Introdução

 

O poder, filosoficamente falando, se manifesta das mais diversas formas, níveis, potências, seja através dos homens, seja através das instituições, seja de outras formas (o poder da energia elétrica, por exemplo). O juiz detém o poder de julgar e sentenciar, assim como o legislador tem o poder de formular e impor as leis aos cidadãos; do mesmo modo que os chefes do Executivo possuem autoridade para ordenar a todos os seus subordinados (quer de forma justa e legal; ou, às vezes, mesmo de forma injusta e ilegal). Ou o fiscal da fazenda pública tem o poder de cobrar os tributos devidos ao fisco, inclusive por força de lei e decisão judicial.

Príncipes, reis, ministros de Estado, presidentes, magistrados, magnatas, os chamados “ministros” das congregações religiosas, fiscais de tributos, e tantos outros, têm sua parcela de poder neste mundo, nos entes estatais ou fora deles. Conduto, existem aqueles que esquecem que todo poder convencional existente criado pelo ser humano, seja em qual potência for, podem declinar diante da existência de outros poderes ou forças que submetem a todos, sem exceção.

Isto é fato, pois ninguém pode fazer nada quando se depara com grandes tempestades em alto mar que açoitam navios de guerra ou marinha mercantil como se fosse barquinhos de papel. Foi a água em estado sólido quem rasgou, literalmente, o casco espesso e de aço do Titanic.

 

Desenvolvimento

 

Na desconhecida e suprema imensidão do Universo existem poderes das mais diferentes formas, potências, efeitos, letalidade, resistência etc. Eles podem ser desta Terra que caminhamos; das profundezas dos oceanos; do espaço ou sistema solar que nos mantém; dos vendavais que se manifestam nos oceanos ou na própria terra – como tantos que açoitam americanos, japoneses, filipinos... Temos ainda os poderes que são dos domínios dos seres humanos: uns investidos de poder político; outros de poder econômico; outros com poder para controlar, conduzir e manipular seus rebanhos pelas falácias ou estratagemas de suas doutrinas religiosas; e tantos outros com poderes sobre seus subordinados e exércitos e instrumentos belicosos que promovem guerras desastrosas e devastadoras.

 

Em 1966, a situação começou a se modificar, pois as operações de guerra norte-americanas passaram a fazer sentir seus efeitos tanto sobre as áreas dominadas pelos vietcongues no Vietnã do Sul como sobre o Vietnã do Norte. Os vietcongues perderam áreas anteriormente, conquistadas, e o Vietnã do Norte, apesar de resistir bem, foi parcialmente destruído pelos intensos bombardeios sobre seu território, o que abalou sua infra-estrutura[1] econômica.[2]

 

De qualquer forma, seja a Natureza (com suas forças e elementos), seja o Universo (em sua plenitude e potência indizível e imensurável) podem submeter a todas as formas de poder convencional emanadas ou estruturadas das sistemáticas, idealizações, instituições, convenções e projetos humanos. E isto, quiçá, não possa ser refutado pelos seres humanos, pois basta uma chuva torrencial, caindo por dois dias ou mais para arrasar países e “potências” mundiais, em qualquer lugar do mundo, sem exceção. De forma que suas riquezas, seus exércitos, suas tecnologias, seus planejamentos, seus sacerdotes (e seus rituais), tudo se torna impotente e em vão. Cabendo aos seres humanos e tudo que eles criaram apenas aguardar, suplicar e, quem sabe, orar – caso seus pedidos tenham serventia para debelar os poderes da senhora Natureza ou do Universo.

 

Em suas origens, dados os estudos actuais[3], a filosofia grega é, quanto ao passado, a obra colectiva de civilizações riquíssimas, que as investigações feitas em Tróia, Micenas, Chipre, Cícladas e Creta revelaram. Nessas épocas recuadas, a representação do universo estava implicada nas práticas rituais, com a unificação dos grupos sociais aos mistérios da Natureza.[4]

Isto é percebido quando aqui ou alhures algum fenômeno, força ou existência da Natureza se manifesta de forma contundente e devastadora, seja em países ricos, seja em países famélicos, promovendo catástrofes que magnata ou riqueza alguma impediu; sacerdote nenhum evitou, general nenhum combateu, político algum resolveu. Foi o que aconteceu com o advento do micro-organismo chamado cientificamente de coronavírus que está causando estragos, dessabores e desesperos, em diversos sentidos, para incontáveis, do extremo Leste (Japão) ao Oeste (EUA), do Norte ao extremo Sul (Argentina), independentemente de suas potências econômicas, políticas, militares, tecnológicas, diplomáticas, religiosas etc. Ou seja, a um ano antes o mundo que conhecemos estava em pânico em virtude da manifestação e ação de um agente ou forma de vida (“insignificante” em tamanho) da Mãe Natureza, desconhecido até então em sua totalidade e letalidade.

 

De acordo com um levantamento feito pela Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos, mais de 4 milhões de pessoas em todo o mundo morreram de Covid-19. Três países lideram o triste ranking: Estados Unidos, com 606 mil mortes, que corresponde a 15% do total global, BrasilÍndia.

Segundo informações da CNN, o número global de mortes ultrapassou 1 milhão em 18 de setembro de 2020, 191 dias após a Organização Mundial da Saúde declarar o estado de pandemia global. Dentro de 115 dias o número de mortos atingiu 2 milhões, em 88 dias ultrapassou os 3 milhões e em mais 89 dias chegou ao número atual de 4 milhões.[5]

 

Há décadas, um cantor, compositor, filósofo e outras coisas mais (Raul Seixas) cantava uma música cujo título é "O dia em que a Terra parou", que teria sido fruto da inspiração de um sonho seu. Só que nunca existiu alguma força ou poder que tivesse feito a Terra parar no sentido da letra de Raul. Pelo menos até o ano 2019/2020 - quando tudo começou a parar gradualmente (indústria, comércio, escolas, igrejas, instituições públicas, trânsito etc.).

Ninguém jamais imaginou que um micróbio, ou vírus, iria conseguir afetar a todos, de uma forma ou de outra, sem exceção, do Oeste ao Leste, dia e noite sem cessar. Países ricos e miseráveis; desenvolvidos ou em desenvolvimento - subdesenvolvidos também -, do extremo Norte ao Sul, estão aflitos, ou ficaram aflitos, com uma forma de vida tão minúscula e insignificante, pois só pode ser vista com lentes microscópicas possantes ou de grande aumento. O coronavírus (atualmente tão examinado e estudado pela microbiologia - especialistas em virologia, infectologia etc.) a todos causou, ou está causando, insegurança, medos ou desesperos, pois ele é invisível e sobretudo letal.

 

Depois de debelada na China, e de castigar Europa e EUA, covid-19 cresce entre os 4 bilhões sem acesso à riqueza global. América Latina e África estão na trilha [...].[6]

Muito poderoso também, de forma que nenhum poder convencional e atribuído aos homens contra ele nada pode fazer. Reis, príncipes, presidentes, magnatas, ministros, generais (e seus exércitos), sacerdotes - padres, pastores, bispos - embaixadores...ficaram impotentes diante dele, de modo que ninguém quer dizer a Covid-19 (que parou a Terra) a autoridade que possui; o título que tem; as riquezas que desfruta nem a nação que governa.

Todos foram nivelados, príncipes ou plebeus, opulentos ou famulentos, governantes ou governados, na condição de simples mortal que outros poderes ou seres existentes no Universo ou na natureza podem arruiná-los a qualquer momento. Homens e mulheres, orientais e ocidentais, fortes e fracos, civis e militares, crédulos ou incrédulos buscaram evadir-se; ou ocultarem-se, "blindarem-se", enclausurarem-se sem que alguém quisesse declarar o quanto tem ou o quanto pode, já que era tudo em vão. Certamente, os títulos, as autoridades, os ofícios, a investiduras de cada um devem ser valorizados, contudo tudo é relativo e tem limites, pois é dos domínios humanos.

Demócrito de Abdera (460-370), um dos filósofos da Natureza, desenvolveu certas ideias e valores (princípios filosóficos) que serviram de inspiração e objeto de estudos para os seus contemporâneos e sucessores; e um dos seus princípios era:

[...]

k) aceita o universo infinito e a multiplicidade de sistemas cósmicos diferentes, uns em formação, outros em evolução, outros em vias de se formarem e outros prestes a se destruírem. Opinião que se aproxima do conceito actual da cosmologia.[7]

 

Felizmente, e especialmente, existem algumas pessoas que não mandam ou governam esta ou aquela nação, possui esta ou aquela riqueza nem usa deste ou daquele poder, mas é a quem todos vão recorrer: os médicos ou os cientistas (com suas ciências) que estão buscando a solução e a CURA para todos. Pois este micro-organismo patogênico é poderosíssimo e não reconhece nem se submete a ninguém, pelos menos até que outras forças, seres ou poderes existentes na própria Natureza, quiçá, sejam transformados ou manipulados pelos cientistas e a ciência para se debelar ou combater, finalmente, um patógeno chamado coronavírus. Isto porque, é sabido, a Natureza é a senhora de todos os viventes, sem exceção, e nela estão os quatro elementos fundamentais da ciência e os cinco elementos da Vida, conhecidos a milênios por antigas sociedades ou povos. Isto sem mencionar os 103 (cento e três) elementos químicos da tabela periódica.

