ANGÚSTIA EM KIERKEGAARD: MEDO, DÚVIDA E DESEJO

 

                                                                                           Alfredo Soares Moreira Filho

 

 

RESUMO 

Este artigo busca mostrar que o conceito de angústia, de Kierkegaard, se constitui numa reflexão sobre a liberdade humana. Nesse sentido, intenta dilucidar que a análise inerente a esse conceito, que aborda o tema do pecado, caracteriza-se como uma reflexão de cunho teológico, com contornos filosóficos, com base nos argumentos de Kierkegaard sobre o assunto em um contexto bíblico. Objetiva-se conhecer a origem e as consequências da angústia em cada indivíduo, diante da possibilidade de escolha: segurar o medo de cair, ou se jogar de vez? Eis o drama proposto por Kierkegaard. Mostrar como esta análise continua atual e pertinente aos nossos dias. O motivo que levou a escolha do tema foi a percepção de que a angústia do homem contemporâneo se equivale a mesma no pensamento de Kierkegaard, no que se refere ao desespero e a busca da liberdade. Objetiva-se conhecer a origem e as consequências da angústia em cada indivíduo, diante da possibilidade de escolha. Essa escolha, propicia o agir livre do homem através da análise da angústia, diante do medo, dúvida e desejo, antes e depois da queda, ou seja, torna-se inerente ao ser humano o ato de pecar. Desse modo, o ser humano é aí abordado como apto a realizar aquilo que a Bíblia costuma chamar de pecado.

PALAVRAS-CHAVE: Angústia. Medo. Dúvida. Desejo. Liberdade. Pecado.

 

INTRODUÇÃO

O tema deste trabalho é Angústia em Kierkegaard, na tríade: Medo, Dúvida e Desejo diante do precipício. Nesse sentido, intenta dilucidar que a análise inerente a esse conceito, que aborda o tema do pecado, caracteriza-se como uma reflexão de cunho teológico, com contornos filosóficos, com base nos argumentos de Kierkegaard sobre o assunto em um contexto bíblico. Objetiva-se conhecer a origem e as consequências da angústia em cada indivíduo, diante da possibilidade de escolha: segurar o medo de cair, ou se jogar de vez? Eis o drama proposto por Kierkegaard. Hipoteticamente, a única solução seria o homem se lançar no precipício e arcar com as consequências, se isso significa pela possibilidade da escolha, a liberdade, para decidir por si mesmo a sua vida, descobrir o significado da sua existência. Essa escolha, propicia o agir livre do homem através da análise da angústia, diante do medo, dúvida e desejo, antes e depois da queda, ou seja, torna-se inerente ao ser humano o ato de pecar. Desse modo, o ser humano é aí abordado como apto a realizar aquilo que a Bíblia costuma chamar de pecado. Mostrar como esta análise continua atual e pertinente aos nossos dias. O motivo que levou a escolha do tema foi a percepção de que a angústia do homem contemporâneo se equivale a mesma, no pensamento de Kierkegaard, no que se refere ao desespero e a busca da liberdade. Daí, concluir que, as ideias de Kierkegaard continuam válidas e atuais na contemporaneidade. O tema da angústia assume uma importância central dentro da filosofia, somente a partir de Kierkegaard, sobretudo para a corrente existencialista, da qual ele é considerado o iniciador. A angústia está ligada a busca do sentido para a existência e o desejo de liberdade, diante da dúvida e o medo. O tema será desenvolvido, na primeira parte, em que se tratará da origem e consequências da angústia em cada indivíduo diante da possibilidade de escolha. Na segunda, reflexões sobre o medo, dúvida e desejo, que por tratar dos modos de ser da existência humana, na construção daquilo que vai se tornar, busca-se entender com essa tríade, que é inerente ao homem o ato de pecar. Considerar também, aquilo que Kierkegaard chama de três estados: o estado estético, o ético e o religioso. Por último, discorrer sobre a atualidade do conceito de angústia de Kierkegaard e como ele soube perceber as transformações socioculturais de seu tempo.

 

1. ANGÚSTIA, DIANTE DA POSSIBILIDADE DE ESCOLHA 

Compreender o conceito de angústia em Kierkegaard, que continua atual e pertinente, na percepção de que a angústia do homem contemporâneo não difere da que foi tratada pelo filósofo dinamarquês. Adentrar no contexto da existência, pois, segundo Dantas (2011) o ser humano não é uma essência definitiva, mas uma existência que se cria e que se adquire em sua trajetória de vida. Portanto, a angústia se faz diante da possibilidade de escolha, que expõe o homem ao medo, dúvida e desejo.

