LEITURA CONTEXTUALIZADA DE CÂNTICO DOS CÂNTICOS 4, 1-7

Joacir Soares d'Abadia[i]

1) Texto bíblico

Tu és bela, minha querida, tu és formosa! Por detrás do teu véu os teus olhos são como pombas, teus cabelos são como um rebanho de cabras descendo impetuosas pela montanha de Galaad, 2 teus dentes são como um rebanho de ovelhas tosquiadas que sobem do banho; cada uma leva dois (cordeirinhos) gêmeos, e nenhuma há estéril entre elas. 3 Teus lábios são como um fio de púrpura, e graciosa é tua boca. Tua face é como um pedaço de romã debaixo do teu véu; 4 teu pescoço é semelhante à torre de Davi, construída para depósito de armas. .Aí estão pendentes mil escudos, todos os escudos dos valentes. 5 Os teus dois seios são como dois filhotes gêmeos de uma gazela pastando entre os lírios. 6 Antes que sopre a brisa do dia, e se estendam as sombras, irei ao monte da mirra, e à colina do incenso. 7 És toda bela, ó minha amiga, e não há mancha em ti.

2) Idéias principais

Elogio físico a amada esposa; a esposa, elogiada pela sua beleza; a admiração do amado pela beleza da amada.

3) Título do texto

O elogio físico a amada esposa

4) Contextos:

a) Contexto imediato

Esta perícope de Ct 4, 1-7 tem como título, segundo a Bíblia de Jerusalém, "O amado", que é precedida do chamado "Terceiro poema" (3, 6-11) que é subdividido como título: "O poeta". Esta subdivisão está marcada pela falta em fazer referência ao tema "amor" e também por não colocar na boca das "filhas de Sião" o pronunciamento, que são interpretadas no v. 11. A perícope é seguida dos versículos 4,8-5,1, nos quais a jovem é chamada "noiva" pela primeira vez. Este escrito segue até 5,1 para retornar à alusão ao "Amado", o qual se sente arrebatado pelos olhares de sua noiva (v. 9), pelo gosto dos seus beijos (v.11) e pelo perfume de suas roupas (v. 10 e 11).

b) Contexto maior

Gn 6, 2: "os filhos de Deus viram que as filhas dos homens eram belas, e escolheram esposas entre elas".

Jd 8,7: "Era extremamente bela, e seu marido tinha-lhe deixado grandes riquezas, numerosos criados e domínios cheios de rebanhos de bois e de ovelhas".

Amós 8,13: "Naqueles dias, desfalecerão de sede as belas jovens e os moços".

Gn 38,19: "E levantando-se, partiu; tirou o seu véu e retomou seus vestidos de viúva".

Sb 4,12: "porque a fascinação do vício atira um véu sobre a beleza moral, e o movimento das paixões mina uma alma ingênua"

Dn 13, 32: "Aqueles homens perversos exigiam que ela retirasse seu véu - pois estava velada -, a fim de poderem (pelo menos) fartar-se de sua beleza".

Is 60, 8: "Quem é que voa assim como as nuvens, ou como as pombas volvendo ao pombal?".

Mt 10, 16: "Eu vos envio como ovelhas no meio de lobos. Sede, pois, prudentes como as serpentes, mas simples como as pombas."

Ct 7, 8: "Teu porte assemelha-se ao da palmeira, de que teus dois seios são os cachos".

5) Comentário

Esta passagem do livro Cântico dos cânticos 4, 1-7, a qual leva como título: "O elogio físico a amada esposa" é um poema que proporciona ao amado poetizar sobre a beleza de sua amada; fala do encanto da amada com contornos apaixonados, sem nenhum asco em delinear sua formosura corporal. É um poema que, pelo conteúdo, remete-nos a questão do matrimônio, tendo em vista a sua perfeição e sua importância.

A união conjugal é perfeita quando há amor mútuo entre os esposos, que se unem por uma ternura deslumbrada. Isso faz com que o amado possa se dirigir a sua amada esposa com palavras de carinho como v. 1: "Tu és bela"; "minha querida"; "tu és formosa!"; "os teus olhos são como pombas". Ou seja, toda a ode canta a perfeição da amada, visto que o amado trama um elogio descritivo a respeito da sedução de sua "pomba" ou esposa, possibilitando discorrer a propósito do matrimônio bem como entrega incondicional dos cônjuges através dos valores.

A forma apresentada, portanto, é o matrimônio inundado nos valores. Porque quando se têm os valores permeando a vida dos consortes, esses, sem dúvida, vão perceberem a magnitude do matrimônio "chegando a unir-se virgem com virgem[1]", como diz São João Crisóstomo. Podendo, com efeito, salientar a pureza da amada como diz o v. 7: "És toda bela, ó minha amiga, e não há mancha em ti".

Com isso, adverte o amor que se necessita colocá-lo em primeiro plano, possibilitando sempre mais o respeito do esposo para com sua esposa que, no plano de Deus, por meio do matrimônio, tornaram-se uma benção.

Na medida em que isso acontece, o esposo poderá fazer "elogios a [sua esposa] por sua beleza[2]" desde que o elogio não venha ser um perigo para ambos. Com efeito, é importante elogiar as pessoas, mas se deve ter bastante prudência ao soltar um elogio a uma jovem, principalmente quando aquele que elogia já seja comprometido com alguém.

Pela prudência em elogiar a beleza da esposa é que o esposo irá conseguir inteligência e procurará sempre mais afastar-se da preguiça por que "o temor de Iahweh é princípio de conhecimento: os estultos desprezam sabedoria e disciplina" (Pr 1, 7). Por que são esses princípios que fazem do esposo um amável inteligente. Livrando-o de ser imprudente com sua esposa como os homens de quem fala Daniel: "Aqueles homens perversos exigiam que ela retirasse seu véu - pois estava velada -, a fim de poderem (pelo menos) fartar-se de sua beleza" (Dn 13,32).

Por fim, o matrimonio não venha da paixão dos corpos, ou seja, do amor eros, ao passo "que o eros necessita de disciplina, de purificação para dar ao homem, não o prazer de um instante, mas uma certa amostra do vértice da existência, daquela beatitude para que tende todo o nosso ser[3]". Ele precisa ser todo espiritual, unida a alma a Deus por um vínculo inefável que só Ele conhece. A preocupação de São Paulo quando diz: "Pelo contrário, quem se une ao Senhor torna-se com ele um só espírito"(1 Cor 6, 17) não está em unir carne e espírito, antes, se preocupa por unir carne com carne e espírito com espírito. Assim, o esposo pode elogiar a beleza física de sua esposa como é dito no Gênesis: "os filhos de Deus viram que as filhas dos homens eram belas, e escolheram esposas entre elas" (6,2).



[1]Cf. San Juan Crisóstomo en la obra: "La educación de los hijos y el Matrimonio", n. 81.

[2] Cf. San Juan Crisóstomo en la obra: "La educación de los hijos y el Matrimonio", n. 82.

[3] Cf. Bento XVI. Carta Encíclica Deus Caritas Est, 2005, n. 4.



[i] Estudou Filosofia e cursa Teologia no SMAB. Foi finalista no concurso internacional de filosofia da Revista Antorchacultural em 2007 e 2008. Em 2007 Com a obra "Riqueza da Humanidade..." e em 2008 com a obra "Opúsculo do conhecer". tem vários artigos publicados em Jornais tanto de Brasília como de Formosa Goiás; além de manter mensal a coluna "Filosofando" do jornal "Alô Vicentinos".