DÍZIMOS e OFERTAS

 

Aqui vamos entender sobre o assunto mais polêmico da religiosidade judaico-cristã. Existem pelo menos duas linhas de interpretação sobre o tema, porém, nenhuma está exatamente correta, já que as intenções são para suprir interesses pessoais e não conforme a Palavra de Deus. Vou fazer um breve comentário sobre cada uma delas e depois explicar o que realmente a Bíblia diz.

 

A palavra “dízimo” vem do hebraico “ma’aser” e do grego “dakate”, traduzindo significa “a décima parte, um décimo”, ou seja, 10% de algo. (Lv 14:10,21; 23:13; Nm 15:9).

 

ABAIXO, OS DOIS ARGUMENTOS MAIS UTILIZADOS:

 
  1. QUEM NÃO DEVOLVE O DÍZIMO VAI PARA O INFERNO [1]

Pessoas que não dão o dízimo estão roubando a Deus conforme Malaquias 3:7-9; É condizente com o que Paulo disse: “nem ladrões, [...] nem roubadores herdarão o reino de Deus” (1 Co 6:9,10). A oferta é para a igreja, e o dízimo para Deus (Lv 27:30). O dízimo era dado antes da lei mosaica, foi dado por Abraão (Gn 14:20) e depois pelo seu neto Jacó (Gn 28:22). O Novo Testamento também ordena a dizimar: O primeiro a dar a ordem foi Jesus Cristo (Mt 23:23), e Paulo aconselha a entrega voluntária (2Co 8:3) e dar com alegria (2Co 9:7). O escritor da epístola aos Hebreus comprova a entrega do dízimo no capítulo 7 versículos do 1 ao 9. Tragam seus dízimos para que tenham muitas bênçãos e as portas de oportunidade possam se abrir (Ml 3:10). Quem não devolve o dízimo é um infiel e não merece nem vir à igreja, já que tudo foi comprado com os dízimos dos irmãos.

 
  1. DÍZIMO É SÓ NA LEI DE MOISÉS [2]

Há também quem discorde da prática do dízimo nos nossos dias, alegando que é uma exigência da antiga aliança Mosaica (Velho Testamento), que os dízimos eram dados à tribo de Levi pelas doze tribos de Israel. Os pastores não são da tribo de Levi e não fazemos parte das tribos de Israel. O dízimo nunca foi dinheiro, sempre foi alimento (Ml 3:10; Dt 14:22-29); logo, não seria errado pegar 10% do meu salário, fazer uma feira e entregar diretamente à alguém que esteja necessitando. E ainda dizem que não vai fazer falta seu dízimo para a igreja, porque o pastor vive bem, administra injustamente e a igreja tem muitos membros. Hoje vivemos na dispensação da Graça e a Lei Mosaica já foi abolida por Jesus e não preciso dizimar, guardar o sábado, circuncidar-me, sacrificar animais e deixar a barba crescer. E mesmo que o pastor seja justo e ajude os pobres, não preciso dar o meu dinheiro a ninguém.

 

O QUE A BÍBLIA DIZ:

 

Para começarmos a entender, temos que fazer três divisões cronológicas das Sagradas Escrituras: Antes, durante e depois da Lei Mosaica.

 

◼  Antes da Lei Mosaica (de Adão até antes de Moises receber as tábuas da lei do próprio Deus – Ex 24; Hb 9:19,20)

 

A prática do dízimo não era obrigatória. Era um voto feito para com Deus. O patriarca Abraão “deu-lhe o dízimo de tudo” (Gn 14:20b; Hb 7:4) mas não consta na Bíblia que o patriarca tornou-se dizimista. Entretanto, “Fez também Jacó um voto, dizendo: Se Deus for comigo e me guardar neste caminho que vou seguindo, e me der pão para comer e vestes para vestir, de modo que eu volte em paz à casa de meu pai, e se o Senhor for o meu Deus, então esta pedra que tenho posto como coluna será casa de Deus; e de tudo quanto me deres, certamente te darei o dízimo” (Gn 28:20-22). Aqui o texto deixa bem claro que o neto de Abraão tornou-se dizimista (por escolha dele), no tempo que durasse a sua viagem. Não há mais registro sobre a prática do dízimo neste período.

 

◼  Durante a Lei de Moisés (das tábuas recebidas até a crucificação de Cristo – Jo 19:30)

 

Moisés separa treze tribos:

  • Doze tribos de Israel que herdaram terras (Lv 20:24; Nm 34:13-15 - “Rúben, Simeão, Judá, Issacar, Zebulom, Benjamim, Dã, Aser, Gade, Naftali e os dois filhos de José: Efraim e Manassés” [Nm 1:5-15] - Lembrando que José não foi contado entre as tribos, somente seus dois filhos); e trabalhavam na lavoura e na criação de animais (Dt 7:13); e serviço militar (Nm 1:3). 

