CONTRA FOTOS, NÃO HÁ ARGUMENTOS: introdução à história do fotojornalismo  

 

Matheus Marques dos Santos*

Andrea Teresa Martins Lobato**

 

RESUMO

 

Este artigo teve como objetivo dissertar acerca do fotojornalismo, abordando seus aspectos históricos, trazendo diferentes pontos de vistas e técnicos à respeito da sua evolução e da relevância nos diferentes períodos culturais. Além disso, almeja-se avaliar o papel relevante da fotografia nesse contexto, visto que, a descoberta do uso da fotografia em jornais trouxe diferentes discursões à respeito da seriedade que traria à notícia, se esta se encaixaria nos aspectos culturais e se pode ser equiparada à reportagem escrita, uma vez que, considera-se que a fotografia traz consigo um rico acervo normativo, mesmo não contendo nenhuma palavra. Utilizou-se uma pesquisa bibliográfica, baseando-se em teses abordadas em livros e artigos científicos.

Palavras-chave: Fotojornalismo. Fotografia. Aspectos históricos.


ABSTRACT 

 

This article aimed to discourse about photojournalism, dealing with historical aspects, bringing different view points and techniques to respect its evolution and relevance over different cultural periods. Moreover, it lusts after to evaluate the relevant role of photography in this context since the discovery of newsletter photography brought different discourses about the seriousness that would bring to the news if this would fit in the cultural aspects and if it could be equited to the written materials once it’s considered that photography brings normative archive even though there wouldn’t be one word. In all such studies, literature search was utilized on the basis of approached themes of scientific books and articles.

Key words: Photojournalism. Photography. Historical Aspects.


  • INTRODUÇÃO

 

Por definição, fotojornalismo é, essencialmente, um gênero de jornalismo, no qual a fotografia é principal veículo de informação. A mistura desses dois conhecimentos, resultou em uma necessidade de se demonstrar a realidade dos fatos de uma forma mais específica, e não somente mais através de textos, desenhos ou pinturas.

Antes de se descobrir a fotografia, os jornais já faziam uso de imagens ilustradas através de desenhos e pinturas, porém, houve o desejo de representar o “real” através das imagens capturadas através das câmeras.

Ocorre que no início, a fotografia não foi bem recebida. Conforme se abordará neste artigo, a rejeição decorreu em virtude de muitos editores e jornalistas da época (início do século XX) acreditarem que a fotografia não se encaixava na cultura e no modo artístico da sociedade.

Passando por inúmeros processos de desenvolvimento, ao fotojornalismo foram incorporadas melhorias, através dos avanços tecnológicos e do uso da fotografia em outras vertentes. Além disso, o aperfeiçoamento das câmeras e o entendimento a respeito das técnicas de fotografia, fez aguçar nos fotojornalistas o desejo e a competição da melhor imagem. E assim, deu-se início a uma corrida nas editoras. Além da melhor imagem, era necessário também, ter-se uma foto inédita.

Assim, no presente artigo, aborda-se, no primeiro ponto, trata-se, essencialmente, da fotografia, abrangendo também aspectos históricos, que vão esclarecer a história do fotojornalismo, uma vez que, é o seu principal meio de veiculação.

A partir do segundo ponto, a historicidade do fotojornalismo, retratando o seu início, a descoberta e a utilização da fotografia por jornais ao noticiar diversos acontecimentos. Trazer à tona os aspectos históricos, é de suma importância para a compreensão do desenvolvimento do fotojornalismo.

No último ponto, aborda-se um tema relevante a respeito do profissional da fotografia, incluindo ademais os principais pontos da arte de fotografar, tais como os ensinamentos básicos para todo iniciante se tornar um profissional. Assim, tenta-se enfatizar a importância desse profissional, que, em alguns casos, passa a ser desvalorizado devido aos avanços tecnológicos que propiciaram a captura da imagem por todos, ainda que de forma eminentemente amadorística. Porém, frisa-se que, para uma boa imagem é necessário compreender a técnica, e não somente, o clicar de um equipamento.

