ANÁLISE DIALÉTICA DA TEORIA DOS ÍDOLOS DO NOVUM ORGANUM NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO APODÍTICO: CONTRIBUIÇÕES À CIÊNCIA E À FILOSOFIA

RESUMO: No projeto da construção do conhecimento científico e filosóficos realizado por Francis Bacon no Novum Organum, o pensador inglês busca identificar os erros ou vícios mais comuns que prejudicam o processo intelectivo de aprendizado e construção do saber científico. Intuitivamente percebemos que os quatro tipos e ídolos ou vícios são possibilidades reais e existentes em todas as construções teoréticas ou práticas do saber, mas necessitamos de um método dialético que nos certifique que ambos são necessários e ao mesmo tempo suficientes para toda ação científica ou filosófica. Para essa análise utilizamos o raciocínio decadialético de Mário Ferreira dos Santos, uma aposta efetiva e confiável para esses objetivos.

PALAVRAS CHAVE: TEORIA DOS ÍDOLOS – CONHECIMENTO – DECADIALÉTICA – SABER – PENSAMENTO CONCRETO – MÁRIO FERREIRA DOS SANTOS

INTRODUÇÃO:

Francis Bacon é considerado como um dos fundadores da ciência moderna. Como filósofo dedicou-se a desenvolver uma nova metodologia científica, baseada na indução e na experimentação (MARQUES, 2015, p.18). Para o filósofo inglês a natureza é superior aos argumentos racionais para a construção do conhecimento, o que implica que os axiomas teoréticos devem ser retirados dos fatos particulares, da realidade, não da lógica abstrativa realizada na mente (BACON, 2014). Por outro lado, Francis Bacon enfatiza que para construirmos corretamente esses axiomas devemos primeiramente evitar ações temerárias e prematuras, o que o autor chama de  

antecipações da vida, mas sim realizar uma real interpretação dos fatos da natureza (BACON, 2014, af. XXVI). Nesse ponto temos que nos precaver dos ídolos ou vícios consequentes, que fazem parte do nosso ser ou nossa sociedade, e que podem corrompem nossa real interpretação da realidade. É nesse ínterim e de forma clara e evidente que quando buscamos as causas dos nosso preconceitos e ideias cristalizadas estamos indiretamente utilizando das grandes contribuições do filósofo inglês tanto para a filosofia como para a ciência: a teoria dos Ídolos. Localizada nos aforismos de XXXVII a LXIX do livro Novo Organum (BACON, 2014), apresenta-se para muitos autores como uma das mais famosas e sofisticadas passagens do autor na história da Filosofia. Nessa parte do Novum Organum, Bacon intenta identificar vícios ou preconceitos que não permitem que possamos construir um conhecimento teorético-prático real e verdadeiro.

A teoria dos Ídolos é sistematizada em quatro ideias cristalizadas ou preconcebidas que de acordo com o pensador inglês interferem no processo de construção do conhecimento: os ídolos da Caverna, os ídolos do Fórum, os ídolos do Teatro e os Ídolos da tribo (BACON, 2014, P.19-35).

Por outro lado, mesmo que intuitivamente percebemos que esses vícios são possibilidades reais, não sabemos se eles encerram completamente os erros que podemos encontrar na construção do saber e se eles representam real-realmente fontes necessárias e suficientes de análise dos erros no processo intelectivo. Nesse ponto cremos que o método dialético de dez campos de Mário Ferreira dos Santos é uma possibilidade analítica válida de análise por ser uma aposta séria e concreta nas busca de soluções reais, por ser coerente com a apoditicidade metodológica necessária, por buscar contradições e aporias no discurso, e finalmente por intentar uma concreção humana teórico-prática mais completa e sólida ao saber.

Assim sendo, o objetivo desse artigo é analisar através da dialética de dez campos de Mário Ferreira dos Santos as reais contribuições que a teoria dos ídolos tem para a construção de um método apodítico e eficaz de análise de construção dos erros nos raciocínios científicos e filosóficos.

TEORIA DOS ÍDOLOS:

A teoria dos Ídolos do Novo Organum (BACON, 2014) é sistematização em quarto vícios ou ideias cristalizadas ou preconcebidas que de acordo com o pensador inglês interferem no processo de construção do conhecimento: os ídolos da Caverna, os ídolos do Fórum, os ídolos do Teatro e os Ídolos da tribo (BACON, 2014, P.19-35). 

Os primeiros dos vícios ou ídolos, como chama o pensador inglês, são os Ídolos da Tribo (BACON, 2014, aforismo XLI). Esses ídolos são aqueles presentes em nós mesmos como seres humanos limitados e imperfeitos, ou seja, na nossa própria imperfeição sensível ou intelectiva diante da avaliação dos fenômenos da natureza. Muitas vezes nossos sentidos ou nossa própria mente nos mostra os dados da realidade erroneamente, devido a nossa própria imperfeição na captação da informação ou na própria abstração intelectiva. Somos seres imperfeitos tanto cognitivamente como sensivelmente por nossa própria forma constituinte.

Os segundo erro que nos pode acontecer, segundo o pensador inglês são os Ídolos da Caverna (BACON, 2014, aforismo XLII). Nesse ponto, Bacon enfatiza que nossa construção intelectual, assim como os nossos valores não-intelectuais muitas vezes são construtos originados de vários fatores exógenos, sejam eles modelos educacionais familiares ou acadêmicos incompletos, sejam eles de modelos morais ou religiosos não racionalizáveis, ou seja, significa que sempre estamos sujeitos a formas culturais do senso comum comunitário que formam inconscientemente preconceitos ou vícios que posteriormente usaremos de forma impensada nos nossos raciocínios intelectuais.

O terceiro vício são os ídolos do Fórum (BACON, 2014, aforismo XVLLL). Como somos construtores sociais da nossa própria linguagem e esta muitas vezes não se relacionam com a realidade, mas sim com discursos de pessoas doutas e intelectuais, muitas vezes incutimos conceitos intelectuais que não se condizem com a realidade, mas sim com o pensamento equivocado de um experto, somos levados a ter crença irreais de discurso ou de significação. Temos assim, um conjunto de ideias cristalizadas que não são esquemas da realidade, mas sim falsos esquema de linguagem que cremos fazer parte da realidade, mas que são construtos lógicos sem relação ontológica real, ou ao contrário, relações ontológicas reais sem um adequado construto lógico adequado.

E por último, o quarto vício, os ídolos do Teatro, seriam como uma forma

mais complexa e mais sofisticada do vício do Fórum (BACON, 2014, aforismo XLIV). Nela não somente temos conceitos linguísticos inadequados provindo de falsas analogias teorético-práticas incorretas, mas sim temos assentadas em nós doutrinas ou ideologias totais de pensamento que julgamos corretas por já estarem assentadas na comunidade intelectual, ou seja, consensuadas como autoridade científica, mas que não passam de ficções sobre a realidade. Criamos um mundo fictício porque cremos logicamente que funciona, mas que não correspondem com a realidade que percebemos ou abstraímos.

Assim sendo, podemos afirmar que os vícios são 4 topos diferentes na localização do conhecimento, aos quais se encontram os erros de construção do pensamento: em nossas limitações psicofísicas, em limitações do meio próximo a nós na qual fomos aculturados, nas limitações dos nossos grandes modelos, sejam grandes mestres ou educadores, e nas limitações dadas por falsas doutrinas assentadas no meio acadêmico que seguimos erroneamente no nosso processo formativo, mas que seguimos por fazer parte delas...