Arte Digital: Técnico/Programador vs Artista/programador.
Por Heverton Luis Barros Reis | 04/12/2014 | ArteRESUMO
O trabalho faz uma breve analise sobre a Arte Tecnológica e dos meios Digitais, apresentando termos e nomenclaturas que circundam esse campo. São levantados questionamentos sobre o Técnico e o Artista, Artista X Técnico, Homem-Maquina, o papel do programador e a programação na arte digital, sua importância e os meios que se desenvolve a Arte mediada pelas tecnologias. A compreensão fica por conta do dialogo que travo com artistas/ teóricos, estudiosos que há alguns anos veem pesquisando e escrevendo sobre. A ideia central do texto refere-se a programação para gerar Arte Digital, mas antes se faz necessário explicar o papel do Técnico, e também situar o leitor sobre a arte e o artista contemporâneo.
Palavras-chave: Arte Digital, programador, Artista/Homem Maquina,Tecnologia.
Na contemporaneidade estamos vendo surgir no âmbito das artes novos conceitos e formas dos fazeres artísticos, com isso não podemos ficar inerente a todo esse processo e/ou tentar nos abster de tudo que acontece em nossa volta, principalmente para os artistas e estudantes de artes desse novo tempo.
Para compreendermos melhor o que se trata a arte tecnológica e suas interfaces (O conceito de interface utilizado nesse trabalho deriva dos estudos de Claudia Giannetti, no texto: Operadores e Socialização Link* Reflexões sobre sujeitos, telas, dispositivos e interfaces) é preciso compreender historicamente a transformação das produções artísticas. Os novos lugares que as artes mediadas pelos aparatos tecnológicos veem ganhando. Também não devemos pensar que esse motim de produção artística começou ontem, visto que desde que a globalização se tornou fato que estamos vendo artistas se reinventando e criando novos caminhos para lidar com as mídias e produções artísticas.
Com isso a frase de Christine Mello (Arte e novas mídias: práticas e contextos no Brasil a partir dos anos 90) que nos diz em outras palavras que a as tecnologias estão em nosso meio social e não podemos nega-la ou rejeite-la, serve como ponto de partida para pensarmos sobre as Artes tecnológicas.
Novas configurações veem ganhando espaço nas produções artísticas e com isso surgiu novas nomenclaturas para designar as Artes tecnológicas digitais. “ arte & tecnologia”, “artes eletrônicas”, “arte-comunicação”, “poéticas tecnológicas” “artemídia”, entre outras ganharam espaço, e no Brasil particularmente na década de 60.
As produções artísticas também ganharam novas formas e nomes para conceituar essa nova (não tão nova) produção (me permita assim chamar) artística. Como “Instalação Artística”, esse conceito se desenvolveu por volta de 1942 por nomes como Kurt Schwitters e Marcel Duchamp. Os elementos que caracterizam esse conceito são: lugar, espaço ou não lugar, sensorialidade, percepção, hibridismo, tempo de permanência do trabalho entre outros. Entre as obras mais famosas estão: 16 Milhas de Fios de Duchamp e On Translation-El aplauso de Antoni Muntadas. Outro conceito muito utilizado é “site-artistic”, que surgiu no meado dos anos 60 afim de descentralizar a arte, de tirá-la do local canônico e especifico e dialogar com os espaços urbanos. Temos ainda o “Wired City”, “Interversão Artística”, etc.
O que podemos observar antemão é que todas essas novas formas perpassam pelo hibridismos em suas produções, ou seja, as artes se misturam, interagindo entre si, para chegar a um produto final. E esse hibridismo é uma característica dessas produções, assim também como a participação do público, que sai apenas de meros apreciadores para coparticipantes nas obras, pois as obras podem estar não acabadas; Outra característica que varia dentro dos conceitos apresentados (interatividade, instalação, etc) é os novos lugares que essas produções e fazeres artísticos ganharam; algumas obras saem das galerias e ganham os espaços públicos (city-specfic) e de forma efêmera (outra característica presente é a efemeridade) ocupa espaços novos, dialogando de diversas formas.
O que Paulo Bernardino nos mostra em seu texto, Arte e Tecnologia: Intersecções de 2010, entre outras coisas, é questões da Imagem, e de como a arte pode se modificar dentro de algo já existente. Quanto a essa ruptura autoral Bernardino também nos apresenta novos quadros para entendermos a arte contemporânea.
Outros autores e estudiosos das Artes já diziam há muito tempo que, nada se inventa tudo se recria, por que tudo que tinha pra ser inventado já foi. Concordando parcialmente com essa afirmação e levando ela apenas ao viés discutido aqui, podemos perceber justamente essa recriação dentro do campo das Artes Tecnológicas. A “pop-Art” é um belo exemplo do trabalho nas tecnologias digitais, da imagem e das novas produções.
Indo além do texto e dando um exemplo mais conhecido dessas novas produções, do próprio hibridismo e dos conceitos ainda não explorados, temos o Eduardo kac, (http://www.ekac.org) brasileiro conhecido no mundo todo, pioneiro da Arte digital, e bem conhecido também por suas experimentações com arte e biologia, a “bioarte” Ou ainda falando em kac em suas Instalações Interativas promovidas via redes como a obra “Uirapuru”, 1999 do qual o público participa do outro lado da tela, uma espécie de “Telepresença”. E tudo isso possível graças aos dispositivos tecnológicos, suas interfaces, seus programas, softwares desenvolvidos para dialogar com essas produções “Homem-Maquina”.
Portanto vivemos dentro desse “Rizoma social” (o rizoma é um conceito apresentado por Paulo Bernardino remetido do Gilles Deleuze e Felix Guattari para explicar a não hierarquização das redes) que se recria e se reinventa a todo tempo, por artistas amadores e profissionais, promovido muito das vezes pelas redes.
Mais será que devido a toda essa facilidade de se fazer arte tecnológica, essas produções artísticas teriam se perdido entre o artista e um técnico?
Para pensarmos sobre, devemos primeiro entender que tipos de classificação dão a alguém, seja ele Artista ou Técnico. Pois será que alguém capaz de gerar uma sensibilidade artística tendo a facilidade com as interfaces “Homem-Maquina” não estaria fazendo uma proposição artística? Não podemos mais pensar que o artista é aquele com a ideia e que controla tudo e sabe de tudo, que diz o que devemos achar da obra feita! Não, o artista é aquele que constrói passo-a-passo de sua obra e deixa aberta a fruição do público participante.
É desse Artista contemporâneo que estamos falando aqui. O artista que pensa conceitualmente a obra e que no caso das artes tecnológicas, usam os instrumentos digitais para gerar um resultado. Ora, então todo mundo que produz uma atividade por meio das interfaces tecnológicas está produzindo Arte? Também não podemos dizer que sim, por exemplo, quem produz um carro gráfico com o intuito apenas de vender aquele carro (como o que ocorre na publicidade) não está criando uma proposição artística sensível, está apenas se utilizando das tecnologias e dos programas para produzir algo.
A diferença entre o artista e o técnico é justamente na sua intenção. Por que até mesmo um artista pode gerar proposições durante sua carreia e em contra partida pode trabalhar para vender uma marca, em um momento ele estará produzindo Arte em outro como técnico, alguém que domina a linguagem e seus códigos para gerar resultados de mídia tecnológica.
Dentro desse sistema de Arte Tecnológica temos os programas específicos e suas linguagens. As linguagens fazem parte da nossa estrutura sociocultural, pois para nos comunicarmos em qualquer meio precisamos aprender códigos.
No exato momento que estamos em formação no útero de nossas mães, ali começamos a trocar códigos; quando nascemos inconscientemente produzimos códigos, seja através do choro para dizer que estamos com fome, ou com dor ou ainda sede. Quando entramos em contato com a fala, começamos ali a troca do código verbal na língua vivenciada e mais tarde através da escrita. No cambito da esfera computacional também existem códigos numéricos que são transformados inicialmente em algoritmos. Esses códigos vão variar de complexidade e de sua quantidade, como Suzete Venturelli no texto: SOFTWARE ART/CÓDIGO ARTE, nos diz que toda linguagem dentro do campo da programação tem os métodos que já existem ou preexistem.