Diante do exposto, pretende-se lançar um olhar a respeito da importância da fotografia para o jornalismo, além de tratar de seus pontos técnicos e a relevância de um profissional para essa área. Na forma de identificar a conexão desses elementos, adotaremos como base metodológica a pesquisa bibliográfica.





2. ASPECTOS METODOLÓGICOS

 

Esta pesquisa será fundamentada baseando-se em livros e artigos científicos, por este motivo é que se utilizou o procedimento bibliográfico, pois segundo Gil (2002, p.55), “a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos”.

Primeiramente, abordaremos sobre o fotojornalismo, acerca dos aspectos históricos: descoberta do uso de imagens, o início da sua utilização em jornais, a ruptura do realismo e a chegada do fotojornalismo no Brasil; além dos aspectos teóricos e técnicos: teorias acerca do fotojornalismo, o poder da imagem e a o uso dessas no cenário informativo.

Quantos aos aspectos históricos, observou-se uma dualidade acerca das indagações a respeito do uso da fotografia nos jornais e revistas. E isso dava-se pelo fato de que, grande parte da burguesia, no século XX, não considerava a fotografia como uma arte, por ser mera repetição do real (BUITONI, p. 47, 2011). E assim, em consonância, expõem Helouise Costa e Renato Rodrigues da Silva, “a primeira vez que uma fotografia apareceu publicada na imprensa [...] provocou uma revolução nos meios de comunicação existentes.” (COSTA; SILVA, 2004, p. 98)

 

3. REVISÃO DE LITERATURA 


3. 1 A RELEVÂNCIA DA FOTOGRAFIA: DESDE O SEU SURGIMENTO ATÉ OS DIAS ATUAIS


  • Existem diferentes padrões estabelecidos na indústria da informação, operando cada um com um regime próprio de visibilidade (BUITONI, 2011, p. 85). Dessa forma, mesmo que houvesse padrões pré-estabelecidos, referentes ao domínio instrumental do profissional fotográfico, percebemos que cada um se apresenta de forma diferente, trazendo ao contexto jornalístico uma fala diferente através das suas imagens, tornando-a relevante.

Isso ocorre desde há muito tempo. Porém, nem sempre as imagens capturadas pelas câmeras eram bem aceitas pelos jornalistas, uma vez que acreditavam que ela não transmitia ao leitor uma informação e também não representava a realidade dos fatos. Quando a fotografia surgiu no século XIX, trouxe consigo um cenário invulgar, marcado por opiniões diversas acerca do que ela representava, e se realmente poderia ser considerada como uma arte. Nessa ocasião, ainda predominavam nos jornais da época as pinturas feitas pelos artistas, na tentativa de representação dos fatos narrados (SOUSA, p. 13, 2002).

No século XX, a fotografia passou a ser utilizada em grande escala pela imprensa mundial. A fotografia para o jornalismo tornou-se uma grande “revolução”, uma vez que se podia transmitir uma imagem conforme o acontecimento e, no decorrer de seus desenvolvimentos, dispensando até mesmo uma descrição normativa do acontecimento (SOUSA, p. 13-14, 2002).

“A imagem representada, isto é, inscrita em um suporte de veiculação está diretamente relacionada aos conceitos representativos que são próprios daquele suporte” (B UITONI, p. 155, 2011). Sendo assim, ao utilizar a fotografia para retratar um acontecimento, busca-se demonstrar o real acontecimento dos fatos. Por isso, é válido o que é dito pelo senso comum: “uma imagem vale mais do que mil palavras”, pois a imagem não demonstra somente a realidade de um fato, ela rompe essa ideia de “reflexo”, trazendo aos receptores desta fotografia, não somente a informação de um fato, mas indagações, e, posteriormente, opiniões acerca do tema abordado;

Nesse contexto, o homem passou a tentar sistematicamente aumentar o grau de veracidade dos fatos e das representações do “real”, e então, surgiu a necessidade de se utilizar a máquina, para alcançar esse objetivo, dando espaço ao nascimento da fotografia:

