Curso de Pós-Graduação em Docência do Ensino Superior

 

Wallas Cabral de Souza

 

 

ANALFABETISMO FUNCIONAL NO ENSINO SUPERIOR SOB A ÓPTICA LINGUÍSTICA DENTRO DA SEMIÓTICA SINCRÉTICA

 

RESUMO

A despeito da classificação que se dá para o “analfabetismo funcional”, há critérios linguísticos, sobretudo na óptica da semiótica sincrética desenvolvida por Hjelmslev, que inspirou este trabalho a fim de elucidar uma possível causa a esse tipo de analfabetismo, principalmente em um grau de ensino superior que deveria abarcar alunos aptos ao entendimento de uma mensagem de forma mais crítica. Este trabalho, portanto, promove uma reflexão para que se observe as características do analfabetismo funcional no foco, contexto e na intenção da mensagem a ser interpretada pela linguagem em si e por si, dentro dos fatores de textualidade. Apresenta-se para isso, um trabalho de campo que descreve uma perspectiva didático-metodológica a uma docência com suas estratégias, desafios e soluções.

 

PALAVRAS-CHAVE: analfabetismo funcional; linguística; semiótica sincrética; metodologia no ensino superior; didática.

1 INTRODUÇÃO:

1.1   Disposição geral

Este estudo tem como foco descrever alguns aspectos relevantes sobre o analfabetismo funcional no ensino superior numa óptica linguística e promover ao mesmo tempo uma descrição crítica sobre didática e metodologia do docente no ensino superior frente a esta constatação. Há aqui, no entanto, uma reflexão, mais do que uma solução, relacionada à compreensão textual do corpo discente tanto por meio da linguagem verbal, em texto, como também pela linguagem não verbal, em imagem, que, em conjunto, reforça uma proposta possivelmente diagnosticando a situação do assim chamado “analfabeto funcional”, assim como as possíveis disposições básicas no campo metodológico, psicológico e na dinâmica educacional.

Com o objetivo de sustentar este estudo, houve um interesse para que se apresentasse um diagnóstico desse tipo de analfabetismo dentro de um espaço mais linguístico, sobretudo por teóricos europeus, seguindo alguns parâmetros da “semiótica sincrética” do linguista dinamarquês Louis Hjelmslev, autor que promoveu uma teoria para a linguagem e serviu de inspiração para inúmeros pesquisadores contemporâneos, mais ainda a consideração dos “fatores pragmáticos de textualidade” na concepção da autora Maria da Graça Costa Val; e conduziremos com a disposição de alguns teóricos da educação no que concerne a postura pedagógica do docente que se pôde aplicar aqui a esta temática.

Nesse sentido, a motivação para adoção desse arcabouço inicial seguiu-se a seguinte motivação: há a constatação do analfabeto funcional no ensino brasileiro, especialmente constatado pelo Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), mas há também uma enorme carência de uma descrição mais aprofundada para a causa dessa situação. A contribuição aqui consiste em começar uma discussão no aspecto linguístico, ciência segundo a qual se tem como base a linguagem e a comunicação, uma vez que o “não entendimento do texto” pode ter a causa tanto na esfera pontualmente linguística como na comunicação que por ela é expressa.

1.2   Constatação do tema

Em muitos manuais do candidato para a seleção de um vestibular ou diante de uma proposta curricular da escola secundária, especialmente na descrição da programação das disciplinas acadêmicas envolvendo a produção de texto, seja no curso de bacharelado ou licenciatura, a questão do entendimento do texto parece ser fundamental para o processo de seleção como critério crucial ao ingresso, por exemplo, de uma faculdade, ou qualquer forma de instituição ao ensino superior, assim como para o aprendizado durante o tempo de estudo durante o aprendizado do educando. O ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), prova medidora do grau de habilidades linguísticas e matemáticas, de modo geral, é um recurso de aceitação para a seleção de muitas instituições universitárias hoje no Brasil. Por isso, ler e interpretar um texto faz com que se traga a esta análise cada vez mais a consideração sobre o que é ser um  “analfabeto funcional” e como proceder para que se evite isso.

Ao observar o que foi descrito pelo Inaf no Brasil, desenvolvendo ao mesmo tempo a classificação desse instituto para a condição de não alfabetização funcional principalmente no ensino superior, em tese dever-se-ia ter graduandos selecionados nas faculdades com um grau acentuadamente pleno de alfabetização funcional pós-seleção à instituição de ensino superior. Aqui não se avaliará fatores de seleção e condução política ou até legal por meio da instituição desses educandos, mas sim, a condição própria deles frente à percepção de alfabetização funcional analisando-os na percepção da linguagem verbal e não verbal. Ou seja, o que se ler, ver e ouve é ou não entendível, relacionável e criticamente embasado? Assim, segue-se a teorização e critério deste trabalho e com esses parâmetros.

1.3   Teorização prévia

Para essa consideração, faz-se a menção complementar de teorias textuais de acordo com as autoras Koch (Introdução á Linguística Textual. São Paulo: Martins Fontes, 2011) e Costa Val (Redação e Textualidade. São Paulo: Martins Fontes, 2004) que, no geral, colaboraram para o desenvolvimento da discussão sobre os fatores pragmáticos de textualidade, expondo, assim, aspectos textuais relevantes e em que o sujeito (receptor da mensagem) interpreta um texto diante de: “contextualidade”, “intencionalidade”, “coesão/coerência”, “situacionalidade”, “informatividade” e “aceitabilidade”.

Além disso, fatores paralelos ao texto, mas que também faz parte da análise interpretativa da mensagem, principalmente no que se refere às imagens, justifica, em parte, a preocupação básica que se tem quanto à linguagem não verbal deste trabalho: Imagem e texto juntos muitas vezes são sincrônicos e, por isso, serve-nos como referência para uma interpretação mais global da intenção dela avaliada na interpretação “investigativa” motivando o direcionamento da análise para aspectos de uma descrição linguística no estudo da “semiótica sincrética” (no geral: uso simultâneo de várias linguagens, em signos, interagindo ao mesmo tempo).

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 Prolegômenos do objeto de estudo

A caracterização do que se nomeia “Analfabeto Funcional” produz, além de outras considerações no campo didático, metodológico ou linguístico, uma talvez um pouco menos criteriosa, em geral construída de forma que pode se aproximar do senso comum (por não ter base e critério cientificamente testado): de que alguém que seja analfabeto funcional é “aquele que apenas não entende o que ler”. Tal ideia, na sua essência, ainda pode ser vista em definições um pouco mais criteriosa tais como: “Analfabeto funcional é a denominação dada à pessoa que, mesmo com a capacidade de decodificar minimamente as letras, geralmente frases, sentenças, textos curtos e os números, não desenvolve a habilidade de interpretação de textos.” (Wikipédia).

A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), em 1978, com um pouco mais de critério, mas não muito distante do cerne das demonstrações até aqui citadas, definiu o “analfabetismo funcional” como “o agrupamento daqueles que são capazes de ler e escrever, mas não tem habilidades para aplicar (isso) ao seu desempenho profissional, não compreendendo o texto e não aplicando ao contexto externo a ele como sujeito dessa operação”. Esse já é um critério que traz a luz as habilidades e competências vistas no ENEM que serve inclusive para selecionar alunos para a graduação. 

Ainda na busca geral de definições/percepções gerais sobre o objeto deste trabalho, o  IBGE, dentro de uma visão mais local, no espaço brasileiro, avalia o mesmo tema definindo-o o grau de analfabetismo de cada pessoa: analisa “a quantidade de anos dedicados ao estudo”.

Afora os aspectos da política brasileira frente à educação ao longo de sua história, especialmente na política contemporânea neoliberal, tudo isso parece mostrar que a percepção e critério para o assim chamado “analfabetismo funcional” ainda é superficial, genérica e encontra-se numa espécie de vácuo diante da verdadeira causa de isso ainda ocorrer. A quantidade de anos na faculdade, por exemplo, não pode determinar uma pessoa ser ou não alfabetizada funcionalmente, porque se o tempo de estudo na faculdade fosse diretamente determinante, não haveria analfabetos funcionais no ensino superior, que é, inclusive, o foco aqui.

Quando se trata de estudantes universitários, em que se pese a quantidade de leitura a ser indicada, é preciso tentar refletir a causa do não entendimento de um texto, ou imagem, como ele é, ou seja, com a interpretação pontual do próprio texto, antes mesmo da intervenção crítica-opinativa do estudante universitário durante  a interpretação da mensagem. Parte-se do pressuposto que o texto teve em si uma motivação independentemente da crítica que possamos inserir ao lê-lo, por exemplo. Em que pese o perigo da generalização sem base, mas aqui se parte dessa hipótese: a visão crítico-opinativa do receptor está em caráter secundário quando se deseja o entendimento pontual do texto pelo próprio texto. Talvez ai esteja uma característica metalinguística em que, a priori, o texto se auto explica e o receptor o investiga para depois fazer a sua investida crítica.

