PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 12.03.2010, horário: 18:40 horas:

Estava na Corregedoria da Polícia Civil e fui surpreendido pelo Delegado Nilton Andrade que já estava de saída naquele final de sexta-feira doze e veio até minha sala trazendo as “boas-novas”:

- “Eu estava participando da formatura dos novos policiais lá na Academia e o ‘Pavan’ também estava lá, tu precisas ver o respeito que o ‘Pavan’ tem pelo Renato (Hendges). Ele de imediato já assinou o aumento de mais cento e noventa e seis cargos de Escrivães de Polícia, tu vê! Ele disse que logo que assumir o governo vai mandar para a Assembleia Legislativa aquela ‘PEC’ recolocando os Delegados de Policia como carreira juridica na Constituição. Entregaram para ele uma cópia do que foi aprovado lá em Minas Gerais, em não sei se tu visses lá o Aécio Neves reconheceu os Delegados como carreira jurídica, tu sabias disso? Ele se comprometeu em mandar para a Assembleia essa ‘PEC’…!”

 Interrompi:

- “Então, Nilton esse é o nosso cara! Imagina, vamos torcer para ele assumir o governo, eu espero que o Maurício, o Ademir, o Renato saibam aproveitar esse momento…”.

Me deu uma vontade de perguntar para Nilton sobre o projeto de “PEC” que havia entregue para Ademir Serafim (Delegado Regional de Balneário Camboriú) para que repassasse para o Delegado-Geral Maurício Eskudlark, sobre a “PEC” de criação da  “Procuradoria-Geral de Polícia”. Mas como sabia que isso era dar tiro no escuro, na verdade achava muito difícil Maurício Eskudlark, Ademir Serafim e Renato Hendges se preocuparem naquele momento com uma “PEC” que não fosse a da carreira jurídica que para mim era um tiro no pé, não traria benefício algum, diferentemente da “PEC” da “Procuradoria-Geral de Polícia” que traria o segundo grau na carreira, abriria caminho para a autonomia institucional... Quanto a “PEC” da carreira jurídica que na minha avaliação era mais um discurso fácil argumentei:

- “É, mas já tem o artigo cento e noventa e seis da Constituição do Estado que garante tratamento isonômico com as carreiras jurídicas não tem?” Nilton ponderou que isso era coisa ultrapassada e que uma nova “PEC” seria muito importante. Permaneci mudo, optei pelo silêncio porque Nilton Andrade era muito ligado aos Delegados Ademir Serafim e Maurício Eskudlark e fiquei pensando:  “Pois só o tempo é que poderá mostrar no que vai dar tudo isso, vender esperanças, porém a única coisa boa era vender sonhos para nossos Delegados, o importante era fazer, sonhar, sonhar… sonhemos, pois!!!”. Na verdade nós já havíamos sido considerados carreira jurídica na Constituição de 1988 (art. 241), cujo princípio foi revogado pela EC 19 de 1998 (Governo Fernando Henrique Cardoso – PSDB), mais por pressões dos governadores contra a isonomia salarial que teriam que pagar nos seus Estados.  Mas o fato era que carreira jurídica nós já éramos há muito tempo e a luta seria nacional para recuperar o terreno perdido...

 Durante nossa conversa, a sobremesa ficou por conta da lei recentíssima (LC 491/10), presente dos Procuradores do Estado que revogou dezenas de artigos do Estatuto da Polícia Civil (Lei 6.843, de 1986) e retirou a autonomia da Corregedoria da Polícia Civil. Nilton Andrade fez o seguinte relato:

- “Tu vê, Felipe, eu estava conversando com o Feijó, imagina ele mesmo que me contou, ele disse que tem um amigo lá na Casa Civil que telefonou para ele relatando que tinha um projeto tramitando lá que revogava o Estatuto da Polícia Civil, modificava o regime disciplinar. Aí, o Feijó disse que perguntou: ‘muda muita coisa?’ O amigo dele lá, acho que não leu direito o projeto, disse que não mudava muita coisa, aí o Feijó falou para o amigo que se não mudava muita coisa era para tocar para frente, imagina, o Feijó fazendo uma coisa dessas, agora estamos nós aí…”.

Acabei lembrando em silêncio de outro grande feito de Feijó, quando foi o ultimo Delegado Diretor de Polícia Científica e segundo relato de alguns Peritos, ele ficava insuflando o pessoal a lutar para tirar da Polícia Civil a atividade “Técnico-Científica”, o que  acabaram conseguindo. Imagina o que os Peritos deveriam ter pensado do Delegado Ricardo Feijó que ao invés de defender a unidade da sua instituição, muito pelo contrário, para ficar bem na foto, para parecer bonzinho para seus comandados (no caso os Peritos Criminalísticos) fomentava ideais emancipacionistas… Pensei: “Êta Feijóóó!!!, só ele e outro grande artista... É por esses e outros que estávamos só perdendo espaços … Acabei lembrando daquele filme ‘bastardos inglórios’…”.

