A historiografia atual tende a usar o conceito Achamento em lugar de Descobrimento do Brasil. A razão é simples e ao mesmo tempo controversa.

Controversa, porque se parte da constatação de que Portugal já sabia da existência das terras “d’além mar”. Isso pode ser demonstrado pela insistência em assinar o tratado de Tordesilhas, ocorrido em 1492. Tendo os espanhóis encontrado as terras que se configuraram como América, os portugueses intuíram e concluíram que poderia haver mais terras no vasto Atlântico. Daí a insistência na assinatura do tratado: queriam, também, o seu quinhão.

O rei português incumbiu o navegador dom Duarte Pacheco Pereira de fazer uma viagem exploratória que resultou na chegada ao litoral brasileiro, no ano de 1498. Esse nobre português chegou à foz do Amazonas e regressou a Portugal, anunciando a existência de vastas terras. Em consequência disso foi que Cabral viajou com a missão de tomar posse das terras, em nome de Portugal. O que não foi feito por Pacheco porque o local por ele visitado estava dentro dos domínios espanhóis, assegurados pelo tratado de 1492. Refazendo as rotas a esquadra comandada por Cabral chegou ao Brasil. Com a chegada de Cabral, em 1500, o escrivão de bordo mandou cartas ao rei informando a situação da missão.

Pero Vaz de Caminha, em sua carta ao rei dá notícia do “achamento” das terras. Começa a carta com os seguintes termos: “Posto que o Capitão-mor desta vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a nova do achamento desta vossa terra nova, que ora nesta navegação se achou, não deixarei também de dar disso minha conta a Vossa Alteza”.

As terras, portanto, foram achadas e não descobertas! E, como se pode notar, Cabral, cumpriu sua missão. Achou o que veio procurar!

Entretanto, essa documentação e as consequências de sua leitura, raramente é comentada nos livros didáticos. Por essa razão, e em virtude dos conceitos positivistas da história tradicional, popularizou-se a afirmação do descobrimento. De modo geral o resultado das “Grandes Navegações” é comentado como “descobrimento” da América e do Brasil.

Outro elemento importante. O conceito, “descobrimento”, sugere que todos os episódios da viagem e chegada ao Brasil teriam sido obras do acaso. Os dados da documentação, como se sabe hoje e já se sabia na época das grandes navegações, demonstram que a viagem de Cabral tinha duplo objetivo: o primeiro: localizar as terras pertencentes a Portugal, por derivação do Tratado de Tordesilhas; e o segundo: chegar ao oriente para sedimentar uma rota comercial. Também essa missão foi cumprida por Cabral. Portugal, efetivamente assentou postos comerciais na Índia.

Como se pode perceber, a controvérsia se dá ao redor da documentação, do costume e dos conceitos tradicionais de história positivista. Dessa forma nega-se a ação humana e afirma-se o acaso ou, se preferíssemos uma linguagem da mitologia grega, poder-se-ia dizer que o resultado da viagem foi obra das Moiras, as três irmãs, divindades que comandavam o destino.

Mas também se trata de algo simples. E isso por razão semântica e conceitual: se eu sei que algo existe, embora não saiba onde está, a minha busca resultará num achamento e não em descobrimento. Achou-se o que não se sabia onde estava, mas sabia-se da existência.

Pode-se descobrir o que ainda não foi inventado ou criado. No caso do Brasil o que se descobriu foi um caminho de acesso, para tomar posse de algo que se estava buscando, mas não se sabia onde era. O que se deu, portanto, foi um achamento do território. Isso aconteceu quando se descobriu um caminho... ou o caminho também foi achado...???

Neri de Paula Carneiro

Mestre em educação, filósofo, teólogo, historiador

Rolim de Moura - RO