Na tentativa de elucidar essa hipótese, observa-se que há tempo o estudo da linguística era voltada a teorias “transcendentais” como aponta o linguista Hjelmslev. Antes a linguagem era entendida numa óptica humanística, psíquica e histórica, mas não na própria linguagem. A visão deste pesquisador traz uma tentativa de expor a estrutura da língua enquanto estrutura que é específica e se baseia apenas em si mesma. Para isso, além dos critérios textuais apresentados por Koch e Costa, há que se considerar também, e por não dizer essencialmente, fatores mais internos, estruturais, pragmáticos, semânticos, semióticos e funcionais do texto que é sugestivamente uma abordagem dentro de uma óptica da linguística moderna e que este trabalho pretende articular com alguma forma de significação, pois, são teorias altamente complexas da linguagem e não simples soluções diretas ao problema.

Com essa condição, um dos linguistas que desenvolveu uma teoria para a linguagem na sua obra Prolegômenos a uma teoria da linguagem, Louis Hjelmslev aborda o princípio ativo da comunicação por meio da concepção aperfeiçoada do que Saussure, considerado o “pai da linguística”, descrevia sobre o signo linguístico para que se tivesse a comunicação por meio da linguagem. Várias inferências desse estudioso foram deduzidas com base nesse princípio saussuriano. Em um dos aspectos deduzidos na sua teoria, Hjelmslev mencionou um capítulo sobre o “Sincretismo”, parte conceitual abordada em paralelo aqui pelo professor-doutor José Fiorin entre outros linguistas que se dedicaram para um desenvolvimento mais didático frente a essa reflexão. O sincretismo semiótico é um universo a ser explorado. Por isso, escolheremos aqui um ângulo de ação e adaptação dessa teoria para sustentar a reflexão sobre o objeto deste estudo “Analfabetismo Funcional”.

Neste trabalho, esse conceito foi um dos fatores inspiradores para tentar explicar o que motiva, na comunicação (receptor e emissor), alguns equívocos ou desaparecimento de sentido quando o sujeito, alunos universitários, interpreta uma mensagem. A visão aqui será sugestiva para a causa do analfabetismo funcional uma vez que a linguagem, como bem aponta Hjelmslev: “(...) é uma inesgotável riqueza de múltiplos valores. É inseparável (a linguagem) do homem e segue-o em todos os seus atos; é o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos, instrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado.” (Hjelmslev, Prolegômenos a uma teoria da linguagem. São Paulo. Editora perspectiva. p.1)

A linguagem, portanto, é inata no homem, revela-se como fruto de uma percepção de mundo que pode ser lido de forma funcional, ativa, influente, mas que por uma leitura às vezes equivocada do contexto da mensagem, aspecto linguisticamente tratado como “significante” do signo textual, anula o foco principal, denominado de “significado”, conceito essencial e parte fundamental da mensagem dentro da ilustração desenvolvida aqui numa concepção de signo linguístico expresso por esse autor (Hjelmslev) partindo do seu precedente, Ferdinand de Saussure que considerava a linguagem expressa em signo e que havia, assim, o significado e o significante.

Essa interferência se dá por meio de um sincretismo textual, deduzido na teoria sincrética de Hjelmslev e aplicado, na prática, dentro das ideias trazidas pelos fatores de textualidade desenvolvidos por outros pesquisadores da linguagem. E é nessa direção que se pode perceber, em parte, o fenômeno para notarmos o grau de analfabetismo funcional no ensino superior, ao menos na tentativa de começarmos uma descrição de causa para ele.

Em linhas gerais, diz-se que o “analfabetismo funcional” caracteriza-se pelo não entendimento daquilo que se ler. Mas por que isso acontece? Embora que esse conceito se aplique também à área da matemática (no cálculo básico de números e problemas de raciocínio lógico), o foco aqui é delimitado na interpretação textual e um pouco também da linguagem não verbal, imagética.

Segundo o Instituto Paulo Montenegro, em parceria com a ONG ação educativa, pelo Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional (Inaf), há alguns níveis de analfabetismo funcional trazendo, assim, a classificação de quatro tipos de analfabetismo segundo o qual se tem:

  • Analfabetismo: Não conseguem realizar tarefas simples para a leitura de palavras e frases.
  • Nível rudimentar: corresponde à capacidade de localizar uma informação explícita em textos curtos e mais conhecidos pelo interlocutor.
  • Nível básico: leem e compreendem textos de média extensão. Traz deles informações implícitas, não em contexto longo. Considera-se a partir daqui a presença de um alfabetizado funcionalmente.
  • Nível pleno: não há limitações para ler e interpretar um texto com relação, avaliação e comparação de dados contextuais. Sabem sintetizar ideias.

Essa classificação parece focar pontos mais “transcendentais” ao uso da linguagem, uma vez que informações implícitas são coroadas para um bom entendimento do texto, ou mesmo um assunto, do texto, seja compreendido pelo conhecimento particular do leitor, contudo pecaria por apresentar que o tipo de avaliação pontual do texto é substituído pela avaliação e critério de relações próprias da pessoa, além de não se explicar também, nessa classificação, como um “Alfabeto Funcional pleno” sintetiza as ideias do texto, senão pelo seu próprio critério, sendo que o texto por si mesmo poderia revelar o foco principal sem interferências da opinião crítica de quem ler, se o alvo for compreendê-lo, de fato. 

Contudo, apesar dessa colocação, voltando para a classificação citada, pelos dados do Inaf, no Brasil, em 2005, cerca de 75% da população foi considerada analfabeta funcional; 4% chegaram ao ensino superior e  25% possuíam habilidades plenas descritas acima.

Ainda numa constatação pela Inaf, no que tange o foco do nosso estudo (os estudantes do ensino superior), foi publicado no jornal Estadão em 17 de julho de 2012 que “Entre os estudantes do ensino superior, 38% não dominam habilidades básicas de leitura e escrita, segundo o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), divulgado pelo Instituto Paulo Montenegro (IPM) e pela ONG Ação Educativa.[1]” Para reforçar essa problemática, em 19 de fevereiro de 2014: “de acordo com uma pesquisa feita pela Universidade Católica de Brasília, a partir da análise de 800 alunos, em 6 cursos de 4 faculdades, 50% dos estudantes do ensino superior são analfabetos funcionais, ou seja, não entendem o que leem” [2]

Com essa classificação do Inaf e os dados dessas pesquisas, deduziu-se aqui um critério de exposição ao problema na tentativa de ser mais amplo dentro de um parâmetro linguístico e mais autônomo para tentar expor a soma de mais outros critérios de definição na busca de uma causa para esta situação, especialmente quando a análise se refere aos fatores de textualidade exposto anteriormente, com a comunicação textual, base peculiar da análise pesquisada, e as teorias da linguagem conduzidas por Hjelmslev.

O enriquecimento linguístico, na medida do possível, fará aqui com que a condução da reflexão sobre “Analfabetismo Funcional” beneficie-se mais ainda com algumas considerações complementares da linguagem de forma que uma mensagem que envolve em essência os conceitos e um enunciado escrito ou imagético possua um tripé sintético e didático: “foco”, “contexto” e “intenção”.

Assim, a ideia delineada como “foco” se dá aqui como o assunto-chave de uma mensagem que é conduzido pelo “contexto” e motivado por uma “intenção”. No dicionário de semiótica de Greimas, página 82, parafraseando suas palavras, o “contexto” em seu esquema da comunicação, considera o que Jakobson apresenta como um dos fatores da atividade linguística considerando-o necessário à explicação da mensagem, quer seja verbal ou verbalizável. Já a ideia de “intenção” é mais apropriada na semiótica com o uso da expressão “intencionalidade” (pela crítica julgar que esse termo explica a comunicação às vezes como algo voluntário e outras vezes, consciente), mas de qualquer modo, em que pese o respeito a essa análise, ela será usada aqui com uma significação direta, usual e mais didática pela simples expressão “intenção”. De qualquer forma, o sentido dessa característica é a de que nela há a motivação de um texto.

 

 

2.2 Descrição do objeto

 

Caracteriza-se, assim, nesse processo teórico, o “analfabeto funcional” ser a falta de entendimento, por parte do receptor, de um  texto, ou de outras linguagens não verbais. Há dois principais problemas abordados na formação desse objeto de estudo: a falta de habilidade do receptor frente ao texto, não conseguindo fazer as articulações e combinações de palavras e frases com sentido, além de também, mesmo tendo conteúdo (arcabouço de conhecimento e conceitos adquirido ao longo da vida) não tem habilidade suficiente para fazer uma articulação adequada ao que o texto por si mesmo apresenta como significado, seja em forma de argumento ou tema principal que ele expressa. Essa sugestão abarca, portanto, princípios que norteia de forma linguística, o motivo dessa falta de percepção e sentido.  