Aproveitando a carona, aproveitei aquele “espírito natalino” trazido por Nilton para argumentar:

- “Bom, acho que é uma boa hora para a gente reapresentar aquele nosso projeto para a Corregedoria-Geral, lembra? A gente pode aproveitar o momento para desfazer tudo isso que os Procuradores fizeram.  Já que o ‘Pavan’ está tão receptivo assim, vamos conversar com ele e dizer que temos que rever as infrações disciplinares previstas no nosso Estatuto e já mudamos tudo! Temos essa turma aí que é amiga do Pavan, mais o Secretário de Segurança, o André Mendes da Silveira, todos amigos do futuro governador…”. Nilton me interrompeu:

- “Felipe, nem precisamos argumentar que temos que mudar as infrações, o homem está tão receptivo que é só mandar o projeto que ele assina e vai direto para a Assembleia Legislativa”.

A EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS RELATIVA AO ANTEPROJETO DA CORREGEDORIA-GERAL DA POLÍCIA CIVIL encaminhado por meio do Corregedor Nilton Andrade ao Delegado-Geral Ademir Serafim para o Secretário de Estado da Segurança Pública Delegado André Mendes da Silveira:

ESTADO DE SANTA CATARINA

SECRETARIA DE ESTADO DE SEGURANÇA PÚBLICA E DEFESA DO CIDADÃO

DELEGACIA-GERAL DA POLÍCIA CIVIL

Corregedoria Policial Civil 

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS N.  001/COPOC/DGPC/SSPDC/2010 

Excelentíssimo Senhor Delegado-Geral, 

A presente iniciativa teve como fato gerador a edição da Lei Complementar n. 491 de 20 de janeiro de 2010 que trouxe sérias alterações ao rito procedimental inerente às sindicâncias e processos disciplinares no âmbito do serviço público e à própria Polícia Civil.  

A bem da verdade a referida legislação foi aprovada sem que o órgão policial civil fosse consultado e, tampouco, houve participado da direção da Polícia Civil do nosso Estado. A despeito disso, vale registrar que o presente anteprojeto de lei complementar tem como meta principal corrigir distorções criadas pela “nova legislação”, especificamente no que diz respeito ao rito nos processos disciplinares, de maneira a propiciar harmonização com a realidade policial civil que certamente foi ignorada em razão da supremacia legiferante daqueles que produziram a concepção da “nova ordem”.  

De outra parte, não se pretende pontificar imperfeições contidas na referida legislação e, também, prescinde-se da necessidade de se enumerar a dissonância das medidas contidas na legislação extravagante com a realidade policial, mesmo porque nossa realidade é bem diversa daquela vivenciada pelo servidor público regido por legislação geral, mormente, em razão da natureza da atividade de segurança pública e da necessidade de se adotar medidas imediatas para solução de problemas com repercussão pública relevante e da inerente higidez do aparelho policial.  

Registre-se como preliminar que a proposta não pretende gerar despesas para o Estado, tão-só, indenizar os profissionais da área correcional dos gastos e desgastes decorrentes do exercício da atividade especial de segurança no âmbito policial (investigar condutas de policiais). A meta a se alcançar é principalmente o aperfeiçoamento de dispositivos que tratam do regime disciplinar do servidor policial civil, consoante as reformas produzidas pelas Leis Federais ns. 11.689/08, 11.690/08 e 11.719/08 que produziram profundas alterações no Código de Processo Penal, bem como definir princípios que devem reger o órgão correcional, sua competência, além de dar relevo a sua significativa importância, assegurar a certeza de punibilidade a partir de um sistema mais rígido e racional, além de fixar critérios inerentes ao rito procedimental. Também, pretende-se como preliminar a efetiva revisão das infrações disciplinares tendo com pressuposto um rearranjo das faltas de maneira mais racional, além da infusão de novas figuras típicas, mercê da experiência amealhada durante esses anos todos de vigência do nosso ordenamento jurídico maior (arts. 204, 207, 208, 209, 210, 211, 215, 222, 224 e 226 do  Estatuto da Polícia Civil – Lei n. 6.843, de 28 de julho de 1986). Também, a reorganização do sistema de infrações disciplinares e revisão dos procedimentos correcionais farão com que haja uma otimização da qualidade dos serviços, a partir de uma nova política voltada principalmente à orientação e o controle interno da atividade policial civil.  

Ademais, há que se anotar que as inovações que ora estamos apresentando melhoram sobremodo a dinâmica da atividade de correições, fazendo com que o sistema seja mais ágil e produtivo e as sanções mais consentâneas com nossa realidade, eis que passa a se dar maior celeridade na apuração das faltas e eficácia na sua apuração, considerando os reclamos da sociedade e o grau de discernimento dos nossos policiais, a grande maioria já com formação superior.  

