Escrevo em uma noite tranqüila. Talvez esta seja a única forma de se fazer ouvido, sentido e quem sabe lembrado. Perco-me em meus pensamentos, faço lembrar a saudade do tempo em que era criança.

Era um grande inventor, em minha rua vivia o paraíso, pois fazia parte dele. Mas como em uma orquestra o grande Maestro da vida, o tempo, me cortara do conjunto. Não existe mais o toque; não escuto mais os sons, expulso do paraíso, sem que ao menos tivesse uma explicação.

Hoje vivo de ilusões, às vezes até me apego em Deus, mas como toda a perda e substituição da esperança também ele me serve de ilusão e esconderijo que acortina o espelho em que não vejo mais meu rosto.

 Alguns me dirão: “- É preciso que se mate um leão por dia”, pois bem, de tantos leões que já matei só me sobraram poucos, e como caçador preciso pensar antes do tiro. Pois quando os leões se forem não me sobrará mais nada, não haverá caça, não terei mais aventura.

A vida talvez seja isso, uma eterna busca de sentido. E o maior de todos os sentidos seja justamente em ter ela nenhum sentido. Por mais que pensamos, por mais que agimos, o mundo continua e solitários buscamos companhia. Eterna ilusão; viemos ao mundo sozinho e dele saímos. Nesses dois pontos onde é que ficou o meio termo?

Só o que resta é angústia e qualquer sentimento contrário a ela não se passa de ilusão. A esperança não passa de um devaneio pelo qual não sentimos a realidade da vida que soa. Assim como os sinos das Igrejas que apenas anunciam à hora em que os convidados devem participar em coro pela missa de sétimo dia.

Mas como em outra pegadinha angustiante do tempo, como um ladrão que rouba seus maiores bens, esqueceu ele de me avisar que horas chegaria para que o recebesse com toda nobreza e etiqueta que só aos filhos de sangue real sabem servir.