Carolina Rodrigues Silva Farias[2]

Lara Cavalcante Farias[3]

Antônio de Moraes Gaspar[4]

RESUMO

Para desenvolvimento do tema sobre a aplicação da nova lei tributária à luz de fatos geradores pendentes deve-se se ater à analise dos artigos 105 do Código Tributário Nacional, e os que se relacionam diretamente a este no mesmo código, e art. 150, III, “a” da Constituição Federal. Do confronto destes nasce a problemática do presente trabalho, vez que há quem se levante pela inconstitucionalidade da aplicação imediata da nova lei aos fatos geradores que se encontram pendentes à época do inicio da sua aplicação, tal inconstitucionalidade se daria por conta do princípio da irretroatividade da lei tributaria emanado da Constituição Federal, esta que hierarquicamente é superior ao CTN. Entretanto, há de se ressaltar que para construção deste embate se faz preciosa analise do que se tem como “fato gerador pendente” e aqui há posicionamentos doutrinários diversos, uns que dão lastro à inconstitucionalidade, bem com outros que demonstram a existência do fato pendente, sendo necessária ainda a diferenciação entre situação de fato e situação jurídica, trazida pelo art. 116, CTN. Diante disto, o presente trabalho desenvolverá a cerca da aplicação imediata da lei tributária, da conceituação de forma divergente do fato gerador pendente, bem como discorrerá sobre o princípio da irretroatividade da lei tributária.

INTRODUÇÃO

A norma jurídica tributária consiste em interpretar o texto normativo, norma geral e abstrata, adequando-o ao caso concreto, e, portanto, encontrando uma norma individual e concreta. Nesse sentido, o art. 105 do Código Tributário Nacional disciplina que a legislação tributária se aplica imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes. Entretanto, busca-se demonstrar a técnica da expressão fato gerador pendente, de modo a verificar que a legislação tributária se aplica, portanto, aos fatos geradores futuros.

Além disso, analisam-se os limites da retroatividade da lei dita expressamente interpretativa, que consiste em uma das exceções ao princípio constitucional da irretroatividade tributária, previsto no art. 150, III, “a”, da Constitucional Federal de 1988. Isto porque, a referida lei deve retroagir apenas para elucidar os dispositivos interpretados, pois prescinde de caráter normativo.

O princípio da irretroatividade está previsto na Constituição Federal no art. 150, III, “a”. Fica expresso que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado. Dessa forma fica expressa na CF/88 a impossibilidade de cobrança de tributos em relação aos fatos geradores, que são instituídos ficticiamente no dia 31 de dezembro, anteriores a criação da norma.

Ocorre, porém que a Súmula 584 do STF se choca diretamente com o artigo 150 da Constituição, uma vez que a súmula expõe que ao imposto de renda calculado sobre os rendimentos do ano-base, aplica-se a lei vigente no exercício financeiro em que deve ser apresentada a declaração. Assim sendo, essa determinação se mostra totalmente incompatível com o princípio da irretroatividade do poder de tributar.

Para chegar nesse ponto é necessário analisar o princípio da irretroatividade e consequentemente da anterioridade. Também é de suma importância aplicar os mesmos conceitos ao imposto de renda, de forma a analisar o motivo pelo qual há essa incompatibilidade entre a súmula e o que está expresso na Constituição.

Portanto, objetiva-se apontar aspectos controversos pontuais acerca da aplicação da legislação tributária. Dito isto, no primeiro capítulo, far-se-á necessário entendermos sobre a vigência e aplicação das normas jurídicas, no que tange a sua forma se aplicação imediata e aplicação retroativa. Seguindo o estudo, no segundo capítulo, falaremos sobre o Fato gerador, sua situação jurídica e sua situação de fato, correlato ao fato gerador pendente.

Por fim, mas não menos importante, trataremos sobre o embate de princípios constitucionais e a aplicação imediata da Lei Tributária, tendo por parâmetro o Princípio da anterioridade    e o Princípio Constitucional da Irretroatividade da Lei Tributária. Assim como se faz se suma importância o estudo da súmula 584.

1 VIGÊNCIA E APLICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS

     Vigência e aplicação, apesar de guardarem certa semelhança, não sem confundem. A primeira corresponde à validade formal da lei, é o “tempo de vida de uma norma jurídica, cuja extensão, por sua vez, é ditada pela aceitabilidade social, na proporção da submissão da sociedade à determinada lei que a todos obriga” (SABBAG, 2012, p.656), ou seja, lei em vigor é aquela que pode ser aplicada. Por sua vez a aplicação é a concretização da vontade do legislador, é a incidência sobre um fato, no contexto jurídico-social da norma ao contexto que ela prevê.

1.1 Aplicação imediata da norma tributária 

Regulada pelos artigos 105 e 106 do CTN, a aplicação da lei tributaria é trazida de tal modo, artigos in verbis:

Art. 105. A legislação tributária aplica-se imediatamente aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início mas não esteja completa nos termos do artigo 116.Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados; II - tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo como infração; b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática. (BRASIL, 1966).

Como o legislador prevê no caput do art. 105, a legislação tributária, uma vez vigente, deve incidir de forma imediata aos fatos geradores futuros e pendentes. O fato gerador vem a ser o fato sobre o qual a norma vem a incidir, é a ocasião deste fato que dá razão à aplicação da lei tributária, sendo assim imediata para fatos que virão a se concretizar.

A lei nova também será aplicada de forma imediata aos fatos geradores futuros. Esta possibilidade se faz lógica, vez que estes terão início e conclusão na égide da nova lei, ou seja, quando a nova lei entra em vigência, os fatos futuros ainda não foram verificados e quando isto ocorrer terão sobre eles recaídos os efeitos da nova lei.

Ainda que se faça menção a fatos geradores futuros e pendentes, a doutrina e a jurisprudência levantam grande divergência no tocante a fatos geradores pendentes, por discutir a sua real existência, vez que se entende que o fato gerador ou ocorreu ou ocorrerá, não existindo este estado de pendencia, alguns explicando tal situação como uma possibilidade apenas de vir a ocorrer tal fato, de todo modo, o que é vetado é a aplicação aos fatos geradores já consumados.

Sobre os fatos geradores já ocorridos, o CTN resguarda artigo específico, a saber, art, 116, para defini-los e os traz, in verbis:

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existente os seus efeitos: I – tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. (BRASIL, 1966).

Desta feita, definido o fato concluído, tem-se que o fato gerador pendente deve ser aquele que ainda que tenha tido início da égide de uma lei anterior, porém nesta não se completou, ele continua a realizar seu ciclo e, uma vez chegando à consumação na égide da nova lei, esta se aplicará ao mesmo. É esta continuidade do ciclo que possibilita à nova lei a imediata aplicação sobre aquele (CARVALHO, 2012).

1.2 Aplicação retroativa

Ainda que a priori pareça incoerente afirmar a possibilidade da retroatividade da aplicação da lei tributária, vez que, em regra, a lei regulamenta, incide sobre fatos ocorridos a partir da sua vigência. Entretanto, ressalta-se a previsão do artigo 106 do CTN, que excepcionalmente traz a norma tributaria atingindo fatos ocorridos anteriormente a ela. São duas exceções à regra geral do ordenamento pátrio, que é a irretroatividade da lei tributarias. Exceções essas vinculadas a duas ocasiões específicas, a possibilidade de retroagir a lei interpretativa e a lei mais benéfica.

A lei interpretativas, nas palavras de Eduardo Sabbag:

[...] a lei interpretativa, conquanto inábil a inovar, deve tender a retirar pontos obscuros e imprecisos da matéria pretérita, elidindo duvidas a seu respeito. A compatibilidade dessa norma com o postulado ora estudado desponta, a nosso ver, quando se restringe a tarefa da lei interpretativa ao ato, genuíno e verdadeiramente, interpretativo. (SABBAG, 2012, p. 671).

No mesmo sentido:

O inc. I alude às chamadas leis interpretativas que, em qualquer caso, assumindo expressamente este caráter, podem ser aplicadas a atos ou fatos pretéritos, mas excluindo-se a aplicação de penalidades à infração dos dispositivos interpretados. As leis interpretativas exibem um traço bem peculiar, na medida em que não visam à criação de novas regras de conduta para a sociedade, circunscrevendo seus objetivos ao esclarecimento de dúvidas levantadas pelo termo da linguagem da lei interpretada. Encaradas sob esse ângulo, despem-se da natureza inovadora que acompanha a atividade legislativa, retrotraindo ao início da vigência da lei interpretada, explicando com formulas elucidativas sua mensagem antes obscura. (CARVALHO, 2005, p. 94).

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