é admitida no ordenamento jurídico penal pátrio; e sim, a responsabilidade penal que é identificada no crime de rixa é a responsabilidade penal subjetiva, estando dessa maneira em conformidade com o sistema penal vigente no país.  

 

Considerações Finais

                 O crime de rixa tipificado no Código Penal visa penalizar todos os agentes envolvidos em tumultos seguidos de agressões mútuas que venham de certa forma, atingir não só a incolumidade física e psíquica dos envolvidos e de possíveis terceiros como também a ordem pública.

                   O crime de rixa, portanto, em sua caracterização geral é um crime comum no que diz respeito ao sujeito ativo e passivo, pois qualquer pessoa pode ser enquadrada em qualquer um desses polos; crime de perigo concreto; doloso em seu tipo subjetivo, pois não há em sua forma culposa; de forma livre; plurissubjetivo, havendo necessidade, para fins de sua configuração, da presença de, pelo menos, três pessoas e plurissubsistente.

As divergências doutrinárias surgem em pelo menos dois pontos cruciais no crime de rixa: primeiro na aplicação da pena quando da rixa resulta lesão corporal grave ou morte, e a discussão é: aplica-se rixa qualificada em concurso material com o crime de homicídio ou de lesão corporal de natureza grave? Ou aplica-se rixa simples em concurso material com o crime de homicídio ou o de lesão corporal grave? A doutrina majoritária e a jurisprudência têm adotado a primeira.

O Segundo embate leva em consideração a responsabilidade penal do agente nesse tipo penal: Para uns a responsabilidade penal é subjetiva, já para outros a responsabilidade penal é objetiva, sendo que o que prevalece nos tribunais é que a responsabilidade penal é subjetiva, pois se coaduna com o Princípio da Culpabilidade adotado no sistema penal brasileiro.

 

Referencias

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Gomes, Luiz Flávio. Direito Penal: Parte Geral, volume 2, Editora Revista dos Tribunais. 2007

 

Gonçalves, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado: parte especial / Victor

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GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte especial. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. V.2

 

MIRABETE, Júlio Fabbrini, Manual de Direito Penal, v 2, 14ª ed, São Paulo: Atlas.

 

PRADO, Luis Régis. Curso de Direito Penal brasileiro v. 2. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

 

Siqueira, Julio Pinheiro Faro Homem de. &  Teixeira, Bruno Costa.  Considerações sobre a disciplina do crime de participação em rixa no Código Penal brasileiro, 2007.

Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/9448/consideracoes-sobre-a-disciplina-do-crime-de-participacao-em-rixa-no-codigo-penal-brasileiro#ixzz2zYeGOQqC>. Acesso em 10 de Abril de 2014.

 

 

[1] Artigo apresentado à disciplina de Direito Penal Parte Especial I, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

[2] Alunos do 4º Período, do Curso de Direito, da UNDB.

[3] Professor Esp., orientador.

[4] Decreto-Lei nº. 2.848, de 07.12.1940. Código Penal.

[5] http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/anexos/10861-10861-1-PB.htm

[6] Idem.

[7]http://jus.com.br/artigos/9448/consideracoes-sobre-a-disciplina-do-crime-de-participacao-em-rixa-no-codigo-penal-brasileiro.