As penas restritivas de direitos podem ser caracterizadas como sendo medidas penais alternativas com relação à imposição de penas privativas de liberdade, havendo a expressa previsão legal da sua possibilidade aplicação na forma do inciso IV do art. 59 do Código Pena, in verbis:

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: (....)

IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.

A possibilidade da substituição de uma pena privativa de liberdade por outra menos rigorosa constitui um caminho eminentemente natural realizado pelo magistrado na confecção de uma sentença criminal, cuja natureza possui caráter preventivo[1]. Neste sentido, tal substituição dependerá fundamentalmente da prévia análise da personalidade do agente, onde igualmente será realizada uma abordagem dos demais requisitos expressos na forma do art. 59 do CP, tais como, as circunstâncias, o comportamento da vítima, entre outros elementos.

Neste diapasão, caso o quantum da pena imposta ao réu não seja superior a quatro anos, ou ainda, na hipótese de uma condenação por crime culposo, havendo, em ambos os casos, a presença de pressupostos legais (art. 44, incisos I, II e III do CP), deverá o juiz considerar sobre a substituição de uma pena privativa de liberdade por outra restritiva de direitos, havendo ainda, a possibilidade da utilização da suspensão condicional da pena como ultima alternativa.

Deste modo, preconiza o art. 44 do Código Penal o que segue:

Art. 44 - As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:

I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II - o réu não for reincidente em crime doloso;

III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

§ 1º (Vetado)

§ 2º Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.

§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

§ 4º A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.

§ 5º Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.

Observadas às circunstanciam elencadas acima, a utilização de uma sanção punitiva menos branda constitui um recurso extremamente adequado dentro da ótica penal, uma vez que, a privação de liberdade possui uma série de consequências negativas ao condenado, sendo ela, uma medida dessocializadora, indicada, nos casos de maior gravidade.

Neste campo, segundo MIRABETE e FABBRINI[2], a falência da pena privativa de liberdade no referente à ressocialização acabou fortalecendo uma tendência moderna na procura por punições substitutivas, sobretudo com relação a condenações menos graves, onde a privação de liberdade e o encarceramento acabam não sendo recomendáveis.

OBJETIVOS DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS

A utilização da pena restritiva de direitos em substituição à pena privativa de liberdade está adstrita a existência de alguns requisitos objetivos e subjetivos, sendo indispensável à presença de ambos, independentemente do caso concreto.

Os requisitos objetivos, dizem respeito à natureza do crime cometido, a quantidade da pena aplicada e a modalidade da execução.

Com relação à natureza do crime cometido, em condenações culposas, há a possibilidade da substituição da pena privativa de liberdade independentemente da quantidade da pena aplicada, consoante preconiza o inciso I do art. 44 do CP, in verbis:

I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

Neste viés, em condenações não superiores a um ano de prisão, poderá ocorrer a substituição de uma sanção privativa de liberdade por uma pena de multa ou outra restritiva de direitos, sendo necessária uma escolha alternativa entre ambas, hipótese onde restará vedada a cumulação das duas, o que consolida a multa como uma sanção alternativa à privação de liberdade, na forma do § 2° do art. 44 do CP:

§ 2º Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.

Com relação esta escolha alternativa, as circunstâncias gerais determinarão a medida mais adequada ao caso, com atenção a prevenção e a reprovação da conduta ilícita substituída.

Ainda[3], o referido inciso estabelece que em condenações superiores a um ano de prisão, a substituição da sanção privativa de liberdade poderá ser feita por uma pena restritiva de direitos e multa, ou, duas restritivas de direitos.

No condizente a ausência de limites estabelecidos no quantum condenatório de crimes culposos[4], tal regramento é utilizado sob a premissa da ausência de qualquer sentido preventivo especial na punição de autores destes crimes, quase sempre praticados em decorrência de comportamentos descuidados, cuja natureza dispensa a aplicação de medidas ressocializadoras.

No tocante a modalidade da execução como quesito objetivo da substituição, é incabível a sua aplicação na anuência de um crime praticado com violência ou grave ameaça a pessoa, devendo ser considerado, para todos os efeitos, o momento da ação do agente, nestes termos:

I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo

Contudo, a violência contra determinada coisa ou objeto, como é o caso do furto qualificado com rompimento de obstáculo, não será óbice a concessão da substituição, consoante a própria jurisprudência ensina:

