Amor adolescente

Autor: Eduardo Silveira


A chuva se fazia anunciar.
Trovoadas já eram ouvidas ao longe. James Taylor cantava no aparelho de CD do carro de Maurício.
Temos que voltar logo. - Disse ele para sua filha Amanda. - Vem chuva por aí.
É. Mas eu só vou comprar um shampoo e uns esmaltes. Não vou demorar.
Você tem cada uma. Precisava vir a essa hora? Perguntou ele e emendou ? Não podia deixar para amanhã? Seria mais tranquilo.
Ah, pai, para com isso. Parece até um velho falando. Amanhã não ia dar porque vou precisar me arrumar pra festa da Dani, né?- Justificou Amanda rindo e fazendo cócegas na cabeça dele.
Para! Para! - Disse ele ? Tentando fugir dos afagos dela. - Estou dirigindo. Será que não notou?
Ah, tá é? Você dirige tão mal que eu nem percebi. - Respondeu ela dando uma gostosa risada.
Assim eram aqueles dois. Maurício e Amanda se entendiam bem. Se amavam. Amanda morava com a mãe, mas quando o pai ia visitá-la, ela se derretia em amor e carinho por aquele pai. Ele havia se separado da mãe dela quando ela tinha uns nove anos. Mas nunca, entre os dois, ficou nenhuma mágoa., muito pelo contrário, havia uma cumplicidade que, a mãe, ás vezes, ficava enciumada. Nessas ocasiões, Amanda, muito brincalhona, se jogava em cima do pai, só pra mãe se "roer" de ciumes. No final, todos acabavam rindo das palhaçadas dela.
Vou parar aqui. - Disse Maurício, de repente.
O que? - Ah, Pai! Aqui não, tá longe da entrada do shopping. Se a chuva cair, a gente vai se molhar todo até chegar no carro.
Não tô vendo vaga nenhuma . Tá tudo cheio. - ponderou ele.
Ali! - Disse ela, apontando. - Ali... ali.
Aonde? - Perguntou ele, já se irritando.
Pô! Tá cego? Ali do lado do carro branco...ali.
Ah...já vi. - respondeu ele.
Até que enfim! Cruzes! Esse homem tá cego mesmo. - Riu zombeteiramente.

Saltaram e dirigiram-se à entrada do shopping. Maurício estava com uma cara de poucos amigos. O que ele queria mesmo, era ter ficado em casa e ver o jogo do Vasco, que por sinal, iria começar às nove horas. Faltavam quinze minutos para as nove. Ou seja, quando chegassem em casa, o jogo já estaria no segundo tempo. Mas, em contrapartida, ele também não podia deixar a filha ir ao shopping, aquela hora da noite, de ônibus.
Aonde é a loja? - Perguntou ele.
No terceiro piso. - respondeu ela.
Pegaram a escada rolante e subiram.
É ali. - Disse ela.
O que? Ah, essa não. Mas eu não entro aí nem morto.
Que é isso, pai? - Falou ela recriminando-o. E complementou. - Vai entrar sim, que coisa!
Não, não e não. - Decretou ele. - Não vou entrar nessa loja entupida de gente.
Ai, meus sais! - Disse Amanda. - Olha, quer saber? Então fica aqui fora mesmo, tá? Eu não demoro. - Disparou já perdendo a paciência.
Tá bom. Tá bom. Eu fico aqui fora mesmo. Mas vê se não demora, tá? Ainda quero ver o jogo.
Tá bom, seu rabugento! - Deu-lhe um beijo no rosto e foi se rindo loja adentro.
Maurício ficou ali no corredor olhando as vitrines .
Passaram-se dez minutos.
Maurício que andava de um lado para o outro, de vez em quando, parava em frente à loja em que Amanda estava, e ficava olhando através do vidro, pra ver se a via.
Então, enquanto tentava descobrir Amanda., em meio às pessoas na loja, seu coração, de repente. deu um sobressalto. Ajeitou melhor os óculos no rosto, e olhou com mais atenção. Não havia dúvidas, era ela.
Em um segundo, se viu transportado aos seus quinze anos. Recordou o rosto de Marcela. Seu corpo, seu jeito de sorrir, de andar, tudo. E as imagens foram surgindo em sua mente, primeiramente enevoadas, mas depois, foram se tornando cada vez mais nítidas.
Marcela havia sido a paixão da sua vida. A pessoa com a qual ele comparara todas as mulheres da sua vida, e obviamente que todas perdiam naquela comparação, porque, Marcela era o sonho, um sonho de juventude que não se concretizou. As outras, faziam parte da realidade.
E agora, ela estava ali. A poucos passos dele. O que fazer? - Pensou, transpirando por todos os poros.
Encheu-se de coragem e entrou na loja.
Para se certificar, perguntou a uma vendedora: - Você conhece aquela mulher ali?
Conheço sim. - respondeu a vendedora solícita.
Sabe o nome dela? - Perguntou, já adivinhando a resposta.
É Marcela. Ela vende produtos aqui para a loja. - Disse a moça convicta.
Obrigado. - agradeceu ele.
Um milhão de pensamentos atravessaram a sua mente, enquanto caminhava na direção dela.
Pode me vender alguns desses? - Perguntou, apontando para os frascos que Marcela tinha nas mãos.
Maurício! - Surpreendeu-se ela, ao mesmo tempo em que o abraçava fortemente.
O tempo deixou de existir por breves segundos. Depois dos abraços e dos olhos, disfarçadamente, lacrimejantes, ela pediu licença a gerente da loja, se afastaram um pouco e ficaram conversando.
Pouco depois, chegou Amanda.
Feitas as apresentações, conversaram mais um pouco, trocaram telefones e se despediram.