Etimologicamente, a palavra “angústia” advém do latim angustus, “estreito, apertado”, e de ang?re, “apertar, estreitar, afogar” (HOUAISS, 2001). Por sua vez, a raiz latina remete ao grego???? (sufoco); que “significa um estado em que o homem se sente como sufocado perante um mal que está iminente, que é inevitável e pelo menos em parte não foi ainda experimentado” (MORUJÃO, 1990, p. 263). Com essa definição, entende-se, pois, que a angústia é um misto de curiosidade, esperança e desespero.

A angústia é um dos temas chaves da filosofia existencialista, a tal ponto que nas obras de outros pensadores, após Kierkegaard, há reflexões sobre este sentimento enquanto condição intrínseca ao ser humano. Segundo Heidegger, o conceito de angústia há que ser lido como a obra mais importante de toda a filosofia de Kierkegaard. Entende que a angústia existencial se estabelece em uma análise profunda e original por Kierkegaard, o qual, todavia, “do ponto de vista ontológico”, permanece “inteiramente tributário de Hegel e da filosofia antiga vista através deste”. (HEIDEGGER, 2012, p. 651, n. 6). A rigor, foi Kierkegaard o primeiro a introduzir este conceito na filosofia, enquanto atitude inerente à própria condição de vida do indivíduo, atitude que o indivíduo deve perceber como o sentido da busca para a liberdade. E para se alcançar essa liberdade, o homem deve escolher, diante de uma possibilidade, o seu destino. Como fundamento, recorrer ao próprio Kierkegaard em sua argumentação, na qual afirma que, para se chegar ao verdadeiro conceito de angústia, é preciso percorrer um caminho árduo de reflexão acerca de tal assunto, sobre o qual se tem várias hipóteses. Ao refletir acerca do conceito de angústia, Kierkegaard refere-se à sua origem a partir de outros conceitos, para que se tenha em vista que a angústia não é simplesmente criada através de ideias fantasiosas, mas que existe sim toda uma articulação que dá sentido à sua existência no homem. Daí, a relação entre angústia, medo, dúvida e desejo.

 

2. MEDO, DÚVIDA E DESEJO

Quando toma decisões, o indivíduo tem liberdade absoluta de escolha. Percebe que pode fazer algo ou nada, daí surge um sentimento de angústia que o acompanha. O pensamento de angústia, nada mais é do que a vertigem da escolha da liberdade que se quer conquistar. Kierkegaard, defende uma abordagem subjetivista da filosofia. Ele pretende estudar o ser humano enquanto um indivíduo autônomo e não como parte de um sistema. O ser humano é determinado por ações e estas, conduzidas por escolhas. Portanto, as escolhas são cruciais na vida de cada indivíduo, mas que lhe trarão consequências, seja pelo fato de cair ou de se lançar no abismo, o que Kierkegaard exemplifica muito bem.

 

2.1 MEDO

Para tal, Kierkegaard citou o exemplo de um homem num penhasco. Se o homem olhar para baixo, terá dois medos: o primeiro é o medo de cair e o segundo é o medo de se lançar no vazio. Esse segundo medo, do vazio, é a angústia e isso porque ele se dá conta de que tem liberdade para se lançar nesse vazio e é tão alucinante quanto o primeiro medo, o de cair, que é a vertigem. Portanto, angústia é o medo de se lançar no abismo a partir de sua escolha e a vertigem é o medo da queda.

A angústia de se lançar num penhasco, é a mesma que o indivíduo sente em todas as suas escolhas morais e em todos os instantes que faz escolhas, de modo similar, de se lançar no penhasco. Tal angústia, aumenta a consciência e a responsabilidade moral antes das escolhas. Toda escolha, conduz ou para o caminho do bem ou para o do mal. A vertigem da liberdade, ou angústia, é como se fosse um vício. Com ela, o indivíduo sempre busca meios para controlar a vida.

Kierkegaard, em suas considerações sobre a angústia, usa como suporte primeiro para a sua tese a Bíblia. Para começar, desenvolve esta questão, no livro de Gênesis, em que Adão, como o primeiro homem criado por Deus e que representa toda a humanidade, se deparou com o problema inicial: a angústia, pois “frente à proibição de comer o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, Adão ficou angustiado” (REBLIN, 2008, p. 110) e, através dela, a consequência é a queda (pecado). Neste sentido, destacar o conceito de inocência, no qual o indivíduo (Adão) como ser primitivo, não se coloca no estado, como já reconhecedor do bem e do mal, como bem enfatiza Kierkegaard. Nessa condição, porém, percebe-se outra coisa, como bem afirma literalmente o filósofo:

Em tal estado, existe calma e descanso; porém existe, ao mesmo tempo, outra coisa que, entretanto, não é perturbação nem luta, porque não existe nada contra que lutar. O que existe então? Nada. Que efeito produz, porém, este nada? Este nada dá nascimento à angústia. Aí está o mistério profundo da vida; é, ao mesmo tempo, angústia (KIERKEGAARD, 1968, p. 45).

Notar, que há uma imanente relação entre o nada e a angústia, que se equivalem, como destaca Kierkegaard na citação acima, corresponde a dizer que nesse nada está situada, ao mesmo tempo, a angústia. Mas, como Adão deve proceder diante desse “mistério profundo da vida”, pois sobre a questão da inocência no indivíduo, é interessante perceber que ele ainda não tem reais condições de confrontar, ou seja, discernir entre o bem e o mal, pois não é capaz de visualizar o que ainda não aconteceu, já que “a inocência vê sempre e sempre, diante de si, este nada” (KIERKEGAARD, 1968, p. 45). Se, na inocência, o indivíduo não é capaz de discernir entre o bem e o mal, então o medo se inverte na forma de dúvida, no ato de escolher.

 

2.2 DÚVIDA

Ter medo de quê? O homem esquece o medo e entra a dúvida: obedecer a ordem do criador, ou ignorá-la e dar um “salto” no seu desejo livre de escolher, pois, perder a condição de inocência não é mais uma questão de medo, mas sim de saber o que o leva a descumprir tal ordem. Assim, resta apenas um motivo para cair ou resistir à tentação, que, emblematicamente prefigurado no pecado original de Adão, é uma consequência para cada indivíduo, que nasce com predisposição para o pecado.

Só ao homem, determinado espiritualmente, pode encontrar um motivo para cair ou resistir. Kierkegaard assinala que, através dessa determinação é que o homem realiza a experiência da angústia diante da possibilidade de liberdade. Esta é “a realidade da liberdade como puro possível” (KIERKEGAARD, 1968, p. 45. Kierkegaard defende em seus argumentos que, no momento que há a angústia do ser inocente, ela não deve ser vista como sentimento de dúvida, sofrimento ou peso de consciência, pois “o ser humano em sua existência e sua subjetividade não pode deixar a angústia tomar conta de sua vida, na mesma medida em que não pode viver sem ela” (REBLIN, 2008, p. 126). Deste modo, é possível observar sua importância em uma criança. Como Kierkegaard argumenta nas seguintes palavras,

[...] observai a infância: achareis aí esta angústia mais exatamente desenhada como uma procura de aventura, do monstruoso, do mistério (...). A angústia é de tal modo fundamental na criança que ela não deseja dispensá-la; até quando inquietada pela angústia a criança mostra-se encantada com sua suave inquietação (KIERKEGAARD, 1968, p. 46).

Nesse argumento, perceber que a criança é atraída pela aventura, fantasia, mistério, através da angústia que incentiva a procura do desconhecido, do invisível e a criança sente o desejo de permanecer com esse sentimento que a inquieta, deixando-a encantada com tal situação. É fácil perceber, nesse contexto, a relação, no sentido teológico, da inocência da criança, com Eva, pela inquietude diante do mistério. Para tentar esclarecer esta questão, Kierkegaard, ao refletir sobre a origem da angústia, como a procura da aventura, na inocência, recorre especificamente ao ser humano como uma “síntese de alma e do corpo”, em pequenos detalhes que, muitas vezes, não são de respostas imediatas, mas que precisa de um terceiro elemento.

Em Kierkegaard, nota-se, insistentemente, que o homem é um ser espiritual pela existência da alma e do corpo, de tal forma que essa unidade não seria imaginável se não existisse a possibilidade da reunião de tais elementos em um terceiro, que é o espírito. Por ser a união entre espírito, alma e corpo, o homem pode determinar as suas ações. Isso o faz sentir-se angustiado diante do proibido, misterioso ou fantasioso e revela uma inquietação imaginativa e começa a pensar na possibilidade de escolher. Portanto, mesmo em seu estado de inocência, o homem não é como os outros animais e “se alguma vez o fosse em qualquer instante de sua existência, nunca se tornaria homem” (KIERKEGAARD, 1968, p. 47) e não poderia tomar suas próprias decisões diante de uma proibição.

A proibição instiga Adão a experimentar, o que significa desobediência, transgressão da ordem Divina, embora sem saber a diferença entre o bem e o mal, o que o coloca em uma situação angustiante. Adão se vê diante de uma possibilidade: comer ou não o fruto e, assim, subverter uma lei. Essa situação incomoda o primeiro homem, gerando um misto de dúvida e temor diante da possibilidade de contrariar o Criador, mas paralelamente a isso, uma expectativa ante a possibilidade de conhecer algo totalmente novo. 

 

2.3 DESEJO

Segundo Kierkegaard, em uma de suas hipóteses relacionadas a essa narrativa, fica estampado que, no mais profundo de sua inocência, Adão não entendia o real significado da proibição Divina, já que o mesmo só poderia compreender a diferenciação entre o bem e o mal após o saborear do fruto. Ainda, Kierkegaard reflete condicionalmente a respeito da possibilidade de que, com a proibição em Adão, tenha nascido o desejo, e que daí, no lugar da ignorância, o conhecimento é revelado. Porém, para que se confirme isto, seria necessário que Adão já conhecesse a liberdade, pois seu desejo deveria fazer uso da liberdade. Fica claro, então, que, após a proibição, Adão é submetido a uma tamanha inquietude que nele, então, desperta a possibilidade da liberdade, pois “o que se ofertava à inocência como um nada da angústia adentrou-se e conserva ainda aqui um nada: a aflitiva possibilidade de poder” (KIERKEGAARD, 1968, p. 48). Com isso, evidencia-se que a angústia está relacionada com o medo, a dúvida e o desejo, diante da possibilidade de escolher, mesmo que seja se jogar de vez no precipício, mas que a queda represente, no caso de Adão, a liberdade como uma das consequências.

Segundo Kierkegaard, o ser humano tem como o seu modo de ser a existência e ele está em contínuo devir, contínuo vir a ser a mudança. O ser humano não é um ser perfeito ele é um ser em construção em toda a sua existência. Ele vai construir aquilo que vai se tornar, o que ele vai ser neste vir a ser. Por conseguinte, em Kierkegaard, o devir do ser humano vai se construir a partir de três estados: o estado estético, o ético e o religioso.

 

2.3.1 Estético

No seu estado estético, o indivíduo é descompromissado, ele é um artista que vive em busca da fantasia, do prazer, do agradável e do que é desejável como caminho para se chegar ao conhecimento. Esse descompromisso, impera sobre a razão e a vontade. Se vê claramente na Bíblia, em Gênesis 3.7: “E, vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela”. Percebe-se, no caso de Eva, essa fantasia que predomina. Pela fantasia, Eva descobre o possível, o belo, e o desejo. Diante dessa possibilidade, fantasiosa de conhecer, entender, conquistar o mundo exterior, o passageiro, os prazeres, e o hedonismo, Eva não se preocupa com a consciência moral, não é capaz de ter um senso crítico sobre a sua própria existência e não é um sujeito responsável sobre os seus atos. Na Bíblia, sobre o comportamento de Eva, diz que “primeiro foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão”, 1 Timóteo 2:13,14. Nesse caso, Adão desobedeceu a ordem do criador deliberadamente, sem se preocupar com as consequências, apenas por opção, diante da possibilidade de escolha.

 

2.3.2 Ético

Já no seu estado ético, o indivíduo vive com um compromisso, responsabilidade e ética, ele supera esse estado anterior que é muito presente na juventude. Ao contrário do que acontece com os modos estético e religioso, no pensamento de Kierkegaard, no estado ético, fundamenta-se o bem e o mal, portanto, a ética social, as universais regras do dever em que o homem se vê envolvido em um mundo de ideias e regras prontas e acabadas as quais não pode transgredir. Com isso, o eu ou se reprime ante às regras, ou se lança, ao escolher frente às possibilidades da liberdade de construção da sua própria existência. 

 

2.3.3 Religioso

No estado religioso, é quando ser correto naturalmente não é mais suficiente e a fé acaba por exigir certas obrigações que podem conflitar com a lei e Kierkegaard cita o exemplo em que Deus manda Abraão matar o seu filho Isaac. Só que, nessa situação, Abraão se depara com o perigo de transgredir a lei de não matar. Quando Abraão se vê impotente para resolver a questão, ele se sente inseguro, diante da instabilidade da situação e a única saída é a fé de que “Deus proverá” a melhor forma de sacrificar, para atender a sua vontade, sem violar as suas leis (GÊNESIS, 22.8,14). O estado religioso é o estado de fé, o estado ético é o estado dos deveres e o estado estético é o estado dos prazeres. Enquanto a existente estética é divertimento, a ética é luta e a religiosa, é sofrimento.

 

 

3. ATUALIDADE DA ANGÚSTIA.

Pelo fato de as coisas nunca serem as mesmas, nem estarem sempre nos mesmos lugares, dificultar as escolhas, vive-se num mundo de incertezas. O indivíduo está sempre em busca de algo, sente-se inseguro e angustiado; vive o desespero, absurdo, alienação e tédio, por ser o único responsável em dar significado à sua vida e vivê-la de maneira íntegra, sincera, apesar da existência de inúmeros obstáculos.

Para Kierkegaard, a insegurança, angústia, incerteza, desejos e dilemas, se configuram como distrações existenciais. Por conta disso, existir é viver essa tensão entre a possibilidade de escolha e o drama de escolher. Como exemplo de alienação, a sociedade contemporânea usa os meios de comunicação de massa que distorcem a verdade dos fatos e confundem o indivíduo. Segundo Kierkegaard, cabe ao indivíduo refletir, questionar e determinar a sua verdade, na liberdade de escolha. Atualmente, o indivíduo ainda vive a angústia, o desejo do seu (grito) “Libertas Quae Sera Tamen”. Por fim, existir é viver essa tensão entre a possibilidade de escolha e o drama de escolher.

Essa possibilidade, como drama de escolher, revela a atualidade do conceito de angústia de Kierkegaard e como ele soube perceber as transformações socioculturais de seu tempo. Ele foi capaz de fazer uma análise profunda da angústia que continua ainda válida para hoje. A angústia do homem contemporâneo tem muito em comum com a angústia tratada por Kierkegaard nas suas obras. Daí, a importância de retomar a leitura desse pensador, como um dos pensadores importantes do existencialismo e um prenunciador da época atual.

Neste sentido, depreende-se, diante do exposto, que Kierkegaard defende a angústia como condição fundamental do indivíduo na busca do sentido para sua existência, diante da possibilidade de escolher. Também observar que, por mais que se deseje fugir desta condição, não se consegue, pois a angústia se faz presente em todos os momentos da vida de cada ser humano, cabendo ao mesmo se atirar ao possível, a ponto de, simplesmente, saber conviver com tal sentimento e, ao mesmo tempo, tirar proveito das próprias adversidades e consequências do cair ou do salto no precipício. Afinal, se na parte subjetiva, cair significa apenas vertigem, a parte objetiva, por outro lado, é um salto no escuro, mas que representa a liberdade de escolha, pois a possibilidade está intimamente relacionada à liberdade na existência dos indivíduos.

 

CONCLUSÃO

Este artigo buscou mostrar que o conceito de angústia, de Kierkegaard, se constitui numa reflexão sobre a liberdade humana. Dilucidou-se, que a análise inerente a esse conceito, embora aborde o tema do pecado, caracteriza-se como uma reflexão não só de cunho teológico, mas também de contornos filosóficos. Objetivou-se conhecer a origem e as consequências da angústia em cada indivíduo, diante da possibilidade de escolha: segurar o medo de cair, ou se jogar de vez? Eis o drama proposto por Kierkegaard. Tentou-se mostrar que a única solução seria o homem se lançar no precipício e arcar com as consequências, se isso significa pela possibilidade da escolha, a liberdade, para decidir por si mesmo a sua vida, descobrir o significado da sua existência. Essa escolha, propicia o agir livre do homem através da análise da angústia, diante do medo, dúvida e desejo, antes e depois da queda, ou seja, torna-se inerente ao ser humano o ato de pecar. Procurou-se mostrar como esta análise continua atual e pertinente aos nossos dias. O motivo que levou a escolha do tema foi a percepção de que a angústia do homem contemporâneo se equivale a mesma no pensamento de Kierkegaard, no que se refere ao desespero e a busca da liberdade. Objetivou-se, também, conhecer a origem e as consequências da angústia em cada indivíduo, diante da possibilidade de escolha. Desse modo, o ser humano foi abordado como que diante do precipício a ponto de cair ou se jogar e realizar aquilo que a Bíblia costuma chamar de pecado.