 
  • E uma tribo sacerdotal, (“Levi [Nm 1:49,50]) que trabalharia na Casa de Deus e não herdaria terra, porém, recebeu alguns lotes para habitarem – Lv 25:32,33. 

 

A partir daqui, a prática do dízimo passa a valer como uma obrigação, pois o próprio Deus afirma que aos filhos de Levi tenho dado todos os dízimos em Israel por herança, pelo serviço que prestam, o serviço da tenda da revelação” (Nm 18:21), e os Levitas, “Quando dos filhos de Israel receberdes os dízimos, que deles vos tenho dado por herança, então desses dízimos fareis ao Senhor uma oferta alçada, o dízimo dos dízimos” (Nm 18:26).

 

Houve tempos em que determinadas práticas da lei e situações morais eram infringidas. Práticas essas, principalmente pelos sacerdotes, com cobranças exageradas de determinados mandamentos que Deus não havia autorizado, e a má administração da economia judaica em seu próprio favor; como o divórcio, o sábado, e o dízimo (Mc 2:23-28; Lc 6:9,10; ver Ne 13 e Ml 1-4).

 

◼  Depois da Lei (a partir do cumprimento da lei por Jesus – Ef 2:15; Hb 7:18)

 

Depois da crucificação de Jesus, não se falou mais em dízimos entre os apóstolos no sentido doutrinário. Entretanto, a respeito das ofertas, os discípulos de Cristo foram bem explícitos. Todos aqueles que tinham condições, ofertariam de forma voluntária (At 4:34; 1Co 16:1,2; 2Co 8:3,12). Então você se pergunta: – Jesus e o escritor aos Hebreus falaram em dízimo! Como explicar?

 

Para começar, primeiro, precisamos entender que a lei ainda estava em vigor enquanto Jesus estava vivo em Seu ministério terreno, ela só foi ab-rogada (Hb 7:18; Ef 2:15) depois da crucificação (Jo 19:30). Jesus viveu sob a velha lei (Gl 4:4), então, naturalmente, ele obedecia a lei de forma correta, e não como os fariseus hipócritas (Mt 23), por exemplo, Ele guardou o sábado (Lc 4:16) e foi circuncidado (Lc 2:21). Como já aprendemos, Jesus não cancelou a lei (velha aliança), mas o Seu sangue derramado deu início a uma nova aliança (Mt 26:28). O que ficou das práticas cerimoniais, litúrgicas e civis foram os princípios (Gl 3:24,25; Hb 10:1). Por exemplo, hoje ainda fazemos sacrifícios, porém, não de animais (Rm 12:1); fazemos circuncisão, não na carne (Rm 2:29; Fl 3:3; Cl 2:11).

 

Jesus teve animais oferecidos em seu nome (Lc 2:22-24), iniciou o seu ministério aos 30 anos (Nm 4:23; Lc 3:23), ensinou os outros a oferecerem animais (Mt 8:4; Mc 1:44; Lc 2:22; veja Lv 14:1-32), observou os dias festivos (Lc 2:41,42; Mt 26:17), mostrou grande zelo pelo templo físico (Jo 2:13-17), e ensinou a ouvir e praticar todas as coisas ensinadas por aqueles que se assentavam na cadeira de Moisés (Mt 23:2,3), entretanto, nada fala que Jesus devolveu o dízimo, mas isso não significa que eu não possa fazer um voto com Deus e dizimar. A prática do dízimo continua de forma voluntária como era antes da lei de Moisés. Contudo, não preciso ser da tribo de Israel para dizimar, e não entrego a um sacerdote levita, mas, ao pastor da igreja. 

 

Explicando Mateus 5:17,18 – Jesus não destruiu a lei e os profetas, temos o Velho Testamento até hoje para aprendermos sobre Deus e sua maravilhosa criação. Sem ele não entenderíamos o Novo Testamento. Cristo não veio ab-rogar, veio cumprir, sua morte na cruz foi quem ab-rogou a prática da lei que tinha como propósito do povo de Deus serem purificados e perdoados dos pecados (Ef 2:15; Hb 7:18,19,27). O ministério de Jesus foi para cumprir a lei e os profetas, fazendo acontecer o que as profecias falavam a respeito dEle (Jo 5:39), e “anunciar o evangelho do Reino de Deus” (Lc 16:16). As leis cerimoniais e litúrgicas foram ab-rogadas, e são diferentes dos princípios (leis morais). 

 

Então como entender as passagens do Novo Testamento que falam de dízimos?