Uma semana depois, os dois, se amavam loucamente num motel.

Maurício, ligou para um amigo da adolescência, com quem ainda mantinha contato e que havia convivido com eles, e dizia o quanto estava apaixonado. Que eles estavam fazendo planos para morarem juntos. Que ele, agora sim, havia encontrado a mulher da sua vida, a verdadeira felicidade. A felicidade que buscara, em todas as mulheres com quem havia se relacionado, mas que nunca conseguira encontrar.
Marcaram um almoço, num restaurante, para que ele, Marcela e o amigo se encontrassem. E foi um encontro maravilhoso, com direito a muitas recordações e sonoras gargalhadas.

Três meses depois.
Alô!
Fala aí, estrupício! Tudo bem? -
Tudo. - respondeu o amigo, reconhecendo a voz de Maurício. - Que me contas de nôvo?
Cara! Nem te conto.
Como assim? O que é que você nem me conta?
A Marcela.
O que é que tem a Marcela? Já brigaram?
Terminei.
O quê? - respondeu o amigo incrédulo.
Como assim, terminou?
Você não vai acreditar, cara.
Pera aí, meu irmão! Me explica isso direito. - pediu o amigo.
É o seguinte, lembra que eu te falei que ela adorava fazer sexo?
Lembro, claro! Mas, segundo você mesmo falou, era isso que você, também, adorava nela, né?
Pois é, cara! Eu gostava.
Pera aí...pera aí, cara! O que você está querendo me dizer com isso? Virou boiola? A essa altura da vida? - Falou o amigo rindo. E completou. - Como assim, gostava?
É o seguinte! - Confidenciou ele. - No começo foi uma maravilha. A gente fez sexo até no elevador do prédio dela. Era uma pegação só.
E daí? Não era bom?
Era, cara! Era.
Era?
É isso aí! Era. Com o tempo, a mulher foi ficando pegajosa, sugadora, vampiresca, sabe como é?
Hummmmm!
É isso aí mesmo, cara! Ela queria fazer sexo à toda hora. Todo dia. De manhã, de tarde, de noite, e até de madrugada.
Eita!
É, meu irmão! - Queixou-se. - Eu já não podia dar nem bom dia, que lá vinha ela, tirando a roupa e se mostrando toda pra mim.
É, assim é meio barra, né não?
Barra? Põe barra nisso, cara! Barra pesadíssima. E quando eu comecei a dar uma desculpa que não estava bem, que tava assim ou assado, ela começava a me chamar de broxa, de viado, e aí começava uma discussão interminável, xingamentos, enfim...um caos.
Mas, e aquele amor todo que você sentia por ela?
Amor? Que amor, que nada. Depois disso é que eu vi que eu fui um verdadeiro babaca. Conheci e convivi com algumas mulheres maravilhosas na minha vida. E por causa de uma ilusão adolescente. Perdi todas.
E olha que você foi avisado por "n" pessoas, foi ou não foi? - lembrou o amigo.
Pois é, irmão! Mas tem coisas na vida que a gente só aprende pelo amor ou pela dor, não é?
Concordo plenamente. Mas tudo isso que passamos na vida tem um nome.
Qual? - perguntou Maurício curioso.
Aprendizado, amigo! Aprendizado.
E ali ficaram conversando a respeito das surpreendentes peças que a vida, às vezes, prega.

Então, repentinamente.
Filho da mãe! - Esbravejou ele.
O que foi, cara? - Assustou-se o amigo.
Porra! O Vasco tomou outro gol.



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