A utilização da máquina como mediadora dessa tarefa marcou o aparecimento da fotografia e favoreceu a realização de seu propósito, de maneira até então nunca imaginada, uma vez que na sociedade capitalista do século XIX a máquina era sinônimo de imparcialidade e precisão cientifica. Acreditava-se que a fotografia determinava a alienação total do homem do processo de representação. Era como se o aparelho fotográfico possibilitasse à natureza se auto-representar. O aparelho, portanto, adaptou a perspectiva à sociedade moderna. (COSTA; SILVA, 2004, p. 17)


Contudo, observa-se que a invenção da fotografia foi um alvoroço ideológico. Ao mesmo tempo que representava uma inovação, apresentava-se também como uma mera repetição daquilo que era real, uma arte de “linguagem fria e direta” (COSTA; SILVA, 2004, p. 18). Acerca disso, expõe-se que:

Em todas as épocas, a fotografia serviu para assegurar validade e legitimidade ao real, ao mesmo tempo em que alguns fotógrafos ou pensadores a usavam para questionar o efeito da verdade. Muitos fotógrafos e artistas trabalham em uma linha de inventar a realidade que será fotografada, como o espanhol Joan Fonctuberta, que criou vários projetos em diálogo com a ciência ou o jornalismo. (BUITONI, 2011, p. 49).


No Brasil a fotografia também enfrentou essas duas realidades, pois ainda predominava o uso de desenhos para as representações das histórias, tornando dificultoso o uso das próprias imagens nos jornais, bem como expõe:

Quando a fotografia começou a aparecer na imprensa, as técnicas de gravura ainda gozavam de muito prestígio juntos aos leitores de jornais [...] Paradoxalmente, as pessoas acreditam mais no real desenhado in loco, do que no registro mecânico da fotografia [...] Apesar da possibilidade técnica de reprodução fotomecânica a meio-tom, sua adoção foi relativamente lenta, pois os leitores preferiam processos de gravura feito à mão. (BUITONI, 2011, p. 68).


Mesmo em meio a essa lentidão, no que diz respeito à inserção da fotografia na sociedade brasileira, em 1840, utilizaram-se pela primeira vez, por intermédio de Dom Pedro II, fotos como documentos, o que representou um passo ao modernismo. Em seguida, os primeiros registros foram cenas urbanas da cidade de São Paulo e o início das construções das ferrovias. (OLIVEIRA, VINCENTINI, p. 33, 2009)

[...] Cada inovação tecnológica da fotografia também produziu embates e alterações desde a matriz do índice até as sucessivas visualizações dos produtos difundidos pelos meios de comunicação e/ou arquivados ou contemplados em consumo privado. Uma indagação possível é sobre o que transforma uma foto comum em jornalística. Seriam as intenções que direcionaram a captura da imagem? Uma foto de família pode vir a ser uma foto jornalística? Que usos sociais legitimam essa qualificação? (BUITONI, p. 56, 2011)


A força e a vulnerabilidade da imagem fotográfica são marcadas por essa proximidade com a realidade (BUITONI apud ROUILLÉ, p.47, 2011). Nos jornais, por exemplo, preferiam-se os desenhos descritivos à própria fotografia, por isso que muitas vezes esta servia apenas como suporte para o desenho. Acerca disso, aponta-se:

A fotografia não substitui tão fácil e rapidamente o desenho na imprensa. Há relatos que durante um bom tempo nos jornais europeus, a fotografia servia de modelo para o gravurista e de que o público atribuía mais credibilidade ao desenho do que à foto. Mesmo no século de grande aceitação da ciência – e a invenção da fotografia está relacionada ao desenvolvimento científico- esta é uma situação em que a nova tecnologia não suplantou de imediato a anterior. [...] No Brasil, o clima não foi diferente. Apesar da grande difusão da fotografia, muitas publicações preferiam os desenhos descritivos. (BUITONI, p. 50, 2011)


Dessa forma, observa-se que a fotografia passou por um longo processo de inserção, até se tornar o “procedimento técnico-expressivo mais determinante do conteúdo visual da imprensa” (BUITONI, p. 53, 2011). Dessa maneira, o uso da imagem fotográfica ajudou na interpretação e no esclarecimento dos fatos para os leitores, pois não se discutia muito sobre a qualidade da foto, pois a simples representação do real supria as expectativas daqueles destinatários. (BUITONI, p. 52, 2011).

Contudo, quanto à representação da realidade, a fotografia traz à tona um objeto muito importante para a sua formação: o tempo. Por esse viés,

A fotografia transmite a seu espectador o tempo do acontecimento luminoso do que é registrado. O dispositivo cuida de assegurar essa sensação. Muitas reflexões de fotógrafos sobre fotografia recaem sobre essa inclusão do tempo na foto. A famosa fórmula de Cartier-Bresson, que define a (boa) fotografia como o encontro do instante e da geometria, pode ser ampliada a toda fotografia documental. (BUITONI, 2011, p. 48)


O tempo é fundamental para a gênese fotográfica, pois é capaz de congelar e embalsamar o passado. E assim, “essa vinculação temporal – em especial o instantâneo, espécie de congelamento de um plano-sequência imaginário- pode ser apontada como um elemento definidor de propriedades jornalísticas.” (BUITONI, 2011, p. 54). E assim:

A fotografia transmite a seu espectador o tempo do acontecimento luminoso do que é registrado. O dispositivo cuida de assegurar essa sensação. [...] O congelamento de um gesto de um jogador de futebol, por exemplo, percebemos que foi uma fração de segundo, pois os olhos não poderiam capturar o chute no ar dessa maneira. (BUITONI, p. 48, 2011)


Diante disso, observa-se que, desde o seu surgimento, fotografia tem um papel importante na disseminação de notícias, por retratar a realidade, não de uma forma descritiva, mas de uma forma reflexiva e real, apresentando o acontecimento, em uma imagem “congelada”, permitindo o estudo do fato e o conhecimento acerca do assunto à toda sociedade.


3.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DO FOTOJORNALISMO


O século XIX foi marcado por grandes transformações, sob a égide do sistema capitalista, das revoluções industriais e do avanço acelerado da economia. E nesse mesmo contexto, o jornalismo já exercia um papel fundamental na sociedade. Assim, o homem passou a tentar sistematicamente aumentar o grau de veracidade dos fatos e das representações do “real”, surgindo a necessidade de se utilizar a máquina, para alcançar esse objetivo, dando espaço ao nascimento da fotografia. (SOUSA, p.17, 2002)

Porém, apesar do potencial informativo das imagens publicadas nos jornais, os editores resistiram um certo tempo ao seu uso, pois não consideravam que trazia seriedade às notícias, além de acharem que e as fotografias não se enquadravam nas convenções e nas culturas jornalísticas da época (SOUSA apud HICKS, p. 13, 2019).

Em 1904, lançou-se o tabloide britânico chamado Dailly Mirror, que marcou uma mudança muito importante para o fotojornalismo, uma vez que nesse periódico as fotografias deixaram de ser usadas de forma secundária (servindo apenas para ilustrar o texto publicado) e passaram a ser definidas como uma categoria de conteúdo, equiparando-se à notícia escrita. Assim, iniciou-se uma competição entre as editoras, fato que trouxe ainda mais relevância ao uso da fotografia nos jornais, pois gerou uma necessidade e uma rapidez de obter uma imagem, que fosse única e inédita (SOUSA, 2002, p. 14).

Assim, vale também destacar, que em 1920 iniciou na Alemanha o que denominamos de fotojornalismo moderno. Devido ao grande investimento em arte, após a primeira Guerra Mundial, o reflexo na imprensa foi crucial para esse novo movimento. Assim, evidenciam-se cinco pontos que marcaram o desenvolvimento e a evolução do fotojornalismo:

1. Aparição de novos flashes e comercialização das câmaras de 35mm, sobretudo da Leica e da Ermanox, equipadas com lentes mais luminosas e filmes mais sensíveis. Segundo Hicks (1952), a facilidade de manuseamento das câmaras de pequeno formato encorajou a prática do foto-ensaio e a obtenção de sequências; 2. Emergência de uma geração de foto-repórteres bem formados, expeditos e, nalguns casos, com nível social elevado, o que lhes franqueava muitas portas; 3. Atitude experimental e de colaboração intensa entre fotojornalistas, editores e proprietários das revistas ilustradas, promovendo o aparecimento e difusão da candid photography (a fotografia não posada e não protocolar) e do foto-ensaio. As revistas ofereciam um bom produto a preço módico; 4. Inspiração no interesse humano. Floresce a ideia de que ao público não interessam somente as actividades e os acontecimentos em que estão envolvidas figuras-públicas, mas também a vida das pessoas comuns. As revistas alemãs começam, assim, a integrar reportagens da vida quotidiana, com as quais se identificava uma larga faixa do público, ansioso por imagens; 5. Ambiente cultural e suporte económico. (SOUSA, 2002, p. 18)


Devido a isso, pode-se dizer que, a fotografia passou a ser mais valorizada nesse contexto, no qual, até então, prevaleciam as pinturas como forma de ilustração. Assim, a fotografia passou a ser tão essencial, quanto o texto escrito. É válido dizer, que, na maioria das vezes, parafraseando um dizer popular, uma foto vale mais do que mil palavras.

Além da Alemanha, o fotojornalismo moderno também se afirmou na Europa e na América do Norte:

Enquanto essas transformações se davam no fotojornalismo europeu, nos Estados Unidos o fotojornalismo afirmava-se como vector integrante da imprensa moderna. Porém, se no Velho Continente o fio condutor do fotojornalismo, nas revistas ilustradas, envereda pela fotografia de autor e pelo foto-ensaio, nos Estados Unidos é nos jornais diários que se dão mudanças importantes para o futuro da actividade. Estas mudanças, à semelhança do caso europeu, afectarão todo o mundo. Acrescente-se, todavia, que na América surgem também fotojornalistas que cultivam abordagens próprias do real, como Weegee. E que é também na América que se desenvolve o projecto fotodocumental Farm Security Administration, altura em que o fotodocumentalismo alicerça o seu afastamento da ideia de que serve apenas para testemunhar, quebrando amarras, rotinas e convenções. (SOUSA, 2002, p. 19)


Percebe-se, com isso, que na década de 1920, que o fotojornalismo começa a ocupar um lugar fundamental no jornalismo, afirmando o seu lugar nesse contexto. Em 1933, quando Hitler assume o poder na Alemanha, o fotojornalismo nesse país começa a entrar em declínio, pois os profissionais começam a sofrer perseguições políticas, sendo obrigados a se exilar em outros países (MAIA, p. 5, 2012)

Porém, mesmo com isso, pode-se observar um papel muito relevante dos fotojornalistas na Segunda Guerra Mundial. Junto com as forças combatentes, também foram mobilizados muitos fotógrafos e jornalistas, que foram incumbidos da missão de noticiar as frentes civis e militares tanto dos aliados quanto do eixo (NETO, p.5, 2017):

As fotografias profissionais produzidas durante o conflito podem ser consideradas documento/representação, pois elas possuem realidades e ficções, conforme discute Boris Kossoy (2009). A partir das considerações feitas pelo autor, partimos do pressuposto que elas serviram, ao mesmo tempo, como registros de um contexto de guerra e de representação sobre o próprio conflito. Elas foram usadas de várias formas, como os cartões postais ou ilustrações de matérias em jornais e as revistas publicadas dentro e fora dos países em guerra. No seu conjunto, elas produziram narrativas visuais sobre o conflito, destacando aspectos do esforço de guerra escolhidos pelos seus responsáveis. (NETO, p. 8, 2017)


Diante do contexto de guerra, afirma-se, segundo Heloísa Sousa (p. 251, 2015), que o fotojornalismo e o jornalismo de guerra se desenvolveram quase paralelamente, pois os dois seguiam com o mesmo intuito: de que é necessário um profissional acompanhando todo o decorrer do conflito e retratar de forma fiel o que ocorre através das imagens. Ainda, se afirma, que o fotojornalismo se desenvolveu de forma mais proeminente nesses períodos de guerra, pois a “cobertura fotográfica é mais rápida, crível e sensibilizante do que qualquer relato de repórter ou informações frias impressas em um jornal” (SANTOS, p. 252, 2015).