 
  1. Mateus 23:23 – Aqui Jesus estava censurando os escribas e fariseus pela falta de compaixão, por cumprirem a lei na parte prática dos rituais, mas em obras para com os necessitados estavam em falta, legalismo. Jesus enfatiza que poderiam continuar as práticas da lei (ver todo capítulo), e não desprezar os princípios, o mais importante da lei, que era o juízo, a misericórdia e a fé. Lembrando que Jesus concordou com a continuação da prática do dízimo porque ele estava sob a lei das ordenanças (Gl 4:4). Seguindo essa perspectiva, Jesus também ensinou a sacrificar animais depois que se recebe um milagre de cura (Mt 8:4).

 
  1. Lucas 18:12 – Nessa passagem trata-se de uma parábola. As parábolas não podem ser usadas como doutrinação, pois elas servem para ilustrar o que está sendo dito, nesse caso, aquele que se exalta. Se fosse usada como doutrina, teríamos por obrigação “jejuar duas vezes na semana”. O mesmo acontece com a ilustração sobre “o rico e Lázaro”, que aponta uma situação onde quem estava no céu poderia ver e se comunicar com quem estava no inferno. Sabemos que não vai ser assim (Ap 21:4).

 
  1. Hebreus 7:1-10 – O escritor está dando ênfase na superioridade de Melquisedeque (um tipo de Cristo) em relação a Abraão (v. 4). Enquanto Melquisedeque abençoou Abraão (v. 7), Abraão reconhecia essa superioridade dando o dízimo de tudo (v. 2). Isso para que possamos entender a superioridade de Cristo, que é “segundo a ordem de Melquisedeque” (v. 17; ver Sl 110:4) e não sendo da ordem de Arão (Hb 5:1-10). O propósito do texto não é doutrinário, mas de comparação e reconhecimento da supremacia de Cristo. Simplesmente um relato do que aconteceu. Outro jeito de reconhecer a grandeza de Deus era levantar um altar em todo lugar que se orava buscando um propósito com o Criador (Gn 12:7,8; 13:18; 22:9). Não fazemos isso, simplesmente nos prostramos e oramos a Deus.

 

Nada nessas três passagens podem afirmar com clareza a continuação da prática do dízimo como obrigação, assim como outros mandamentos da lei que Jesus ensinava que não estão mais valendo, tais como, sacrifício, sábado, etc. O interessante é que o Apóstolo Paulo, o maior doutrinador do Novo Testamento, depois de Jesus, não trata do assunto para os gentios (não-judeus). Se a obrigatoriedade do dízimo estivesse prevalecendo, seria necessário Paulo doutrinar os gentios sobre essa questão que é tão discutida nos dias de hoje, já que eles não tinham tal prática.

 

CONCLUSÃO:

 

Os dízimos e as ofertas eram consagrados ao SENHOR (Lv 27:30,32; Ex 35:5). Antes da lei não tinha quem recebesse os dízimos, todavia, não se sabe o que acontecia com ele. Muito provavelmente o dizimista comia o dízimo juntamente com pessoas necessitadas (Dt 14:29; 26:12). Durante a lei o seu destino seria para os Levitas, que não herdariam terras e não trabalhavam no campo, porque estavam a serviço do tabernáculo (Nm 18:21,24). O dízimo não era em dinheiro, mesmo já existindo na época[3] (Dt 14:25,26). Alguns entendem que Deus fez assim para evitar a corrupção, entretanto, outros acreditam que o dízimo era pago com o fruto do trabalho braçal, não era em dinheiro, mas era com a melhor parte da plantação, e do gado (Nm 18:30; Dt 14:24-26). Hoje, é óbvio, o fruto do trabalho braçal da grande maioria da população é o salário pago em espécie (dinheiro), e a melhor parte seria separar logo o de Deus antes das contas e dos gastos da casa. Os Levitas tinham a obrigação de dar o dízimo dos dízimos (Nm 18:26) e essa prática continua com todo aquele que recebe o dízimo nos nossos dias (Hb 7:9; conf. Dt 26:12-19)

 

Os sacerdotes tinham a obrigação de administrar com seriedade e transparência todo valor alçado; o dízimo não era para ser gasto em construções, reformas e luxos no templos, para isso tinha as ofertas (Ex 35:5,21,22; Ed 2:68; 3:7; 1Cr 29:1-5). Os dízimos eram “para que haja mantimento” para os que vivem da obra, pois eles não podiam ter algum trabalho secular; e não podiam perverter o direito das pessoas que não tinham condições de se manterem, entre eles, “aos estrangeiros, aos órfãos e às viúvas” (Dt 12:17,18; 26:12,13), “somente para que entre ti não haja pobre” (Dt 15:4). Caso essa perversão ocorresse, haveria consequências, com repreensão ou mudança da liderança. Dois exemplos podem ser citados:

 
  1. Neemias 13: O governador Neemias juntamente com o sacerdote Esdras, fizeram uma grande restauração no judaísmo, por conta da perversão dos sacerdotes e levitas que induziram os israelitas ao erro.

