Em alguns diplomas estatutários constam a figura do “afastamento preventivo” e a “suspensão preventiva” de caráter disciplinar,  ambas importando com a interrupção do exercício das funções, cuja medida extrema se justifica como mecanismo para afastar o servidor público do exercício de suas funções, sem que o Poder Público tenha que  aguardar a instauração ou a conclusão de feito disciplinar. Basicamente, o “afastamento” difere da “suspensão” porque esta exige sempre um procedimento disciplinar instaurado e, ainda, não concluído, cuja iniciativa é sempre da autoridade correcional que esteja à frente do feito apuratório, até a sua decisão final transitada em julgado. Já o “afastamento” poderá ser decretado por autoridade administrativa superior ou por decisão judicial, independentemente de procedimento disciplinar instaurado.  

Nada impede que o “afastamento preventivo”  seja decretado por autoridade correcional, entretanto, assim como na “suspensão preventiva”,  esse ato depende da necessária  fundamentação da autoridade competente para decidir, já como consequência de decisão judicial, os fundamentos encontram-se na própria decisão interlocutória e monocrática.

A suspensão preventiva disciplinar deve sempre ter um procedimento disciplinar instaurado e se constitui uma prerrogativa da autoridade sindicante ou dos membros da comissão disciplinar, entretanto, deverá ser confirmada sempre pela direção do órgão superior após a instauração do incidente. A bem da verdade, dever-se-á assegurar ao servidor prévio conhecimento da decisão que deverá  ser sempre fundamentada. O afastamento preventivo independe também de conhecimento prévio do autor de possíveis ilícitos administrativos ou criminais, cujo ato deverá ser fundamentado e subscrito por dirigente superior do órgão correcional ou, ainda, Secretário de Estado (ou dirigente com mesmo status), Procurador-Geral do Estado  e Governador do Estado. Enquanto durar o afastamento deverá ser assegurado todos os direitos do servidor afastado ou suspenso preventivamente.

O “afastamento” como a “suspensão preventiva” de caráter disciplinar têm como escopo evitar que o servidor venha a influir na apuração das irregularidades. Entretanto, o “afastamento preventivo” poderá se justificar também em razão da próprio segurança do servidor (v.g.: ameaças de linxamento, riscos para seus familiares...), clamor público pela repercussão do fato e resguardar a colheita de provas).

A Lei Federal 8.112/90, estabelece que: "A autoridade instauradora do Processo Disciplinar poderá determinar o seu afastamento do exercício do cargo, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração" (art. 147, RJUSPC/União).

O Regime Jurídico dos Servidores Civis da União (Lei n. 8.112/90),  deixou de contemplar da prisão administrativa, em razão da sua abolição na Carta Fundamental Política de 1988. Registre-se que Estatuto dos Servidores da União anterior (Lei Federal n. 1.711/52) trazia em seu bojo o referido instituto que não foi ratificado pela Lei Federal 8.112/ 90.

Também, a Lei Federal n. 8.429, de 02 de julho de 1992, em seu parágrafo único, do art. 20, dispõe que "a autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual". Vale lembrar que essa legislação federal, com a aplicação no âmbito estadual, diz respeito às sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito, desde que no exercício da função.

No Estado de Santa Catarina o afastamento preventivo encontra-se contemplado especificamente no art. 254 da Lei n. 6.843/86 (Estatuto da Polícia Civil).

“Art. 254.  A suspensão preventiva, de até 30 (trinta) dias, é aplicada a pedido do presidente da comissão do processo disciplinar ou ordenada pelo Delegado-Geral da Polícia Civil desde que o afastamento do policial civil seja imprescindível à livre e cabal apuração da infração.

§1°  Cabe ao Delegado-Geral da Polícia Civil prorrogar, até 120 (cento e vinte) dias, o prazo da suspensão já ordenada, findo a qual cessam os respectivos efeitos, ainda que, o processo não esteja concluído.

§2°  A suspensão preventiva como medida acautelatória, não constitui pena, e por isso o policial tem direito:

I - à contagem do tempo de serviço relativo ao período em que tenha sido suspenso, quando do processo não houver resultado pena disciplinar ou esta se limitar à repreensão; (181)

II - à contagem do período de afastamento que exceder o prazo de suspensão aplicada;

III - à contagem do período de suspensão preventiva e ao pagamento da remuneração e de todas as vantagens, do exercício desde que reconhecida a sua inocência”.

Já o art. 238 dessa mesma Lei estabelece que “O policial civil que estiver respondendo a processo disciplinar não pode, antes de seu término, ser exonerado a pedido, nem se afastar do serviço, a não ser em virtude de licença por doença, suspensão preventiva, (REVOGADO), prisão preventiva ou prisão em flagrante” (a redação original sofreu revogação parcial por meio do art. 5o, inciso LXI, CF). Idêntica redação encontra-se prevista no art. 163, da Lei 6.745/85 (Estatuto Geral dos Servidores Públicos do Estado de Santa Catarina): “O servidor que estiver respondendo a processo disciplinar não poderá, antes de seu término, ser exonerado a pedido, nem se afastar do serviço, a não ser em virtude de licença por doença, suspensão preventiva, prisão administrativa ou em flagrante”.

O art. 224, parágrafos 2°. e 3°., do Estatuto da Polícia Civil do Estado de Santa Catarina não estabelece prazo para que o servidor policial civil permaneça afastado de suas funções, o que  a nosso ver constitui uma irregularidade. Nesse caso a nosso ver há flagrante sujeição ao arbítrio da autoridade superior, eis que o poder discricionário encontra seus limites quando não na lei, deve-se socorrer também na equidade  e no bom senso,  considerando-se que não existe possibilidade de afastamento por tempo indeterminado. Recomenda-se que não se deva confundir o termo suspensão preventiva com suspensão disciplinar. Esta é pena e aquela é decisão interlocutória de caráter cautelar.

Também, sobre “afastamento”, dispõe o mesmo diploma estatutário que rege os policiais civis catarinenses que:

“Art. 29.  O policial civil é afastado do exercício de suas funções até decisão transitada em julgado, quando:  

I - preso preventivamente ou em flagrante delito;  

II - denunciado por crime:  

a) contra a administração pública;  

b) inafiançável;  

c) de natureza hedionda a provocar clamor pública.  

Parágrafo único. No caso de condenação e não sendo esta de natureza a determinar a demissão do policial, continuará o mesmo suspenso até o cumprimento total da pena, (vetado)”.

 A Lei Orgânica do Ministério Público/SC (LC 197/2000), estabelece que:  “Ressalvada a hipótese do parágrafo único do art. 227 desta Lei Complementar, durante a sindicância ou o processo administrativo, o Procurador-Geral de Justiça, por solicitação do Corregedor-Geral do Ministério Público e ouvido o Conselho Superior do Ministério Público, poderá afastar o sindicado ou o indiciado do exercício do cargo, sem prejuízo de seus vencimentos ou subsídios e vantagens. Parágrafo único. O afastamento dar-se-á por decisão fundamentada na conveniência do serviço, para apuração dos fatos, para assegurar a normalidade dos serviços ou a tranquilidade pública, e não excederá  a sessenta dias, podendo, excepcionalmente, ser prorrogado por igual período”.

Algumas legislações estatutárias que regem servidores públicos confundem esses dois institutos, tratando afastamento como suspensão disciplinar, sem dar o devido tratamento e sobre o momento de suas respectivas aplicações, mercê também da falta de conhecimento sobre a matéria.

Jurisprudência:

AFASTAMENTO PREVENTIVO DO CARGO

"STJ, terceira seção, MS n. 8.998, DF, dec. 12.11.03: “(...) III – A sanção administrativa é aplicada para salvaguardar os interesses exclusivamente funcionais da administração pública, enquanto a sanção criminal destina-se à proteção da coletividade. Consoante entendimento desta Corte, a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, consagrada na doutrina e na jurisprudência, permite à administração impor punição disciplinar ao servidor faltoso à revelia de anterior julgamento no âmbito criminal, ou em sede de ação civil, mesmo que a conduta imputada configure crime em tese. Nos termos do art. 147 da Lei n. 8.112/90, como medida cautelar e a fim de que o servidor não venha a influir na apuração da irregularidade, a autoridade instauradora do processo disciplinar poderá determinar o seu afastamento do exercício do cargo, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração. Na hipótese dos autos, a portaria que determinou o afastamento do servidor está suficientemente motivada, tendo em vista que houve a expressa remissão ao artigo em comento e ao processo administrativo disciplinar (...)”.

"STJ, HC n. 7.309, AC, data: 19.10.98: “Ato do Corregedor-Geral de Justiça. Sindicância administrativa. Fatos relevantes. Não constitui hipótese de constrangimento ilegal a proibição de que funcionários envolvidos em sindicância acerca de desaparecimento de processos, e suspensos de suas atividades, continuem a circular no local aonde teriam ocorrido os eventuais ilícitos. Writ desprovido”

“(...) Administrativo. Processo administrativo disciplinar. Ultrapassagem do prazo fixado para o término do processo. Nulidade. Não-ocorrência. Precedentes. Recurso improvido. 1. A ultrapassagem do prazo fixado para o encerramento do processo administrativo disciplinar não conduz à nulidade, mas tão-somente à cessação da medida cautelar do afastamento preventivo do cargo do servidor público acusado” (STJ, Segunda Turma, Rel. Min. Adhemar Maciel, recurso em MS n. 455, BA, data da dec.: 15.05.97).

