AÇÃO RESCISÓRIA E AÇÃO ANULATÓRIA: APLICABILIDADE PRÁTICA

Autor: Adison Aiff dos Santos Silva

 

RESUMO – Este artigo busca apresentar as principais características da Ação Rescisória e da Ação Anulatória, apresentando-as como instrumentos do Direito Processual Civil para sanar eventuais erros de ordem material, formal e processual, que possam surgir no processo de conhecimento ou execução e não venham a ser sanados durante o seu desenvolvimento regular. O artigo também busca demonstrar a aplicabilidade prática destas modalidades de ação no âmbito do processo civil brasileiro, principalmente em virtude da vigência do novo código de processo civil de 2015, bem como o respeito a coisa julgada e ao princípio da segurança jurídica constitucionalmente instituído. 1 Introdução, 2 Ação Rescisória e Ação Anulatória: Aplicabilidade Prática, 3 Conclusão, 4 Referências.

PALAVRAS-CHAVE: Ação Rescisória. Ação Anulatória. Direito Processual Civil. Aplicabilidade. Prática.

 

ABSTRACT – This article seeks to present the main characteristics of the Termination Action and the Annulment Action, presenting them as instruments of Civil Procedural Law to remedy any material, formal and procedural errors that may arise in the process of knowledge or execution and do not come to be healed during their regular development. The article also seeks to demonstrate the practical applicability of these modalities of action in the Brazilian Civil Procedure, mainly due to the validity of the new Civil Procedure Code of 2015, as well as respect for res judicata and the principle of constitutionally established legal certainty. 1 Introduction, 2 Action Rescessory And Action Anulatory: Practical Applicability, 3 Conclusion, 4 References.

KEY WORDS: Termination. Related searches. civil procedural law. Applicability. Practice.

 

1. INTRODUÇÃO

O direito processual civil é um ramo do direito público que visa conduzir os processos civis a sua devida solução por intermédio do uso da jurisdição que é imanente a natureza soberana do Estado. Desta forma, o Direito Processual Civil Brasileiro é dotado de um conjunto de princípios e normas que objetivam a efetividade das leis materiais, tendo o objetivo de instrumentalizar o Direito Civil e os demais ramos do direito civilista e subsidiariamente a outros segmentos processuais, para a sua devida aplicação prática, mas com o advento do Novo Código de Processo Civil de 2015, inúmeras duvidas surgiram em face do novo diploma legal e a sua efetivação, dada a vivacidade do direito e suas ciências que crescem e se desenvolvem juntamente com a sociedade, variadas construções jurídicas vieram se formalizando diante dos casos concretos que iam se apresentando aos julgadores, suscitando novas duvidas e questionamentos entre os operadores do direito, bem como entre os teóricos processualistas do direito civil.

A coisa julgada é um dos elementos mais importantes do direito, pois é parte integrante do princípio da segurança jurídica, que é indispensável para a manutenção de qualquer sistema jurídico, onde a imutabilidade das decisões judiciais garantem a estabilidade do sistema e a pacificação social garantindo o direito como meio de satisfação racional, civilizada e democrática dos interesses tanto particulares quanto públicos dos indivíduos integrantes da nação.

Todavia, em nosso ordenamento jurídico inexiste a figura de um direito ou principio absoluto, eles apenas se autobalanceiam propiciando o equilíbrio do jurídico do sistema, conforme pontuou Robert Alexy em sua Teoria dos Direitos Fundamentais, havendo a colisão entre eles tendo o mesmo valor jurídico compete ao julgador fazer a relativização e ao sopesar a situação no caso concreto decidir qual deve ser aplicado no dado momento em análise.

Todavia, quando ocorrem erros nas decisões, e tais equívocos apenas são descobertos após o transito em julgado ou quando determinado ato processual é concluído, como solucionar tal problema, haja vista que o transito em julgado confere a característica de imutabilidade e indiscutibilidade da causa conferida pelo principio da segurança jurídica, neste sentido surgem as Ações Rescisórias e Anulatórias como mecanismos processuais para sanar tais problemáticas. Agora passa-se a tratar de forma mais minuciosa a discorrer sobre o tema.

