Artigo - Os habeas corpus coletivos para presas com filhos menores. Roberto Ramalho é advogado. Roberta Acioli é advogada e Pós-graduanda em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho.

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu no dia 24 de outubro, conceder prisão domiciliar para ao menos dez mulheres com filhos pequenos que haviam tido seus pedidos de liberdade negados por instâncias inferiores. Nove dessas mães tinham sido presas por envolvimento com tráfico de drogas. 

Entre os motivos para negar a aplicação do habeas corpus coletivo concedido pela Suprema Corte, juízes locais alegavam que as mães não são capazes de provar serem indispensáveis para o cuidado dos filhos, por terem outros parentes que podem ficar com eles. Outra justificativa é de que elas seriam má influência para os filhos, por terem cometido crime.

O Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), por sua vez, argumentou que não cabe a magistrados locais, em apreciação sumária, afastar a guarda de crianças ou impedir cuidados maternos, desobedecendo o habeas corpus coletivo do STF com base em questões moralistas.

Lewandowski deu 15 dias para os interessados se manifestarem no processo, incluindo a Defensoria Pública da União (DPU), as defensorias estaduais e os Tribunais de Justiça dos estados. Em seguida, deu prazo para que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste, antes de proferir decisão “sobre medidas apropriadas para efetivação da ordem concedida neste habeas corpus coletivo”.

Ricardo Lewandowski é relator do habeas corpus coletivo concedido a todas as mulheres presas preventivamente que estejam grávidas ou tenham filhos de até 12 anos. Mesmo com a decisão em vigor desde fevereiro, o STF tomou conhecimento de que a medida não estava sendo cumprida. Daí a nova decisão tomada pelo ministro. A medida vale para detentas provisórias, ou seja, que ainda não foram condenadas em definitivo.

Manifestando-se sobre o grave problema, o defensor Público-Geral Federal, Carlos Eduardo Paz, relatou que as defensorias públicas lidam cotidianamente com o cárcere e situações a ele correlatas. Segundo ele, "não é preciso muito exercício de imaginação para entendermos os augúrios do cárcere para recém-nascidos e mães. Os conhecidos problemas saltam aos olhos e afronta a dignidade". Assim sendo, ele afirmou que, para problemas coletivos, são adequadas soluções coletivas.

"Esta é uma mudança de cultura importante que acontece a partir de hoje. Nós, que trabalhamos com direito penal e processual penal, sabemos como é caro o entendimento de que o Habeas Corpus cabe coletivamente", declarou o defensor Público-Geral Federal. Também disse que a decisão deverá se tornar instrumento de cabeceira de defensores públicos e promotores de direitos humanos para casos futuros.

A advogada da entidade que impetrou a ação, o Coletivo de Advogados em Direitos Humanos (CADHu), Nathalie Fragoso, comemorou muito a decisão, afirmando ser este um passo importantíssimo para a superação do encarceramento em massa feminino. Porém, lembrou que o pedido não foi integralmente contemplado.

Disse ela: "Os ministros colocaram restrições em relação à natureza do crime. O que não cabe, pelo nosso entendimento, no momento da prisão preventiva, quando se tem a presunção da inocência".

Para a advogada Heloisa Machado, no coletivo, na prisão as mulheres estão expostas a doenças como sífilis, tuberculose, de prevalência bem maior nesse ambiente, além de abusos e violências variadas.

Reforçando sua tese afirmou: "E tem-se ainda o uso excessivo da prisão provisória. O que significa que gestantes e mães enfrentam esse inferno sendo por princípio inocentes". De acordo com o coletivo, na média, 30% das mulheres estão ainda sob prisão provisória, ou seja, sequer foram julgadas ainda. Em alguns estados, como Sergipe, o número passa dos 90%.

Lewandowski decidiu ainda oficiar o Congresso Nacional para avaliar se não é o caso de estender a norma para presas definitivas.

Disse Lewandowski em seu despacho: “Oficie-se ao Congresso Nacional para que, querendo, proceda aos estudos necessários a fim de avaliar se é o caso de estender a regra prevista no art. 318, IV e I, do Código de Processo Penal, às presas definitivas, i.e., aquelas cuja condenação já transitou em julgado, dados os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil e, em especial, as regras de Bangkok. Encaminhe-se cópia da decisão concessiva do habeas corpus coletivo”.

Em fevereiro do corrente ano, a 2ª Turma do STF havia concedido o HC coletivo para determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar – sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no artigo 319 do CPP – de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças com até 12 anos sob sua guarda ou pessoa com deficiência, listadas no processo pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) e outras autoridades estaduais, enquanto perdurar tal condição, excetuados os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelo juízes que denegarem o benefício.

A decisão é muito importante para as mulheres mães que precisam cuidar de seus filhos. Por que decisões como essa geram polêmicas quando se sabe que mães que praticaram crimes mais graves e pertencem a classe alta ou média alta já foram beneficiadas?

A lei é igual para todos e o STF está de parabéns por essa decisão apropriada, feliz e justa.

Não é penalizando dessa forma que construiremos um verdadeiro ‘Estado Democrático de Direito.

Com certeza o futuro ministro da Justiça e da Segurança Pública deverá aplicar sanções mais duras contra criminosos, mas que, no entanto, não resolverá o problema, que tem natureza econômica e social.

É claro e evidente que tem pessoas que já nascem com uma índole criminosa, juntando características do fenótipo e do genótipo. E essa natureza cabe aos psiquiatras, psicólogos e peritos criminais o estudo aprofundado sobre o assunto.