Jurisprudência Catarinense:

Afastamento preventivo disciplinar:

“(...) O afastamento temporário do servidor público envolvido em fatos que deram margem à instauração do processo administrativo disciplinar, ainda que indevidamente  rotulada de suspensão, não se confunde  com a pena disciplinar de suspensão. É ela providência de precaução, com a natureza de medida cautelar processual, cuja decretação não está relacionada com a gravidade dos fatos  investigados, eis que visa, precipuamente, o sucesso dos trabalhos apuratórios. Prevista expressamente  no Estatuto dos Servidores Públicos Municipais incidente, constitui-se  ela em medida perfeitamente legal” (Apel. Civil em MS n. 98.001647-9, Gaspar, Rel. Des. Trindade dos Santos, DJ 10.045, de 01.09.98, p. 18).

Afastamento das funções- Necessidade à instrução processual:

" (...) Caso o agente público se utilize do seu cargo, mandato, emprego ou função para pressionar a comissão processante, ou de alguma forma tente encobrir ou fazer desaparecer as provas, poderá a autoridade judicial ou administrativa competente determinar o seu imediato afastamento, sem prejuízo da remuneração, até o final dos trabalhos da referida comissão. Entendemos que a autoridade judicial ou administrativa deverá ter muito cuidado no exame do afastamento do agente público. A cautela deverá ser a tônica, e as autoridades referidas somente deverão tomar tal atitude se plenamente convencidos de que a presença do agente poderá, de alguma forma, prejudicar as investigações acerca das irregularidades por ele praticadas" ( Paulo Mascarenhas, in  Improbidade Administrativa e Crime de Responsabilidade de Prefeito) No mesmo norte, decidiu o Superior Tribunal de Justiça: 'Conquanto mereça respeito a fundamentação vertida no v. acórdão do agravo de instrumento, forçoso é reconhecer que a ilegalidade tida por praticada pelos co-réus da ação civil pública não se encontra devidamente comprovada de plano, a ponto de escorar a drástica medida de afastamento de cargo eletivo. É certo que o respectivo parágrafo único permite o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, quando a medida se fizer necessária à instrução processual. No entanto, para que se pudesse cogitar da aplicação dessa exceção, fazia-se mister demonstração da necessidade de aplicação da medida exrema, o que, em nenhum momento emergiu dos autos" ( MC 2299/SP, rel. Min. Franciulli Netto, 2ª T. DJ de 08.05.2000)" ( AI 00.014066-0 de Mafra, rel. Des. Torres Marques, DJ nº 10.513, de 03.08.2000).

Na verdade esse afastamento não deve ser caracterizado como de suspensão do efetivo exercício e sim de interrupção, não podendo o servidor policial sofrer prejuízos em sua vida funcional. Entendo não aplicar-se – ‘in casu’ -, o princípio da detração penal (art. 239, EPC/SC),  podendo compensar-se as medidas disciplinares justamente porque esse afastamento constitui-se uma interrupção do exercício.

Suspensão Preventiva – Processo Administrativo:

“(...) A aplicação do decreto preventivo de suspensão da atividade laboral, por conta da instauração de processo disciplinar, é medida amparada no Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado de Santa Catarina. A suspensão preventiva de servidor, dês que precedida da instauração do respectivo processo disciplinar administrativo, é rotina inelutavelmente normal, nada tendo de ilegal;  eis que prevista na Lei 6.745/85, em seu art. 153. Não há falar em ilegalidade, ou violação a direito líquido e certo, se o processo administrativo, regularmente instaurado, observou o princípio do devido processo legal, assegurando à parte ampla defesa” (MS 96.004169-9, Capital, Rel. Des. Pedro Manoel Abreu, DJ 9.822, de 01.10.97, p. 7).

Processo Administrativo -  Suspensão preventiva - possibilidade de interferência na apuração dos fatos:

"(...) O fato detonador da possível suspensão é a interferência do titular na colheita das provas, o que deve ser evitado" ( Walter Cenevita in " Lei dos Notários e Registradores Comentada", Saraiva, 2ª ed., 1999, pág. 216)            (Processo Administrativo nº 687/00, da comarca de Piçarras. Conselho da Magistratura, Edital nº 03/2000-CM, DJ nº 10.460, de 19.05.2000, p. 1).