AS PALAVRAS DAS IMAGENS 7*

OH! MEU AMATO AMADO…

Oh! meu Amato amado:
A medicina amaste
E nela, bem cerrado,
O Homem, quanto baste.

Um ‘perpétuo testemunho’*
Derrama da tua obra
De coração e de punho,
Com feitos altos de sobra.

Apartado da cidade,
O teu lugar era o mundo,
Fechado, sem liberdade
Onde eras oriundo.

Mas tu rompeste o destino:
Tal horizonte rasgaste
Que ao berço teu, de menino,
O mesmo mundo levaste!


* Da Dedicatória da 1ª Centúria a Cosme de Médicis.

— em Castelo Branco.

POMBAS TÃO CHEGADAS…

O que atrai estas pombas tão chegadas?
As gotas de água? O voo alto que cansa,
E pede tréguas, na praça cheia de graça?
Ou, simplesmente, o afago da criança?

— em Praça do Rossio.

 

NA PRAÇA DO ROSSIO, COM UM VERSO DE GOETHE:

"Não canteis com lúgubre canto
A solidão da noite.
Não: porque ela, oh formosas,
Está feita para o convívio.

Por isso no longo dia,
Recorda-o, querido coração:
Cada dia tem o seu tormento
E a noite o seu prazer"

GOETHE

— em Praça do Rossio.

Vista de Castelo Novo:

A RÃ E O TOURO (réplica)

Dizia a rã, no alto da montanha,
À vista de uns prados bem formosos:
“Não há touro capaz desta façanha
De o mesmo ver, sem olhos cobiçosos!

— em Castelo Novo.

 

QUANDO AS MÓS SALTAREM DOS MOINHOS...

Quando as mós saltarem dos moinhos
E da ribeira a água não regar;
Quando o verde já for o trilho dos caminhos
Onde os passos perderam o andar;

Quando a fruta cair inerte no pomar
E o chão em vez de uvas der espinhos
E a azeitona não luzir na pia do lagar
E nem vivalma aqui houver... sozinhos

Ficarão o vento, que à mesma irá chegar,
Sorrateiro ou brusco sobre os pinhos,
Com os ramos a gemer ou a cantar,

E o sol alegre, em dias lavadinhos
(Deixando a noite fasta de luar),
Saudoso de dar viço aos cebolinhos.

— em Souto da Casa.

 
"A LITERATURA TRAZ AO HOMEM PLENITUDE; O DISCURSO SEGURANÇA; E A ESCRITA EXACTIDÃO" - FRANCIS BACON, Ensaios

 

RETRATOS CONTRÁRIOS

São dois retratos contrários:
O mais velho, ainda novo;
E o novo, bem mais precário,
Mais velho, como eu comprovo.

E não sei como explicar!
No novo, mais jovial
O rosto parece estar;
Mas no velho, nem sinal!

 

Castelo Branco: à sombra do castelo:

As cabras partiram das almagras*
E o feno no verão ficou altivo.
Faltou o leite e as crianças magras
Não brincam lá, privadas de motivo.

*Argila avermelhada. Nestes locais da proximidade do castelo, houve em tempos fornos de fundição e agricultura. Na zona existe a Rua dos Oleiros.

— em Castelo Branco.

 

O templo de Kom-Ombo, do período Greco-Romano, na margem do Nilo, em setembro de 2008:

e um verso de ARQUÍLOCO, poeta jónico (c. 700 a.C.)

“A mim o que me mata,
Querido efebo, digo-te:
Desejo sem prazer,
Versos sem graça ou ritmo,
E ceias só com chatos.”

e a réplica:

 A MIM O QUE ME MATA…

Pois ‘a mim o que me mata’,
Com tal prazer de viver
É esta coisa bem chata
Do gosto não entreter.

— em Kôm Ombo, Aswan.

 

Ainda o templo de Kom-Ombo, no vale do Nilo (período greco-romano),em setembro de 2008,

e um verso de Safo (630-570 a. C.):

"É um mal a morte,
E os deuses pensam assim:
Ou já estariam mortos,
Há muito, muito tempo..."

e uma réplica:

 PODE O MORRER SER UM BEM?

Pode o morrer ser um bem?
Tudo depende, conforme:
Viver mais quando convém
Ao corpo mesmo disforme.

Mas se o gozo for enorme
Algum cansaço há de ter.
Que bem melhor deve haver
Num alquebrado que dorme?

— em Kôm Ombo, Aswan.

 

 "A EUROPA QUASE MORTA’*

‘A Europa quase morta’
está num estado de torpor,
e sopra que não importa
à Europa ter rigor

mortis
** à periferia.
Coitada! Como se houvesse
vida assim, mesmo de um dia,
se a periferia morresse!

*Título na TSF, do dia 10 abril 2013

** Rigor mortis: sinal cadavérico.

 

CEREJEIRAS

 "Acordar...ser na manhã de Abril
a brancura desta cerejeira…"

EUGÉNIO DE ANDRADE

In: "Cerejas - Poemas de amor"
Antologia de: GONÇALO SALVADO e MARIA JOÃO FERNANDES


FLORES BRANCAS, QUE CANDURA…

Flores brancas…que candura!
E se as folhas não viessem
Resguardar tão inocente
Cortesia de uma mãe?

— em Donas.

 
AS PÉTALAS IRÃO - SOPRO TÃO BREVE…

As pétalas irão - sopro tão breve -
Num assombro que não finda; vai durar:
Quando o fruto acudir, o belo aos olhos,
E mais prodígio ainda ao paladar!

— em Alcongosta, Fundão.

 

ALENTEJO EM ABRIL

Este manto é tão macio,
Faz um sono tão folgado,
Que até o sonho arredio
Começa estando acordado!


 — em Nisa.

 “ECOS

O seu vigor revibra aqui
entre pedras o sopro da verdura -

ecos vindos vibrantes do porvir
de que a morte soez será vencida,

que antes das flores hão-de ser os frutos."

ANTÓNIO SALVADO, in: "entre pedras, o verde", Palavra em Mutação, 2004

 — em Castelo Novo.

* Colheita das palavras das minhas imagens do facebook, no dia 16 de abril de 2013