Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne; sede, antes, servos uns dos outros, pelo amor.

Gálatas 5.13

Quando nos referimos sobre o conceito de ?liberdade? nossos pensamentos voam nos diversos campos dos questionamentos e reflexões. Na verdade, cada ser humano possui um significado subjetivo sobre o termo ?liberdade? e defende a qualquer custo suas ideologias. No entanto, quando analisamos e refletimos a riqueza do tema nos surpreendemos com a complexidade existente no assunto e recorremos para diversos ramos do conhecimento com o intuito de compreender sua profundidade.

Começando com um breve comentário sobre a epístola aos Gálatas, a priori, a Magna Carta da liberdade espiritual e o grito de guerra da Reforma Protestante, damos o primeiro passo para uma reflexão profícua no assunto ?liberdade?. Veremos adiante qual o pensamento e o propósito da exposição do tema ?liberdade? no pensamento de S. Paulo e, de forma sucinta, a importância da liberdade na vida eclesiástica e individual de cada cristão.

Diante disso, segue alguns princípios referentes ao capítulo 5 de Gálatas?

I. Chamados para liberdade.

Paulo trata com maestria esse conceito de liberdade aos cristãos da Galácia. Ele afirma isso como resposta a certa doutrina que corria no seio da igreja daquela época. Ele diz: Porque vós, irmãos, fostes chamados à liberdade (v.13).

No começo do capítulo ele também utiliza o termo ?liberdade? para expressar com maior clareza o que significa estar debaixo da Graça. Ele diz: Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão (v.1).

Para melhor entendermos o que Paulo quer dizer com ?liberdade?, precisamos investigar o contexto da carta aos Gálatas para descobrir com mais afinco sua intenção de tratar sobre liberdade.

Naquela época as igrejas da Galácia estavam sendo visitas por certos mestres judeus que tinham se "convertido" ao cristianismo. Esses mestres ensinavam que para ser salvo tinham que guardar a lei mosaica e praticar a circuncisão (Gl 1.7; 5.7,8,10,12). Eles também colocavam em dúvida a autoridade apostólica de Paulo.

No começo de sua carta, logo depois de sua introdução, Paulo diz: Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, 7 o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo (1.7). Esses "alguns" são os mestres judeus que tentavam introduzir no seio da igreja o jugo de estar debaixo da lei. Esses mestres se chamam judaizantes.

Em seguida Paulo faz sua surpreendente declaração: Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema (1.8). Em outras palavras, Paulo estava afirmando que o ensinamento desses supostos mestres era maldição!

Mas afinal, o que Paulo queria dizer com liberdade? Ele disse: Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. O que é essa liberdade?

Embora o termo ?liberdade? seja bem abrangente, o contexto em que Paulo escreve é ser livre da escravidão da lei. No decorrer da carta ele intensifica seu ensinamento afirmando que a lei é impotente para salvar (Gl 3) e que somente em Cristo somos livres da lei (Gl 4).

O que Paulo tinha em mente em escrever sobre liberdade é que não é preciso guardar a lei como meio de justificação e salvação. Desse fardo fomos, de fato, livres! Afinal, ninguém é justificado pelas obras da lei!

A liberdade foi fato; foi realizada de uma vez por todas! Paulo continua seu ensino dizendo: Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão (v.1).

Quando ele diz "firmes" ele quer dizer perseverante! É uma ordem imediata a qual deve ser obedecida por seus ouvintes. A igreja dos Gálatas era constituída tanto por judeus como por gentios. Isso nos faz entender que Paulo considerava como escravidão, até certo ponto, todos os estados pré-cristãos. Ou seja, tanto o judaísmo ou o paganismo é uma prisão a qual Cristo os libertou!

Quando Paulo fala "não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão" ele estava se referindo a estar preso (emaranhado) num jogo de servidão. Ou seja, retornar ao antigo modo de vida!

Paulo usa a palavra grega ?palin? que significa "outra vez, novamente". A intenção de Paulo era que entendessem que Cristo os libertou não para ser novamente escravos. Não é ser livre do paganismo e cair nas teias do judaísmo. Nesse caso continuariam presos! Cristo os chamou para liberdade! E eles deveriam permanecer firmes (perseverantes) nessa liberdade!

O jugo da servidão é estar preso a algo que o oprime. O jugo é uma pequena barra de madeira que é colocada no pescoço dos bois. Isso liga os bois fazendo-os puxar a mesma carga. Para os cristãos voltar à prática da lei é o mesmo que se sujeitar ao antigo código externo de regras e costumes impostos pela lei. É retornar novamente à opressão de ser servo do pecado (v. Rm 6.14)!

