Este trabalho discute e propõe a utilização de alguns referenciais metodológicos que favoreçam o atendimento à gestante, uma vez que durante este período há uma desvalorização da individualização da mulher, que volta todo o cuidado à criança que está gerando. A própria sociedade impõe que ela deve se cuidar neste período para não prejudicar o bebê e que deve fazer tudo em benefício deste. Percebe-se um detrimento do “ser mulher” que fica em segundo plano para valorização do filho. Faltam ações que se voltem às suas especificidades e que favoreçam o autocuidado.

1- Introdução

1.1 - Educação em Saúde

A educação em saúde pode ser considerada um campo multifacetado e de grande abrangência nos dias atuais, uma vez que abarca concepções tanto da área da educação quanto da saúde. Essa ação multidisciplinar permitiu à saúde pública orientar novas práticas, favorecendo a promoção da saúde. Pode-se dizer que o conceito de educação em saúde se sobrepõe ao conceito de promoção da saúde, pois define de forma mais ampla o processo de participação da população no seu contexto de vida, favorecendo seu autocuidado, e não apenas atuando nas pessoas sob risco de adoecer (SCHAL e STRUCHINER, 1999). Esse processo é conhecido como educação em saúde ampliada que inclui:

políticas públicas, ambientes apropriados e reorientação dos serviços de saúde para além dos tratamentos clínicos e curativos, assim como propostas pedagógicas libertadoras, comprometidas com o desenvolvimento da solidariedade e da cidadania, orientando-se para ações cuja essência está na melhoria da qualidade de vida e na 'promoção do homem' (SCHALL e STRUCHINER, 1999, sp.)

O movimento da Educação Popular em Saúde visa romper com a verticalidade entre profissionais de saúde e usuários do sistema, com a valorização das trocas interpessoais e das iniciativas desses usuários no que tange a ações em seu próprio benefício. Os indivíduos são considerados portadores de saberes importantes com os quais deve haver uma interlocução dialógica, para um aperfeiçoamento das estratégias de saúde (ALVES, 2005).

1.2 - Assistência à gestante

Quando se discute a assistência humanizada à mulher, a maioria dos estudos aborda questões como parto, puerpério, recém-nascido e aborto. Entretanto, poucos se voltam especificamente às necessidades da própria mulher. Percebe-se tanto na literatura quanto na prática, que há uma escassez de ações de saúde que atendam a esta demanda, que deve considerar a mulher como um ser único, individualizado e com características psicossociais próprias.

Durante anos, perpetuou-se nos serviços de saúde, uma assistência à gestante quase que exclusivamente vinculada à consulta médica, não propiciando ações de saúde que permitissem à mulher expor suas ansiedades, queixas e medos relacionados à gravidez. Assim, a gestação era conduzida de forma intervencionista, tornando as atividades educativas e assistência integral fragmentadas, sem levar em consideração a realidade e individualidade da mulher (DELFINO et.al, 2004).

Neste sentido, compreende-se a importância de se repensar as práticas de atenção à mulher pelos profissionais de saúde, buscando ações que possam atender às suas reais necessidades, de forma mais humanizada e multidisciplinar possível, respeitando seus aspectos psicosocias.

Neste período a mulher sofre diversas alterações fisiológicas que interferem no seu bem-estar físico e psicológico, que muitas vezes limitam ou impedem o seu autocuidado. É possível citar alguns diagnósticos de enfermagem da NANDA (2005-2006) para esta fase:

- Padrão de sono perturbado;

- Mobilidade física prejudicada;

- Intolerância à atividade;

- Ansiedade;

- Dor aguda;

- Risco para infecção;

- Déficit no autocuidado (para banho, higiene), (para higiene íntima), (para vestir-se, arrumar-se).

A utilização dos diagnósticos de enfermagem como instrumento da consulta de enfermagem permitirá às equipes desenvolverem ações imediatas e coerentes de suporte à gestante, diminuindo o ônus dos serviços de saúde com complicações tardias e necessidades mais complexas desenvolvidas pela usuária.

Desta maneira, ações de enfermagem que promovam e facilitem esse cuidado à gestante são fundamentais. O profissional enfermeiro deve incentivar a mulher neste período a realizar o autocuidado, permitindo que se torne o mais independente possível. É importante que os profissionais tenham um olhar mais crítico e holístico em relação à gestante, estimulando-a ao autocuidado e melhora da auto-estima.

Assim, os principais objetivos, ao se atender à gestante na consulta de enfermagem, a partir do enfoque da mulher, deve permear os seguintes aspectos:

- Promover o autocuidado das gestantes;

- Potencializar a realização de atividades cotidianas;

- Orientar quanto a medidas preventivas;

- Compartilhar práticas efetivas de educação em saúde e atenção integrada e humanizada à mulher/gestante;

- Estimular atividades físicas compatíveis com o ciclo gravídico-puerperal;

- Melhorar a auto-estima das gestantes, ressaltando-as como um ser individualizado e enfatizando a importância de manter o "ser mulher" durante este período.

2 Metodologias do cuidado à mulher-gestante

Ao se propor uma atividade educativa em saúde é imprescindível que esta seja pautada em um referencial teórico/metodológico que possa nortear as suas práticas e concretizar a assistência de enfermagem. A Teoria do autocuidado e do déficit do autocuidado de Orem é um importante referencial que pode fornecer bases concretas para o suporte dessas mulheres na gravidez.