Anos mais tardes, em 2016, o papel do fotojornalista nas coberturas de guerra, ainda continuava muito relevante. No segundo semestre deste mesmo ano, vários fotógrafos se deslocavam para o norte do Iraque, a fim de fotografar a luta pela libertação de Mosul e de outras cidades da Planície de Nínive, que se encontravam sob domínio do Estado Islâmico. Esses fotojornalistas continuam sendo os responsáveis pelas fotos comovente, que chocam o mundo e causam indignação em conflitos deste tipo (VEIT, 2017). É através do olhar e das técnicas por eles estudadas que o mundo se mantém informado à respeito do que acontece diante desses conflitos, onde poucos podem estar presentes, bem como expõe:

Gil Perez, um francês que vive em Nova York, Ele foi ao Irã na época em que os reféns americanos estavam presos na embaixada dos Estados Unidos em Teerã [...] Perez foi mostrar a vida do país e, no livro, colocou ao lado de suas fotos reproduções de mensagens de telex dizendo que precisava de mais filme, que tinha sido preso, mandado um alô para sua mãe - tudo para tornar evidente que estava, ali, como um correspondente estrangeiro. Ele fotografou coisas que a TV não estava mostrando e voltou do Irã com urna outra visão. The New York Times Magazine, que publicou suas fotos - seis páginas sob o título "Uma visão do Irã"-, talvez tenha usado pela primeira vez fotos como uma forma de mostrar um ponto de vista. (RITCHIN, p. 7, 2017, grifo nosso.)


O fluir histórico do fotojornalismo foi marcado por grandes evoluções, mas também por fortes banalizações do uso da fotografia, uma vez que foram desenvolvidas tecnologias que nos proporcionam com maior facilidade a captura da imagem. De todo modo, até os dias atuais ainda é muito utilizada para valorização e representação de textos em reportagens e documentários. (MAIA, p. 7, 2012)


  • A ARTE DE FOTOGRAFAR E A VALORIZAÇÃO DO PROFISSIONAL DA FOTOGRAFIA
  • Com o avanço da tecnologia, pode-se pensar que tirar uma fotografia é somente apertar o botão de um equipamento. Esse é somente um dos percursos da fotografia, pois, a princípio, é realmente necessário capturar uma imagem fotográfica a partir de um equipamento, na contemporaneidade, primordialmente digital.
  • Porém, a fotografia exige muito mais do que esse gesto de um fotógrafo, por isso, incentiva-se o aprendizado das técnicas. O primeiro ponto essencial para se obter uma boa fotografia é entender a respeito da sua composição. Assim, expõe Tom Ang (2007):
  • Composição não é só o modo como a imagem é enquadrada, mas também como a abertura da lente é utilizada a fim de controlar a profundidade de campo, como o foco comanda a atenção do observador e como a exposição determina o jogo de luz e sombra delineando a imagem. O iniciante, deve dedicar atenção à estrutura geral da cena, em vez de se concentrar em detalhes, por vezes de importância secundária. (ANG, 2007, p.12)


De todo modo, como exposto acima, pode-se afirmar que qualquer composição fotográfica funciona, porém é necessário um olhar técnico diante da imagem, para se entender o que deve ser evidenciado ou não, para que assim, se obtenha um resultado profissional, mesmo tratando-se de um iniciante atrás das lentes.

O segundo ponto tão importante quanto o primeiro, é entender a respeito da luz. Sabemos que, a fotografia é o processo de captura e registro da luz, assim compreende-se que:

As coisas são visíveis porque existem fontes de luz que projetam os raios luminosos sobre elas e a imagem iluminada é refletida. Esse reflexo poderá ter aparências distintas, dependendo da condição da fonte emissora, que é o instrumento gerador de luz [...] As fontes de luz podem trazer diferenças substanciais na cor, no contraste e na textura das fotografias, por isso, devemos conhecer suas características para tirar melhor proveito delas e não sermos surpreendido por efeitos desagradáveis, como a divergência cromática, por exemplo (PALACIN, 2012, p. 31-32)


Assim, de acordo com isso, pode-se perceber que esse ponto é crucial no momento da captura da imagem, pois dependendo da fonte de luz, havendo ausência ou o extremo, a fotografia pode ser completamente alterada, não permitindo que se obtenha o resultado desejado.