2. AÇÃO RESCISÓRIA E AÇÃO ANULATÓRIA: APLICABILIDADE PRÁTICA

A estrutura orgânica do direito brasileiro prima pela manutenção da justiça e todos os efeitos decorrentes de sua aplicação no mundo dos fatos, este pensamento decorre do principio constitucional da segurança jurídica, que se desenha no art. 5º, inciso “XXXVI” da nossa Carta Magna, in verbis:

TÍTULO II

DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS

CAPÍTULO I

DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988).

Todavia, mesmo com toda a estrutura disponível nem sempre a justiça é feita de forma “correta”, como o sistema judiciário é operado por seres humanos que são falhos por natureza há de se imaginar que ocorram equívocos durante o processo de construção ou obtenção da justiça, em “Justiça: O que é fazer a coisa certa”, Michael J. Sandel, nos leva a refletir acerca da ótica Aristóteles, Kant, Jeremy Bentham, John Rawls, como deve-se proceder para se chegar a justiça tomando como base o pensamento filosófico.

Ao partir do pressuposto que os operadores do sistema são falhos chega-se a hipótese de que podem ocorrer erros na execução dos atos inerentes ao processo, ou seja, a justiça pode falhar e gerar um erro que eventualmente pode impactar na vida dos jurisdicionados que buscam seus átrios em busca de amparo legal para solucionar uma problemática juridicamente possível, mas quando o erro surge após os prazos regulares para recursos precluírem? Nesta hipótese o Novo Código de Processo Civil de 2015 possibilitou o uso de duas ações que tem de certa forma corrigir um suposto erro na aplicação da justiça no desenvolvimento do processo e são a ação rescisória e a ação anulatória que veremos mais adiante.

2.1. AÇÃO RESCISÓRIA

A ação rescisória tem sua previsão legal no artigo 966 do Código de Processo Civil de 2015, esta ação tem por objetivo a desconstituição de uma sentença meritória que tenha transitado em julgado, que em virtude de algum dos vícios elencados no rol taxativo do referido artigo não tenham sido percebidos e/ou sanados no desenvolvimento do processo, veja-se:

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;

III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte

vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;

IV - ofender a coisa julgada;

V - violar manifestamente norma jurídica;

VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória;

VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;

VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.

§ 1º Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado.

§ 2º Nas hipóteses previstas nos incisos do caput, será rescindível a decisão transitada em julgado que, embora não seja de mérito, impeça:

I - nova propositura da demanda; ou

II - admissibilidade do recurso correspondente.

§ 3º A ação rescisória pode ter por objeto apenas 1 (um) capítulo da decisão.

§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei.

§ 5º Cabe ação rescisória, com fundamento no inciso V do caput deste artigo, contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão decisório que lhe deu fundamento.

§ 6º Quando a ação rescisória fundar-se na hipótese do § 5º deste artigo, caberá ao autor, sob pena de inépcia, demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta ou de questão jurídica não examinada, a impor outra solução jurídica. (BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015).

No caput do artigo 966, a lei diz claramente “A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida...” em outras palavras a lei está dizendo que a “decisão transitada em julgado” pode ser desfeita, anulada ou cancelada, mas de certa forma não se estaria atacando a segurança jurídica do sistema normativo, eis a questão? Nas palavras de João Aguirre e Renato Montans de Sá a “[...] ação rescisória, que constitui uma ação autônoma de impugnação, de cunho cognitivo e natureza desconstitutiva, que procura desfazer o julgado, quer por motivos de invalidade, quer por motivos de injustiça” (AGUIRRE, João Ricardo Brandão, 2017, p.118).

Segundo o jurista e professor Fredie Didier Jr., a ação rescisória é dotada de autonomia própria não se tratando de recurso em hipótese alguma:

“A ação rescisória é a ação autônoma de impugnação, que tem por objetivos a desconstituição de decisão judicial transitada em julgado e, eventualmente, o rejulgamento da causa. Ela não é recurso, exatamente porque dá origem a um novo processo para impugnar a decisão judicial. A ação rescisória pressupõe a coisa julgada, contrariamente ao recurso, que impede o trânsito em julgado e mantém o estado de litispendência ou de pendência do processo”. (DIDIER JR., Fredie, 2016, p.421).

Neste sentido depreende-se que a ação rescisória constitui uma ação autônoma, não se tratando de recurso, contando com prazo próprio para o devido protocolo que conforme o artigo 975 do Código de Processo Civil, veja-se:

Art. 975. O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

§ 1º Prorroga-se até o primeiro dia útil imediatamente subsequente o prazo a que se refere o caput, quando expirar durante férias forenses, recesso, feriados ou em dia em que não houver expediente forense.

§ 2º Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

§ 3º Nas hipóteses de simulação ou de colusão das partes, o prazo começa a contar, para o terceiro prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou da colusão. (BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015).

Sendo assim, o prazo para a propositura de ação rescisória começa a fluir após o trânsito em julgado e extingue-se após dois anos do mesmo, ressalvadas as hipóteses previstas nos parágrafos 1º, 2º e 3º, que aventam situações em que este prazo possa vir a ser estendido.

Desta forma o pedido presente na ação rescisória será sempre “desconstitutivo”, em sendo acolhida a ação rescisória ocorrerá o desfazimento da coisa julgada. Sendo assim, a ação rescisória se presta como instrumento juridicamente constituído para o desfazimento da sentença transitada em julgado por dois motivos invalidade processual e injustiça conforme interpretação extraída do artigo 966 do Código de Processo Civil.

Todavia quando a sentença ainda não transitou em julgado a propositura da Ação Rescisória finda impedida de ser devidamente proposta em face de seu objeto de ataque ainda não ter sido constituído, ou seja, a coisa julgada, desta maneira quando se objetiva desconstituir uma decisão que ainda não transitou em julgado deve se optar por outro tipo de ação que vise reparar os possíveis efeitos que venham a surgir a partir de sua materialização fática e está é a ação anulatória.

2.2. AÇÃO ANULATÓRIA

Quando atos decisórios que transitam em julgado no processo venham a prejudicar determinada parte, esta pode socorrer-se com base na ação rescisória, prevista no art. 966, mas quando tais atos decisórios que não versam sobre o mérito, as chamadas decisões interlocutórias geram direitos e deveres em relação as partes e até perante terceiros, nestes casos o lei exige uma ação própria a ação anulatória, anteriormente a ação anulatória estava prevista no art. 486 do CPC/1973, diferente da ação rescisória que visa desconstituir a coisa julgada, a ação anulatória visa invalidar ato judicial que venha criar indevidamente obrigações a parte que a propõe, pois entende-se que o referido ato judicial deva ser invalidado evitando a sua produção de efeitos, a ação anulatória permanece interligada à ação rescisória, mas agora se apresenta com nova redação e inserida no parágrafo 4º do artigo 966 do Código de Processo civil, o qual transcreve-se in verbis:

CAPÍTULO VII

DA AÇÃO RESCISÓRIA

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

[...]

§ 4º Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação, nos termos da lei. (BRASIL, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015).

O legislador optou por manter a ação anulatória junto a ação rescisória devido a compatibilidade temática, mas não implica dizer que se trata do mesmo instrumento processual, sendo que ambas têm momentos e objeto distintos, além disso a nova redação ao afirmar “Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo”, nos diz que a ação anulatória não versará sobre a decisão meritória, apenas sobre os atos praticados pelas partes ou terceiros que venham a ser integrados ou homologados pelo juízo, sendo assim em se tratando de mérito cabe apenas ação rescisória e nas questões que não versão sobre o mérito é cabível a ação anulatória.