Essa teoria baseia-se no pressuposto de que todos os pacientes são capazes e desejam realizar ações em seu próprio benefício, em prol da sua saúde.Quando há seu impedimento ou limitação, o déficit do autocuidado pode aparecer. O déficit ocorre quando as habilidades de autocuidado são insuficientes para satisfazer suas necessidades terapêuticas. Nesse caso o enfermeiro atua como provedor do autocuidado (OREM, 1991).

Essa autora fornece uma base teórica concreta para que as ações possam ser efetuadas de forma holística. Ela sugere o levantamento de dados, a interpretação destes, e a definição dos diagnósticos de enfermagem, que são imprescindíveis para o planejamento da assistência, e que, por conseguinte, nortearão as intervenções de enfermagem. "O acompanhamento da gestante será mais eficaz, uma vez que as ações serão voltadas para as suas peculiaridades, visando a redução dos déficits de AC (...)"(FARIAS et.al, 2000, sp.).

Existem diversos trabalhos que utilizam a teoria do autocuidado na assistência de enfermagem, devido a este modelo facilitar o planejamento da assistência e mostrar-se efetivo e eficaz, uma vez que induz o paciente ao autocuidado (FARIAS et.al, 2000, sp.).

No período da gravidez, a mulher passa por diversas transformações que acarretam algumas demandas e déficits de autocuidado, que precisam ser trabalhadas junto à paciente para serem compensadas e supridas, com o objetivo de preservar o seu bem-estar e manter sua saúde. Neste sentido, a gestante deve ser incentivada pela enfermagem a engajar-se no autocuidado (FARIAS et.al, 2000, sp.).

O trabalho desenvolvido por FRANTZ (2008) ajuda na definição das necessidades cotidianas vivenciadas pelas gestantes, com uma abordagem multidisciplinar, para o enfrentamento junto a essas mulheres, de hábitos e posturas que a prejudicam durante este período, e que diminuem a qualidade de vida. Essa terapeuta ocupacional traz orientações básicas a fim de ajudá-las a utilizar o corpo de forma eficaz durante a gestação. Trabalhos como o de Frants (2008) devem ser estimulados e inseridos no cotidiano das equipes de saúde.

As atividades desenvolvidas para as mulheres podem ainda ser baseadas nas estratégias de ensino de WALDOW (2005), uma vez que enfoca a educação no cuidado e no pensamento crítico, fundamentais para a proposta de atenção à mulher como ser individualizado durante a gestação. O pensamento crítico é fundamental para captar das participantes os seus contextos de vida e sentimentos ocultos. A autora traz também uma série de recursos pedagógicos para o desenvolvimento do cuidado, além de técnicas de relaxamento que ajudarão essas mulheres nessa fase.

É importante que as ações tenham embasamento teórico e conhecimento prático dos profissionais. Abordar temas como edema de MMII, cuidado com as mamas (fissuta de mamilos), estrias, alimentação, higiene corporal, sapatos e roupas adequadas, ansiedade e troca de experiências, lombalgia e cuidados posturais e o "ser mulher" durante a gestação são fundamentais. Sugere-se a utilização de oficinas de cuidados posturais, oficina de técnicas de auto-maquiagem que possam valorizá-las enquanto mulher, massagens, técnicas de relaxamento, grupos de caminhada ou outras atividades como Yoga e Shiatsu, sessões de vídeo, dentre outros.

3 Conclusão

Com a descoberta da gravidez as mulheres anulam-se em favorecimento da criança que estão gerando. A própria sociedade mantém o culto de que a mulher deve se cuidar neste período apenas para não prejudicar o bebê e que a mulher deve fazer tudo em benefício deste. Há um detrimento do "ser mulher" que fica em segundo plano para valorização do filho.

A Teoria de Orem e os trabalhos de Waldow podem servir de instrumento para o embasamento das práticas desenvolvidas pelos profissionais de saúde no que tange ao atendimento das mulheres-gestantes.

É perceptível a importância do tema autocuidado para as gestantes, sendo fundamentais a educação em saúde voltada à quebra de paradigmas e o estímulo da mulher no período gravídico. Ações multidisciplinares devem ser desenvolvidas, englobando a nutrição, atividade física, acompanhamento psicológico, orientações, dentre outros.

7- Referências Bibliográficas

SCHAL, Virgínia T.; STRUCHINER, Miriam. Educação em saúde: novas perspectivas. Cad. Saúde Pública vol.15  suppl.2 Rio de Janeiro,  1999.

ALVES, Vânia Sampaio. Um modelo de educação em saúde para o Programa Saúde da Família: pela integralidade da atenção e reorientação do modelo assistencial. Comunic, Saúde, Educ, v.9, n.16, p.39-52, set.2004/fev.2005

DELFINO, Maria Regina Rufino; PATRÍCIO, Zuleica Maria; MARTINS, Andréia Simon; SILVÉRIO, Maria Regina. O processo de cuidar participante com um grupo de gestantes: repercussões na saúde integral individual-coletiva. Ciência & Saúde Coletiva, 9(4):1057-1066, 2004

Diagnósticos de Enfermagem da NANDA: definições e classificação 2005-2006 / North American Nursing Diagnosis Association; tradução Cristina Correa. Porto Alegre: Artmed, 2006. 312p.

FARIAS, M.C.A.D.de; NÓBREGA, M.M.L.da. Diagnósticos de enfermagem numa gestante de alto risco baseados na Teoria do autocuidado de orem: estudo de caso. Rev. latino-am. Enfermagem. Ribeirão Preto - v. 8 - n. 6 - p. 59-67 - dezembro 2000

OREM, D.E. Nursing: concepts of practice. 4. ed. Saint Louis: Mosby, 1991.