Como podemos imaginar, o Brasil nem sempre foi essa disparidade que vemos na sociedade, na economia e na política. Embora sempre tenha sido, “bonito por natureza”, como contou o Jorge Ben, na música lançada em 1969 e continuou fazendo sucesso na década de 1970.

O fato é que a insatisfação com a monarquia portuguesa e depois com os imperadores, Pedro I e II, esteve presente na população que era obrigada a trabalhar para manter os privilégios da nobreza. Isso acendeu a vontade da população ver-se em outro regime político-econômico, como se isso pudesse mudar a sociedade.

Uma amostra do longo mergulho na corrupção, em que se envolviam as classes dominantes do país pode ser mencionado no fracasso do plano econômico de Rui Barbosa, já na república implantada. Aqueles que tomavam empréstimos, alegando implementar alguma atividade produtiva, usavam esse dinheiro em outras atividades, normalmente de ostentação, sem criar empreendimento alegado.

Por sua vez, pouco antes da implantação da república já no sec. XIX foi divulgado o documento chamado de Manifesto Republicano, o qual denunciava a centralização e a hereditariedade da monarquia.

No período pré-republicano, ou seja, no Brasil imperial, a Igreja detinha algum poder e muitos privilégios, pois, a bem da verdade, fazia parte não só da elite, mas também dos quadros do governo. Com a implantação da República isso mudou. Os fundamentos positivistas previam a implantação daquilo que se chama de “Estado Laico”. Ou seja, tem que se dividir as esferas de atuação. Cabe ao Estado promover e prover as necessidades da população e cabe à Igreja aquilo que dela se espera, o anúncio dos elementos da fé. Com a implantação da república, também isso mudou. A Igreja se divorciou do poder político, mas manteve a vontade de influenciar sobre os caminhos da sociedade. Por isso exigia, por exemplo, que seus clérigos deixassem a maçonaria, reduto do poder político.

A expectativa pela superação da monarquia, portanto, vinha de longa data. Deve-se notar, entretanto, que a busca pela república não era um anseio popular, mas sim de alguns setores da elite nacional. E isso é fácil de entender. As bases dos movimentos republicanos vinham dos ideais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade, fraternidade. E, também dos princípios positivistas, que afirmava a necessidade de progresso. Ora, liberdade, igualdade, fraternidade exigia o fim da escravidão. Mas as elites, com base no positivismo, presavam o “progresso”, algo que demandava mão de obra escrava. Portanto, as elites queriam a república, mas não queriam a abolição dos escravos, que eram a mão de obra para o desenvolvimento, a produção e o progresso.

Mas apareceu uma princesa, de nome Isabel, e decretou extinta a escravidão. Com isso ficaram satisfeitos aqueles que estavam vendo a aquisição de mão de obra escrava como um investimento caro. Sabiam que trazer imigrantes pobres, mas com vontade de ficar rico, poderia ser mais barato, visto que esses teriam que arcar com seu próprio sustento, diferentemente do escravo, um animal a ser mantido pelo seu proprietário.

Por outro lado, as fazendas produtoras, perderam seus equipamentos de alta produtividade, os escravos. Esse grupo da elite apoiou aqueles que desferiram o golpe militar que implantou a república da espada. Episódio ocorrido em 15 de novembro de 1889, um ano após a abolição. Aquilo que era uma expectativa de alguns setores empresariais e produtivos, foi realizado por um grupo que se presta a apoiar o poder: uma elite da elite militar.

Esse episódio mostra bem claramente de que se fez nossa história. De corrupção e desvio de dinheiro; de acomodação dos militares ao sistema e do sistema aos militares; de empresários proprietários rurais que preferem se esconder atrás da espada militar do que pegar nas rédeas da história e reescrevê-la; de um grupo capitalista que não aposta no capital, mas na possibilidade de tirar proveito do contexto político.

Aquilo que em algumas nações é feito por políticos que se colocam a serviço do capital, no nosso caso são empresários e proprietários rurais que, na surdina se beneficiam da força dos militares não para implementar melhorias para a nação, mas para tirar proveito pessoal de situações dadas pela circunstância. Nossa história tem mostrado que não são os políticos que fazem politica, mas os que usam os militares para desferir os golpes que têm medo de aplicar.

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO