Chuva Molhada
Por Louise Bomfim | 18/05/2009 | ContosAtravessei um dia desses uma rua, eu fazia um enorme esforço
para não pisar nas poças ali deixadas pelo temporal que caíra, eu não
sei por que justamente esse dia tão triste tinha que chover, e lutava
contra a minha capa de chuva para não deixar molhar os meus livros. A
ruela ficaria mais estreita se eu as olhasse pela ponta dos meus pés, o
trânsito estava um caos e observei as pessoas dormindo acordadas com
desesperos pelos pingos de chuvas.
Pisando no meio fio para
fugir da lama que se acumulava ao redor eu achei melhor parar em algum
banco de alguma praça, a primeira que eu avistasse. Passei em um
supermercado e meu rosto ficou avermelhado de timidez quando pedi uma
sacola plástica à moça, somente para colocar meus livros e voltei para
a chuva. Às vezes, eu não entendia essas minhas atitudes. Logo que eu
tinha saído do supermercado, andei até avistar um lugar para sentar.
Arrastando
a sacola com os livros, eu começava a pensar que nunca mais eu teria
uma distração com alguém. Sentia falta de alguém, realmente e
verdadeiramente as chuvas entristecidas me acompanhavam em um ritmo
através do qual eu levantei meu rosto para o céu. Misturei gotas de
chuvas com gotas de sal sobre minha face, acabei me esbarrando em uma
menina mais distraída do que eu poderia ser.
Meu deus, como chovia... Assim foi difícil chegar a algum lugar para sentar.
Eu
falava comigo mesma, enquanto a água da chuva pingava sobre meus lábios
um pouco avermelhados. Enquanto meu perfume barato de cheiro singular
se perdia com a água que escorria por meu pescoço fino, meus cabelos de
cachos dourados estavam encharcados e grudavam em meu rosto. Corria, e
corria e estava satisfeita por não estar com saltos altos, até que eu
encontrei um banco com um garoto.
E até mesmo sem querer eu
Elizabeth, eu esforcei o meu olhar desconfiado em direção a ele. O seu
corpo mostrava sinais claros de cansaço. As feridas eram invisíveis e
ao mesmo tempo visíveis para qualquer um que os observasse. Ele era
passivo. Com medo dele, tinha jogado meus cachos ensopados sobre meu
rosto, assim não o incomodei e me incomodei de não olhar mais. Cadê que
o sol aparecia? Eu precisava abrir um dos meus livros.
Tudo
estava dolorido e tudo era dolorido pelo desejo de sentir dores, eu fui
incapaz de tocá-lo, não sabia que olhar era tão julgador. Na verdade eu
estava julgando-o. Naquela hora só queria conversar um pouco, e estava
roendo meus pensamentos sobre aquele garoto estranho. E o frio foi
tomando conta da minha pele um pouco frágil. Pensei em voltar para
casa, pois a chuva havia amenizado.
Começo a sentir frio
novamente. Por que tanto frio? Não podia escrever sorrisos, nem
inventar abraços. O silêncio arquitetou sua presença projetada por um
estômago frio. Me aproximei dele, só que, ele levantou-se e atravessou
a rua. Um acidente surgiu. Seu corpo foi fotografado no dia seguinte
como uma simulação de suicídio. Suas feridas estavam abertas, ainda não
cicatrizados, os seus olhos estavam acinzentados e sua face
extremamente pálida. A chuva havia parado, e ele lá cercado de
policiais e peritos. Desamarrei a sacola plástica, peguei um dos meus
livros e voltei de onde eu tinha saído. Essa foi a chuva mais molhada que sentí.