A Lei Federal n. 9.784, de 29.01.1999 que regula o processo administrativo no âmbito Federal, aplicada subsidiariamente (art. 24, incisos XI e XVI, CF/88), estabelece que a competência é irrenunciável, salvo nos casos de delegação e avocação legalmente admitidos.

Também:

“Art. 15. Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior”.

O art. 17, da mesma Legislação Federal, prevê: “Inexistindo competência legal específica, o processo administrativo deverá ser iniciado perante a autoridade de menor grau hierárquico para decidir”.

Inicialmente, sobre “sindicância”, dispõe sobre o rito procedimental o Provimento 003/99,  de cujo art. 1o, exsurge: “As notícias de infrações disciplinares deverão ser apuradas, quanto à autoria e materialidade, por meio de sindicância preliminar deflagrada através de portaria que conterá: I – descrição do fato infracional; II – quando possível, dados qualificativos do sindicado; III – designação do(a) secretário(a).

Frise-se como salutar a iniciativa do Corregedor-Geral da Polícia Civil do Estado de Santa Catarina, Delegado João Lipinski, no sentido de propiciar que fosse formado juízo preliminar acerca da infração disciplinar. O art. 3o, do mencionado Provimento estabelece que: “O Corregedor-Geral da Polícia Civil, após análise do parecer proferido por um dos Corregedores determinará, através de despacho fundamentado: I – o arquivamento dos autos: a) por insuficiência de provas; b) por não restar provada a ocorrência do fato infracional e/ou c) por não ser possível identificar a autoria do fato infracional. II – O retorno dos autos, requisitando novas diligências, as quais serão devidamente elencadas pela autoridade requisitante; III – o prosseguimento do feito, quando houver nos autos elementos probatórios do ato infracional e de sua autoria.”

O atual RJUSPC/União ( Lei 8.112/90), no seu Título V, dispõe igualmente sobre o processo como instrumento de que se vale a Administração Pública para apurar faltas disciplinares. Em seu art. 143, dispõe que a Autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa.

Dessa maneira, entendemos que o processo administrativo previsto no texto constitucional abrange tanto a fase da sindicância como a fase processual disciplinar. A meu ver, desde que cumprido o princípio do contraditório, bem como da ampla defesa, a sindicância se mostra capaz de resultar na aplicação de sanções disciplinares em infrações de menor gravidade, a exemplo do que ocorre com a legislação federal. É bom lembrar que o RJUSPC/União entrou em vigor no final do ano de 1990, portanto, bem posterior à Constituição Federal/88. Nesse sentido, não constatei qualquer ilegalidade ou afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório, haja vista estar o EPC/SC em consonância com o referido diploma. Além do que, a sindicância se mostra instrumento célere e da maior utilidade na Polícia Civil, onde as faltas disciplinares, muitas das vezes são uma constante, considerando-se a própria natureza da atividade policial. Sobre o princípio da verdade sabida, doutrina Diógenes Gasparini: “IV – Verdade sabida e termo de declaração – Esses dois meios sumários de apuração de irregularidades e de punição de seus autores já não podem ser utilizados em nosso meio,  pois que aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5o, LV, da CF), o que esses institutos não propiciam” (in Direito Administrativo, 4a ed., Saraiva, 1995, pág. 585). Hely Lopes Meireles também se manifesta:

“Conforme a gravidade da infração a apurar e da pena a aplicar, a Administração disporá do meio de responsabilização adequado, que vai desde o processo administrativo disciplinar até a apuração sumária da falta, através de simples sindicância, ou mesmo pela verdade sabida, mas, qualquer hipótese, com a garantia de ampla defesa (CF, art. 5o, LV)”(Direito Administrativo Brasileiro, 20a Ed., Malheiros, 1990, pág. 422).

“A falta de audiência do infrator e o não-oferecimento de oportunidade para que se defenda, verbal ou expressamente (por escrito), nos casos disciplinares punidos sob o patrocínio jurídico da verdade sabida, são na verdade inadmissíveis. Toda e qualquer falta disciplinar sujeita, potencialmente, a uma determinada penalidade administrativa, por menor que seja ou for, deve ter amparo de todos os textos legais existentes e pertinentes ao fato probando, mormente aqueles que expressa ou tacitamente digam respeito à audiência do acusado e ao seu direito de ampla defesa ou defesa plena” (J B de Menezes Lima, “Sindicância e Verdade Sabida”, 2a Ed. Saraiva, 1994, pág. 275).