II. A Liberdade Não É Ocasião Para Carnalidade!

Muitos confundem liberdade com libertinagem! Paulo diz: porém não useis da liberdade para dar ocasião à carne (v.13). Paulo não queria que nós confundíssemos o fato de ser livres com a prática maligna do pecado!

Talvez alguns indagariam: "Se fui livre da lei, posso viver do jeito que quero". Para esses Paulo diz: Como viveremos ainda no pecado, nós os que para ele morremos (Rm 6.2). É totalmente inaceitável para o cristão viver ainda no pecado! Como viveremos para aquilo em que fomos mortos? Nosso antigo "Eu" foi crucificado e o resultado, agora, é uma vida de santidade (Rm 6.4,6)!

A respeito da liberdade Paulo diz: não useis da liberdade para dar ocasião à carne (v.13). A carnalidade é um estado a qual deve estar longe de todo cristão! Quando Paulo diz ocasião ele quer dizer ?oportunidade?!

Não devemos dar oportunidade à carne em nossa maneira de viver!

A palavra ocasião aqui vem de uma palavra grega, aphorme, que trás a ideia de "base de operação de guerra". É um termo militar que Paulo usa para descrever que a liberdade cristã não é para oferecer uma base de operação para a carne.

Não devemos usar a desculpa de sermos livres como argumento para práticas de pecados! Não é a carne que dita as regras! Pelo contrário, a vida cristã tem que ser submissa à direção do Espírito Santo (Rm 8.14)!

Mas, o que é carne? O que posso ilustrar para entender o que é a carne?

No nosso contexto de Gálatas 5 carne significa o estado não regenerado dos homens. A natureza humana, terrena, inclinada ao pecado. Para Malanchthon carne é a "natureza inteira do homem, seu senso e razão, sem o Espírito Santo". Ou seja, quando agimos sem o Espírito, agimos na carne!

Carne é a natureza caída do homem. A velha natureza. Essa natureza é irreconciliável! Incurável! Não há maneira ou jeito de transformar a carne. Não existe remédio para essa natureza corrupta. O único jeito é a crucificação. Veja o que Paulo diz: E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências (Gl 5.24).

Sobre esse pensamento nos diz John Stott: "Essa uma metáfora espantosa. Pois a crucificação era uma forma horrível e brutal de execução. Contudo, graficamente ilustra qual deve ser nossa atitude para com a natureza caída. Não devemos acariciá-la, nem estragá-la, dando-lhe estímulo ou até mesmo paciência. Pelo contrário, devemos rejeitá-la de modo cruel, juntamente com seus desejos".

A ação de crucificar é nossa! É nossa responsabilidade em negar os desejos e prazares da carne no poder do Espírito Santo (Rm 8.13)! Ou seja, no poder do Espírito nossa antiga natureza tem que ser destituída de poder e os prazeres do corpo mortificado!

Paulo seleciona algumas obras evidentes da carne. Nos versos 19 a 21 ele diz: Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia, 20 idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, 21 invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.

O crente carnal vive na prática dessas obras. Somente o Espírito Santo para conduzi-lo a liberdade (2 Co 3.17)!

Desejo destacar algumas obras da carne para compreendermos o estado degenerado que as mesmas produzem na vida dos cristãos:

1. PROSTIUIÇÃO: Paulo usa uma palavra grega (porneia) que significa imoralidade sexual. Em outras palavras, relação sexual ilícita.

O termo também inclui adultério, fornicação, relações homossexuais... uma verdadeira desmoralização no que se diz aos quesitos espirituais!

No mundo pagão nos dias de Paulo a imoralidade sexual era algo normal. O vício sexual era provido até mesmo pela lei pública sendo praticado na adoração de certas divindades. Um exemplo é a adoração a Afrodite que constuia orgias. A prostiuição era uma forma de adoração. Paulo condena essas atitudes enfatizando que os tais que as praticam não herdarão o reino dos céus!

Isso é visto claramente em nossa sociedade. O moço não se guarda mais para moça e ambos se precipitam abrindo mão das bençãos referentes a santidade. A palavra de Deus pede urgência em santificação!

2. LASCÍVIA: Lascívia esta relacionada com licenciosidade, libidinosidade, luxúria desordenada. Está incluída a ideia de libertinagem, mas o pensamento fundamental é o de não contentação, ou seja, fazer qualquer coisa que o capricho sugerir.

A lascívia tem estado presente em nossa juventude. A moça que veste uma roupa inadequada. O moço que se deleita em cenas proibídas. Isso tudo leva a um estado de impureza, o que caracteriza outra obra da carne!

Eis acima um breve relato teológico sobre liberdade. Em breve continuaremos falar sobre esse assunto num outro ângulo de visão de acordo com os melhores teólogos e reformadores.

Um grande abraço,

Adriano Neto