AULAS DE MÚSICA PARA ALUNOS COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E AS POSSIBILIDADES DE ENSINO E APRENDIZAGEM: ESTUDO DE CASO EM UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NO MUNICÍPIO DE CURITIBA

Por Celia Mozer da Silva Taborda Ribas | 24/03/2018 | Educação

Acreditar na potencialidade dos educandos e nas possibilidades de aprendizagem que podem surgir a partir de atividades práticas é uma constante busca para o professor em sala de aula. Na educação especial esse trabalho pedagógico pautado numa visão em que o educando precisa de atividades concretas para se apropriar dos conceitos fundamentais relacionados à música é recorrente a cada dia dentro dos planejamentos de ensino e tem se tornado um desafio diário. Esse estudo apresenta as práticas de ensino desenvolvidas com um grupo de 10 alunos, que apresentam deficiência intelectual, numa escola de educação especial, no município de Curitiba. As atividades estão embasadas no método de Zoltán Kodály (1882-1967), pedagogo musical húngaro que contribuiu largamente para a pedagogia da educação musical. Foram utilizadas duas técnicas de ensino que propõem atividades de solfejo e canto, envolvendo vários conteúdos do currículo básico do ensino de música, que são: a manossolfa, e o pentagrama lúdico móvel. A manossolfa é uma técnica de gestuais com as mãos que representam as notas musicais e as alturas. O pentagrama lúdico é um recurso que pode ser confeccionado pelo próprio aluno e utilizado posteriormente para práticas de ensino com solfejo e canto, podendo se ampliar para possíveis composições de sequências melódicas. A pesquisa apresenta um breve histórico sobre as políticas públicas relacionadas à deficiência intelectual, trazendo definições acerca da deficiência, com abordagens da legislação vigente que têm contribuído para avanços significativos. Do mesmo modo, abordam-se especificidades acerca da educação especial musical, amparo legal relacionado ao ensino da música e as características da escola especial. A metodologia de pesquisa está pautada na natureza qualitativa e quantitativa, visto que se trata de um estudo de caso, numa determinada escola, realizando uma análise do quadro clínico dos educandos, os planos de aula aplicados ao grupo e por fim os resultados das atividades. O trabalho pedagógico observou a eficácia das práticas aplicadas que somaram novas experiências e aprendizado tanto para a professora quanto para os alunos.

PALAVRAS CHAVE: Educação musical especial. Deficiência Intelectual. Método Kodály.

INTRODUÇÃO

O tema da pesquisa em questão pretende discorrer sobre os desafios diários enfrentados pelo professor de Arte para planejar e executar seus planos de aula envolvendo conteúdos de música. Na disciplina de Arte o professor precisa desenvolver seus planos de ensino contemplando as diversas manifestações artísticas, cênicas, plásticas e musicais. Dentre elas, acredita-se que, pela experiência diária, a dificuldade maior evidenciada se relaciona com a música, devido a diversos fatores, tais como formação, recursos didáticos, espaço físico apropriado, reconhecimento do valor desta disciplina na formação discente, dentre outros. 

A pesquisa foi realizada em uma escola de educação especial no município de Curitiba, com alunos que apresentam deficiência intelectual. Como professora já atuante na escola referida, percebe-se que a música funciona como meio motivador para potencializar as possibilidades de execução de tarefas nos educandos, despertar a criação e envolver o grupo numa cumplicidade de interesses comuns em aprender mais sobre música.

A estratégia que foi aplicada com esse grupo de 10 alunos selecionados para esse estudo de caso se baseia no método Kodály, desenvolvido pelo pedagogo musical e compositor Zoltán Kodály (1882-1967), utilizando de sua metodologia, o chamado pentagrama lúdico móvel, visando a desenvolver com essa prática o reconhecimento da pauta, clave de sol, posicionamento das notas musicais no pentagrama, solfejo, afinação, formação de coral, dentre outras possibilidades que surgiram a partir das vivências com os alunos, no decorrer do ano de 2014 e que se estenderam no ano de 2015.

Foi possível perceber que os alunos apresentam interesse em explorar os instrumentos musicais e em fazer sequências rítmicas, participar de rodas de canto, entre outras atividades envolvendo o ensino da música. Neste estudo, promove-se a iniciativa de que venha a contribuir com essa questão, na tentativa de fazer um estudo de caso com esses educandos de como se processa esse aprendizado com os conteúdos de música e quais possibilidades de aprendizagem que esses alunos apresentam.