A Autoridade deverá usar de muita cautela ao determinar a abertura de uma sindicância. Dessa maneira, recomenda-se às autoridades policiais  evitar atitudes precipitadas, condição essa que poderá trazer problemas sérios à repartição, sem contar o desprestígio ao procedimento adotado injustamente, sem deixar de se levar em conta o clima de intranqüilidade que se estará propiciando perante todos os demais servidores. Vige o princípio de que um policial não poderá responder a dois procedimentos administrativos sobre o mesmo fato. O entendimento é que a autoridade que primeiro tiver conhecimento de fato onde haja a possibilidade de existência de infração disciplinar, deverá imediatamente comunicar essa ocorrência ao superior hierárquico, salvo se se tratar de seu subordinado, quando estará autorizada a instaurar a sindicância. O prazo para comunicação dessas irregularidades à autoridade competente é de 48 (quarenta e oito) horas, contados da ciência do fato. Não procedendo dessa maneira, poderá o policial responder pela infração prevista no art. 209, VII, desta Lei. O pedido de prorrogação de prazo de sindicância deverá ser justificado através de despacho fundamentado nos autos pela própria autoridade sindicante. O prazo para a instauração e conclusão da sindicância é contado a partir do conhecimento do fato e não da instauração e conclusão da mesma, prazo esse peremptório. O prazo de 15 (quinze) dias poderá ser prorrogado por até mais 30 (trinta) dias, inclusive, porque beneficiaria a autoridade sindicante quanto a concessão do benefício que estava previsto no Decreto n. 294, de 31.08.95, com as alterações previstas no Decreto n. 467, de 20.11.95 (esses dois Decretos tratavam da concessão de gratificação pela participação de servidores em comissões oficiais e foram revogados por meio do Decreto n. 094, de 22.03.99, DOE 16.130, de 22.03.99, pág. 4).

"Sindicância é promovida como peça preliminar e informativa do processo disciplinar e sempre que este não for obrigatório, como adiante se verá. É absolutamente correto dizer-se que a sindicância está para o processo administrativo assim como o inquérito policial está para o processo criminal (...). Sindicância e inquérito, no entanto, não se erigem em peças essenciais à instauração processual. O processo pode apoiar-se nessa peça informativa, inicial, ou simplesmente ter vida e curso autônomo" (Egberto Maia Luz. Direito Administrativo Disciplinar, Ed. Revista dos Tribunais, 2ª. edição, 1992, SP, pág. 128).

Algumas dúvidas têm sido suscitadas a respeito de funcionários que prestam serviços à Polícia Civil. Nesse caso, seguindo a regra contida no art. 4°., desta Lei, não tenho dúvida de que os mesmos devem se subordinar ao sistema disciplinar preconizado nesta Lei. Para tanto, impõe que os mesmos estejam prestando serviços oficialmente à Polícia Civil, isto é, que estejam efetivamente à disposição, com exercício em órgão ou unidade da corporação para exercerem atividade policial civil. Do caso contrário, se os serviços prestados forem temporários e/ou se não são inerentes à Polícia Civil, como é o caso de empréstimos de funcionários por Prefeitura Municipal para ter atuação na área de trânsito, entendo que deva se subordinar ao sistema disciplinar a qual está vinculado estatutariamente o funcionário, nada obstando que as irregularidades sejam apuradas em sindicância policial civil, mormente se houver repercussão no âmbito da corporação.

Registre-se ue as irregularidades praticadas por militares, no exercício de função eminentemente policial civil, deverão ser apuradas de acordo com as disposições deste Estatuto. Justifico meu entendimento nos seguintes princípios: a) O servidor que presta serviços de natureza policial civil deve se subordinar ao regime disciplinar deste ordenamento jurídico, sob pena de haver quebra de princípios da maior relevância para a instituição, como a Hierarquia e Disciplina; b) Estímulo a prática de infração disciplinar; c) estímulo a indisciplina e insubordinação; d) evitar a impunidade; e) efetiva apuração dos fatos; e) efetiva resposta sobre infrações disciplinares com repercussão na sociedade; f) preservação dos serviços prestados pela Polícia Civil. Em se tratando de policial civil prestando serviços em órgão estranho à Polícia Civil, entendo que deva o mesmo se subordinar ao regime disciplinar a qual esteja vinculado, salvo se a infração praticada venha violar disposições previstas neste diploma, sendo alcançado pelo regime disciplinar policial civil.

O policial civil que se julgar prejudicado com a instauração de sindicância pode pedir a Autoridade Sindicante reconsideração do indeferimento do recurso. No que diz respeito ao seu questionamento pela via judicial, entendo que o policial irá encontrar obstáculos no princípio da liberdade que tem a Administração de apurar faltas disciplinares cometidas no serviço público. Diante disso, somente se se verificar o descumprimento de qualquer formalidade que se contraponha à exercício do direito da ampla defesa, estará o policial em condições de postular direito líquido e certo em juízo.

Um dos questionamentos que se pode fazer é quanto a possibilidade de serem avocados procedimentos disciplinares pela Corregedoria Geral. No meu ponto de vista, existe plena possibilidade jurídica e administrativa,  haja vista o princípio da hierarquia administrativa. AVOCAR - Diógenes Gasparini ensina que "pela ação de avocar ou avocação, chama-se para si funções atribuídas a outrem que lhe é subordinado. Essa prática, apesar de legal, não deve ser abusiva, dados os inconvenientes que pode trazer, a exemplo da deslocação da diminuição e da extinção dos níveis ou graus dos recursos administrativos e o fato de desprestigiar o subordinado (...)" (in Direito Administrativo, 1993, 3a. Edição, Saraiva, SP, p. 39).

Marco Túlio de Carvalho Rocha, em artigo intitulado "A unicidade orgânica da representação judicial e da consultoria jurídica do Estado de Minas Gerais", publicado no Juris Síntese nº 17 -Maio/Junho de 1999, estabelece com absoluta clareza que o "controle administrativo interno realiza-se ora pela aplicação do princípio da hierarquia, ora pela atuação de órgãos especializados. Pelo princípio da hierarquia, pode o órgão superior da Administração em relação aos que lhes são subordinados: rever os atos, delegar e avocar atribuições e aplicar as penas disciplinares previstas em lei. A inferioridade hierárquica confere  aos subordinados o dever de obediência".  Assim, muito embora a legislação estatutária faça alguma menção a respeito do poder avocatório no campo disciplinar, o entendimento que propugnamos é que, baseado no princípio da hierarquia que rege as forças policiais, se justifica como pleno e  viável o poder avocatório do Corregedor-Geral da Polícia Civil ou de qualquer autoridade policial, em se tratando de exercer o poder avocatório de procedimentos administrativos policiais civis (ver ato administrativo – competência). O mesmo deve ocorrer em se tratando de inquérito policial, considerando a linha de subordinação hierárquica entre os órgãos policiais civis, no entanto, entendo que o procedimento deverá prosseguir na comarca em que se deveu a ocorrência policial, isso pelo princípio de identidade da infração com o local onde deverá o fato ser processado e, finalmente, julgado.

O Estatuto da Polícia Civil de Santa Catarina (Lei 6.843/86) estabelece que até por não se constituir uma Lei Orgânica -, como não poderia deixar de ser, deixou-se de contemplar o instituto da “avocação” em texto legal que pudesse orientar os procedimentos disciplinares. Também, carece de lei que disponha sobre a estrutura e organização da Corregedoria-Geral.

JURISPRUDÊNCIA:

PROCESSOS – AVOCAÇÃO:

STF, 2ª Turma, HC 73.423, RJ, data da dec. 10.12.96: “(...) II – A avocatória prevista no artigo 82 do CPP é norma que deve ser interpretada juntamente com o artigo 80 do Código, que faculta a separação dos processos quando pelo excessivo número de acusados ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação. Ausência de ilegalidade. Pedido indeferido”.

" (...) O pedido formulado ao Ministro de Estado, para avocar e decidir a questão, o Ministro não estava obrigado a atender, dado que avocar é chamar a si funções originariamente atribuídas a um subordinado, poder que o superior hierárquico exerce voluntariamente". ( STF - RMS 21.752 - MS - 2ª T. Rel. Min. Carlos Velloso - DJU 04.11.1994.