 

 

 

2.3 Diagnóstico / problemática

 

Em linhas gerais, a hipótese da análise é revelar a ideia de que a não percepção do foco principal, base de ligação para a enunciação legível do interlocutor, em uma mensagem textual ou não verbal, fazendo o receptor colocar o contexto como fator crucial à análise de uma comunicação escrita maior do que o foco, prejudica o entendimento da intenção original do enunciador da mensagem, que seria aqui o objeto passivo, podendo ser vista como uma interpretação desfocada por esse sujeito ativo; caracterizando aqui como fator crucial para a existência do que se denominou “analfabeto funcional”. Tendo em vista esses fatores linguísticos, algumas atitudes e métodos para ajustar a ordem de percepção interpretativa realizar-se-á a proposta-base investigativa para uma maior reflexão deste tema. A tentativa deste trabalho é embasar Isso com o apoio da teoria do dinamarquês Hjelmslev, na sua obra “prolegômenos para uma teoria da linguagem”, numa visão dedutiva da concepção da semiótica sincrética.

 

 

2.4 Conceituação

 

Essas três características, “foco”, “contexto” e “intenção” são princípios que, como vimos, em síntese, abarcam o exercício de estudos de fatores de textualidade em que há os seguintes tópicos: “situacionalidade, contextualidade, intertextualidade, interdisciplinaridade e intencionalidade”. (Val, Maria da G. C. Redação e Textualidade. 2.ed. São Paulo : Martins Fontes, 1999 )

Para Maria da Graça Costa Val “Intencionalidade e aceitabilidade referem-se aos protagonistas do ato de comunicação. Intencionalidade: empenho do produtor em construir um discurso coerente, coeso e capaz de satisfazer os objetivos que tem  em mente numa determinada situação comunicativa. Aceitabilidade: expectativa do recebedor de que o conjunto de ocorrências com que se defronta seja um texto coerente, coeso, útil e relevante, capaz de levá-lo a adquirir conhecimentos. Situacionalidade: Elementos responsáveis pela pertinência e relevância do texto quanto ao contexto em que ocorre. Coerência pragmática: necessidade de o texto ser reconhecido pelo recebedor como um emprego normal da linguagem num determinado contexto. Informatividade: O interesse do recebedor pelo texto vai depender do grau de informatividade de que o último é portador. Medida na qual as ocorrências de um texto são esperadas ou não, conhecidas ou não, no plano conceitual e no formal. Intertextualidade: Fatores que fazem a utilização de um texto dependente do conhecimento de outro (s) texto (s).”

Essa descrição de textualidade de Maria da Graça Costa Val motivou este trabalho a sintetizar os dados em três fatores: foco, intenção e contexto que são fatores já descritos aqui. Para justificar isso, considerou-se a “intenção” com o sentido da “Intencionalidade” e “aceitabilidade” que Costa Val delineou, havendo, assim, a consideração aqui da troca de percepção comunicativa do receptor com a motivação do emissor da mensagem. Já no que se refere ao “contexto”, o termo abarcaria duas características de Costa Val: a “situacionalidade” e a “informatividade”, sendo que no “foco” teríamos um ponto de intersecção com o contexto pelas características de informatividade, mas que se diferenciaria pela intertextualidade, e caracterizar-se-ia ainda de forma mais peculiar quando considerado de forma sintética ele ser o assunto-chave da mensagem. A interpretação propriamente dita seria, nesse sentido, o resultado desses três elementos escolhidos (foco, contexto e intenção) e que geraria essa “aceitabilidade” descrita por Costa Val.

Ora, tendo como perspectiva central a razão da existência do assim classificado “Analfabeto funcional”, a pesquisa pelo Inaf dentre outras não abordaram reflexões para entender o porquê de essa característica ainda ser presente no ensino superior, pois fato é que não se mostra o que leva o estudante a não entender essa leitura, seja em texto ou na interpretação da imagem que é uma tendência cada vez mais presente e funcional no mundo contemporâneo e multimidiático por não dizer também multifocal, fazendo o leitor se perder cada vez mais em suas análises com interferências opinativas, e cada vez menos textuais com análise pelo próprio texto.

E essa “aceitabilidade” que Costa Val mostra é muitas vezes interpelada por várias opiniões ou visão desfocada. Seria talvez interferências paradigmáticas ao eixo sintagmático do texto, fator mais investigativo pelas ideias que Saussure levanta sobretudo por esses termos (paradigmático e sintagmático). Contudo, para ser mais pontual, observa-se com esses pesquisadores a base que sustenta a ideia de que a leitura de um texto com a visão particular do receptor não é o mesmo que ler um texto observando estruturas formadas e motivadas do emissor, extraindo, assim, o sentido do texto usando recursos linguísticos do próprio texto, sem interferências individuais, pois nela há o transcendentalismo da linguagem (pela cultura, religião, região, história etc). Em que se preste atenção aqui da não consideração sobre a “isotopia semiótica”.

Neste trabalho, explorar-se-á, então, três grandes grupos que se sobrepõem à análise e compreensão de um texto de forma sincrônica, fazendo-o compreensível, seja com elementos verbais e não verbais, diante daquilo que se constrói para evitar essa característica presente nos estudantes (Analfabeto funcional), no ensino superior.

Essas características textuais constroem a lógica do texto como ele é na sua composição de significado para o receptor não se limitar ao seu escopo particular, mas sim fazer uma investigação dos elementos do texto entendendo a constâncias dos argumentos que se mostram como um “quebra-cabeça a intenção ao redor do foco principal da mensagem. Portanto, resume-se aqui os fatores pragmáticos de textualidade em apenas três categorias representativas, como proposta sucinta e didática, mas que propõem a fidelidade da análise do texto. São eles: foco, contexto e intenção.

No estudo linguístico há “signo”, base primordial pelo qual se norteia a análise de qualquer linguagem numa visão semiótica. De acordo com o professor-doutor José Luiz Fiorin “(...) a realidade só tem existência por ele”. Começamos, então, abranger uma direção no âmbito estruturalmente linguístico para embasar nossa reflexão sobre a linguagem e o seu uso na percepção do receptor que se classifica como alfabetizado funcionalmente ou não. Os signos são, assim, uma forma de apreender a realidade. Só percebemos o mundo o que nossa língua nomeia”. (FIORIN, Introdução à linguística, I. Objetos teóricos. org. 2ed.p.55.são Paulo:contexto, 2003).

Saussure, linguista francês, considerado fundador, o “pai” da linguística como hoje se desdobra, fazendo uma exposição analítica da linguagem, principalmente na expressão do som da fala, em sua obra Curso de Linguística Geral, buscou uma definição para esse signo de modo que ele tivesse um caráter arbitrário (acredita que o sentido do “signo” fosse algo convencionado, não motivado naturalmente), além de possuir também uma certa linearidade (o signo não existiria simultaneamente a outro). Mas essas duas caraterística serviriam para a linguagem verbal; não para a não verbal (imagens, sons, símbolos, teatro etc).

Assim, desde os “signos mínimos”, expressão usada na linguística e que compõe parte da palavra, da sílaba (mais informalmente falando), morfemas; desde signos mais complexos como frases e textos inteiros que é nosso foco principal, há uma convenção, uma arbitrariedade, e uma linearidade, organização sequencial. Já quando se refere à linguagem não-verbal, Fiorin aborda também a ausência dessa linearidade. Há uma simultaneidade de sentido. Isso pode ser visto na linguagem, por exemplo, em forma de pintura, teatro e música, em que é mostrado o sentido de muitos signos que coexistem numa mesma expressão. Estão sincronizados. Já numa linguagem verbal, a linearidade que Saussure aborda promove a ideia de que uma letra (fonema) é seguida por outra para poder ser expressa na fala, assim como uma palavra (ou morfema) é seguida por outra palavra para que se dê sentido à frase que esta ao texto.

É no signo apresentado por Saussure, que há um significado relacionado a um significante. Esse significado é o sentido e objeto de estudo de um campo da linguística denominado Semântica. Mas sobre essa diacronia do signo saussuriano (significado x significante) Fiorin descreve: “O significado não é a realidade que ele designa, mas a sua representação. É o que quem emprega o signo entende por ele. (...) O significante é o veículo do significado, a parte inteligível”.

Voltando ao linguista Saussure, observa-se então que ele aborda a visão de signo no aspecto do som para explicar esse fenômeno. Assim, Fiorin esclarece que “Ao ‘conceito’, Saussure chama ‘significado’ e à ‘imagem acústica’, ‘significante’. Não existe significante sem significado, enquanto o significado não existe fora dos sons que o veiculam.” Essa separação é meramente didática, pois ambos estão simultaneamente agindo para o mesmo signo[3]. Continua: “Não se pode falar em imagens acústicas quando se trabalha com outros sistemas de signos. Por isso, é necessário ampliar a definição de significante para que ela possa ser usada em todas as linguagens. Poder-se-ia então dizer que o significante é o veículo do significado, que é o que se entende quando se usa o signo(...)”

Há ainda uma descrição quanto à teoria dos signos dada pelo semioticista Greimas no Dicionário de Semiótica, p.422, mostrando uma base analítica aos conceitos da Semiótica, mais do que simplesmente a definição deles, falando sobre a contribuição de Hjelmslev  “(...) mostra ele que a dimensão das unidades de manifestação não é pertinente para a definição de signo, (...) pode-se falar de signos-enunciativos ou de signos-discursivos, postulando para cada um dois planos da linguagem: expressão e conteúdo – a distinção entre forma e substância. Foi ele levado a precisar a natureza do signo como reunião entre forma da expressão e a forma do conteúdo”.