            Os motivos que levaram a buscar por abordagens significativas acerca da temática advêm de inquietações vivenciadas cotidianamente como professora de Arte. É fundamental a reflexão e a discussão sobre tais enfrentamentos, pois isto requer o reconhecimento de que as aulas de música são importantes e de que os professores de arte necessitam urgentemente de melhor formação nesta área. Os desafios e deficiências no sistema de ensino são muitos e vêm sendo apontados constantemente. Sendo assim, faz-se necessária a busca por alternativas viáveis para a escola observada.

            Normalmente as aulas de Arte acontecem nas escolas especiais com caráter de atender às quatro áreas: visuais, musical, dança e teatro e, como em outras realidades educativas, comumente a atenção maior é direcionada para as artes visuais. Por vezes alguma atenção é dada à dança e ao teatro, porém a música é convencionalmente deixada de lado, abordada apenas ao final do ano letivo, ou em datas comemorativas. A explicação mais aceitável para essas questões que vêm sendo observadas nos docentes, colegas de trabalho, está justificada na falta de formação específica, o que impossibilita o desenvolvimento de práticas musicais dentro da escola, visto que já possuem outra formação na área de arte e, portanto, não estão dispostos a reiniciar uma nova formação, já que a instituição não incentiva nem tampouco prioriza a formação docente.

            Tal problemática não é de responsabilidade apenas dos docentes, mas uma falha no sistema de ensino que, por muitas décadas, vem ofertando cursos de formação sem qualquer atenção para a área musical. Nesse sentido, até mesmo a formação básica dos professores que estão atuando nas escolas nesse momento continua sendo precária na área de música, pois não oferece alfabetização musical e esse fracasso continua na sua formação enquanto docente.

            Na educação especial, esse descaso parece ser ainda maior, pois prevalece a ideia de que se os alunos que têm deficiência, seja ela qual for, já carregam consigo um bloqueio na aprendizagem, ou que não irão conseguir cumprir as atividades adequadamente, ou ainda que caso saibam o básico já terão atingido o objetivo das aulas. Não há uma preocupação por parte das equipes gestora, administrativa e pedagógica, de olhar cuidadosamente para as necessidades dos alunos e atender essas expectativas que muitas vezes eles trazem para a escola, nem tão pouco se preocupam em estimular as potencialidades para além do que já sabem, ficando sempre no marasmo.

Perece-nos normal que todo sujeito que olha para o individuo com deficiência intelectual, a partir de hipóteses embasadas em uma concepção clinica que indica (em função de uma classificação diagnóstica) o que esse indivíduo poderá fazer; que condições terá de aprender; como se comportará diante dos objetos com que irá interagir; acabe, em função de tal concepção, não estimulando que esse individuo experimente, explore, vivencie situações de interação com os objetos, com os outros, com o mundo, e tenha suas hipóteses prognósticas comprovadas (SILUK, 2012, p.155).

A principal problemática levantada estava relacionada ao ensino de música na escola observada, visto que os professores de Arte não possuem formação especifica na área de música e por essa razão sentem dificuldade em trabalhar com os conteúdos. Um dos problemas apontados pelos professores é a não valorização da formação continuada pela gestão da escola, ou seja, os professores não são liberados para sair da escola mesmo nos horários de hora atividade para fazer cursos e oficinas na área escolhida. A instituição não permite que a formação continuada aconteça nos horários de trabalho, não há dispensa para possível estudo. A falta de estudos e continuidade com a formação podem prejudicar os planos de ensino pela falta de conhecimentos específicos na área e, assim, a prática fica comprometida.

Diante de situações assim citadas pela autora e, vivenciadas no cotidiano por esta pesquisadora como professora, fica o seguinte questionamento: esse pensamento produzido pelo pré-julgamento de que o deficiente tem limitações e incapacidades irreversíveis, não seria resultado da falta de tentativas para estimulá-lo e impulsioná-lo em novas atividades?