O que produzimos na disciplina “Artes e Mundo Digital” (UFBA, 2014.2) é um ótimo exemplo para tal. O Storyboard que é nada mais que escrever os códigos que será reconhecidos e entendido dentro da linguagem de programa especifica, e que será transformada em um resultado visual tecnológico. Digo “visual tecnológico” não necessário artístico. Em sala estávamos/estamos aprendendo a utilizar o programa, como estudantes de artes podemos utilizar o aprendizado para gerar arte. São coisas diferentes e que devem ser ressaltada para melhor compreensão do Técnico X Artista (que pode também ser o programador, técnico).
Ricardo Portella de Aguiar no texto: SOFTWARE ARTE: LINGUAGEM DE MÁQUINA E O ARTISTA PROGRAMADOR, vai justamente nos explicar todo processo para descrevermos através dos códigos. Servindo de guia para quem pretende iniciar como programador. Mas a intenção maior do autor é nos dizer que para se produzir essa linguagem é preciso existir antes de mais nada um software que dialogue com esses comandos. Outra questão para além é mais uma vez revisitada pelo autor, a respeito dos códigos para a criação artística, pois não se faz arte computacional sem aprender essa linguagem, sem se comunicar com ela.
O artista apenas das grandes ideias ficou no passado, e como o mesmo diz, é um desafio, mas que se faz fundamental para dialogar com as novas formas de produção artística.
Antes de terminar devemos compreender o papel do programador nas Artes Tecnológicas. Ele vem justamente compor esse espaço que é tão múltiplo. Ora vem como Artista que sentiu a necessidade de colocar a mão na obra e desenvolver sua proposição, lidando com todas as interfaces, com os programas e dispositivos descodificando linguagens e transformando em outras; ora o mesmo vem como Técnico que conhece todo o processo e também é capaz de transformar códigos em resultados. O que diferencia um do outro é sua intenção, o que ele gera com os softwares, para quê e para quem ele cria. A maneira que ele utiliza os mecanismos da tecnologia também vai dizer o local do Artista/Técnico.
Quanto à programação na Arte Digital, é fundamental. Não devemos ficar refém de outro que pode não desenvolver de forma sensível. E o papel do artista contemporâneo é justamente aprender e está submerso nos processos da programação. Não podemos pensar Arte Tecnológica Digital sem os programas, pois são eles que tiram o campo da ideia para um resultado sensível concreto. É descodificando linguagens que criamos e produzimos Arte Digital.
Para concluir, ressalto a importância de compreendermos o mundo que vivemos; as novas formas e caminhos que se fazem presentes, principalmente no campo artístico. Compreendo e faço parte dos que têm dificuldades de passar da linha do teórico para o campo pratico no quesito das Tecnologias Digitais, mas vejo como fundamental estar cada vez mais dentro dos processos artísticos digitais.
Poderá chegar um tempo onde isso seja a base para se produzir artisticamente, e como artistas não podemos, e nem devemos para no tempo. Ou mais tarde seremos o que alguns críticos de arte são hoje para nós, dos quais (alguns) não compreendem as mudanças no cenário social e cultural que reverberou e transformou o mundo e com isso modificou também o fazer artístico. Mas antes de tudo isso, devemos nos permitimos e experimentarmos o novo. “Nada se perde, tudo se transforma”.
Bibliografia:
BERNARDINO, Paulo. Arte e Tecnologia. Intersecções. ARS (São Paulo) vol.8 n°16 São Paulo 2010;
SOGABE, Milton. Instalações interativas mediadas pela tecnologia digital: análise e produção. SCIArts. Metacampo, Itaú 61 Cultural, 2010.
MELLO, Christine. Arte e novas mídias: práticas e contextos no Brasil a partir dos anos 90.ARS (São Paulo) vol.3 n°.5 São Paulo 2005
FREIRE, Cristina. Poéticas do processo: arte conceitual no museu. São Paulo: Iluminuras, 1999.
NARDIN, Heliana Ometto. Objeto e instalação-itinerários de criação e compreensão em artes plástica. Tese de doutorado, UNICAMP, 2004.
SCHIOCCHET, Michele Louise, Site-specific art? Reflexões a respeito da performance em espaços não tradicionalmente dedicados a esta. Revista Urdimento, 2011. Edição de n°17.