Olá Maira, já faz algum tempo que lhe disse que enviaria uma carta para sua nova residência. Pedi seu novo endereço, que agora se encontra em Madri, porém o tempo passou - talvez uns dois ou três anos e acabei não te mandando nada. Porém cumpro agora meu dever com a palavra.
Muito do que quero falar é sobre o tudo e sobre o nada. E você sabe como sou daquelas pessoas que dizem muito, mas não dizem nada. Acho que seria melhor explicar com algo que esteja entre o tudo e o nada. Falo metaforicamente de um caso ao qual ouvi algo estranho, mas talvez não tão estranho quanto o tudo e o nada. É sobre Blue, um pintinho que ainda no ovo foi retirado por M., do seu ninho. Os motivos de M. não são de absoluta forma, estranhos, mas sim dúbios. Queria ele agradar o seu filho, ao qual não conseguia dar a devida atenção por motivos de trabalho ou talvez fosse puro sentimento de culpa que moveu M. em dar aquele ovo ao seu filho? Isso é o que ainda não se sabe, porém M. ficou muito satisfeito com o efeito que Blue teve nos primeiros dias de sua vida na existência de seu filho. Aliás, o nome do pintinho é ainda um mistério, pois não se sabe se foi porquê o ovo chocou-se em uma segunda-feira de céu azul ou se o filho de M. quis praticar o seu inglês que ainda estava em uma fase de afloramento. Porém é certo que foi o filho de M. quem deu o nome à Blue e não M.
Blue, quando nasceu e abriu os olhos piou para o filho de M., pois M. não estava por perto Blue acreditava que o filho de M. fosse sua mãe, assim como toda ave que sai do ovo acredita que o primeiro ser que o olha e lhe impõe cuidados acredita ser essa a sua cuidadora. O filho de M. cuidava com grande maestria de Blue, dando todo o alimento necessário que a ave precisava nos primeiros dias de sua vida e Blue que chocou e piou se emplumou.
As semanas passaram e Blue começou a perambular pela casa de M., sempre seguindo o que assim achava ser a sua cuidadora.

Guilherme, um gato gordo que existia na casa e que não seguia o filho de M., começou a se interessar por Blue. Talvez fosse um início de amizade ou quem sabe o despertar de algum instinto selvagem, bem se sabe foi que ele começou a seguir Blue, primeiro com olhos atentos e depois para cada lugar que ele ia, mas nunca se atrevendo a chegar perto o bastante quando o filho de M. estivesse ao lado.
Houve um dia, porém em que o filho de M. se distraiu e fechou a porta sem que Blue tivesse passado e Guilherme apesar de ser considerado um gato gordo, facilmente se apoderou de Blue e lhe deu uma dentada na cabeça, o que fez com que a vida do jovem Blue se desvanecesse.
O filho de M. quando deu pela falta de Blue começou a procurá-lo pelos cantos da casa e não demorou muito para encontrar aquele animal peludo que ao olhá-lo soltou um miado que esboçava satisfação por estar digerindo Blue. O filho de M. ficou apavorado ao ver as penas amarelas de Blue soltas pela sala.
O fim de Blue trouxe toda uma tristeza para o filho de M. e M. assim que percebeu que seu filho não corria pela casa com o seu pintinho tratou de se questionar o porquê dele não ter mais gostado daquele presente que a principio lhe dera tanto prazer. M. não sabia que Guilherme havia comido

Blue, muito menos seu filho havia contado tal tragédia, por isso suas conclusões não passavam perto da realidade, eram meras conjunturas. Pensava ele que talvez Blue tivesse crescido e abandonado seu filho ou o inverso.

Esse foi o triste fim de Blue, não só ter morrido e ter deixado uma vida de piados pela frente, mas por não ter despertado a consciência daquele que o trouxe até sua casa, pois esse se quer ouviu o seu piar.