RESUMO

O presente trabalho tem como propósito analisar os efeitos da era digital na escrita, a forma de comunicação e expressão de ideias muito importantes para a humanidade e sua história. Em um momento onde a tecnologia digital faz parte da vida de quase toda população mundial, muitos debates acontecem e em meio a tantas dúvidas, uma tem grande relevância e precisa ser estudada: a sobrevivência da escrita na era digital, na era dos e-books e pesquisa por voz. A análise dos efeitos do avanço digital na vida escolar, nas ciências, nas tradições, hábitos e na arte, e a análise das mudanças que ainda estão por vir, são complexas e necessárias.

INTRODUÇÃO

A escrita surgiu como necessidade econômica e de comunicação da sociedade da época, principalmente no oriente médio, foi uma grande revolução, trouxe benefícios imensuráveis para a humanidade, contrariando ideias de um dos homens mais sábios de todos os tempos. Sócrates temia um desastre com a disseminação da escrita, acreditava que os jovens atenienses deixassem de exercitar a memória, com o recurso fácil da escrita e leitura, e perdessem o hábito de questionar; apreciava a linguagem oral, achava que só o diálogo, a retórica e o discurso estimulavam o questionamento e a memória.

Sócrates provavelmente não imaginava os avanços que ainda estavam por vir, quanto mais avançamos no século, mais novidades aparecem, e hoje vivemos mais uma revolução na escrita e consequentemente em toda forma de comunicação e processo de  aprendizagem. A cada mês são fabricadas maquinas com mais recursos de inteligência artificial, como por exemplo, os celulares, que funcionam como computadores de bolso ou mini portáteis. 

A era digital trouxe facilidades para o homem, mas também é causa de temor, pois tais facilidades podem causar prejuízos a longo prazo, diversos debates acontecem ao redor do mundo e causa divergências, por aqueles que são amantes da era digital e acreditam apenas nos benefícios da inteligência artificial, contrariando os que apoiam a preservação da cultura e do aprendizado humanizado, que não se colocando como inimigos dos avanços digitais, se preocupam com a sobrevivência da escrita e sua preservação nas gerações futuras.

 

Souza (2006), analisa que a globalização trouxe novas perspectivas e oportunidades, por outro lado, pode acarretar problemas e dificuldades. Em contrapartida, há os que enxergam um mundo fantástico da tecnologia, como destaca Santaella: 

O aspecto mais espetacular da era digital está no poder dos dígitos para tratar toda informação, som, imagem, vídeo, texto, programas Informáticos com a mesma linguagem universal, uma espécie de esperanto das máquinas (2002, p.54)

O avanço da tecnologia está tendo reflexos diretos na forma de comunicação e expressão, é imprescindível a necessidade de se preservar a escrita, um bem valioso da humanidade, além da própria linguagem culta e correta, e da gramática; necessário é valorizar em nosso país a Língua Portuguesa, bastante complexa e rica. 

 

UM POUCO DE HISTÓRIA

O homem da pré-história não sabia escrever, mas sabia desenhar e sentia a necessidade da comunicação, queria que o homem do futuro tivesse conhecimento da sua existência; por desenhos feitos nas paredes das cavernas, as famosas pinturas rupestres, trocavam mensagens e contavam suas histórias. Mas foi por volta de 4.000 ac que os sumérios desenvolveram a escrita cuneiforme, com registros cotidianos em placas de argila, desenvolveram uma escrita silábica para representar a língua Suméria falada; no mesmo período há o surgimento da escrita hieroglífica no Egito antigo, com alguma relação com a escrita da Mesopotâmia. 

A escrita hieroglífica era mais complexa e formada por desenhos e símbolos, as paredes internas das pirâmides são repletas de textos que falam sobre a vida dos faraós, rezas e mensagens também foram deixadas para espantar saqueadores. Uma espécie de papel chamado papiro, produzido a partir de uma planta de mesmo nome também era utilizada para escrever.

Em Roma antiga havia no alfabeto romano somente letras maiúsculas, contudo, na época em que estas começaram a ser escritas nos pergaminhos, com auxílio de hastes de bambu ou penas de aves, ocorreu uma modificação em sua forma original e depois criou-se um novo estilo de escrita denominada uncial. Na Idade Média, no século VIII, Alcuíno, um monge inglês, elaborou outro estilo de alfabeto atendendo ao pedido do imperador Carlos Magno. Contudo, no século XV alguns eruditos italianos, incomodados com este estilo complexo, criaram um novo estilo de escrita.

 

No ano de 1522, outro italiano chamado Lodorico Arrighi, foi o responsável pela publicação do primeiro caderno de caligrafia, foi ele quem deu origem ao estilo itálico. A escrita cuneiforme foi sendo substituída pela aramaica, que possuía 22 sinais em oposição aos 100 sinais da cuneiforme.

