Aquém da porta

  

À medida que o amor de Carlos acaricia o corpo de Heloísa, ruídos ecoam do lado de fora da casa abandonada – refúgio da intensa paixão. Seduzidos pelo desejo, nada ouvem. Almejam apenas a concretização do amor de forma plena.

Os gritos de prazer que se sucedem, movidos pela avidez com que Carlos e sua amada se completam, são mais intensos do que a percepção de qualquer som. O tempo e a música emudecem, suspirando em volta.

Os ruídos intensificam-se. Mas nada nesse mundo impediria Carlos de desfrutar o jorro de sensações que a companheira lhe proporciona. Percorre os labirintos da memória, em busca do passado e do perdão. Heloísa havia confessado que o traíra com Jorge, seu colega de trabalho, enquanto Carlos viajava.

Quando uma parede desaba aos pés da cama dos amantes, Carlos treme. Não de medo, mas sacudido pelo estrondo do gozo. Desconfianças tornam-se muito vivas. Ergue-se, rápido, buscando a luz para a razão.  Não mais a encontra.

Novas paredes continuam a ruir, como peças de dominó enfileiradas, uma a uma. Corre para a rua. No chão, árvores abatidas e folhas mortas, tais como seus amores. Os relâmpagos rasgam o ventre da noite e pousam no ninho de amor não saciado.

Redesenhando seus passos, ele olha para a casa demolida. Os pés pisam sobre os destroços. Um raio fulmina o que restou.

Ruínas o saciam. 

 

Themis   Groisman Lopes