A visita conjugal no sistema penitenciário angolano

Resumo

O presente artigo aborda o instituto da visita conjugal no âmbito do ordenamento jurídico angolano. A visita conjugal é uma das modalidades de visita ao recluso, constituindo uma das formas de relacionamento do mesmo com pessoas estranhas ao estabelecimento prisional. No sistema penitenciário angolano, prevalece o entendimento de que esta modalidade de visita deve ser encarada como um verdadeiro estímulo para adopção de comportamentos que se conformam a boa execução da medida privativa de liberdade imposta pela autoridade competente.

Palavras-chave: Visita, recluso, prisional.

Caracterizada por proporcionar ao recluso o contacto íntimo com o cônjuge ou companheira(o) de união de facto no interior do estabelecimento penitenciário, o tipo de visita em análise pode assumir a natureza de um verdadeiro estímulo, dado que durante a execução da medida privativa de liberdade, o detido ou condenado que não beneficia do gozo das licenças de saída prolongada normal ou especial, não tem outra oportunidade de ter o envolvimento privado com a parceira, em conformidade com o número 1 do artigo 40.º da Lei n.º 8/08 (2008).

Além da vantagem do contacto íntimo referido acima, de acordo com a Direcção Geral dos Serviços Prisionais de Portugal(1), a visita contribui para a estabilidade do vínculo conjugal e das relações familiares.

Por outro, na esteira de Cue(2) as relações sexuais contribuem significativamente para a estabilidade psico-emocional e física de qualquer pessoa.

Nos termos do artigo 40.º da Lei n.º 8/08 (2008), mediante requerimento formulado pelo recluso e correspondente autorização do director do estabelecimento penitenciário, pode a visita ser realizada uma vez por mês em local que reúna as condições elementares para o efeito, comummente denominado por quarto conjugal, observando a duração compreendida entre uma a três horas.

Porém, conforme a alínea c) do artigo 288.º do Decreto Executivo n.º 272/16 (2016), a Comissão de Análise e Classificação pode conceder a visita como estímulo ao bom comportamento do recluso, observado durante a execução da medida privativa de liberdade, independentemente da periodicidade acima descrita.

Entretanto, a formulação legal constante no número 4 do artigo 40.º da Lei n.º 8/08 (2008) tem suscitado debates nas lides penitenciárias, na medida em que de acordo com a interpretação do referido preceito é permissível o contacto homossexual no âmbito da visita conjugal(3).

Em boa verdade, o preceito em análise não tem qualquer aplicabilidade no ordenamento angolano, na medida em que o mesmo viola o preceito constitucional que estabelece a protecção que o Estado deve dar as famílias angolanas fundadas em casamento e união de facto apenas entre homem e mulher, conforme o disposto no número 1 do artigo 35.º da Constituição da República de Angola.

Importa também clarificar que a noção legal de casamento e de união de facto não compreende a união entre pessoas do mesmo sexo, em conformidade com os artigos 20.º e 112.º do Código de Família angolano; assim, atendendo que a concessão da visita conjugal se circunscreve ao cônjuge ou companheiro de união de facto do recluso, conforme o disposto no número 1 do artigo 40.º da Lei n.º 8/08 (2008), o visitante ou a visitante deve ser do sexo oposto em relação ao beneficiário.

Por outro, no âmbito da disposição em análise, é permissível a visita de apenas um parceiro ou parceira, situação que desencadeia outra dicotomia, resultante da poligamia ou poliandria do recluso ou reclusa beneficiária.

Nestas circunstâncias, caso exista uma parceira ou parceiro cuja relação esteja fundada em casamento ou união de facto reconhecida, obviamente que a visita deve ter lugar entre esta e o beneficiário, nos termos do número 1 do artigo 40.º da Lei n.º 8/08 (2008).

Porém, nas situações em que no seio das várias parceiras ou parceiros não exista alguém casado ou cuja união de facto seja reconhecida pelo Estado, afigura-se recomendável que o recluso, no seu requerimento, indique o parceiro ou parceira com a qual pretenda envolver-se, competindo ao director averiguar o laço familiar existente entre ambos e evitar a troca regular de parceiro ou parceira, com o intuito de impedir a promoção da promiscuidade no estabelecimento penitenciário.

 

(1) Portugal, Direcção Geral dos Serviços, Visitas Íntimas, Regras e Impedimentos, Prisões em Revista (1998), p. 23. O artigo espelha: “Partindo da premissa de que uma vida familiar estável é contributo sério para a reinserção do indivíduo, o que se exige é que esta estabilidade, encarada a todos os níveis, possa ser reforçada com mais este sinal de abertura do sistema prisional português”.

(2) Cue, F.(2011), Os Segredos da Boa Prática do Sexo, p. 17. O autor afirma que “além do prazer da relação sexual(…) essa prática liberta as anfetaminas naturais do corpo, ajuda a limpar o sistema linfático e produz o mesmo efeito, que quando se pratica desporto”.

(3) Lei n.º 8/08, de 29 de Agosto (2008). Aprova a Lei Penitenciária, p. 2333. De acordo com o preceito,   “ em cada visita conjugal só é admitida uma pessoa, independentemente da identidade de sexo entre recluso e visitante”, pelo facto da visita permitir o contacto homossexual.

 

Referências bibliográficas

Portugal, Direcção Geral dos Serviços (1998, Dezembro) Visitas Íntimas, Regras e Impedimentos, Prisões em Revista, 9, p. 23.

Cue, F. F. F(2011),Os Segredos da Boa Prática do Sexo, 1.ª Edição, Mayamba Editora, Luanda;

Lei n.º 8/08 (2008) Aprova a Lei Penitenciária. Diário da República I Série, n.º 163 (08/07/29), 2325-2344.