Na escrita Ocidental os gregos tiveram destaque, incorporando novos fonemas, que resultaram nas letras A, E, I, O, U. As demais escritas, arábicas e hebraicas, assim como a fenícia, são escritas apenas consonantais, o alfabeto fenício foi completamente absorvido pelos gregos antigos.

A escrita chinesa e a colombiana, como por exemplo a escrita maia, tiveram origem independentes; a escrita japonesa foi criada a partir da escrita chinesa por volta do século IV. 

 

A ESCRITA NA ERA DIGITAL 

Os dispositivos eletrônicos estão cada vez mais populares e com o desenvolvimento das tecnologias de informação e recursos multimídia, tornou-se inevitável a expansão desse mercado digital. Com a evolução dessas tecnologias a escrita também ganhou novos contornos e está a cada dia sendo alterada, uma vez que a internet prioriza a velocidade, a qualidade gramatical fica em segundo plano, abreviações começaram a ser usadas pelos internautas como uma conversa em tempo real e muitos já estão passando essa escrita da web para o papel.Muitos estudiosos já estão demonstrando preocupação com o impacto do mundo digital na cultura da escrita, como o professor Robert Damton, da Universidade Harvard, respeitado historiador cultural, explica que o texto no computador fica limpo, organizado, justificado; fica tão bem que parece dispensar revisão e pode ser despachado com um clique, o que para ele é uma desgraça para quem preza a clareza e o estilo.

A leitura também sofreu alterações desde o avanço digital, hoje passamos muito tempo em frente a telas de tablets ou celulares, isso desde a infância, e esses hábitos digitais estão interferindo na concentração na leitura e na interpretação de textos complexos e consequentemente irá interferir no desenvolvimento de uma escrita correta e limpa, sem vícios digitais. 

O AVANÇO DOS LIVROS DIGITAIS

Os livros digitais, os chamados e-books, estão cada vez mais ganhando espaço como forma de leitura nos dispositivos moveis, a facilidade e vantagens encontradas pelos usuários destas plataformas estão fomentando esse avanço. Diversos sites disponibilizam downloads gratuitos de livros; o autor pode interagir com o texto, aumentando a letra durante a leitura, pesquisando palavras e capítulos por meio de ferramentas de buscas e ainda criar anotações no texto.

Segundo a pesquisa Produção e Venda do Mercado Editorial, feita pela Fipe por encomenda da Câmara Brasileira do Livro (CBL) e do Sindicato Nacional de Editores (SNEL), foram produzidos em 2018 por 197 editoras consultadas, 7470 e-books e 197 aplicativos de livros; o faturamento foi de 3,8 milhões em livros vendidos, com tendência a aumentar nos próximos anos.

A Amazon já vende mais livros digitais do que físicos nos EUA, só o livro Cinquenta Tons de Cinza vendeu 2 milhões de exemplares eletrônicos em quatro meses; já existem livros que trazem trilha sonora, vídeos e fotografias, na Inglaterra, a edição enriquecida de Aventuras de Sherlock Holmes emite sons, como gritos, trovões e ventos uivantes. Mas será que tanta facilidade com efeitos e acessibilidade não trará consequências para o pensamento e a própria imaginação? O crítico literário Sven Birkerts chama atenção para a deterioração da qualidade da leitura, ainda na década de 90 percebeu que seus alunos, as voltas com aparelhos eletrônicos, não conseguiam ler um romance com paciência e concentração, perdendo a riqueza de uma boa leitura, que enriquece a imaginação e permite viajar em sua própria mente.

LER E ESCREVER

Saber ler e escrever no passado, era um bem valioso, almejado por muitos que não tinham acesso ao aprendizado, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios continua (PNAD Continua), atualmente o analfabetismo ainda é uma realidade para 7% da população no Brasil com mais de 15 anos, o que corresponde a 11,5 milhões de pessoas, desse total 19,3% são idosos que quando jovens não tiveram acesso as escolas por causa da condição social em que viviam. Ler e escrever também era objeto de trabalho para aqueles que ganhavam dinheiro escrevendo cartas para quem não conheciam as letras nem sabiam desenhar as palavras; o que dizer dos poetas e escritores se não existisse a escrita? Quantos romances e músicas tiveram como origem rabiscos em um pedaço de papel? Hoje muitos são aqueles que já não usam a caneta e o papel cotidianamente, inseridos que estão na realidade de usar aplicativos, redes sociais e e-mail diariamente; escrever à mão está ganhando espaço de outra forma, como terapia e trabalho manual, existem hoje em dia cursos, canais na internet e no mercado editorial onde a escrita à mão está se popularizando com os nomes de caligrafia e lettering, se baseia em desenhar letras, com a diferença que caligrafia tem regras gráficas e lettering é livre, feita no improviso e mistura várias técnicas, como misturar letra cursiva e bastão na mesma frase. 

