O Cine Vitória, em São Caetano do Sul teve os seus dias de glória. Seu nome foi uma homenagem ao seu proprietário, o empresário Vittorio Dal’Mas, que chegou à cidade com 12 anos e tinha como sonho construir um grande edifício na cidade. O prédio chegou a ser sede da prefeitura e, também, da ACASC, uma associação onde eram promovidos bailes e formaturas.

Próximo do Natal, lá pelo final dos anos 1950, meus pais reuniram a família com a melhor roupa disponível; os meninos com ternos de calças curtas e gravatas borboleta, fizemos uma fotografia no Foto Mitto, próximo da estação e clic. Estava pronta uma lembrança para ser enviada para os parentes do interior: avô, tios, tias e primos. Depois da foto, fomos para o Cine Vitória, onde assistimos um longo e cansativo documentário sobre o fundo do mar na primeira sessão e em seguida o filme “Lá Escondida”, um dramalhão mexicano ambientado durante a revolução de 1910, liderada por Zapata.

Teve uma época em que não era permitida a entrada de homens sem a clássica indumentaria: paletó e gravata. Com o tempo foi relaxando e cheguei a assistir bons filmes com camisa esportiva de mangas curtas em companhia de amigos ou de alguma namorada, cujos nomes ficaram perdidos nos escaninhos da memória. Lá, lembro-me bem, assisti o clássico Doutor Jivago, baseado no romance do mesmo nome do escritor russo Boris Pasternak, além de uma reprise de Laurence da Arábia outro clássico épico do cinema com três horas de duração.

Tal como no belo filme “A última sessão de cinema” que tem como palco a pequena cidade de Anarene, no estado do Texas, Estados Unidos, o Cine Vitória também chegou ao fim em 1 de setembro de 1998, exibindo o filme Armagedon, com apenas cem espectadores. A reforma do cinema com duas salas, em 1995, não atraiu grande público. Nesse dia resolvi não entrar no cinema, pois já havia visto o filme e preferi fazer outro programa   daquele que foi o principal ponto de encontro de namorados, de políticos e de amigos.

No filme de Bogdanovich, com Cybill Shepherd, fazendo a sua estreia, o filme exibido na tela do filme é o “Rio Vermelho”, de 1948, com John Wayne. Os personagens da “Ultima Sessão de Cinema” tinham poucas opções de lazer na pequena cidade e se revezavam entre o bar com sinuca e o velho cinema. O filme é nostálgico e a história se passa entre o final da Segunda Guerra e a Guerra da Coréia, tempos difíceis no oeste norte-americano em que as pessoas viviam as perdas durante o conflito mundial e as possibilidades dos jovens serem convocados para mais uma guerra.

O Cine Vitória não era o único cinema da cidade, diferentemente de Anarene em que havia apenas um. Tínhamos “O Lido”, mais moderno e bem próximo, que também já chegou ao seu ocaso. Além do Lido, havia o Max perto da estação de trem, onde assisti bons filmes como A primeira noite de um homem, com o Dustin Hoffman e bem antes, o primeiro filme dos Beatles, Help, quando se ouvia mais os gritinhos das meninas do que as belas canções do quarteto de Liverpool.  Encerraram suas portas também os cinemas de bairros, como o Real e o Átila na Vila Gerty, entre outros, restando apenas as pequenas salas dos cinemas de shopping centers.

O fechamento do Cine Vitória foi resultado de mudanças socioculturais, com a chegada dos filmes alugados nas locadoras que há tempos já estavam se espalhando pela cidade. Tal como na canção do Chico Buarque, a televisão mudou o hábito das pessoas e “Os namorados, já dispensam seu namoro, quem quer riso quem quer choro, não faz mais esforço não. E a própria vida, ainda vai ficar sentida, vendo a vida mais vivida, que vem lá, da televisão”.