A LC 243 de 30 de janeiro de 2003 - que reformou a Administração Pública do Estado - objetivando alinhar-se à política prevista no “Plano Nacional de Segurança Pública”, criou a Corregedoria-Geral de Segurança Pública vinculada diretamente ao Gabinete do Titular da Pasta e, no mesmo ato transformou o ex-órgão de correições da Polícia Civil (Corregedoria-Geral da Polícia Civil) primeiramente na Gerência de Orientação e Controle. Depois dessa inaudita experiência, com o advento da LC 254/2003 aquela gerência deixou de exercer funções correcionais, pois foi criado o cargo de Corregedor da Polícia Civil. No entanto, em que pese a previsão legal do cargo de Corregedor, essa iniciativa ficou muito aquém das necessidades em termos de política correcional e controle interno, em especial, porque houve um considerável abalo do prestígio que o órgão anteriormente gozava. Além do que, urge se ter um controle interno cada vez mais eficiente da atividade policial, principalmente, considerando o grau de exigência  da sociedade atual  e em razão da necessidade de se dar uma melhor resposta ao avanço incontido da demanda criminal. Se não bastasse isso, a LC 491/10 fez mais, acabou nivelando a política correcional da Polícia Civil com a de outros órgãos que possuem infrações disciplinares em menor quantidade, intensidade, repercussão e gravidade, sem contar a forma como são praticadas (muitas vezes envolvem práticas de delitos criminais e envolvimento com a marginalidade) e de complexa elucidação. 

A partir dessa proposta estar-se-á corrigindo deformidades originadas pelas legislações citadas, delimitando-se competências e propiciando que o Corregedoria da Polícia Civil, com atuação no controle interno da atividade policial,  como órgão coadjuvante, possa  auxiliar também no controle externo, fazendo com que o sistema tenha mais credibilidade e transparência. De outra parte, a Corregedoria da Polícia Civil e os procedimentos disciplinares passam a se constituir órgão e sistema mais estável, equalizados e definidos administrativa e legalmente, considerando o elenco de competências discriminadas e as prerrogativas para o pleno exercício da função correcional.   

Para tanto, diante do quatro de redução dos efetivos policiais e frente às exigências sociais cada vez mais impondo respaldo num modelo de segurança pública sinérgico, pretende-se viabilizar alterações ao Estatuto da Polícia Civil (Lei n. 6.843, de 28 de julho de 1986), especificamente no Título que trata do “Regime Disciplinar”, com o propósito de infundir as condições legais capazes de modernizar a instituição que passará a contar com um órgão corretivo não só voltado a reprimir infrações disciplinares, mas, sobretudo, à política de orientação, centralização de informações e serviços de inteligência para assuntos  internos.   

Pretende-se que o órgão seja integrado por Delegados de Polícia designados oficialmente para as funções de “Corregedores de Polícia” (isso já ocorre de fato), procurando-se propiciar algumas prerrogativas básicas e mecanismos de estabilidade no exercício das suas funções. Como embasamento dessa iniciativa, há que se destacar que a direção de todos os órgãos e unidades policiais civis deverá viabilizar-se a partir dos Delegados de Polícia que se constituem carreira jurídica do Estado, sendo seu reconhecimento alçado tanto nas Constituições Federal e Estadual, como também no Código de Processo Penal e legislação extravagante, cujo arcabouço exige de  seus operadores  experiência policial,  aprofundado e dinâmico conhecimento jurídico. Além do que, os serviços correcionais são essenciais à Justiça na medida que contribuem para o substancial melhoramento da qualidade dos misteres promovidos pelo Poder Judiciário e Ministério Público.   

De outra parte, também, digno de registro é que a presente proposta não tem o condão de embargar a necessidade da fixação de competência ao órgão e definir as  atribuições dos Corregedores da Polícia Civil, o que obrigatoriamente deverá ocorrer por meio de legislação complementar, nos termos do parágrafo único do art. 105 c/c o art. 106, par. 3º, ambos da Constituição Estadual.    

As despesas residuais decorrentes do incremento da reforma disciplinar se justificam quer pela incomensurável relevância dos serviços correcionais que dignificam a função e de controle interno da atividade policial quer em razão da dedicação exclusiva e dos desgastes gerados em razão da necessidade de intensiva atuação. Assim, a jornada de trabalho e os deslocamentos correcionais merecem plausível tratamento justo por parte do poder público em termos de retribuição pecuniária (horas extras/diárias/deslocamentos), como também é o caso do adicional correcional específico para aqueles poucos que forem convocados para exercício da função.  

Diante dessas considerações, solicito a Vossa Excelência o encaminhamento da presente proposta ao Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa do Cidadão, a fim de viabilizar as inovações sugeridas ao diploma estatutário encaminhando a matéria ao Chefe do Poder Executivo do Estado.   

Florianópolis, 19 de março de 2010  

Nilton Andrade

Corregedor da Polícia Civil