CABOTAGEM OU CAPOTAGEM NA AVIAÇÃO AÉREA BRASILEIRA

Cmte Roberto V. Janczura

Era estranhíssima a notícia do JORNAL DO SENADO de 31 Out 2007: "empresas aéreas estrangeiras em rotas internas". Onde o Senador Gerson Camata (PMDB-ES) anunciava seu projeto de lei, que permitirá às empresas aéreas estrangeiras explorarem o serviço aéreo no Brasil a chamada Cabotagem. Para isso o Brasil deverá aplicar, pela primeira vez na história de aviação brasileira e mundial, a Nona Liberdade do Ar (ICAO-1944); para, segundo o nosso Senador: "disciplinar o setor e melhorar os serviços".

Parecia, até então, mais uma bravata em busca de holofotes do que uma tentativa de melhorar o setor. Porém No mês de julho de 2008 fomos brindados com uma notícia ainda mais estarrecedora: O Brasil deverá aceitar um acordo de "Céus abertos" que incluem completo intercâmbio dos cinco direitos de tráfego básicos (liberdades do ar), livre determinação de capacidade e freqüências, quadro de rotas sem restrições, liberdade tarifária e multidesignação, ou seja, empresas estrangeiras poderão operar de/para o Brasil na quantidade de vôos que quiserem. O que pode não ser conveniente para o Brasil, devido à assimetria entre estas realidades. - a primeira delas é a diferença de escala; como competir com megaempresas aéreas como United, Air France, Korean que tem receitas até cinco vezes maiores que a da nossa maior aérea? Vale lembrar que o Brasil representa receita de apenas 2,5% para essas empresas, o que possibilita a ação de dumping, inviabilizando as operações de empresas brasileiras atuais ou até iniciativas nacionais futuras, no dizer do especialista Luiz Adonis Batista Pinheiro (Coppe/UFRJ).

Aqui, as aéreas brasileiras tem que viver em contraste e arcar com o custo Brasil: impostos, encargos sociais, juros de financiamento do capital de giro, custos de leasing, dos seguros, de aquisição de aeronaves e equipamentos de solo, taxas de pouso e proteção ao vôo - todos mais caros que os das empresas estrangeiras em seus países.
Nos EUA, por outro lado, as necessidades e as receitas são garantidas pelos "Fly America act", que obriga todos os que têm passagens pagas pelo governo a viajar em empresas americanas, e, pelo "Civil Reserve Air Fleet" onde mais de US$ 1 bilhão são direcionados para que essas empresas transportem militares e seus equipamentos. Só utilizam transportadora estrangeira se as nacionais não oferecem o serviço. Lá as empresas recebem recursos na ordem de dezenas de bilhões de dólares, aqui o governo matou, pela asfixia da indiferença, a VARIG, uma empresa aérea de 80 anos que conquistou uma tradição de segurança e serviços sempre perseguida pelos concorrentes nacionais e que ainda levará muitas décadas para ser igualada por aqui.

Por outro lado o nosso Ministério do Turismo argumenta que o "Céus Abertos" aquecerá o setor no Brasil, mas não divulga o saldo negativo de mais de US$ 4 bilhões da Conta Turismo de 2007. Note-se, na mesma linha de raciocínio, que as perdas no setor aéreo com as remessas feitas pelas empresas estrangeiras, em 2007, contribuíram para aumentar o saldo negativo da conta de viagens internacionais no balanço de pagamentos, como ressaltou, em maio, O Estado.
Assuntos dessa magnitude requerem uma decisão política do mais alto nível, que deve ser de competência do Conselho de Aviação Civil (Conac).

Hoje os céus já estão abertos , e, o que vai se ver não é nenhum céu de brigadeiro para nós. As aéreas estrangeiras já estão tomando conta daquelas rotas (as mais rentáveis, é claro!) porque a crise se lhes avizinha. Onde suas perdas serão de US$ 5,2 BILHÕES(ZH, 3 set 2008) E estão começando a invadir nosso quintal, onde estávamos a recarregar nosso caminhão com frutas frescas.

Outra - os preços das passagens não baixaram e não irão baixar, o que pode ser facilmente confirmado quando se faz uma pesquisa de preços para uma viagem a curto, médio ou longo prazo.

- Senador Camata e demais autoridades - o que disciplina o setor e melhora os serviços são: empresas nacionais fortes, um bom marco regulatório, ambiente bem regulado e fiscalizado, infra-estruturas aeronáutica e aeroportuária modernas e eficientes, pessoal bem treinado, autoridades bem informadas e com claras intenções. A aviação brasileira precisa disso tudo para que empresas e ou profissionais não tenham que buscar, no exterior, um ambiente melhor. E também para que não ofereçamos de bandeja, nosso mercado aéreo aos estrangeiros.

A velocidade de crescimento da aviação brasileira tem aumentado. Curvas no caminho são previstas e perfeitamente contornáveis. Porém manobras bruscas podem terminar em capotagens, se os condutores não tiverem perícia e habilidade necessárias na condução. E depois da colheita que eles fizerem, aqui, só nos restarão os frutos murchos, ressequidos ou amassados que sobrarem no chão.

Aeronauta, Agente de segurança de vôo, acadêmico de Turismo (Católica de Brasília)

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