De acordo com o estudo de MARTINS (1994, pag.22) ´´ A pratica de ler e escrever já era vista pelos gregos e romanos como uma forma de possuir as bases de uma educação adequada para a vida.´´ Escrever bem é fundamental para garantir um bom desempenho em provas do Enem, onde a redação tem o maior peso de pontuação, infelizmente são muitos os casos onde estudantes não conseguem escrever a redação, outros cometem erros gramaticais graves, e há também as abreviações, gírias e modismos que fazem parte da escrita nas redes, termos como “vc’’= você, “pfvr’’= por favor e “ tmb”= também, estão interferindo na escrita cotidiana, e há casos dessa interferência em trabalhos escolares, redações e até trabalho profissional.

A IMPORTÂNCIA DE SE VALORIZAR A ESCRITA NAS ESCOLAS 

O avanço da era digital tem refletido na vida das pessoas, principalmente dos jovens e adolescentes, a maneira como falam, escrevem e se comunicam vem mudando com a utilização da internet, das redes sociais e aplicativos diversos, está se desenvolvendo uma linguagem escrita que foge dos padrões da língua, principalmente da norma culta da Língua Portuguesa. Não se deve demonizar a tecnologia e seus avanços, e é inegável os benefícios que a tecnologia trouxe para a humanidade e para o aprendizado, mas devemos ensinar as novas gerações a valorizar a cultura da escrita, a saber a diferença da escrita digital e da escrita pedagógica, da escrita profissional e tradicional, é fundamental que os jovens sejam capazes de ler e escrever bem, de imaginar, refletir e interpretar; inseridos na era do ‘‘selecione, corte e cole,’’ precisam saber respeitar a integridade de um texto.  

No ambiente escolar, a escrita está associada à norma culta e a tradição gramatical, por isso é essencial que os professores e educadores desenvolvam em todas as fases do ensino, projetos que permitam ao estudante não transgredir a escrita convencional. A escola é o berço da alfabetização e letramento, por isso Emília Ferreira (2011) destaca importância do alfabetizador e sua técnica, já que “o alfabetizador que usa textos variados está preparando seus alunos mais para a internet do que aquele que faz um trabalho minucioso ensinando uma letrinha e depois outra’’. 

O avanço da tecnologia vem trazendo transformações e mudando o paradigma da educação, Freire assim se expressa a esse respeito: 

Conhecer não é o ato através do qual um sujeito Transformado objeto, recebe dócil e passivamente Os conteúdos que outro lhe dá ou impõe. O Conhecimento pelo contrário, exige uma presença Curiosa do sujeito em face do mundo. Requer sua Ação transformadora sobre a realidade. (1985, p.7) 

A Educação deve se adequar a tecnologia sem se deixar ser manipulada por ela, aos professores cabe o oficio de construir e reforçar o respeito e preservação da linguagem e escrita.

PROPOSTA 

Em ambientes educacionais e profissionais cada vez mais competitivos, é fundamental que a escola desenvolva nas crianças desde cedo a habilidade da escrita, garantindo na futuro maior chance de acesso a uma boa educação superior, é necessário primeiro desenvolver o gosto pela leitura, expandindo a mente, imaginação e pensamento. 

Quando se perverte a linguagem se perdem os costumes, e uma solução para isso acontece através do ensino, do respeito com a língua materna, da leitura e do exercício da escrita. É importante que se construa projetos educacionais que desenvolvam as potencialidades individuais em um mundo globalizado, ensinar crianças e jovens a verem a escrita como ela é, expressão, carrega arte, sentimento, lembranças, registros e o próprio conhecimento.

Os professores podem incentivar a cultura da escrita com alguns métodos, como:

. Demonstrar a importância de ler e escrever;

. Desenvolver a capacidade de interpretação e reflexão; 

. Usar a Literatura para comprovar a escrita como arte e cultura; 

. Ensinar a se comunicar e se expressar;

. Desenvolver a construção de uma escrita legível;

.Desenvolver a capacidade de transferir para o papel ideias, pensamentos e emoções, eternizando a própria identidade;

. Estimular a construção de novos leitores e escritores; 

. Conscientizar sobre a importância da norma culta da língua e do valor da palavra escrita. 

