A vida também é para ser lida.

Não literalmente, mas no seu supra-senso.

                                                                                          Guimarães Rosa

 

 

Resumo: A abordagem em foco evidencia alguns aspectos relacionados à dimensão da leitura e sua imprescindível inserção no universo jornalístico, conforme Corrêa (2002). À priori, analisaremos a abrangência da concepção de leitura e o caráter global da sua aplicação, extrapolando a redundante legibilidade de um código apenas gráfico, correlacionando dinamicamente leitura e realidade, segundo Yunes (2003) e Silva (1995), numa atitude eminentemente investigativa de desvendamento dos signos não-verbais, táteis, visuais, sonoros, icônicos, bem como os verbais, na leitura dos fatos, matéria - prima da cotidianeidade.

 

PALAVRAS - CHAVE: Leitura. Jornalístico. Código. Gráfico. Realidade. Signos. Não - verbais. Táteis. Visuais. Sonoros. Icônicos. Verbais. Fatos. Cotidianeidade.

 

 

Introdução

 

         O estudo acerca da leitura como um conceito experimental que transgride as sistematizações usualmente introduzidas no âmbito escolar, caracteriza-se pela sublimação de uma faceta da leitura, por ora, negligenciada por professores, e, por conseguinte, pelos alunos, com vistas à uma leitura como experiência íntima, profunda, única, situada na vida de todos, e de cada um de nós, suporte primordial para análise e interpretação dos fatos no mundo.

            Maria Lírio Gurguel (2000, p.209) do ponto de vista pedagógico e etimológico situa leitor e texto sob a ótica processual de um fazer gradativo, com todas as implicações, desafios e exigências, quando da aquisição de alguma técnica, por conseqüência, esta gestação apóia-se na elaboração semântica de um “tornar-se eterno leitor”, bem como, de um “tornar-se texto” eternamente.

            A rigor, uma vez contextualizadas as práticas de leitura percebemos a predominância de concepções de leitura atreladas a uma operação eminentemente tecnicista, dissimulada na utilização de textos, como recurso indispensável no desvelamento de questões gramaticais apenas, segundo, Ângela Kleiman[1] (2000, p. 67). 

            A escrita é entendida como um processo decorrente da leitura, sem a qual se torna inócua, vazia, sob esta perspectiva, assumir uma postura leitora diante das circunstâncias inscritas em nossa vida social e histórica se revela indubitavelmente como exigência de um contexto sócio-econômico e político que reclama uma, leitura, sua, constante, por um ser humano eminentemente contextualizado, a partir das decodificações atualizadas de textos-pessoas, fatos, imagens, em síntese, textos-signos.

 

 A decifração do código vivo

 

            A leitura, dentro da perspectiva experimental apresentada por Yunes (2003, p.07) é vista como uma atividade essencialmente prática, donde podemos julgar ou não, o seu apreciado valor de experiência. A escrita apesar da sua relevância, não sobreviveria sem a leitura, à qual, além do importante papel de fundadora daquela, também contribui para a sua permanência como marca e registro inalienável.

            Decifrar códigos, tarefa na qual a observação e investigação predominam, constitui-se de um fazer elaborado, embora profundo. Ler é decifrar codificando, porquanto a leitura funda outros processos de ciframento, nos quais somos ideologicamente impregnados. Do ponto de vista prático, esta atividade supõe um alargamento dos estreitos limites, com vistas à compreensão mais rica e aprofundada dos códigos inscritos em nosso meio social, político, e humano.

            Yunes (2003, p. 09), relata sobre a dinâmica da leitura no seu processo histórico, no qual a interpretação do mundo era a única legibilidade possível. Por ora, valoriza-se a compreensão, a claridade vocabular, nos seus processos gráficos. Mas como assinala Guimarães Rosa, a vida, o código vivo, móvel e mobilizado pelas circunstâncias e seus fatos, é passível de intensa, ininterrupta, e inconclusa, leitura, numa operação íntima, pessoal, que denota a superioridade e aliteralidade de um verbo polissêmico e com caracteres universais.

             A espontaneidade pueril da criança permite-a a concretização de uma interpretação autônoma do mundo que a circunda, a curiosidade é um dos importantes fatores, todavia, a sua compreensão formulada a partir do mundo é descartada pela escola, quando dentro de seus muros, a única decodificação validada é exclusividade dos professores. A linguagem do mundo lhe é fácil, animadora, sugestiva, ao passo que a da escola, representada apenas por umas palavras confusas e inanimadas, codificadas num tempo e espaço, que não são o seu, embota o pensamento e a participação em verdadeiras atividades de leitura, segundo Yunes (2003 p.42).

            Em face dos argumentos descritos, depreende-se a imprescindível articulação entre vida e leitura, relação de reaproximação do fenômeno da interpretação de códigos à realidade, ora posta, ora em processo de elaboração. Para tanto, a leitura nos faz resistir, subsistindo aos sistemas destrutivos e obliterantes da nossa sociedade, nesse sentido “ler é um condição de sobrevivência”[2].

 

Leitura: uma experiência no jornal

            A partir das entrevistas e depoimentos coletados no que se refere à leitura, verificamos a indissociável conexão existente entre leitura e realidade. A redatora Pollyanna Tarsy, funcionária do Jornal Alerta há 3,5 define leitura como “tudo aquilo que podemos entender a partir da interatividade com o meio, seja aquilo que vemos, ouvimos ou que sentimos.” Sob este mesmo ponto de vista, Yunes defende a palavra referencializada pelo seu contexto, haja vista a inocuidade da mesma quando vislumbrada de modo isolado, extraída do seu momento de fala, isto é, da sua ocorrência, para ser enxertada num outro, distante da logicidade exigida.

O mundo, vale dizer, a vida registrada na escrita, traz marcas de certos valores, certa época, certas condições sociais, dos que usaram a linguagem. A escrita... parece aprisionar o mundo e, também como numa fotografia, o paralisa.[3]

           

            Toda informação e/ ou fato apresentado justifica sua realização nas malhas ideológicas do jogo de poder, no espaço político, econômico e social. A vida relatada, em suas cenas dolorosas, desiguais, injustas, é uma faceta do cotidiano reconstruído na visão anti-fragmentária de um jornalista.  A leitura do código gráfico é imóvel, em contrapartida a do signo vivo, atravessa experiências diversas de dor, alegria, frenesi entre outros, porque diz respeito à vida, viva.[4]



[1] KLEIMAN, Ângela B. Concepções da escrita na escola e formação do professor. In: VALENTE, André. (orgs). Aulas de Português: perspectivas inovadoras. 2° ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2000, p. 67.

[2] YUNES, Eliana. Leituras, experiência e cidadania. In: ______; OSWALD, Maria Luiza. (orgs.). A experiência da leitura. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

[3] Idem, ibidem, p. 42.

[4] Idem, ibidem, p. 43.