Sozinho ele alterou a ordem econômica, política e social, sem precedentes, atingindo o funcionamento de tudo que existe, das empresas às igrejas, dos templos aos palácios, da prestação de serviços dos hospitais à produção dos parques industriais, afetando todas as engrenagens do modo de produção, contrariando os programas e lógicas humanos, existentes a tanto tempo.

 

 

Conclusão

Os seres humanos “evoluíram”, organizaram-se e criaram instituições e atribuíram poderes a elas e aos seus membros, com as mais diferentes funções sociais, ou estatais, com o propósito de organizar o corpo social e prestar serviços públicos aos governados, por meio do poder e das atividades de cada servidor. E todas têm sua importância e serventia.

Mas, certamente, o Universo é insondável e imensurável em sua plenitude e totalidade e as formas, forças e seres existentes na Natureza deste mundo ainda não se deram a conhecer completamente – nem nunca se darão, possivelmente. De forma que para além de todas as forças, saberes e poderes dos seres humanos existem, certamente, forças, saberes, formas e poderes que são intangíveis pelas limitações humanas. Afinal de contas é insondável quantas formas de vida possuem as profundezas dos oceanos.

Ninguém jamais imaginou que um dia a realidade do mundo moderno (acelerado, ansioso, ambicioso, competitivo, consumidor – e por isto “hipocondríaco”) fosse ser transformada passando por um processo de paralisação e alteração das suas mais simples realidades (a condição do morador de rua) até as realidades mais complexas e difíceis (como a organização e estruturação da produção industrial), desta forma prejudicando a todos, chegando  ao cidadão mais humilde que tinha dificuldades para adquirir seus bens de consumo.

E tal situação foi antevista ou profetizada por um notável cantor, compositor, místico etc., que na letra sua música já dizia como seria no “dia em que a Terra parou”, fruto de um sonho seu, sonho este que se materializou depois de tantas décadas.

 

Referências bibliográficas

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Temas de Filosofia. 3ª ed., revista. São Paulo: Moderna, 2005.

DOS SANTOS, Mário Ferreira. Convite à Filosofia e à História da Filosofia. 4ª ed. São Paulo: Livraria e Editôra LOGOS, 1966.

OLIC, Nélson Bacic. A guerra do Vietnã. São Paulo: Moderna, 1988. (Coleção Polêmica).

REALE, Giovani. História da filosofia: filosofia pagã antiga. Vol. 1. Tradução: Ivo Storniolo. São Paulo: Paulus, 2003.

 

Publicações eletrônicas

Covid-19 já matou mais de 4 milhões de pessoas em tudo o mundo, diz relatório. Disponível em: https://olhardigital.com.br/2021/07/08/coronavirus/covid-19-ja-matou-mais-de-4-milhoes-de-pessoas-em-todo-o-mundo-diz-relatorio/. Capturado em 23 jul. 2021.

A pandemia assola as periferias do mundo. Disponível em: https://outraspalavras.net/outrasaude/brasil-34mil-mortes/. Capturado em:  27 jul. 2021.

Mortes por Covid-19 no mundo podem ser o dobro do estimado, segundo estudo. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2021/05/08/mortes-por-covid-19-no-mundo-podem-ser-o-dobro-do-estimado-segundo-estudo. Capturado em: 28 jul. 2021.

 

 

[1] A palavra infra-estrutura está grafada aqui com hífen porque a obra usada para leituras  é anterior ao acordo ortográfico.

[2] OLIC, Nélson Bacic. A guerra do Vietnã. São Paulo: Moderna, 1988, p. 27. (Coleção Polêmica).

[3] As palavras actuais e colectiva aqui no texto estão grafadas com o acréscimo de um “c” por se tratar de uma obra de Filosofia do ano de 1966, sendo esta sua grafia do passado.

[4] DOS SANTOS, Mário Ferreira. Convite à Filosofia e à História da Filosofia. 4ª ed. São Paulo: Livraria e Editôra LOGOS, 1966, p. 98.

[5]Covid-19 já matou mais de 4 milhões de pessoas em tudo o mundo, diz relatório. Disponível em: https://olhardigital.com.br/2021/07/08/coronavirus/covid-19-ja-matou-mais-de-4-milhoes-de-pessoas-em-todo-o-mundo-diz-relatorio/. Capturado em 23 jul. 2021.

[6] A pandemia assola as periferias do mundo. Disponível em: https://outraspalavras.net/outrasaude/brasil-34mil-mortes/. Capturado em: 27 jul. 2021.

[7] DOS SANTOS, Mário Ferreira. Convite à Filosofia e à História da Filosofia. 4ª ed. São Paulo: Livraria e Editôra LOGOS, 1966, p. 125.