Aprender a ler e escrever segundo Brasil (2017) permite ao estudante se inserir na cultura letrada, criando possibilidades de protagonismo e autonomia na vida social. Segundo Vygotsky (apud FONTANA; CRUZ, 1997): “A escrita é maior do que um sistema de formas linguísticas com o qual o sujeito se confronta, esforçando-se por compreende-lo. Ela é uma forma de linguagem, uma prática social de uma sociedade letrada.

RESULTADOS

Estudos comprovam que escrever à mão é muito importante para o cérebro, ainda assim, hoje em dia a escrita à mão se tornou para muitos, descartável, pesquisadores das Universidades de Princeton e da Califórnia nos EUA, realizaram um estudo onde foi analisado dois grupos de estudantes, o primeiro grupo fazia anotações por computador, o segundo fazia anotações no papel, esse grupo da escrita à mão se saía melhor em provas do que o primeiro, compreendia melhor a explicação do professor e conseguia transmitir para o papel com suas próprias palavras. Um estudo da Universidade de Bloomington,nos EUA, comprovou que crianças que aprendem a escrever com letra cursiva, desenvolvem habilidades motoras e forçam o cérebro a trabalhar mais e melhor. 

Influenciar a prática da leitura contribui diretamente para uma boa escrita, “quem lê muito escreve bem’’, não é apenas uma frase de efeito, é um fato, a leitura proporciona a expansão do vocabulário e a capacidade de interpretação e compreensão, comprovando a relação entre leitura e escrita, o exercício da escrita resulta em menos erros ortográficos, textos coerentes e capacidade de argumentação, o que ajuda em provas de vestibular e processos seletivos. Essa influência tem que partir da escola, mas também dos pais e do meio em que o sujeito vive, como afirma Lindgren apud José e Coelho (2001), o aprendizado se forma todo o tempo, independente de se estar dentro ou fora da escola e em diferentes níveis de consciência. 

O ato de escrever pode trazer diversos benefícios para a vida, é também uma terapia, chamada de grafoterapia, ajuda a diminuir o stress, além de desenvolver a criatividade e a imaginação e melhorar a memória. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Escrevemos para contar histórias, para expressar nossas emoções e opiniões, visões políticas, teorias filosóficas, reflexões e pensamentos, escrevemos para construir um aprendizado, para nos comunicar e nos encontrar no meio em que vivemos, escrevemos por trabalho, pela identidade e pela evolução intelectual, para dar voz as palavras e eternizar o que somos. A escrita tem uma importância que vai além do reconhecimento e da decodificação de palavras, a necessidade de se valorizar a escrita nesse momento de evolução digital é grande, a nova geração que irá contar nossa história, precisa saber escrever a nossa história e escrever bem.

Cada vez mais os jovens e até adultos e idosos estão inseridos na era da tecnologia, das redes sociais e palavras abreviadas, dos e-books e aplicativos de textos, onde tudo é corrigido sem precisar da atenção do produtor; toda essa modernidade está trazendo está trazendo prejuízos a curto e longo prazo, não só para a sobrevivência e cultura da escrita, mas também para a vida escolar e acadêmica, e é aí que um professor pode fazer a diferença no aprendizado de uma criança ou jovem, não tentar tirar da vida ou demonizar a era digital e suas facilidades, mas trabalhar em propostas projetos que possam inserir o sujeito no universo da escrita, fomentando no mesmo o prazer pela escrita e a sua necessidade, como uma riqueza da humanidade, que muito se evoluiu e não pode ser esquecida como algo descartável.

Escrever bem necessita de esforço e dedicação do aluno e da orientação e mediação segura do professor, por isso a escola e o professor são tão importantes na luta pela sobrevivência da escrita. A escrita à mão é pessoal, é uma forma de se apresentar aos outros, é uma forma de identidade. 

Não é preciso entrar em guerra com o mundo digital, não é preciso escrever um livro, revistas ou músicas, não é preciso tentar fazer dos jovens escritores absolutos, o que é preciso é escrever, e não deixar no esquecimento o valor da escrita e nem perder o encanto de uma palavra escrita belamente em um papel. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

BRASIL. Ministério da educação (Mec). Conselho nacional de educação (CNE). Base nacional comum curricular: educação é a base. [Brasília]: MEC/CNE, [2017] .

Conheça o Brasil-população. IBGE EDUCA. Disponível em http://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-obrasil/populacao/18317/educacao/html .

FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 2011.

FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Traduzido por Moacir Godotti e Lilian Lopes Martins.10 ed. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1985.

JOSÉ, Elisabete da Assunção & Coelho, Maria Teresa. Problemas de Aprendizagem. 12 ed. SÃO Paulo: Ática, 2001.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. 19 ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. 

SANTANELLA, Lucia. Cultura e artes do pós-humano: da cultura das mídias a cibercultura. São Paulo: Paulus,2008.