A Vingança, na Literatura e no Cinema

Por Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho | 04/08/2025 | História

O senso comum, muitas vezes, nos dá a impressão de uma falsa sapiência. E isso ocorre, também, em relação a citações falsamente atribuídas a alguns autores. Uma delas é o fato de que a frase “vingança é um prato que se come frio” teria sido escrita ou dita por Maquiavel. Não é verdade.

De acordo com sérios historiadores, o mais provável é que seu autor tenha sido o escritor francês Eugène Sue. Filho de um nobre cirurgião, sua madrinha foi a Impetrariz Josephine, esposa de Napoleão Bonaparte. Uma das curiosidades a respeito de Sue é a de que ele nunca se destacou nos estudos formais. Ao contrário: depois de determinada idade, percebendo o quão medíocre, consequente vítima de perseguição e infeliz o filho havia se tornado por seu baixo rendimento, o pai o permitiu que se jubilasse e com ele fosse aprender cirurgia.

Quando do falecimento do pai, este deixou a Sue considerável fortuna. Diga-se que o herdeiro era um homem que, apenas, atraía mulheres por sua posição social e fortuna, que ele conseguiu esgotar em, apenas, sete anos. Então, se viu forçado a escrever para viver, revelando ao mundo, assim, o seu verdadeiro talento, e desde então escreveu várias obras. Numa delas, e creio que antes mesmo da pessoal crise financeira (se não for, me corrijam), estaria expressa a frase (neste momento não recordo qual, mas lembro que a personagem principal seria “Matilda”).

Refletindo sobre a citação em si, mostra que a vingança, para ser, eventualmente, plena, deve ser meticulosamente calculada, em seus pretensos atos e possíveis consequências, exarando um tom verdadeiramente maquiavélico (daí a falsa atribuição de autoria). Mas, quando a confrontamos com a própria arte, percebemos que, por mais que nos dê satisfação ao ser levada a cabo, no fim sempre se revela vazia e uma real perda de tempo. Vou dar-lhes dois exemplos difundidos pela própria arte.

Na literatura, também francesa, temos o romance “O Conde de Monte Cristo”, de Alexandre Dumas. No épico, um ingênuo, porém promissor marinheiro, tem amor, fortuna a liberdade tirados por um trio de influentes personagens (dentre eles, um Magistrado corrupto), que lhe mandam a uma masmorra por um crime que não cometeu. Lá dentro, conhece um abade que lhe ensina como a tudo recuperar, bem como na sua própria fuga após um cárcere de muitos anos. Em liberdade, e intitulando-se “Conde de Monte Cristo”, liquida, cuidadosamente, um a um, inicialmente se satisfazendo, mas ao fim não rejubilando-se, tonando a vingança objeto de crítica do mesmo. 

Já no cinema, o clássico “Ben-Hur” trata de um próspero comerciante da Judeia, Judah Ben-Hur, a quem é pedida por seu amigo de infância, o tribuno romano Messala, a delação de judeus que conspiram contra a ocupação latina. Ben-Hur recusa ao amigo a delação, provocando a ira de Messala, que na primeira oportunidade o manda às galeras. Não é preciso dizer que o objetivo máximo de Ben-Hur se torna a volta à Judeia a fim de se vingar de Messala, se possível matando-o. Depois de consegui-lo, Ben-Hur reflete sobre sua reação, eis que tinha conhecido, pessoalmente, o Messias e sua mensagem.

A Justiça, como objetivo máximo do Poder Judiciário, existe para que, todos, tenhamos não uma satisfação sádica em face do réu, mas a inibição de futuras condutas ilícitas. Não para a satisfação, meramente pessoal, mas sim a coletiva sensação de reprovabilidade e prevenção do delito, por meio do exemplo, nunca de emoções pessoais. E a vingança, como a própria arte o demonstra, é o errôneo caminho da pretensa redenção.