Arrombado.
Publicado em 12 de junho de 2013 por Carlos José Esteves Gondim
Arrombado.
“O Senhor das Esferas, pra não ficar com as vastas mãos abanando, depois de ter criado os peixes, e os astros, e as águas, e as trevas e tudo...”, escreveu Vinícius de Moraes, “...resolveu criar a praia de Arrombado, em Maracanã, litoral do Pará” – arremato eu. Lá, o Dia da Criação parece que ainda não acabou.
Areia sem fim, manguezais quase também, nada de terra firme. Vento Norte forte o tempo todo. Maré alta, maré baixa. Sol, muito sol. A presença humana é percebida pelas poucas casas, quase todas feitas de madeiras de mangueiro e cobertas de palhas, trazidas de longe, da terra firme; pelos currais de peixes que franjeiam os bancos de areia, salientes nas marés baixas, e, pela barcas à vela ou motorizadas.
Lá tem peixe, camarão, caranguejo, sururu, mexilhão, turu, siri, sapequara... – Quer mais? – Tem o “Procoió”, apelido de Adriano do Espírito Santo Maia, caboclo puro de coração. Que não troca a amizade por dinheiro. Que vai tirar caranguejo no mangal e presenteia-nos sem esperar retribuição. Que sai com o puçá de pescar camarão na noite escura, quando a maré começa a subir, palmilhando algumas centenas de metros de beira de praia, ensinando para mim mais uma lição de vida. E é aí que, de repente, descubro-me como se estivesse pisando nos astros, nas constelações, na Via Láctea! Olho para a água agitada pelo movimento de nossos passos e vejo uma profusão de luzinhas que se acendem... – Serão organismos luminescentes ou areia radioativa? – Especulo.
A comunidade que lá existe, portanto, vive exclusivamente da pesca, farta quase todos os meses do ano. Mas como disse, lá não tem terra firme. Não tem chão pra plantar a roça e fazer a farinha. Isto é um problema. Perto, existe uma ilha – Ipomonga – que tem. Mas, já tem dono. O seu dono parece que não come farinha... Não faz roça... Por que não repartir um pouco de terra com os que nada têm e dela precisam para sobreviver?
As pessoas dizem que a praia de Arrombado está “crescendo”. É o interminável trabalho das correntes marinhas, das ondas e do vento incansáveis. Tiram daqui, põem ali. E assim vãoi brincando de construir.
Por favor, um apelo eu faço aos senhores “donos do mundo”: Não “incentivem” o turismo, mesmo o dito ecológico, em Arrombado! Não planejem ponte nem estrada! Deixem sossegado o Senhor das Esferas continuar no seu interminável Dia da Criação!