Essa concepção de Hjelmslev é analisada em sua obra-prima de 1940 intitulado Prolegômenos para uma Teoria da Linguagem, que busca de uma forma empírica (Considerado por ele como princípio fundamental para a cientificidade de uma teoria) uma teorização da linguagem humana, de forma mais abrangente, considerando-a como uma “forma” ante os prognósticos humanísticos, históricos e psicológicos a que a linguagem era submetida e considerada (processo “transcendental”).

Hjelmslev expandiu, então, o conceito de signo partindo da premissa de Saussure (e é esse conceito que será enfatizado).  Logo, Fazendo aqui uma breve dedução no Dicionário de Semiótica de Greimas, aquilo que se denominou de “significado”, tem na análise de Hjelmslev (além do som, considerado para algo mais abrangente como a “enunciação textual” e o “discurso”) um plano de conteúdo com sua “forma” e “substância”, enquanto que aquilo que foi denominado de “significante”, (condição concreta, visível e legível do signo), agora possui um plano de expressão também com uma “forma” e “substância”. “Todo signo, todo sistema de signo, toda língua enfim, abriga em si uma forma de expressão e uma forma de conteúdo. É por isso que a análise do texto deve conduzir, desde seu primeiro estágio, a uma divisão nessas duas grandezas.” (Hjelmslev, Prolegômenos a uma Teoria da Linguagem, p.63).

Esses dois planos (conteúdo e expressão) descritos por Hjelmslev faz a construção do chamado “Função Semiótica” em que se prese os valores de substância e forma: “Do mesmo modo, é em razão da forma do conteúdo e da forma de expressão, e apenas em razão delas, que existem a substância do conteúdo e a substância da expressão que surgem quando se projeta a forma sobre o sentido.” (Prolegômenos para uma Teoria da Linguagem, p.61).

Num esquema didático que segue o signo é apontado na visão de Hjelmslev partindo do signo de Saussure:

       
   
     
 
 
   

Uma palavra é escrita ou pronunciada. Essas duas coisas é vista / ouvida num plano externo do signo dessa palavra que é aqui denominado de “significante” de acordo com Saussure. Já o “sentido”, trazido pelo conceito dessa palavra é o “significado” desse signo. Hjelmslev considera esse significante composto de um plano para que ele se manifeste como tal, o “plano de expressão”, assim como a ideia desse signo e o conceito para se manifestarem é preciso estar em um outro plano: “plano do conteúdo”. As duas formas se manifestariam motivadas por duas substâncias. Esse é um processo complexo, mas que pode ser adaptado à análise do texto considerando-o como um signo nessa formação, assim como uma música e uma imagem também o é. Fato é que para que uma forma tenha um sentido, esta precisa ser motivada por uma substância. Vale reforçar que toda essa divisão é didática porque na prática oferece simultaneamente.

Nesse exposto, faz-se necessário, portanto, esclarecer o conceito de “substância” e “forma”. Uma dicotomia que alimenta outra dicotomia mais ampla e já exposta por Hjelmslev e que traz a “função semiótica” da linguagem: “plano do conteúdo” e o “plano da expressão”. Este último é o exterior de um signo, aquilo que genericamente firma-se como parte concreta, palpável da linguagem, assim como aquele outro plano (conteúdo)  é o interior de um signo, aquilo que seja conceitual. Ambos os planos possuem “substância” e “forma”.

De modo geral, a explicação de “forma” que motiva a “substância”, tanto no plano do conteúdo como no plano da expressão, dá-se pela capacidade de possibilidades argumentativa do pensamento do receptor. Há um conjunto de possibilidades tanto da expressão como do conteúdo que se manifesta numa forma (de expressão ou de conteúdo).  

A ilustração para o entendimento desse conceito, entre tantos outros, seria por exemplo o signo da palavra “chupeta” com a ideia geral de ser, em sua função, objeto para satisfação do bebê na ausência do contato com a mãe. O sentido que é o que abarca o plano do conteúdo dessa palavra é conhecido em muitas línguas. Inclusive no próprio Brasil há muitas regiões que tem o mesmo conteúdo, enquanto que em outras regiões para expressar a mesma ideia, norte e sul desse país, ela precisa ter um outro plano de expressão como, por exemplo, “consolo” (Ceará) e “bubu” (no Rio Grande do Norte). A função dessa palavra é conhecida em várias regiões, mas ela é expressa de forma diferente.

De acordo com Hjelmslev esse “fator comum que distingue uma palavra de outra’ é chamada de “sentido”. “O sentido não-formado que se pode extrair dessas cadeias linguísticas assume uma forma de modo diferente em cada língua. (...) O sentido se torna, a cada vez, substância de uma nova forma(...)” (Hjelmslev , Prolegômenos a uma Teoria da Linguagem, p.57).

Com isso, a forma adquire essa condição, dada a necessidade de mostrar uma substância que é a variação do pensamento no qual a ideia da palavra se instala. A capacidade de variação da ideia seria aqui, então, a “substância do conteúdo”; enquanto que o uso de uma determinada ideia em um contexto seria uma forma de um conceito, ou seja, a “forma do conteúdo” daquela ideia, naquele espaço ou cultura. Isso é muito dinâmico e rico ao mesmo tempo. Uma forma alimenta a necessidade retratável de uma substância para expressar o sentido de um signo.

No plano da expressão, isso ocorre quase que da mesma maneira. Há uma infinidade de opções que abarca a maneira de articular essa palavra, mas que é necessário, diante da disposição fonética de cada região como sotaques ou até cultura, etimologia etc, criar uma forma para essa expressão. No Brasil, há doze vogais, por exemplo, que se dispõem na palavra para expressar o sentido, já o norueguês e o alemão possuem quantidades diferentes de vogais comparadas às que existem na língua portuguesa (consideração fonológica). Já em algumas línguas orientais como a chinesa há uma consoante glotal, fator de expressão que não é utilizado no Brasil, por exemplo. A infinidade de fonemas que existe é a “substância de expressão” enquanto que a forma adquirida de determinados fonemas para a escrita ou pronúncia de uma língua seria uma “forma de expressão”. Logo, a forma de expressão mostraria a substância de expressão existente na característica de uma determinada língua.

Hjelmslev dá o exemplo de um punhado de areia na mão que ao ser solta cria várias imagens no chão. Essa areia é a substância e o formato no chão de imagens diferentes é a forma com que essa quantidade de areia cria. A linguagem obedece a esse mesmo princípio tanto no plano do conteúdo como no plano da expressão. E com base nisso também podemos considerar o texto lido como um grande signo fazendo valer a mesma estrutura de análise neste trabalho para refletirmos a razão sistemática do analfabetismo funcional no ensino superior.

 

 

2.5 Hipótese do trabalho

 

 

Como se dá, então, o analfabetismo funcional? Analfabetismo funcional: quem ler a mensagem (verbal ou não verbal ou os dois simultaneamente) os ver como um signo que possuindo a base essencial da teoria de Saussure e adaptando-a para uma teoria mais genérica de Hjlmslev, temos:

Mensagem (texto, música sonora ou imagem) = signo

 
   
 
   

Assim, temos o “texto” como um grande signo linguístico gerando um significado (plano do conteúdo [forma do conteúdo4 e substância do conteúdo3]) /significante (plano da expressão [forma da expressão1 e substância da expressão2])

Com os dados demarcados em números relacionados ao signo hjelmsleviano temos:

  • Argumentos do texto (“Forma de expressão” 1)
  • Contexto que sustenta o foco gerando a intenção (“Substância de expressão” 2)
  • Intenção - implicaturas e subentendidos (“Substância de conteúdo” 3)
  • Foco principal, assunto que é desencadeado explicitamente no texto  (“Forma de conteúdo” 4)

A “semiótica sincrética” acontece no plano da expressão. Considerando o texto como signo, a “forma de expressão”, argumentos do texto, gera a constatação de uma “substância de expressão”, o mundo de possíveis contextos para sustentar o foco original do texto. Nesse momento, no caso do analfabeto funcional, “essa substância de expressão” teria uma extensão tão grande que a forma deduziria argumentos influenciados a outros contextos sobrepostos pelo receptor da mensagem. O sincretismo de vários contextos aleatórios criados na percepção do receptor é o que daria a ele o não entendimento mais pontual da mensagem.

Além disso, há um sincretismo no próprio texto lido, por exemplo, gerando inúmeras posições argumentativas que se sobrepõem ao analisarmos um texto, e isso ainda vêm acompanhado com contextos culturais, regionais, psíquicos, filosóficos, contemporâneos, tecnológicos que a condução argumentativa poderia sugerir ao leitor. Esses argumentos, que estaria no plano da expressão do signo textual, alimentariam inúmeros focos (“forma” do conteúdo) que deve, no texto, representar uma “substância de conteúdo” desproporcional ao que a forma poderia de fato representar, ou seja, apropriada ao que o próprio texto oferece, fora de inúmeros conceitos que possa ser inserido, sugerido, opinado, porém não observacional e não investigativo ao que o autor quis mostrar.