Quando ocorre a arrematação e a adjudicação no desenvolvimentos do processo e o juízo as homologa a parte que se sentir prejudicada poderá propor a ação anulatória, pois tais atos não são decisões meritórias, sendo basicamente de cunho administrativo, além do mais, as decisões meramente homologatórias estão sujeitas a ação anulatória e não a ação rescisória haja vista que não possuem caráter meritório, segundo Seabra Fagundes “para a anulação das sentenças de caráter meramente homologatório é incabível a ação rescisória”, neste mesmo sentido decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, in verbis:

em se tratando de decisão homologatória de divisão, se revela incabível a ação rescisória intentada contra a mesma cuja jurisdição é de natureza meramente graciosa e, pois, sujeita simplesmente à anulação do respectivo ato judicial” (AR 403, Rel. Des. Edésio Fernandes, DJMG 27.09.1975). (Nesse sentido: STJ, REsp 13.012-0/SP, Rel. Min. Athos Carneiro, ac. 02.02.1993, LEX-JSTJ 47/139- 140; STJ, 1ª T., REsp 450.431/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 18.09.2003, DJU 20.10.2003). (grifo nosso).

Desta forma, os defeitos processuais que ocorrem em processos não litigiosos são sanados por intermédio da ação anulatória, e os atos judiciais que não dependem de sentença também são reparados por meio da ação anulatória.

Logo todos os atos decisórios de mérito propriamente dito só podem ser objeto de ação rescisória, todos os atos judiciais contenciosos em que incorra a decisão judicial de mérito, ou seja, todos os atos em que a efetiva manifestação do juízo decisório sobre o mérito.

Tal qual a ação rescisória a ação anulatória tem natureza negativa ou desconstitutiva, pois visa desconstituir uma decisão que não versa sobre o mérito, mas que eventualmente causa prejuízo à parte. A ação anulatória tem efeito “ex tunc”, haja vista que sendo procedente os atos atacados na ação terão seus efeitos apagados.

Mesmo a ação anulatória não atacando a coisa julga diretamente ela poderá ser utilizada para indiretamente a desconstitui-la, pois ao ser procedente a ação anulatória dotada de efeito “ex tunc” retroage ao início. Por exemplo, um acordo entre as partes homologado pelo juízo e transitado em julgado, poderá ser alvo de ação anulatória quando eivado de vícios, observe que o alvo da ação não é o mérito em si, mas a transação jurídica entre as partes em conformidade com o disposto no art. 966, §4º do Código de Processo Civil.

2.3. APLICABILIDADE PRÁTICA

O cerne de saber as distinções entre a ação rescisória e a ação anulatória é a forma correta de utilizar cada modalidade de ação em conformidade com a situação jurídica apresentada, neste momento a figura de um profissional devidamente habilitado e qualificado será determinante no provável sucesso ou infortúnio da empreitada jurídica da parte que visa ter seus direito tutelados pela propositura de algumas das ações em destaque.

Ao analisar o caso concreto o profissional deverá atentar-se aos requisitos de cada ação para propor a ação correta para cada realidade fática, sendo assim, quando a decisão transitada em julgado for de mérito deverá propor-se a ação rescisória em face da mesma, todavia, quando a decisão transitada em julgado não for meritória deverá ser utilizada a ação anulatória como mecanismo processual adequado.

Segundo o professor Marcus Vinicius Rios Gonçalves, a ação anulatória cabe contra atos de disposição de direitos em que as partes praticam no processo por vontade própria, veja-se:

“Um deles é a ação anulatória ou declaratória de nulidade, prevista no art. 966, § 4º, do CPC que cabe contra os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução. Sempre que a sentença for apenas de homologação, como ocorre quando há acordo entre os litigantes, a ação rescisória não será o mecanismo adequado para impugnação, mas as ações anulatórias ou declaratórias de nulidade, previstas para os atos jurídicos em geral”. (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios, 2018, p.504).