Além desses pontos já citados, há também a velocidade do obturador e abertura do diafragma que precisam ser verificados:

O obturador pode ser comparado às pálpebras e seu funcionamento é semelhante ao piscar dos olhos. Suas principais funções são: garantir os movimentos na cena e controlar a quantidade de luz. Com o diafragma, o obturador compõe uma das duas ferramentas mais importantes do ato fotográfico. Sua segunda função (controlar a quantidade de luz) é exatamente igual à segunda função do diafragma, ou seja, a função de equi- librar a quantidade de luz que atingirá o sensor, evitando fotos claras ou escuras demais. (PALACIN, 2012, p. 130)


Acrescente-se, também, o entendimento a respeito da abertura, quanto menor for a abertura se restringirá a luz que passa pela objetiva, alterando também a profundidade de campo. Por outro lado, quanto maior for a abertura do diafragma, maior será a capacidade de entrada de luz pela objetiva, resultando em uma imagem mais clara e com menor profundidade de campo (ANG, 2007, p. 18-19)

É válido também asseverar que, sem uma abertura estreita, fotografias à média distância tiradas com objetivas de grande distância focal, ficam com pequena profundidade de campo. E o cuidado com esta última, resultará em um nível de nitidez da imagem maior. E, assim, uma imagem pequena pode parecer ter grande profundidade de campo, mas conforme ampliada, mais se percebe a falta de nitidez, fazendo a profundidade de campo parecer menor. (ANG, 2007, p. 20).

Diante desse breve resumo sobre os pontos básicos da fotografia, percebe-se o quão técnico é ser fotógrafo, e que não é algo que possa ser desvalorizado devido aos aparelhos tecnológicos que propiciam essa experiência de fotografar amadoristicamente. Com base nisso, expõe-se:

Todas as fases evolutivas do fotojornalismo impulsionaram mudanças no exercício profissional. Nesse sentido, há duas perspectivas que devem ser analisadas, a primeira delas refere-se ao avanço científico, que resultou numa considerável melhoria tanto no ato de fotografar, como no resultado final da fotografia. A segunda perspectiva se dá no âmbito dos profissionais, que precisam se adequar às novas tecnologias, através da troca de equipamentos que se tornam obsoletos. Além disso, o fotógrafo necessita passar por uma renovação de seus conhecimentos, visando o domínio de uma nova linguagem, que permite exercer plenamente as possibilidades oferecidas pela nova tecnologia. (MAIA, 2012, p. 7)


Acerca disso, mais uma vez, frisa-se que, os avanços tecnológicos não devem trazer à tona uma desvalorização do profissional da fotografia, mas sim, expor uma realidade necessária: não basta apenas ter uma boa câmera ou outro aparelho que propicia a captura de boas imagens, mas é preciso a sua profissionalização, um estudo aprofundado das técnicas, para então, obter a materialização do que se planeja através da imagem (RITCHIN, p. 9, 2017).


4. CONSIDERAÇÕES FINAIS 


No decurso desse artigo, inicialmente, abordou-se como se iniciou a inserção do fotografia na sociedade, dissertando sobre o modo como os espectadores se posicionavam acerca dessa inovação. É certo que todo rompimento provoca diferentes posicionamentos, e com a nova forma de representar o real, não foi diferente. Toda sociedade estava diante da arte, da pintura e dos desenhos e, por isso, muitos se mostraram contra ou não valorizaram, no início, a fotografia. Durante todo o seu processo de inserção na sociedade, a fotografia enfrentou ideologias que não a consideravam arte, ou que a excluíam de ocupar o espaço de um texto no jornal. Porém, observa-se que, na evolução dos anos, desenvolveram-se novas técnicas, bem como ampliou-se o espaço da fotografia.

Em seguida, apresentou-se a evolução do fotojornalismo, as necessárias transformações, tanto no seu modo de apresentação nos jornais e revistas, como nas técnicas utilizadas para o alcance de imagens satisfatórias. Observou-se, também, que a inserção da fotografia no meio social, ocasionou diversas críticas e indagações. Dessa forma, por muito tempo, a fotografia dividiu um espaço significativo com os desenhos descritivos, pois para o público, era uma forma mais autêntica de representação de fatos.