Diante de uma mensagem, pressupõe que esse foco seja originalmente a concretização de inúmeros fatores e possibilidades, “substância” de conteúdo, que poderia ser conduzido, delimitado e restringido na própria ideia argumentativa do texto. Logo, como o “plano do conteúdo” é visualizado pelo “plano da expressão”, a “forma de expressão” estaria diretamente ligada a “forma do conteúdo”. E é exatamente nessa “forma de expressão” que não poderia haver um sincretismo semiótico por parte do receptor para não alterar o sentido do texto. Nesse caso, fatores paradigmáticos descritos por Saussure poderiam ser investigados também como uma forma de interferência ao foco original da mensagem a ser compreendida. Mas essa análise não está contemplada aqui neste trabalho.

 Enfim, a ideia que sustenta uma infinidade de assuntos escritos precisaria uma forma, de acordo com Hjelmslev, gerando a percepção de uma “substância de expressão”, enquanto que o argumento escolhido e escrito no texto junto ao foco seria essa “forma de expressão”. Isso traz uma “substância” de conteúdo quando encontramos a “intenção”, fator determinado, encorajado diante de um único assunto-chave que se chama aqui de “forma do conteúdo”. Em outras palavras, o texto adquiriu essa forma porque nela há uma intenção que o motiva a concretizar o tema (foco) principal do texto. Considerando essa análise de forma estritamente pontual, não pode haver interferências transcendentais e nem pessoais ao ler um texto (e que se aplique o mesmo princípio à análise da linguagem não verbalizada), pois o que se vale aqui é a premissa do entendimento do texto, pela observação e situação do texto, criando enfim uma interpretação de texto pelo que o próprio texto apresenta como argumento escrito, o que delimitaria as inúmeras possibilidades contextuais no espaço de entendimento do receptor.

É, portanto, na “forma de expressão” nesta análise que revigora o motivo inicial de todo o signo textual ser entendido. E isso configura um ato sancionado por Hjelmslev quando disse que “(...) um signo é o signo de uma substância de expressão” (Hjelmslev, Prolegômenos a uma Teria da Linguagem, p.62). A “forma” é a forma de uma “substância” de acordo com esse pesquisador. Quando essa forma é fruto de uma substância de expressão inserida opinativamente pelo aluno no ensino superior por meio de conceitos mal entendidos, adicionados ao texto e mal formulados em torno do texto, há, então, a falta da percepção original do texto que seria representada na “forma do conteúdo”, ou seja, há aí um dos possíveis motivos para a configuração do que o infa denominou, sem maiores detalhes, como “analfabetismo funcional”.

É visto, com isso, que a intenção de uma mensagem é o fio condutor do entendimento a ele, apenas por ele mesmo. O não entendimento do foco (aqui tratada como “forma do conteúdo” prejudicaria uma cadeia de situação significativa, fazendo valer apenas o valor opinativo e meramente individual sem “forma de substância”, tanto para o plano do conteúdo com a fuga do foco do texto em detrimento da adoção a focos secundários, como para o plano da expressão com a presença dos argumentos e intenção textual. Que se valha aqui a palavra “investigação” como sugestão e aprofundamento dessa descrição em busca do porquê de haver esse analfabetismo funcional.

O texto, a música e a imagem possuem cada um uma intenção. Há neles muitas motivações, mas dentro de uma intenção maior que se sustenta com argumentos ligados a um foco principal. E esse valor a mais que se insere, por parte do aluno na graduação, ao ler um texto, ver uma imagem ou ouvir uma música está sincronizado a essa mensagem de modo que essa sincronia são aspectos sincréticos (numa semiótica sincrética – outras linguagens funcionando paralelamente) e que atrapalham a motivação original dessa mensagem. Isso acomete muitos interlocutores, mas os fatores que levam a isso pode ir desde o desconhecimento da expressão de um texto (“analfabeto” propriamente dito) a um grau de super lotação de significados (considerando o “plano do conteúdo”) que pairam diante do eixo principal, original ao texto. Tanto um lado como outro, há um forte prejuízo à ideia do texto pela sua própria motivação, e o resultado parece ser o mesmo: o não entendimento do texto, ou seja, a presença do “analfabeto funcional”, seja por meio de letras, de palavras, frases, argumentos, foco, acúmulo de conceitos extra ao texto.

De forma um pouco mais técnica, considerando o signo hjelmsleviano, numa primeira análise, no trato da mensagem ser texto, quando a forma de expressão1 da mensagem é confundida com a sua forma de conteúdo4, há uma ideia (nova grandeza de sentido) superposta (criada) nessa interação, sincretismo, que foge da intenção original do interlocutor que emitiu a mensagem. Além disso, as várias formas de expressão mostradas no texto como um signo em sua totalidade traz traços comuns que podem ser interpretados pelo leitor como o “foco principal”de forma equivocada, pressupondo elementos fora da relação da “forma de conteúdo” uma vez que o plano do conteúdo está diretamente associado ao plano de expressão.

Confunde-se, portanto, o contexto (ou parte substancial dele) com argumentos mais opinativos pelo leitor, ao invés deste investigar o foco central da mensagem que muitas vezes vem, inclusive, explícito no texto por meio dos argumentos. Nesse sentido, abre-se ainda uma segunda observação principalmente quando a mensagem se referir à música ou imagem: O receptor, aqui caracterizado como “analfabeto funcional”, quando associado ao texto, ou à imagem ou ao som, ou a ambos, confunde a localização, no geral, a animação, os gestos, os formatos, as cores e as expressões desenhados na figura com variados assuntos hipotéticos (temas) à interpretação, ou seja, à formação de  várias formas focos da mensagem no esquema deduzido da teoria de Hjelmslev (41, 42, 43 ...4n ) , consequentemente, criaria, por intermédio das respectivas formações, várias formas de expressão (11, 12, 13 ...1n ) gerado, assim, uma má percepção do entendimento da mensagem. A essa criação de formas de conteúdo sem a preocupação de vê-las ligadas a forma de expressão da mensagem é o que desencadearia o não entendimento do conteúdo textual, ou seja, do foco principal dele que seria fruto da intenção.

Com isso, obtém-se a seguinte hipótese: a identificação de uma forma de expressão sincrética e percebida pelo receptor, geraria a forma de conteúdo aleatório que identificaria um equívoco à diaconia expressão X conteúdo, alterando o entendimento original do texto, ou seja, um não analfabeto funcional leria um texto ou analisaria uma imagem ou letra de uma música (dados oferecidos na pesquisa) com compreensão, porque a percepção que ele teria do contexto que cria os argumentos da mensagem apontaria para o foco central da mensagem uma vez que este é apresentado, alimentado, apontado pela intenção do emissor que aqui seria o precursor e motivador (substância do conteúdo) para existência do assunto central (foco escrito/forma do conteúdo).

Em contrapartida, o chamado “analfabeto funcional” seria o receptor de uma determinada mensagem textual que observasse o contexto (leitura propriamente dita no corpo do texto) entendendo-o como um complexo de várias formas de foco principal, fazendo com que o único foco, original da mensagem, seja escondido com inúmeras possibilidades interpretativas vindas do sujeito que ler, ver ou ouve uma mensagem. Não se perceberia, portanto, o significado da mensagem (forma do conteúdo), pois isso seria simplesmente omitido pelo receptor. Isso motivaria esse leitor a não saber com clareza o que se trata o texto, qual seria exatamente o seu conteúdo, senão um conjunto de assuntos sobrepostos sem rumo guiado pelos argumentos do texto. A intenção do texto estaria, assim, confusa ou até não seria encontrada sobre qualquer ponto de vista que o leitor possa remeter.

Os elementos a serem observados nesse fenômeno seria uma espécie de sincretismo por fusão, muitas vezes o sujeito analisando a mensagem trocando-a pela presença de imagens, ou mesmo muitas informações pessoais (culturais e contextuais extratexto) que funcionaria como uma falsa “forma de expressão” entendida pelo receptor embaralhando em trânsito o que seria o conteúdo central originado do texto lido (processo de sincretismo por implicação).

Semelhantemente, é isso que também se observa com a mensagem não verbal em que se preste atenção às variadas formas de contorno dos desenhos, por exemplo, no contexto do receptor, mas não na representação direta entre a forma de expressão da imagem para a criação da forma de conteúdo. Em outras palavras, lê-se o texto, ou vê-se uma imagem, ou escuta-se uma música com critérios próprios e não observados na motivação da própria mensagem.

No que se refere aos estudantes no ensino superior, essa teoria senão pela falta de hábito que o daria formas de expressão muito longe do foco original da mensagem, há uma outra hipótese para o não entendimento do texto: São aqueles que têm muito hábito, mas faz uma leitura segundo os critérios de cultura adquirida e não com a expressão simples e direta que a mensagem exige para ser entendida segundo a motivação não do receptor, mas sim, do próprio enunciador da mensagem, ou seja, pela intenção observada na composição pronta do texto.

Tanto na linguagem verbal como não verbal, a consideração aqui é que há um sincretismo como se estivesse dentro de outro sincretismo. Ou seja, no caso do texto, muitos elementos argumentativos influenciando a formação do foco, e no caso da imagem, muitas formas geométricas, faciais e mesmo em cores fortes e fracas, dando a formação da expressão que pode ser confundida com o contexto de mundo do receptor (gerando a não percepção do conteúdo) ou pode ser direcionada como uma forma de expressão que mostraria o conteúdo mais original do interlocutor que emitiu a mensagem.

2.6 Metodologia da pesquisa

A metodologia adotada para tentar constatar essa hipótese teórica foi um questionário para abordar aspectos interpretativos em texto dissertativo, letra de uma música com um teor descritivo-narrativo e uma imagem (charge) para que se completasse com os três recursos tanto da linguagem verbal como não verbal. Os dados de pesquisa envolveram informações básicas e diretas como: alunos universitários (pelo menos 34 alunos universitários em cursos e duração de graduação variados), percepção de vários tipos de linguagem; dados do Infa, teóricos da linguagem, metodologia com perguntas e respostas discursivas e de múltipla escolha. Estabelecimento de critérios:

  1. Delimitar lugares para a análise;
  2. Delimitar os critérios de análise para testar a leitura de um texto e avaliar as opiniões imediatistas e mais pontuais ao texto; para mostrar possíveis interferências;
  3. Mostrar habilidades escritas para falar sobre uma determinada reportagem, imagem ou música, assim como a justificativa para dizer que alguma coisa seja o foco e pela intenção saber se o estudante interpreta o texto, entrelaçando o mundo virtual com o físico-textual;
  4. Os dados podem ser visualizados assim:
  1. Faculdade:  (    ) Particular     -  (    ) pública
  2. Escolaridade (2º grau): (    ) Maior parte no ensino particular - (    ) Maior parte no ensino público      
  3. Idade:  (    ) até 20 anos   -   (    ) de 21 a 30   -   (    ) de 31 a 40 anos   -   (    )mais de 40 anos
  4. Sexo:                 (    ) Masculino     -     (    ) Feminino
  5. Nível de leitura semanalmente:  (    ) ler muito – (    ) ler razoavelmente – (    ) ler pouco
  6. Nível de escrita: (    ) escreve todo dia – (    ) escreve algumas vezes por semana – (    ) ler e escreve mais do que quatro dias por semana – (    ) ler e escreve menos do que quatro dias por semana – (    ) não gosta de ler e escrever
  7. Nível de acesso à internet: (    )  mais de 2h por dia, em média.     (    )  menos de 2h por dia.
  1. Por favor, leia o texto abaixo apenas UMA VEZ e responda as questões “a” e b”:

Ponto de vista

Cinegrafista da Band está à beira da morte por causa de uma bomba caseira feita por vândalos nas manifestações. Há tempo, muitos, inclusive eu, estamos dizendo que as manifestações com esses vândalos mascarados devem ser evitadas. É preciso morrer quantos para a população começar a apoiar a ação da polícia contra esses bandidos? E se os manifestantes do bem não conseguem nem reprimir esses imbecis, nem manifestação deveria ter. Por isso que sou contra as manifestações!

                                                                                                                             

a)      Escreva em apenas uma palavra o ASSUNTO PRINCIPAL do texto:

b)      Escreva agora em apenas uma frase a INTENÇÃO que o autor quis mostrar com esse assunto:

  1. Por favor, agora observe a imagem abaixo e responda as questões “a” e b”:

a)      Escreva em apenas uma palavra o ASSUNTO que a imagem quis mostrar:

b)      Escreva agora em apenas uma frase a INTENÇÃO que o autor quis mostrar pela imagem:

  1. Lendo os trechos da música abaixo marque APENAS UMA ALTERNATIVA correta:

Quem é a ASA MORENA mostrada na música?

  1. (    ) UM PÁSSADO
  2. (    ) UM SONHO
  3. (    ) UMA MULHER
  4. (    ) UM HOMEM
  5. (    ) UM ROMANCE

No primeiro texto, temos, portanto, um  parágrafo único, pequeno, escrito, com título não diretamente ligado ao foco principal, estilo dissertativo, com ideias intercaladas, foco indireto porque não aparece no início do texto, intenção pressuposta, vocabulário simples (com palavras mais usuais); Já na segunda mensagem encontramos a  imagem de uma charge, com parte escrita, abordagem de conceitos da atualidade didaticamente legível, contexto e intenção subentendida; Por fim, há a letra de uma música, estilo descritivo-narrativo, melodia simples, vocabulário simples para não levar a fadiga durante a resposta.

Para a realização da pesquisa em campo, os dados foram avaliados tendo como critério principal a percepção imediata de um texto, uma imagem e uma letra de uma música, abarcando níveis diferentes de linguagem, além-texto. Nessa condição, a ideia seria observar o quanto as interferências opinativas estão em sincronia com o foco e a intenção originais do emissor da mensagem, desfocando com argumentos fora da mensagem, o que, aqui se caracterizaria como o “analfabeto funcional” por não perceber o que a mensagem quer transmitir por si só.

O questionário foi realizado em um ambiente virtual, via e-mail e as respostas foram escritas em aproximadamente 13 minutos, satisfazendo uma amostragem em forma de perguntas fechadas e abertas claramente mencionadas durante as questões. Antes o questionário foi testado (Pré-questionário) para aperfeiçoar a clareza e intenção da investigação de cada questão. Portanto, o questionário que segue é fruto de um aperfeiçoamento metodológico para a aplicação com seus cuidados de veracidade e objetividade. Não houve (nesta pesquisa) interesse de tabulação dos dados porque o levantamento para o cálculo não passou de 25 participantes efetivos.

2.7 Descrição técnica dos dados de pesquisa

 

O critério para a pesquisa de campo foi o questionário. Assim, cada participante preencheu em tempo real a pesquisa enviada via e-mail e respondida na mesma hora, com exceção de cinco participantes. Os dados de pesquisa A pesquisa abordou 34 pessoas, sendo que apenas 25 preencheram o campo “faculdade”. Como a pesquisa estava focando os alunos do ensino superior, foram avaliados exatamente 25 alunos graduandos, dos quais três são formados e um é doutor.  

Uma pesquisa focada em uma descrição-diagnóstica mais pontual, prática e simples, mas que pode ser posteriormente desenvolvida, a rigor, com mais aprofundamento metodológico e teórico, aplicando-se, reforçando ou adaptando metodologias e didáticas variadas em contextos diferentes. Esta pesquisa tem como objetivo central avaliar o grau de percepção funcional dos universitários quanto à leitura de uma mensagem tanto na linguagem verbal como não verbal.

A pesquisa constatou o seguinte resultado:

Dos 25 participantes pesquisados, 76% é do sexo masculino e 24% do sexo feminino; 70,8% são na faixa etária entre 21 a 30 anos, 12,4% até 20 anos, 12,4% entre 31 a 40 anos e apenas 4,1% mais de 40 anos. Portanto, praticamente a pesquisa situou a grande maioria jovem, em função ativa na graduação. 52% tiveram seus estudos em maior tempo na escola pública, enquanto que 48% passaram maior tempo dos seus estudos na escola privada. 71,4% dos entrevistados estão ou fizeram faculdade ou universidade particular, e 28,6% em faculdade ou universidade pública. Pouco mais de 90% dos entrevistados estão cursando a faculdade ainda. Aqui o ano em que se encontram na graduação não foi considerado por falta de dados.

Numa abordagem mais específica à entrevista, 52% se diz “ler razoavelmente” durante a semana, enquanto que 36% se diz “ler muito” e apenas 12% se diz “ler pouco”. 57,6% declara que tem o hábito de escrever todo dia. Nessa sequência, 26,8% ler e escreve mais do que quatro dias por semana, 23% se declara escrever só algumas vezes por semana. 11,5%  ler e escreve menos do que quatro dias por semana, e apenas 3,85 se declarou não gosta de ler e escreve. Ou seja, quase todos que estão na faculdade têm contato com a leitura numa constância razoável. No tempo gasto com a internet, 92% a usam mais de 2h por dia, enquanto que apenas 8% gastam tempo na internet menos de 2h por dia. A grande maioria gasta, portanto, muito tempo on-line.

No que se refere aos dados com respostas mais discursivas, as variantes e cruzamento presentes neles são inúmeros, até mesmo pelo caráter subjetivo da resposta. Porém, os dados tem como resposta a observação pontual do foco, contexto e intenção da mensagem. Sendo assim, considerou-se como foco o assunto-chave, escrito (explícito) no texto que serve de ponto de partida, com argumento (contexto) para expor a intenção do emissor. Partindo do pressuposto que não há mensagem diretamente lógica para o receptor se, que esta não parta de um assunto, e que esse assunto precisa de um contexto, seja escrito em forma de argumento ou desenhado, nas imagens, justifica-se, assim, o critério: “foco”: assunto-chave; “contexto”: argumentos escritos e não hipotetizados pelo receptor da mensagem; “intenção”: mensagem interpretada e muitas vezes subentendida, mas sempre apoiada no contexto do foco antes aqui descrito. O que vale nesses três itens é a não opinião ou imposição de ideias para o sentido do texto. Aqui é a busca do entendimento do que se diz propriamente sobre o texto pelo texto.

Daí, estabeleceram-se como critério avaliativo as respostas mais sucintas e outras mais elaboradas (às vezes até prolixas). Portanto, a descrição aqui apontará o resultado dos dados mais relevantes até os detalhes mais específicos da pesquisa. É o momento em que o entrevistado escreve o que pensa diante do que é pedido na análise interpretativa do texto, da imagem e da letra de um trecho de uma música (pesquisa que demonstra uma pequena demonstração da diversificação do uso de linguagens do emissor), tendo o seguinte resultado preliminar por parte da proposta deste trabalho:

Mensagem 1 (texto): Foco: “manifestação(ões)” (Foi, inclusive exaustivamente repetido durante o texto e teve sustentação de argumentos que serviram de base para o desenvolvimento desse foco principal); Intenção: “Opinião contrária às manifestações por causa dos vândalos” (esse foi o fator motivador para que se falasse do foco, “manifestação”. Geralmente se acrescenta pequenos vocábulos para esclarecer melhor a intenção do texto. Contudo, quanto mais sucinto e claro for, parece que mais pontual ao texto o receptor será). Assuntos subjacentes ao foco e que ajudaram a construir a intenção do texto, na ordem de relevância e que poderia de repente confundir com o foco central: “Cinegrafista da Band”; “vândalos mascarados”, “ação da polícia”; “bomba caseira” “população”.

Mensagem 2 (imagem-texto): Foco: “política” (A repetição de quadros com o mesmo desenho do candidato com escritas voltadas para o “voto” remetem ao mundo da política. Como nesse caso é uma mensagem imagética, dificilmente o foco será explícito), Intenção: Aqui se trata de uma margem, logo a descrição pode ter vários contornos explicativos, mas não podendo fugir, até pela sugestão contextualizada da imagem, da questão “política”, “voto”, “honestidade” e outros termos como “hipocrisia” e “falsidade”. A sugestão, dentre outras para a intenção dessa mensagem imagética é: descrédito ao voto para os candidatos na política.

Mensagem 3 (letra de uma música): Foco: “Asa Morena” (Explicitamente marcado no texto, tem ao redor dele a manifestação totalmente motivada do interlocutor do texto), Intenção: a atração por alguém que é representado pela “Asa Morena”. Nessa mensagem foi questionada a percepção de leitura atenta do texto pelos detalhes que o próprio texto, com seus elementos morfológicos, trazem. Quem seria essa “Asa Morena”? Pela palavra em si, é alguém feminino ou uma situação que seja feminina. A expressão é feminina, mas a representação dessa “asa Morena” é um “homem, uma vez que o texto mostra no primeiro verso a pista que levaria a condução da declaração da música: “Me faz pequena”. O adjetivo “pequena” é para alguém do sexo feminino, o que traz, num senso direto a figura de uma mulher pedindo a atenção de um homem que ela intimamente parece conhecer.

O resultado geral para a análise, em porcentagem, do primeiro texto foi: 58% dos pesquisados conseguiram acertar pontualmente o foco do texto. Desse número, 76% escreveram nas respostas muitas informações com temas diferentes daqueles presentes no texto, e só 27% foram muito objetivos. 48% dos entrevistados erraram a constatação do foco do texto. Desse número, 27% repetiram focos idênticos entre eles, mas totalmente diferente do foco central; aqueles que colocaram na entrevista temas (focos) totalmente diferentes ao foco principal do texto e bastantes aleatórios entre eles, foram 73% dos casos. Ou seja, a maioria que não acertou o foco, criaram cada qual o seu foco sem repetições na comparação da resposta entre eles, o que justificaria em parte a hipótese teórica deste trabalho no sentido de que formas de expressão, representada por argumentos interpretados do texto de forma equivocada, fez um sincretismo atrapalhando a linguagem argumentativa originária do próprio texto.

Numa outra óptica de análise geral, insere-se aqui mais um fator observado: as respostas sucintas ou mais elaborada (às vezes prolixas). Considerou-se nesta pesquisa uma resposta “sucinta” aquelas com a quantidade de até dez caracteres, incluindo palavras de ligação (preposição, conectores) e pequenos adjuntos (artigos); já uma resposta mais elaborada (prolixa ou não) seria uma resposta com mais de dez caracteres nesse mesmo contexto explicitado. Assim, foi observado um pequeno cruzamento com dados anteriores resultando na seguinte constatação:

Dos que acertaram o foco no primeiro texto, somente 28% foram sucintos sobre a intenção do texto; 76% não; e 85,7% escreveram explicitamente o foco principal na justificativa da resposta sobre qual seria a “intenção” do texto. Somente 14,2% não escreveram explicitamente a palavra que representa o foco central do texto na resposta sobre a intenção. Isso pode sugerir que de um modo ou de outro, a maioria que acertou o foco do primeiro texto retomou-o na justificativa da resposta que perguntava sobre a intenção. Ou seja, a intenção, “substância do conteúdo” é um fator motivado pelo foco, “forma de conteúdo”, e ambos são complementares para a explicação e entendimento do texto.

Dos que não acertaram o foco descrito nos critérios desta pesquisa, a metade, 50%, foram sucintos na resposta sobre a intenção do texto; 60% desse total dos que não acertaram, colocaram o foco principal durante a resposta sobre a intenção, enquanto que 40% dos pesquisados em nenhum momento lembraram-se de escrever o foco principal nas suas respostas. Uma observação interessante que pode ser deduzida dessa situação é que dois entrevistados que fizeram pós-graduação e doutorado não escreveram  foco em suas respostas, foram prolixos e impuseram opiniões adjuntas ao texto, mas não centrados a ele e por ele. A proposta era tão somente entender a mensagem para avaliar o nível, na óptica linguística, do “analfabetismo funcional”. O valor opinativo estava descartado nas respostas. Porém, foram apenas dois no total, o que não pode ser motivo para uma avaliação mais concreta. Fato é que há má percepção para entendimento do foco pelo menos nos 48% dos entrevistados e de modo geral, há uma prevalência enorme da confusão que os entrevistados fizeram quanto à intenção dos textos, inserindo muitas palavras incluindo o foco. Claro que ao se tratar de alunos universitários, a tendência é que houvesse o acerto do conteúdo original do texto em muitos casos, em que pese também a capacidade de um esquema mental sucinto por parte dos que entenderam o texto.

2.8   Interpretação dos dados de pesquisa com conceitos básicos da semiótica sincrética de Hjelmslev

 

Houve interferências de assuntos paralelos, em menor ou maior grau, em todos os casos quando se tratou de expressar a “intenção”. A resposta sempre tinha a tendência de falar de outros focos, inclusive do foco original. Contudo, o arcabouço cognitivo de cada estudante determinava a prolixidade que, na verdade, seriam interferências individuais ao texto. De modo geral, o foco, contexto e intenção do texto foram marcadas constantemente por muitos entrevistados, enquanto que os que erravam esses elementos pesquisados, tinham uma variabilidade enorme de assuntos, sem constância para quase nenhum deles. Respostas com justificativas opinativas seriam uma forma de expressar uma mensagem interpretada paralelamente por parte do entrevistado e isso foi comum durante a pesquisa.

 

 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

3.1 Repercussão metodológica do analfabetismo funcional no ensino superior

De fato, a educação hoje possui desafios que vão além de informar conteúdos. Numa perspectiva construtivista, a interatividade poderia ser usada como uma forma para que se privilegie por parte do docente a interpretação de dados pontuais, focados, antes mesmo de fomentar posicionamento crítico sobre determinados conceitos. Constatado o “analfabetismo funcional” também deveria ser estipulado maneiras motivacionais para que se ache o foco por meio de elementos constituintes do texto, da imagem, do vídeo ou de uma pesquisa. O exercício descritivo traria um potencial de análise crítica muito mais dentro da originalidade dos fatos do que na imaginação simplista de quem interpreta uma mensagem.

A própria proposta de redação requer a leitura atenta de um texto para depois redigir um ponto de vista. Isso parece ser uma condição essencial para a entrada no ensino superior que, em tese, deveria ter estudantes aptos a considerar uma mensagem com investigação antes de dar a sua opinião crítica. Essa primeira situação está em déficit de acordo com os apontamentos diagnosticado pelo Infa e pelos dados observados aqui na teoria da semiótica sincrética. Há uma tendência do estudante universitário brasileiro de emitir opiniões sem base interpretativa retirada do próprio texto, causando, assim, a má função do sentido original da mensagem, ou seja, teríamos o analfabeto funcional.         

 

3.2 Reflexão geral

 

A reflexão sobre o Analfabetismo Funcional no ensino superior sob a óptica linguística de longe não termina aqui e exatamente por ter nesta análise o fator técnico da linguística sincrética que é uma teoria abrangente e ainda em constante estudo por vários pesquisadores da linguagem. Contudo, algo nesse exposto favorece como consequente fruto inicial: mais do que formulações de métodos aleatórios, o fator determinante para que haja uma alfabetização funcional não pode se basear em simples pesquisas, mas sim num aprofundamento mais técnico e funcional quanto à análise enunciativa e no plano discursivo da linguagem, pois o entendimento de uma mensagem depende da linguagem e nos caminhos que ela atua na “aceitabilidade” do receptor para entendimento e compreensão da intenção sobre o foco. A partir daí se tem uma base para a atuação de relações e posicionamentos com opiniões mais críticas.