Mudar essa concepção depende primeiramente de abandonar tais conceitos, pois eles sugerem localizar e classificar os motivos da gravidade da deficiência no que se refere ao grau profundidade: leve, moderado e grave, distinguindo antecipadamente as reações que ele irá apresentar diante dos desafios propostos. As atividades pedagógicas devem proporcionar momentos lúdicos que envolvam o educando com estímulos interessantes, com intuito de desenvolver novas habilidades e potencializar outras que já possui.

A música na escola abre possibilidades de ampliação da expressividade e memorização, desenvolve a criatividade, permite ao educando outras formas de manifestação e de aprendizagem. É neste sentido que a pesquisa busca apontar alternativas viáveis para que as aulas de música sejam reconhecidas nas escolas e que o educando, sujeito principal do processo educativo, seja beneficiado. Ressaltando que são educandos com necessidades educativas especiais, portanto possuem suas especificidades e merecem um olhar cuidadoso do professor e da equipe gestora.

Esse estudo tem como objetivo principal adequar conteúdos de música na escola observada, iniciando esse processo com um grupo especifico para estudo de caso, além de outras práticas com algumas turmas nas aulas de Arte.

            Outros objetivos específicos foram traçados visando melhor direcionamento das intenções pedagógicas a serem desenvolvidas, tais como observar os desafios enfrentados pelos professores de Arte no planejamento dos conteúdos de música; averiguar as possibilidades de execução dos conteúdos de música apresentados pelos educandos com deficiência intelectual e outras patologias associadas; perceber os benefícios das aulas de música para a formação discente; analisar criticamente atividades aplicadas durante o processo; incentivar a utilização do método Kodály na escola, mesmo depois do encerramento da pesquisa.

Nesse sentido, esse estudo pretende incentivar as práticas musicais para os alunos da escola observada, levando em conta ser possível fazer música quando o professor busca esse objetivo e percebe essa necessidade de formação por si só, sem a interferência ou incentivo da instituição.  Para isso, foi realizado um estudo de caso com o grupo de alunos selecionados, visando perceber quais são os avanços em relação às atividades propostas.

Esta pesquisa pretende contribuir para o melhor entendimento dos enfrentamentos do professor de Arte para lecionar os conteúdos de música, sua formação e desafios diários. A mesma será realizada em escola de educação especial com alunos que apresentam deficiência intelectual. O grupo selecionado está entre a faixa etária de dezesseis a trinta anos - Ensino Fundamental I e Educação de Jovens e Adultos.

            A pesquisa está dividida em três capítulos principais subdivididos em tópicos, que irão esclarecer de forma mais direcionada cada especificidade sobre o tema. O primeiro capítulo aborda alguns assuntos pertinentes ao ensino de alunos que apresentam deficiência intelectual, iniciando com um retrospecto histórico acerca das especificidades da trajetória. Assim, foram utilizados alguns autores tais como Jannuzzi (2006); Fernandes (2006); Stobaus e Mosquera (2003); Pan (2004); Brasil (1990); Brasil (1996), que abordam um breve panorama sobre como os deficientes eram vistos pela sociedade e contribuições em relação a políticas públicas de apoio e respeito para com os portadores de necessidades especiais. Com relação ao tópico da definição, há um breve texto relacionando dois autores acerca da terminologia, que são Facion (2008) e Sassaki (2011).

No segundo capitulo há aspectos legais sucintos com relação à educação especial de um modo geral, baseando-se nas obras de Mazzotta (2011). Em seguida, as contribuições acerca da educação especial musical nas palavras de Penna (1999); Brasil (2008); e relacionados aos aspectos legais sobre a educação especial musical Brasil (1971); (1996); Brasil (1997); Brasil (2001); Brasil (2002); Brasil (2009); Siluk (2012); Loureiro (2003); Fernandes (2010); SEED (2008) e Piekarski (2014).

O terceiro e último capitulo traz a metodologia utilizada e os métodos aplicados com os alunos, bem como a análise dos dados coletados no estudo de caso aqui proposto em uma escola de educação especial em Curitiba, fazendo os comparativos das coletas dos dados e as conquistas do grupo durante as atividades aplicadas. Sendo assim a mesma está pautada em autores como Silva (apud MATEIRO E ILARI, 2011); Fonterrada (2008); Puga (2003) Glat (2007) e Freire (2007).

Artigo completo: