A TUTELA DO DIREITO DOS REFUGIADOS.

Matheus da Rocha Spiegel Bastos Pavetits

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Introdução

Tendo em vista, o crescente número de refugiados passando pelas fronteiras européias, e as maciças discussões sobre o direito daqueles que se encontram fora do país de sua nacionalidade devido o temor de perseguição, essa temática vem se tornando tema de muita atenção. 

Esse artigo, tem como objetivo, estudar a ótica jurídica pertinente ao direito dos refugiados. Analisar quais os tratamentos atribuídos pelo direito internacional e nacional àqueles que se encontram em situação de refúgio, sobretudo da incontestável relevância do tema no âmbito internacional. Indispensável, antes de qualquer coisa, elucidar quem são especificamente, os refugiados e quais são seus direitos no âmbito internacional.

Além de apresentar os direitos no âmbito internacional, verificar qual o posicionamento do Brasil e legislação existente para amparar os refugiados. Por fim, contrastar os acontecimentos da atualidade com as propostas de tutela das pessoas em maior vulnerabilidade pelo mundo.

Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967

Instituído no dia 1º de janeiro de 1951, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados é órgão de função subsidiária da Assembléia Geral da ONU. Sendo confiado a ele o dever de zelar pelo emprego das convenções internacionais que versam e tutelam os direitos do refugiado. 

O Alto Comissariado tem caráter humanitário e social, cabendo a ele procurar soluções para a situação de vulnerabilidade dos refugiados e auxiliar os Estados para a integração e aceitação daqueles que vivem em fundado temor. Não obstante, cabe ao ACNUR auxiliar a integração desses refugiados em novas comunidades internacionais, fomentar a admissão de refugiados nos territórios dos Estados, entre outras atribuições que constituem o Alto Comissariado. 

Miguel Daladier Barros salienta que: “O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Re­fugiados (ACNUR). Com sede em Genebra, Suíça, a UNHCR (sigla em inglês) foi criada em 1951 para conferir proteção às pessoas (a maioria europeus) assoladas pela Segunda Guerra Mundial. Na atualidade, busca encorajar os governos a adotarem leis e procedimentos mais flexíveis relativamente aos refugiados, além de coordenar a assistência material para essa população e aos repatriados, ou seja, aqueles que têm o pedido de asilo negado.”

Além da criação do ACNUR, a Convenção de 1951 foi um marco histórico na instituição dos princípios tutelares dos refugiados. Pôde-se, portanto, definir quem é o refugiado e, a partir dessa definição, estipular quais serão seus direitos. No artigo 1º da Convenção de 1951, define-se de maneira genérica o termo “refugiado”. Conforme a redação, aplicar-se-á o termo refugiado a qualquer pessoa “Que, em conseqüência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.” 

Passa-se a aplicar a terminologia sem descriminar e rotular o refugiado, no entanto, a Convenção, além de determinar o refugiado, define o Estatuto jurídico dos Refugiados. Contemplando, neste Estatuto, disposições relativas ao direito ao emprego remunerado, emissão de documentos de identidade e passaporte, o bem-estar, entre outros. Outra grande conquista, foi a proibição a expulsão e o regresso forçado daqueles que se encontram em fundado temor, consoante o artigo 33 da Convenção:

"Art. 33 - Proibição de expulsão ou de rechaço:

  1. Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas.
  2. O benefício da presente disposição não poderá, todavia, ser invocado por um refugiado que por motivos sérios seja considerado um perigo para a segurança do país no qual ele se encontre ou que, tendo sido condenado definitivamente por crime ou delito particularmente grave, constitui ameaça para a comunidade do referido país."

À medida que o tempo foi passando, começamos a esbarrar num novo problema. A Convenção somente abarca os acontecimentos ocorridos antes de 1951, mas percebe-se que com a evolução, novos conflitos e perseguições tornaram-se mais corriqueiros, a despeito disso, começou a ser fomentada providências para essas emergências. Sendo assim, o Protocolo de 1967 pôde abranger a situação dos refugiados pós-segunda guerra. Tendo como fundamento os seguintes termos: 

"Considerando que a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados assinada em Genebra, em 28 de julho de 1951 (daqui em diante referida como a Convenção), só se aplica às pessoas que se tornaram refugiados em decorrência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951; 

Considerando que, desde que a Convenção foi adotada, surgiram novas categorias de refugiados e que os refugiados em causa podem não cair no âmbito da Convenção; 

Considerando que é desejável que todos os refugiados abrangidos na definição da Convenção, independentemente do prazo de 1º de Janeiro de 1951, possam gozar de igual estatuto.

Diante disso, os direitos abarcados na Convenção de 1951 puderam ser estendidos às novas categorias de refugiados, garantindo a esses, em vulnerabilidade, uma proteção internacional, uma vez que, seus direitos já foram violados.  

A Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 são as principais ferramentas internacionais de tutela aos refugiados, sendo importante destacar que seu conteúdo normativo é de alto reconhecimento pela comunidade internacional. Assim como, são os meios que asseguram que todos os homens e mulheres, que foram obrigados a deixar seus países de origem por causa de fundado temor, possam exercer o direito de usufruir de refúgio em outros países.

Direito dos Refugiados

Com base no que foi elucidado, é garantido ao refugiado uma proteção, de maneira que “O refugiado deve ter fundado temor de perseguição em seu país, onde não encontrará um julgamento justo, com o devido processo legal”. 

O refugiado tem direito a receber um “asilo seguro”. Esse asilo internacional compreende a promoção de soluções para garantir a segurança física dos refugiados, auxílio à instalação dos refugiados no país que o recebe, aconselhamento jurídico e o apoio do judiciário e a prevenção ao refoulement (“devolução”). Espera-se que os refugiados possam, ao menos, desfrutar dos mesmo direitos (isso inclui os direitos fundamentais) e assistências que um estrangeiro que reside legalmente no país deve receber. 

Não apenas esses direitos que foram estipulados na convenção como também a aplicabilidade direta de muitos direitos humanos aos refugiados. Em outras palavras, tem a garantia ao direito à vida, direito à nacionalidade, proteção contra tortura e maus tratos, entre muitos direitos civis, políticos, sociais e culturais que são intitulados na Declaração Universal dos Direitos do Homem. 

No que tange à posição do Brasil referente aos direitos do refugiado, o Estado comprometeu-se internacionalmente a proteger os refugiados que buscam integração e sustento, como qualquer nacional. Por meio de uma solicitação formal de refúgio, dando-lhes acessibilidade à serviços públicos de saúde e educação como também o direito ao trabalho. Dentre todos os direitos já assegurados pela convenção e protocolo, o Brasil determina como direito dos solicitantes de refúgio, por exemplo: acesso gratuito ao procedimento legal de solicitação de refúgio sem a necessidade de advogado, não ser punido por entrada irregular no país, não ser discriminado pelas autoridades governamentais e pela sociedade, assim como receber a documentação provisório assegurada pela legislação, etc. 

Considerações Finais

Em suma, sabe-se que a problemática dos refugiados não é atual, a partir da década de 50, com a Convenção de 1951 e, posteriormente, com o Protocolo de 1967, passamos pelo começo de novos esforços internacionais a fim de construir um estatuto que contemplasse os status de refugiado para propiciar-lhes garantias, bem como uniformizar os requisitos definidores de seu status

Ocorre que, apesar da existência de uma fomentação internacional  sobre o esteio dos muitos refugiados, percebe-se que há ainda uma carência e lacuna do que pode ser feito para que essa tutela ocorra de forma natural e efetiva, uma vez que, muitos Estados têm tomado medidas opostas ao de amparo, como o fechamento de fronteiras aos imigrantes refugiados. Para ilustrar a situação, conforme redação da BBC "Países da Europa Oriental que têm recebido um número recorde de imigrantes poderão nos próximos dias anunciar o fechamento coletivo de suas fronteiras como forma de tentar conter o fluxo de pessoas”. O bloco das nações balcânicas (Bulgária, Romênia e Sérvia), em negociações com a União Européia sobre o tema refugiados, fez essa ameaça que anda na contramão aos avanços nessa temática. 

O Brasil, em 1997 implementou a Convenção de 1951 através da promulgação da Lei Nacional para os Refugiados – Lei nº 9.474/1997. Essa lei possui uma peculiaridade, que a difere no âmbito internacional, é o fato de trazer uma ampliação na definição do refugiados inovando, não só apenas na análise dos requisitos clássicos, para abarcar também a ideia de “grave e generalizada violência aos direitos humanos, que engloba um crescente numero de solicitantes de refugio”. Destarte, essa peculiaridade referente aos direitos humanos, gerou muitos elogios na comunidade internacional para esse avanço humanitário. 

Diante disso, é notável que ainda é necessário fomentar a importância do recebimento dos refugiados e criar meios de tirar do senso comum o receio no recebimento destes. Pois ainda há, em meio há tanto sofrimento destes que se encontram em necessidade de um asilo seguro, medos e mitos de que os refugiados podem ser uma ameaça ao país que o recebe, seja no tocante a questões sociais, culturais, econômicas e religiosas. 

Para finalizar, devemos realizar estudos e projetos deconscientização dessas pessoas que ainda não enxergam a vulnerabilidade dos novos refugiados,e instigar o pensamento de reciprocidade, pois qualquer pessoa gostaria de receber amparo alheio se fosse submetida a uma situação tão degradante e sofrida como essa.    

Referências

  1. ACNUR. Handbook on procedures and criteria for determining refugee status under the 1951 Convention and the 1967 Protocol relating to the status of refugee. Genebra, 1992. 
  2. ONU. Convenção Relativa ao Estatuto do Refugiado. 1951.
  3. ONU. Protocolo Relativo ao Estatuto dos Refugiados. 1967. 
  4. VARELLA, Marcelo D. Direito Internacional público. 5ª. ed. - São Paulo: Saraiva, 2014.
  5. REZEK, José Francisco. Direito Internacional público: curso elementar. - 15. ed. rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2014. 
  6. BARROS, Miguel Daladier. O drama dos refugiados ambientais no mundo globalizado. In Revista Consulex – Ano XIV – Número 317 – Março de 2010, p. 12.
  7. FRANÇA, Marjory Figueiredo Nóbrega de França. Declaração do Estatuto de Refugiado no Brasil. In Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região , Brasília, v. 15, n. 12, dez. 2003.
  8. ACNUR. Direitos e Deveres dos Solicitantes de Refúgio e Refugiados no Brasil. Cartilha informativa em português, francês e espanhol. Instituto Migrações e Direitos Humanos. 2012
  9. BBC.Países da Europa Oriental estudam 'mega-fechamento' de fronteiras contra refugiados. Reportagem. Dia 25 de outubro de 2015.