A SALVAGUARDA DOS DIREITOS AMBIENTAIS COMO ELEMENTO INTEGRATIVO DO MÍNIMO EXISTENCIAL

Alexandre Gazetta Simões

Resumo: O presente estudo busca apresentar uma contribuição à construção de um conceito de mínimo existencial, alocando no rol de direitos fundamentais que devem ser prestados ao ser humano, o direito ao meio ambiente saudável, condição necessária para uma vida digna, como se quer crer. Nesse sentido, constata que o direito fundamental a um meio ambiente sadio fora consagrado como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988, com expressa garantia no artigo 225 e seus parágrafos. E, portanto, é crível a relação entre meio ambiente, dignidade da pessoa humana e mínimo existencial. Propugna-se, portanto, por políticas públicas que garantam a concretização desse direito, fundamentadas na referida normatividade dos direitos ambientais.

Palavras-chave: DIREITOS FUNDAMENTAIS. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MÍNIMO EXISTENCIAL.

Abstract: This study seeks to present a contribution to the construction of a concept of existential minimum, allocating in the list of fundamental rights that must be provided to human beings, the right to a healthy environment, a necessary condition for a dignified life, as we want to believe. In this sense, notes that the fundamental right to a healthy environment as a fundamental right had been consecrated by the Constitution of 1988, with an explicit guarantee in Article 225 and its paragraphs. And so it is believable the relationship between environment, human dignity and existential minimum. Advocates, therefore, for public policies that guarantee the realization of this right, based on that normativity of environmental rights.


Keywords: FUNDAMENTAL RIGHTS. HUMAN DIGNITY. EXISTENTIAL MINIMUM.

1. INTRODUÇÃO.

O tema ambiental está ligado à realidade que vivenciamos em nosso tempo, caracterizado pela sociedade de massa, em que o crescimento desordenado e brutal, viceja em um mundo globalizado.
Por tal razão, alicerçado nos valores que emanam dos direitos humanos, o Estado, cada vez mais fragilizado, em sua soberania, é desafiado, em sua função primordial, qual seja, a aplicação de um modelo de convivência social, que considere os paradigmas de justiça na aplicação das políticas públicas, essas consideradas como instrumento de libertação do homem; adotando como vetor onipresente, a significação da dignidade da pessoa humana.
E justamente nesse contexto, insere-se a temática da garantia de um meio ambiente equilibrado, como requisito mínimo necessário para a vida de qualquer indivíduo.
Justamente, faceando esse horizonte de caos generalizado, a preservação e recuperação ambiental somente é possível quando os imperativos jurídicos desprendem-se dos diplomas normativos e ganham vida nas políticas públicas, gestadas pela consciência ética institucionalizada.
E nessa perspectiva, uma vez garantido o direito a vida, a preservação do meio ambiente correlaciona-se com a dignidade da pessoa humana, na medida em que uma vida digna pressupõe uma vida saudável, que só pode advir de um meio ambiente equilibrado.
Por tal razão, o direito ao meio ambiente sadio deve necessariamente compor o mínimo existencial que possibilita a concretização da dignidade da pessoa humana.
Assim, a preservação do meio ambiente, que propicia a vida e a dignidade da pessoa humana ínsita, como direito positivo, na classificação proposta por Jellinek ; demanda políticas públicas, que se impõem a partir da coerção normativa que deriva do reconhecimento desse direito contido no espectro de direitos fundamentais do homem.

2. O DESAFIO DA PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

Adstrito a essa temática, um desafio inicial apresenta-se. Trata-se, justamente do conceito de dignidade, o qual possui uma acepção ampla e plurissignificativa.
Portanto, como paradigma informativo é necessário valer-se de um viés filosófico-axiológico, de forma a se buscar uma maior densificação jurídica, abarcando uma perspectiva mais ampla; intentando-se atingir o âmago conceitual que abarque o espectro necessário de direitos abrangentes a todos os aspectos da personalidade humana.
Nesse desiderato, clarificando essa significação inicial pretendida, Ingo Wolfgang Sarlet ensina que:

Nesse contexto, costuma apontar-se corretamente para a circunstância de que o princípio da dignidade humana constitui uma categoria axiológica aberta, sendo inadequado conceituá-lo de maneira fixista, ainda mais quando se verifica que uma definição desta natureza não harmoniza com o pluralismo e a diversidade de valores que se manifestam nas sociedades democráticas contemporâneas. Há que se reconhecer, portanto, que também o conteúdo do conceito de dignidade da pessoa humana (a exemplo de inúmeros outros preceitos de contornos vagos e abertos) carece de uma delimitação pela práxis constitucional, tarefa que incumbe a todos os órgãos estatais.

