Não, não é o Carlos Lacerda, carioca e influente político brasileiro, que esteve presente nos principais acontecimentos da história brasileira do século XX. O Carlos sobre o qual escrevo, é  o Carlos Clementino de Oliveira Lacerda, paulistano, formado na Escola de Sociologia e Política, que militou durante muitos anos no jornalismo. Uma pessoa culta e bem informada e era um prazer ouvi-lo. Era, também, um gozador incorrigível. Gostava de  brincar com as mulheres sobre a superioridade dos homens. Dizia com expressão séria: “quem são os melhores cozinheiros, os melhores costureiros... Vejam os pássaros! Quem canta melhor? Comparem o pavão com a fêmea...”, mas parece que eram só  brincadeiras do Carlão para provocar as mulheres. Há quem diga o contrário, ou seja, o Carlos era mesmo um “Jece Valadão” enrustido.

Onde estará o Carlos? Há séculos que não o vejo. No meu casamento se perdeu e não conseguiu chegar a tempo e foi uma pena, pois havia se comprometido em fazer as fotos do casório. Como era um ótimo fotógrafo, teria hoje boas imagens desse momento importante da vida.

Na época, Carlos estava casado com a professora Hamide Assaim José, minha inesquecível professora de literatura portuguesa no colégio. Carlos participou da minha juventude de forma bastante significativa. Ensinou-se alguns truques da arte de fotografar e, também, de escrever.  Na época eu editava o jornalzinho do colégio, que ele lia prazerosamente e fazia seus comentários críticos. Um deles foi quando escrevi “ ...pelo Brasil afora...”. Ele me lembrou que “Brasil afora” seria no exterior e não dentro do país.  Ainda hoje ouço e leio jornalistas conceituados repetindo esse erro. Provavelmente não são da escola do Carlos.

Carlos editava a Revista “Dirigente Municipal”, um árduo trabalho que exigia viagens pelo Brasil adentro, entrevistando prefeitos e fotografando pessoas e paisagens urbanas. Voltava editava a revista e retornava para a labuta. Manifestou várias vezes seu desejo que eu seguisse a carreira de jornalista, mas ao mesmo tempo tinha receio de que, muito jovem na profissão, pudesse me perder pela vida. Referia-se ao ambiente nada recomendável para a minha idade. Por essa razão, deixou para depois um estágio no jornal em que trabalhava.

Acabei seguindo outros caminhos profissionais e o jornalismo ficou apenas nos sonhos. Por sua vez o Carlos deu alguns tropeços depois que encerrou sua carreira no jornal e na revista. Decidiu testar seus conhecimentos de gestão empresarial por conta de um curso de pós-graduação na FGV, montando um supermercado, que acabou não sendo bem sucedido. Por fim, como a aposentadoria não dava para seu sustento, voltou ao jornal, trabalhando como copy desk, uma atividade que hoje desapareceu das redações. Em paralelo, passou a fazer terapias ocupacionais, inaugurando um tipo de couching, usando técnicas psicanalíticas como a hipnose.

O casamento também acabou, apesar de do casal ter oficializado a união bem maduros. Apareceu alguma pedra no caminho que encerrou uma relação bastante antiga, com idas e vindas. Hamide foi morar em Embu das Artes, onde o casal tinha uma casa de veraneio e ele ficou morando no apartamento que o casal alugava próximo à região dos Jardins.

A última notícia que tive dele deu conta que havia se casado novamente, teve filhos e que já andava um tanto esquecido. Numa das últimas visitas que fiz à Hamide, em Embu das Artes, encontrei o irmão do Carlos, o ex-publicitário William Lacerda, que foi professor na ESPM.  William disse apenas que o Carlos estava lidando com seus problemas, mas estava bem.