É necessário entender que o texto, como linguagem verbal, e outros meios de linguagens não verbais, sejam compreendidos como um todo pelo seu aspecto funcional com foco, contextualização e intencionalidade, fora do transcendentalismo de ideias particulares por parte de quem é o sujeito para o entendimento dessas enunciações. O fator primordial está mais na percepção da mensagem pela própria mensagem do que pela pressuposição que se tem dela de forma aleatória, mesmo com o arcabouço de conceitos que o receptor tenha durante a leitura da mensagem. Antes de relacionar as ideias, é necessário achar o foco, contexto e intenção do texto.

A arbitrariedade se dá com elementos da própria linguagem considerada. Nela há fatores que correlacionados evitam superposições criando um sincretismo negativo porque por eles se tem a fuga do foco textual e consequentemente da intenção que motiva, a priori, a existência dele. Ou seja, falando de outro modo, elementos contextuais além do exposto no texto são colocados pelo leitor no entendimento do texto de forma que haja assim um desfoco e isso o caracterizaria como analfabeto funcional. Mesmo lendo o texto, e até entendendo algo, não está focado e nem articulado. A prioridade opinativa estaria acima da investigativa ao conteúdo do texto.

No aspecto histórico da educação, o processo tradicional em que se prese a memorização mais do que a correlação de ideias poderia até aproximar, de forma mais pontual, ao que o texto expressa por si só, mas teria o problema da reflexão pois o entendimento exato do texto é o percussor para o valor de opinião pós-texto, produzindo soluções com correlação do mundo e do seu próprio arcabouço cognitivo. Mas tudo parte do entendimento impessoal da mensagem verbal e não verbal. O que não pode não acontecer com facilidade quando se considera processo de educação pela vertente construtivista, pois a “liberdade” poderia ser confundida negativamente com “libertinagem” da análise textual. Ou seja, o perigo do “tudo pode, tudo é, depende do contexto aleatório”. Daí a concepção agora no lado metodológico.

Há uma tendência nesse sistema construtivista para acentuar a livre escolha de ideias, a livre opinião, o livre estudo, sem o critério pontual, não tradicional, do que a mensagem pode realmente trazer de intenção do enunciador sem interferências  do sujeito que a interpreta, pelo menos num primeiro momento. Com base na questão linguística apresentada neste trabalho, há uma ligeira sinalização quanto ao fato de que a livre descoberta pode ser bem-vinda, mas com mais exercício para estabelecer na linguagem uma análise pela própria linguagem como sugeriu aqui o linguista Hjelmslev.

E assim não é a ciência? A busca do senso crítico por fatos vistos, analisados e classificados? Uma vez que a educação, em sua essência, é uma preparação para a vida, não parece haver preparação senão com base na formação e nela há o entendimento, mais do que a opinião livre.

No aspecto político da educação, considerando as consequências para a condução do docente do ensino, parece haver, assim, o que alguns estudiosos da educação aponta como “educação oculta” com a escola dualista (Que mostra a necessidade de crescer para ser “burguês” em comparação com a situação ruim do proletariado) fica promovendo uma forma de trabalhadores, na qual os estudantes aprenderiam a subordinação como modo de adaptarem à situação social e isso interfere diretamente da perspectiva de um aprendizado com mais sentido ao que se ler. Essa aprendizagem se daria com um currículo oculto, isto é, com atitudes e comportamentos, normas, punições e premiações que "ajustam" os indivíduos (alunos em geral) às estruturas sociais existentes e aos comportamentos desejados. Quais? obediência, conformismo e individualismo. Isso não interferiria na condução ao reforço do “analfabeto funcional” em que pese a imposição do conhecimento mais do que a observação dos conceitos?

 Em resumo, trata-se da escola dualista (a burguesia e o proletariado). O bom trabalhador é dócil, aceita as regras; enquanto a elite tem que ser independente, sem questionamentos. (“É um sistema sem escolhas para a prática pedagógica livre, impede a espontaneidade e a percepção da condição humana. não há escolha, apenas obediência. Não há critério pedagógico, logo não há direcionamento didático que convide os alunos a pensar e não só opinar. O que há é apenas uma adaptação ao procedimento empresarial com uma capa de pedagogia tecnológica.

No aspecto didático-metodológico, desde os preparatórios para a entrada no ensino superior, ao veicularem modelos idealizados no lugar da realidade, os próprios livros didáticos inculcam sutilmente na mente dos alunos a ideia de que eles são excluídos de um modelo social conveniente à sociedade e não os convidam a ter nos conceitos um sentido, mas sim a informação.

 

     3.2.1 O “analfabeto funcional” e a Interpretação de texto

Entende-se com tudo isso que, dentre os dados aqui levantados, há dois tipos de interpretação das coisas a nossa volta: a científica, apoiada na investigação que fazemos para descobrir o FOCO, CONTEXTO em que o foco está ligado e INTENÇÃO que se quis mostrar com a mensagem, seja ela escrita ou mostrada em imagem, música, tom da fala. Nessa interpretação fazemos uma observação pontual do que o autor quis revelar. A outra, é a interpretação livre, apoiada na nossa percepção de mundo, na nossa opinião e no que queremos ver. Um docente deveria, assim, sempre procurar seguir inicialmente a investigação do que o autor quis dizer e expressar para, só depois disso, colocar uma opinião que pode ser crítica quando embasada com mais conceitos observados.

O problema se dá quando há alguns que, infelizmente, faz o oposto: começa com a interpretação pessoal para dizer que é a verdade do que o autor quis dizer. Interpretar é juntar as peças do jogo (contexto) chegando a uma ideia (intenção). Investigação? Provavelmente. Não existe texto, música ou imagem que não produza uma intenção. Ou seja, alguém que fez um texto quis se comunicar e para isso partiu de um foco e ligou-o a um contexto. Cabe a nós a investigação e não a opinião simplesmente. Quem investiga, supera quem opina, pois quem opina se limita ao seu mundo, mas quem investiga abre espaço com autoridade para julgar com uma opinião refinada, criteriosa e isso faz toda a diferença para que troque-se o analfabeto funcional por alguém alfabetizado funcionalmente. No ensino superior, em que pese as circunstâncias políticas, pedagógicas, psíquicas da educação, e dados estatísticos, o que precisamos é de pensadores cientistas e não de pseudointelectuais vítimas do sistema, mas também refém de si próprios. A Busca de significado: uma proposta didático-metodológica para a alfabetização funcional no ensino superior. Paulo Freire mesmo atribuía à educação o papel de denúncia das condições alienantes do povo, passando a fundamentar as críticas dos professores que apontavam os mecanismos de opressão da sociedade de classes.

O professor, independentemente da disciplina e do nível em que lecione, é corresponsável pelo ensino da leitura, cabendo - lhe conscientizar o aluno de que ler é atividade de busca em que se trabalha o texto e se transforma a informação em conhecimento. O papel do professor no diálogo leitor-texto-autor é o de provocador ou incentivador, disponibilizando-lhe estratégias para não só jogar com as possibilidades de previsão e confirmação de hipóteses, como também fazer diferentes tipos de leitura em diferentes tipos de texto partindo da investigação dele.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

ANASTASIOU, Lea das Graças. Metodologia do Ensino Superior: da prática

        docente a uma possível teoria pedagógica. Curitiba: 1998.

FIORIN, J. L. (2008) Em busca do sentido. Estudos discursivos. São Paulo: Contexto. 

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 36.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,  2003.

GIL, Antônio Carlos. Didática do Ensino Superior. São Paulo: Atlas, 2006.

GREIMAS, A. J. et Courtés, J.(2008) Dicionário de semiótica. São Paulo: Contexto. 

HJELMSLEV, L. (1975) Prolegômenos a uma teoria da linguagem. São Paulo: Perspectiva. 

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1994.

MASETTO, Marcos Tarciso. Aulas Vivas. Tese (e Prática) de Livre Docência.

        São Paulo: MG Editores Associados, 1992.

         ________________. Didática – a aula como centro. São Paulo: FTD, 1997.

OLIVEIRA, A. C. & Teixeira, L.(Org.) (2009). Linguagens na comunicação. Desenvolvimentos de semiótica sincrética. São Paulo: Estação das Letras e Cores. 

PIETROFORTE, A.V.S. (2007) Análise do texto visual: a construção da imagem. Contexto, 2007.



[2] http://www.pco.org.br/educacao/50-dos-universitarios-sao-analfabetos-funcionais/aeaj,i.html.

[3] De acordo com o linguista dinamarquês Hjelmslev em sua obra Prolegômenos a uma teoria da Linguagem, em busca de uma teoria da linguagem pela própria linguagem, fugindo de uma análise “transcendental” da linguagem, “(...) a teoria precede inicialmente a uma limitação necessária de seu objeto. (...) Trata-se apenas de dividir os problemas e de a partir do simples para chegar ao complexo. (p.23)