O mesmo não se pode dizer a respeito da ação rescisória que tem como objetivo a desconstituição de decisão meritória transitada em julgado, conforme leciona Gonçalves, o trânsito em julgado é indispensável a ação rescisória:

“O trânsito em julgado como condição indispensável para o ajuizamento da ação rescisória. Enquanto não há trânsito em julgado, a decisão deverá ser impugnada por meio do recurso adequado. Só quando não for mais possível a interposição do recurso, após o trânsito, surgirá o interesse de agir para a ação rescisória” (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios, 2018, p.508).

Sendo assim, ao passo que a ação anulatória se demonstra instrumento hábil para desconstituir a decisão transitada em julgado que não versar sobre o mérito ou quando se trata de homologação de transações entre as partes, a ação rescisória fundamenta-se na desconstituição de decisão transitada em julgado que tenha sido proferida sobre o mérito processual, competindo ao profissional do direito a devida identificação dos elementos inerentes ao ato processual para a sua devida qualificação frente a realidade fática apresentada de modo a propor a ação mais adequada a situação.

É fundamental salientar que a legislação não prevê que tenham sido esgotados todos os recursos possíveis para a propositura das ações em comento, mas que tenham se exaurido os prazos, por preclusão, pondo fim as possibilidades de recursos, em outras palavras não é requisito a apresentação de todos os recursos previstos na legislação para que seja viável a propositura da Ação Rescisória ou da Ação Anulatória, basta apenas que tenha havido o trânsito em julgado da decisão a ser atacada, haja vista que sem o transito em julgado falta interesse de agir, porque por meio dos recursos ainda é possível obter a cassação da decisão.

Cabe salientar que em virtude da possibilidade de o juiz fragmentar a decisão meritória como nos casos do julgamento antecipado parcial se torna possível a proposição de ação rescisória contra a decisão interlocutória de mérito, com bem especifica Gonçalves:

“Como o julgamento de mérito pode ser cindido, já que o juiz pode, em julgamento antecipado parcial, apreciar um dos pedidos e deixar para apreciar os demais na sentença, a parte poderá ajuizar ação rescisória apenas contra a decisão interlocutória de mérito já transitada em julgado, ainda que o processo prossiga para o exame dos demais pedidos. Mas, se quiser, poderá aguardar a sentença e o exame das pretensões restantes, porque o direito à rescisória só se extingue depois de dois anos a contar do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo (art. 975)”. (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios, 2018, p.508).

Posto isto, compete salientar que a aplicação prática da ação adequada irá depender da capacidade de identificação e percepção do profissional do direito, no momento da avaliação do caso concreto, onde irá definir qual instrumento será o mais adequado para a propositura da ação com base em uma análise técnica e jurídica que deve ser precisa e coerente, desta forma selecionar entre a Ação Rescisória e a Ação Anulatória qual será a mais pertinente ao momento.

3. CONCLUSÃO

Com base em todo o exposto, conclui-se que a Ação Rescisória e a Ação Anulatória em nada ofendem o princípio da segurança jurídica, pois elas visam única e exclusivamente a justiça, servindo como mecanismo que auxilia no controle da qualidade jurisdicional ofertada aos cidadãos.

Compete reforçar que tanto a Ação Rescisória quanto a Ação Anulatória são ações autônomas e independentes, que visam desconstituir decisões transitadas em julgado, não se tratando em hipótese alguma de recursos processuais. Além disso, a Ação Rescisória busca desconstituir decisão transitada em julgado que verse sobre questão de mérito, ao passo que a Ação Anulatória trata de desconstituir as decisões transitadas em julgado que não incidem no mérito do processo.

Em suma Ação Rescisória tem relação direita com o mérito, já a Ação Anulatória não tem relação direta com o mérito processual, cabendo ao profissional do direito identificar qual instrumento jurídico processual se adequa a situação fática que lhe é apresentada objetivando a melhor prestação de serviços possível.

REFERÊNCIAS

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