APELAÇÃO CRIME. FURTO PRIVILEGIADO-QUALIFICADO. MATERIALIDADE E AUTORIA PLENAMENTE COMPROVADAS. Os acusados, juntamente com o filho da vítima, subtraíram uma televisão, um DVD e R$ 50,00 em espécie, do interior da residência do ofendido. Conjunto probatório que confirma a prática delitiva, em que pese a negativa de um dos acusados. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. DESCABIMENTO. Não caracterizado no caso concreto, em que o valor do bem não é ínfimo e a conduta dos agentes não se caracteriza como irrelevante ao direito penal ou ao senso comum. PRIVILEGIADORA MANTIDA. Preenchidos os requisitos do artigo 155, § 2º, do Código Penal. CONCURSO DE PESSOAS. CONFIGURADO. Os acusados e o filho da vítima, por seus modos de agir, demonstraram que estavam concertados para a realização da subtração, ficando o nexo subjetivo entre ambos evidenciado. Demonstraram estar concatenados para a realização do ilícito, na medida em que atuaram em conjunto, tanto na idealização quanto na sua execução. DOSIMETRIA DAS PENAS. Penas-bases reduzidas para o mínimo legal. Afastamento da valoração desfavorável dos antecedentes, da conduta social e dos motivos da infração. Embora a incidência da atenuante da confissão espontânea e da menoridade, estas não tem o condão de reduzir a pena aquém do mínimo legal. Inteligência da Súmula 231 do STJ. Mantida a redução em razão do reconhecimento da privilegiadora do artigo 115, § 2º, do Código Penal. PENAS CARCERÁRIAS E DE MULTA REDIMENSIONADAS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CARCERÁRIA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. READEQUADAS AS ESPÉCIES. Mantida a prestação de serviços à comunidade, mas substituída a prestação pecuniária por limitação de fim de semana, com frequência a grupo de toxicômanos, a ser regulamentado pelo juízo da VEC. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Crime Nº 70058509696, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Julgado em 26/06/2014)

Ainda, no condizente a delitos como a lesão corporal leve e constrangimento legal (onde há a presença de violência), não haverá a incidência desta norma, uma vez que, se tratam de delitos de menor potencial ofensivo, estando sujeitos ao regramento da Lei 9.099/95.

Por fim, no condizente a pena aplicada, a mesma não poderá ser superior a quatro anos, sendo irrelevante a natureza dolosa ou culposa nestes casos.

REQUISITOS SUBJETIVOS

Os requisitos subjetivos da substituição de penas privativas de liberdade por restritivas de direitos, dizem respeito a não reincidência do réu em crime doloso e a suficiência da substituição.

Com relação à reincidência em crimes dolosos, a princípio as penas restritivas de direitos são incabíveis de serem substituídas. Entretanto, tal entendimento não constitui um fato impeditivo absoluto, vez que, poderá ver a anuência de uma medida socialmente recomendável com relação à condenação anterior, fato que torna permissiva a concessão da substituição nesta situação, senão vejamos:

§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.

Sobre esta norma penal, CAPEZ[5] expõe o seguinte:

“Dessa forma, somente aquele que, após ter sido definitivamente condenado pela pratica de um crime doloso, vem a cometer novo crime doloso fica impedido de beneficiar-se da substituição. Se entre a extinção da pena do crime doloso anterior e a pratica do novo delito tiverem decorrido mais de 05 anos, o condenado fará jus à substituição, não subsistindo a vedação.”

Em outra senda[6], os aspectos subjetivos da análise da suficiência da substituição dizem respeito a requisitos como culpabilidade, antecedentes, conduta social e a personalidade do reeducando, bem como os motivos e as circunstancias do fato concreto.

Da mesma forma[7], esta determinação legal encontra respaldo no art. 5°, inciso XLVI da Constituição Federal, cujo teor versa sobre a prestação social alternativa.

Finalmente[8], com relação à utilização das penas restritivas de direito na hipótese do concurso de crimes, deverão ser observados os critérios da exasperação penal, desde que, obviamente estejam ultrapassados todos os requisitos objetivos e subjetivos supracitados. Desta forma, caberá a utilização da substituição na incidência de crime continuado ou concurso formal de crimes, ou ainda, do concurso material de delitos, desde que a soma dos crimes neste caso não ultrapasse quatro anos de prisão.

Todavia, no concurso material de crimes, será incabível a utilização da substituição caso a soma das penas venha a ultrapassar quatro anos, sendo irrelevante o quantum individual de cada sanção.

CLASSIFICAÇÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS

As penas restritivas de direito são taxativas[9], não permitindo nenhum tipo de discricionariedade por parte de juízes. As penas alternativas previstas em lei são dez, sendo deste total, nove restritivas de direitos e uma de multa.

As penas restritivas de direito são divididas em dois grupos: Seis em sentido estrito, e três pecuniárias.

Neste campo, as penas restritivas de direitos em sentido estrito dizem respeito à restrição de determinado exercício ou prerrogativas de direito, como é o caso da prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas; a limitação de fim de semana e a interdições temporárias de direitos.

Finalmente, as penas restritivas de direitos pecuniários referem-se a diminuição do patrimônio do condenado ou a prestação inominada em favor da vítima ou seus herdeiros, quais sejam, a prestação pecuniária em favor da vítima, a prestação de outra natureza inominada, e a perda de bens e valores.



[1] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1 – 16ª Edição. Editora Saraiva P. 554. 

[2] MIRABETE, Julio Fabbrini e FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Parte Geral, 28ª Edição Revista e Atualizada. Editora Atlas, p. 258.

[3] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1 – 16ª Edição. Editora Saraiva, p. 562/563.

[4] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1 – 16ª Edição. Editora Saraiva, p. 558.

[5] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral 1. 16ª Edição. Editora Saraiva, p.438.

[6] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1 – 16ª Edição. Editora Saraiva, p. 562.

[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral 1. 16ª Edição. Editora Saraiva , p.436.

[8] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral 1. 16ª Edição. Editora Saraiva , p.439.

[9] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1 – 16ª Edição. Editora Saraiva, p. 562.