Na primeira parte, em que discorreu sobre a origem e consequências da angústia em cada indivíduo diante da possibilidade de escolha. Na segunda, reflexões sobre o medo, dúvida e desejo, que por tratar dos modos de ser da existência humana, na construção daquilo que vai se tornar, considerou-se, aquilo que Kierkegaard chama de três estados: o estado estético, o ético e o religioso. Por último, discorreu-se sobre a atualidade do conceito de angústia de Kierkegaard e como ele soube perceber as transformações socioculturais de seu tempo.

Diante do exposto, conclui-se que através do conceito de angústia e a relação com o medo, dúvida e desejo, foi o que propiciou o surgimento do pecado. No aspecto teológico e filosófico, é uma maneira de se pensar as consequências para o indivíduo. A angústia é um conceito resultante das implicações da escolha e da responsabilidade pessoais, ocorre para o homem frente à percepção de que seu porvir não é determinado, desperta-o para a possibilidade de ser livre, frente ao desafio que se impõe no abismo existencial. Isto, com base numa visão de homem como um ser em constante construção, que é aquilo o que decide ser e cuja essência é resultante de seus próprios atos. Esta concepção remete a uma liberdade fundamental que impõe ao homem a necessidade de se escolher a todo instante. Considerou-se este referencial, o ponto central da contribuição de Kierkegaard para a compreensão do indivíduo e o resgate da subjetividade, bem como sua ênfase sobre a vivência, em oposição ao racionalismo abstrato e à ciência objetiva. Sobre a questão da angústia, outra contribuição importante é sua afirmação de que a existência é essencialmente liberdade e, portanto, pura possibilidade e incerteza, demandando continuamente tomadas de decisão. Neste sentido, sua visão da inevitabilidade da angústia, dada pela obrigação e pelo risco de escolher, e da consciência dos próprios limites: vendo em suas mãos o próprio destino, na tríade medo, dúvida e desejo, o homem se dá conta de que precisa tomar uma decisão, por sua liberdade, tendo a angústia como um motor, que o impele à ação e tirando-o do estado de inércia, pela esperança de pôr fim ao estado de incerteza, entre segurar o medo e atirar-se de vez no precipício, que, apesar das consequências, representa a própria liberdade de escolha.

A partir da visão de homem baseada na liberdade, as relações dessas ideias de Kierkegaard reconhece a responsabilidade do indivíduo nas suas escolhas. Leva a crer que o indivíduo pode se levantar após a queda e prosseguir, resgatar tudo que se possa transformar, gerar possibilidades e caminhos para reconstruir a si mesmo. A angústia, portanto, deixa de ser um sentimento passageiro e passa a ser constante na vida do sujeito. Possibilita o alcance da percepção do todo, a pessoa poderia integrar a experiência da angústia para compreender o significado da sua existência. Ao final deste percurso, vale ressaltar que este estudo não teve a pretensão de esgotar a discussão da noção de angústia, mas de despertar, incitar, questionar sobre um aspecto relevante para a filosofia, principalmente o existencialismo de Kierkegaard. Constatar que as aproximações propostas são possíveis e por lançar algumas ideias de como se lidar com a angústia, na tríade medo, dúvida e desejo. Ressalta-se a necessidade de prosseguir, aprofundar, estabelecer relações necessárias à apropriação da noção de angústia, verificar a viabilidade dessas questões, de aplicação prática, o resgate da autonomia, do que foi refletido, no tocante à filosofia existencialista.

 

REFERÊNCIAS

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REBLIN, Iuri Andréas. A angústia kierkegaardiana. Protestantismo em Revista, v. 16, 2008.

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