Expôs-se sobre técnicas utilizadas pelos fotógrafos para captura de instantes, que ao nosso ver natural, são impossíveis de captar e, por isso, tratamos como fundamental a valorização do profissional da fotografia, pois não é somente a captura de uma imagem, mas envolve todo um arsenal, que é preciso de estudo e de grandes investimentos.

Diante disso, Dubois Phillips (1998), autor do livro O ato fotográfico e outros ensaios, expõe que a fotografia é um campo aberto e móvel, portanto é de suma importância poder se aprofundar na área do fotojornalismo e, assim, aprofundar-se nas teorias e compreender as técnicas. E por se tratar de um campo móvel (PHILLIPS, 1993), a linguagem do fotojornalismo é universalmente compreensível, dessa forma, as imagens obtidas por um fotojornalista são rapidamente compreendidas e sua metodologia torna-se automaticamente digna de confiança (RITCHIN, 1986).

O fotojornalismo é relevante socialmente, pois transfere a realidade de uma coisa para a sua reprodução (PHILLIPS, p. 80, 1993). Acerca disso, é certo afirmar: “Contra fotos, não há argumentos”, uma que por meio dela, a sociedade está face a face com a realidade, sem meios-termos e interpretações deturpadas.

 

REFERÊNCIAS 

ANG, Tom. Fotografia Digital: Uma introdução. 3ed. São Paulo: Editora Senac, 2007.

 

BUITONI, Dulcilia Schroedor,. Fotografia e jornalismo: a informação pela imagem. São Paulo: Saraiva, 2011.

COSTA, Helouise; SILVA, Renato Rodrigues da. A fotografia moderna no Brasil. São Paulo: Cosac Naify, 2004.

DUBOIS, Phillips. O ato fotográfico e outros ensaios. Campinas: Papirus, 1993.

GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002

MAIA, Andrea Karine Albuquerque. O momento decisivo do fotojornalismo atual: a importância do métis e a atuação do fotógrafo. SBPJor – Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo, Curitiba, 10º ed., novembro, 2012.

NETO, Wilson de Oliveira. Uma guerra de imagens: apontamentos sobre a produção, a circulação e o uso de fotografias durante a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). Rio de Janeiro, p. 1-13, 2017. Disponível em: < https://www.snh2017.anpuh.org/resources/anais/54/1501694050_ARQUIVO_Umaguerradeimagens-artigoparaanaisdoSNH2017.pdf> Acesso em: 19 junho 2020.

OLIVEIRA, Erivam Morais de; VICENTINI, Ari. Fotojornalismo: uma viagem entre o analógico e o digitalSão Paulo: Cengage Learning, 2009

PALACIN, Vitché. Fotografia: teoria e prática. São Paulo: Saraiva, 2012.

RITCHIN, Fred. O futuro do jornalismo. São Paulo, p. 01-21, 1989. Disponível em: <http://www.uel.br/pos/fotografia/wp-content/uploads/downs-uteis-o-futuro-do-fotojornalismo.pdf>. Acesso em: 30 março 2017.

SANTOS, Heloisa Souza dos. Jornalismo e fotojornalismo de guerra: a visão dos conflitos por mulheres jornalistas. São Paulo, p. 251-262, 2015.

SOUSA, Jorge Pedro. Fotojornalismo: uma introdução à história, às técnicas e à linguagem da fotografia na impresa. Porto, 2002. Disponível em: < http://www.bocc.ubi.pt/pag/sousa-jorge-pedro-fotojornalismo.pdf>. Acesso em: 16 maio 2020.

VEIT, Cristina. O improvável cotidiado nos fotógrafos de guerra. National Geographic, 8 de novembro de 2017. Disponível em: < https://www.nationalgeographicbrasil.com/fotografia/2017/09/o-improvavel-cotidiano-dos-fotografos-de-guerra> Acesso em: 19 junho 2020.





* Graduando do curso de Jornalismo da Universidade CEUMA. E-mail: [email protected]

** Professora da Universidade CEUMA, Cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Doutora em Ciência da Literatura (UFRJ). E-mail: [email protected]