 
  1. Malaquias 1-4: O profeta Malaquias, contemporâneo de Neemias e Esdras, profetizou sobre o “Peso da palavra de Deus contra Israel” (1:1), com ênfase maior sobre os sacerdotes (1:6), por conta das barbaridades que estavam fazendo. A ingratidão (1:2); desprezando e profanando o nome de Deus (1:6,7); se divorciando “e se casando com a filha de deus estranho” (2:11); corrupção em que “pervertem o direito da viúva, e do órfão, e do estrangeiro” (2:5); roubando a Deus nos dízimos e ofertas alçadas (que significa levantadas, juntadas, reunidas - 3:8-10). Claramente o profeta estava falando da liderança, e assim ficou até os tempos de Jesus.

 

As coletas das ofertas não se discutem muito sobre o assunto. Eram erguidas para que não haja “necessitados algum” (At 4:34). Aquele que tem condições e não contribui com as ofertas, como também com esmolas, é avarento, “que é idolatria” (Cl 3:5). No Velho Testamento os dízimos eram exclusivamente para mantimento dos levitas e dos pobres. Quando foi para construir o tabernáculo e os dois templos, foram levantadas ofertas. Já no Novo Testamento as ofertas eram levantadas para mantimento de todos. Não se tem ensinamento doutrinário sobre o dízimo e construções de templos na Nova Aliança. O que é irônico, já que a maioria dos convertidos não eram judeus e precisavam ser ensinados sobre o que deveriam obedecer. 

 

Em minha opinião, não vejo problema, nos dias de hoje, fazer um voto a Deus para dar o dízimo mensalmente (além das ofertas), o problema que vejo, é a má-fé na hora ensinar sobre o dízimo, dando ênfase na obrigação da igreja em dar, omitindo a obrigação de que recebe, e encobrindo a má administração de alguns líderes, que não se utilizando dos valores de forma correta para manter a obra, que é: 

 
  • Investimento na propagação do Reino de Deus (Lc 8:1-3) → Exemplo: Sopão Evangelístico;

  • Ajudar aos necessitados (At 4:34,35; 1Co 16:1,2; 2Co 8) → Exemplo: Membros desempregados;

  • Manter os que vivem do Evangelho (1Co 9:14; Gl 6:6,10) → Exemplo: Dirigentes de congregações;

 

E quando aparece algum gasto ou projeto novo, vai pedir mais dinheiro aos irmãos (uma segunda oferta, como dizem alguns). Essa prática sobrecarrega a igreja e é um procedimento totalmente antibíblico, a não ser, nos casos em que a quantidade recolhida é pouca, em relação à quantidade reduzida de membros; cada caso deve ser analisado.

 

Esses líderes apoderam-se dos valores para benefício próprio (luxo e ostentação)[4], e muitos ainda recebem altos salários pelas convenções. Eles se aproveitando da inocência e da fé alheia. Jesus conversando com Pedro, enfatiza que aquele que ama-o de verdade, deve cuidar das Suas ovelhas (Jo 21:15-17). Nos dias atuais, muitos enganam os fiéis com discursos convincentes e atrai para si riqueza e poder, enquanto muitas ovelhas perecem por falta de ajuda e de interesse de pastores e padres enganadores (2Pe 2:1-3). O ensinamento sobre os dízimos e as ofertas formam uma grande salada, tudo misturado, só me faz lembrar da conversa bonita que satanás teve  com Eva no Paraíso e com Jesus no Deserto. Se o dízimo fosse ensinado e praticado de forma Bíblica, mais pessoas  poderiam contribuir, até mesmo aqueles que não concordam, mas por sentir-se constrangidos ao verem a obra sendo feita, devolveriam seus dízimos com amor (1Cr 29:1-14 - Aqui fala de oferta, todavia o exemplo é o mesmo).

 

REFERÊNCIAS:

[1] Apostolo Agenor Duque – Igreja Plenitude do Trono de Deus (youtu.be/KHgUnjJ8EGI); Pastor ataca com hostilidade quem não dizima (youtu.be/M1ieSe7A56k).

[2] Romilson Ferreira - Estudo sobre o dízimo (youtu.be/yW0zSoJKqEo).

[3] Alguns tentam justificar que não tinha dinheiro na época, por isso o dízimo era pago com parte da colheita e do gado. Aqui alguns versículos que falam da existência de dinheiro nos tempos Bíblicos e refuta esse argumento de cobiça (Gn 20:16; Lv 25:37; Jz 16:5; Mt 22:19). (youtu.be/8DCbJ4Zm3bc).

[4] Pastor Silas Malafaia, em entrevista para Marília Gabriela diz: “Todo pastor deve ser bem de vida” (youtu.be/Myb0yUHdi14). Jesus disse ser o Bom Pastor. Ele era bem de vida? Os Apóstolos eram bem de vida?

 

~Jeferson Bonfim