Por Filippo Caravella Revisão | Leander Botelho Mesquita 19 | junho | 2018

Pensando bem, todo nosso intrincado sistema de relações pessoais e todo o ainda mais entrelaçado sistema de relações econômicas e sociais, no qual, por bem ou por mal, estamos imersos em todo o curso de nossas vidas, são todas baseadas na confiança.
Confiar é ter a certeza de que algo ou alguém, independentemente do nosso controle, realizará no futuro uma expectativa positiva criada no presente, ou que algo/alguém fez/faz agora o que será positivo para nós mais tarde.
Tudo isso se baseia em poucos pressupostos: que o alguém seja honesto, sincero e capaz. E que o algo seja funcional, eficiente e não afetado por mecanismos adversos.

UM ESTADO DE ESPÍRITO COMPLEXO

Então, nós confiamos em uma prescrição médica ou no conselho de um balconista (olha, ficou bom em você!). No horário dos voos (caso contrário, não ficaríamos lá, no aeroporto). No banco no qual abrimos uma conta corrente, ou no cliente que se compromete a nos pagar "30 dias da data da fatura".
Confiamos no/a chef de cozinha, do nosso restaurante preferido, que nos oferece um prato surpreendente. No motorista de caminhão desconhecido dirigindo ao nosso lado na estrada, no engenheiro desconhecido que projetou a ponte que estamos prestes a passar e no político que votamos, de suas promessas e de seus compromissos.
Confiamos na empresa de comércio eletrônico que nos enviará aquilo mesmo pelo qual já pagamos. No filho que nos assegura que retornará o mais tardar à uma da manhã (não, vamos lá, mais um pouco já volto), e naquela pessoa companheira que jura nunca nos trair. No jornal. Na Wikipédia. Ou no blog que afirma nos dizer todas as verdades que os outros mantem em silêncio.
A confiança é uma emoção. Um estado de espírito complexo, para produzir o qual é necessário combinar instinto e raciocínio, cálculo e intuição, expectativa e esperança, experiências do passado (e também do passado remoto da infância) e antecipações sobre o futuro. Quando temos confiança, nos sentimos serenos, calmos e aceitavelmente a salvo dos riscos.
Como todas as emoções, a confiança que temos está ligada ao nosso temperamento e ao nosso caráter. E isso significa que pessoas diferentes, na mesma situação, podem se sentir confiantes, desconfiadas ou desmotivadas.
É o nosso grau de confiança que nos motiva a fazer (ou não) certas escolhas e a cumprir (ou não) certas ações, e determina nossas interações com os outros e os nossos comportamentos.
“A total ausência de confiança, antes mesmo que destrutiva, é paralisante”
Às vezes nós confiamos seriamente. Às vezes, temos que fazer como se confiássemos em nós porque não temos melhores alternativas: por exemplo, para poder pedir um favor, devemos nos sentir confiantes de que podemos obtê-lo. Às vezes, estamos confiantes com bons motivos e outros com bastante aleatoriedade.
O fato é que somos psicologicamente predispostos a confiar (o verdadeiro fundamento da atitude em cooperar no qual se baseia a nossa vida social) e que quando confiamos, nosso cérebro nos recompensa e nos dá uma gratificante sensação subjetiva de bem-estar.
A total ausência de confiança, antes mesmo que destrutiva, é paralisante. A única saída para a paralisia e ansiedade que nos expõe a estar totalmente desconfiados é muitas vezes a mais perigosa: repor nova confiança no primeiro trapaceiro, oportunista, charlatão que passa por ali, e quem sabe, no entanto, nos fazer aquele sorriso que mais uma vez nos toca de novo, aquela promessa que nos faz vislumbrar um futuro melhor (ilusório), justamente no momento no qual mais precisamos.
E aqui estamos nós: para quem e em que estamos inclinados a confiar? Os dois fatores mais importantes são dois: proximidade e empatia. Confiamos mais facilmente em quem, ou naquilo que nos sentimos próximos, bem dispostos em relação a nós, atenciosos, capazes de nos compreender. Basicamente, confiamos em primeiro lugar como uma criança pode confiar em sua boa mãe.
Em segundo lugar, tendemos a confiar em quem fala conosco de maneira compreensível e envolvente, especialmente quando ele explica assuntos sobre os quais pouco ou nada sabemos. Basicamente, nós tendemos a confiar como um jovem garoto que ouve um de seus bons professores.
Em terceiro lugar, tendemos a confiar naqueles que parecem honestos, autênticos e transparentes. Basicamente, nós confiamos como um adulto que confia em um amigo verdadeiro. Uma consequência interessante de tudo isso é que confiar também significa tornar-se aberto e vulnerável como pode ser uma criança ou um menino, ou um adulto quando ele está na companhia de um amigo verdadeiro. A outra consequência é que qualquer traição de confiança é uma ferida real e muito dolorosa.

AS INSTITUIÇOES DEFICIENTES

Por que nessa lista de fatores que favorecem a confiança não há credibilidade, competência e confiabilidade?
Óbvio, quase sempre não temos a oportunidade, o tempo e nem os instrumentos necessários para verificá-las seriamente. E quem deveria fazer isso por nós seriam as instituições, mas eles são deficientes nos três fatores que acabei de listar.
Conclusão: tendemos a confiar cada vez menos nas instituições.
Assim, na roleta de atribuir confiança, nos deparamos em apontar cada vez mais sobre as componentes instintivas e intuitivas, e não dos de cálculo e raciocínio. Com isso, nos arriscando mais para nos decepcionarmos, ofendidos e ainda mais propensos a ouvir o primeiro trapaceiro que passa.
Por outro lado, se uma instituição, um partido, uma empresa ou um único indivíduo quisesse reconstruir a confiança manchada ou perdida, não poderia fazer outra coisa senão recomeçar a partir dos fatores listados que nada mais são do que as virtudes que representam a pré-condição dos valores éticos e morais de cada ser humano que queira se relacionar com os outros de forma saudável, verdadeira e evoluída.
Essas virtudes são simples de se entender, mas não são fáceis de se praticar. E sim, ainda é preciso de muita reflexão, autocrítica, paciência, dedicação e tempo.

“LEVA ANOS PARA CONSTRUIR A CONFIANÇA,
SEGUNDOS PARA QUEBRÁ-LA
E UMA ETERNIDADE PARA CONSERTÁ-LA.”