Ainda nesse passo, renovando o intuito de se enunciar tal acepção, a doutrina de André Ramos Tavares explica que:

Dessa forma, a dignidade do Homem não abarcaria tão-somente a questão de o Homem não poder ser um instrumento, mas também, em decorrência desse fato, de o Homem ser capaz de escolher seu próprio caminho, efetuar suas próprias decisões, sem que haja interferência direta de terceiros em seu pensar e decidir, com as conhecidas imposições de cunho político-eleitoral (voto de cabresto), ou as de conotação econômica (baseada na hipossuficiência do consumidor e das massas em geral), e sem que haja, até mesmo, interferências internas, decorrentes dos, infelizmente usuais, vícios.

Assim, traçado um panorama inicial; prosseguindo em nossa caminhada, evidencia-se a doutrina de Ana Paula de Barcellos . Tal jurista defende a necessidade do Estado, em primeiro lugar, ofertar um mínimo social existencial, para, somente então, garantir que todas as pessoas tenham uma existência digna. Assim, segundo o seu ponto de vista, inicialmente, faz-se necessário o atendimento, ao menos, de um núcleo com um conteúdo básico. Nesse sentido, assevera que:

Esse núcleo, no tocante aos elementos materiais da dignidade, é composto de um mínimo existencial, que consiste em um conjunto de prestações materiais mínimas sem as quais se poderá afirmar que o indivíduo se encontra em situação de indignidade.

Por conta dessa concepção, Ana Paula de Barcellos inclui como integrantes desse "conteúdo básico", os seguintes direitos: educação fundamental, saúde básica, assistência no caso de necessidade e o acesso à Justiça.
Por seu turno, o art. 5º, § 1º da Constituição Federal, revela, em sua normatividade, uma imposição aos Poderes Públicos de alicerçar a eficácia máxima e imediata aos direitos fundamentais. Tal postulado busca apregoar a força dirigente da Constituição e o caráter vinculante dos direitos e garantias fundamentais, irradiados aos Estados e reciprocamente a todos os cidadãos (considerados em uma acepção ampla). Nesse sentido, manifesta-se Ingo Wolfgang Sarlet , nos seguintes termos:

Tal se justifica pelo fato de que, em nosso direito constitucional, o postulado da aplicabilidade imediata das normas de direitos fundamentais (art. 5. § 1º, da CF) pode ser compreendido como um mandado de otimização de sua eficácia, pelo menos no sentido de impor aos poderes públicos a aplicação imediata dos direitos fundamentais, outorgando-lhes, nos termo desta aplicabilidade, a maior eficácia possível.

Assim, uma vez concluindo que a dignidade da pessoa humana é um atributo de sua personalidade. E, a par disso, reconhecido o papel do Estado na sua preservação; vem à lume a indagação que lança a dimensão em que essa proteção se dará, no sentido de se estabelecer um patamar mínimo de atuação, sem o qual, a dignidade não se manifestará, aviltando o ser humano detentor dessa.
Desse modo, é necessário evidenciar até que ponto podem os entes públicos deixar de efetivar a concreção das normas constitucionais que disciplinam os direitos sociais e fraternais, na concepção de Karel Vasak , visto que a temática aqui diz respeito aos direitos associados ao meio ambiente saudável, sem que exista ofensa aos direitos subjetivos dos indivíduos protegidos, ante a inexistência de recursos públicos suficientes. E nesse sentido, Guilherme Amorim Campos da Silva é enfático, ao explicar que:

No âmbito do constitucionalismo contemporâneo, a realização dos direitos humanos e dos direitos sociais constitui-se em condição legitimadora de qualquer ordem jurídica estabelecida. (...) A função dos sistemas de direito, na realidade contemporânea, deve ser orientada instrumentalmente para a tradução de princípios e previsões normativas em ações públicas e judiciais vertidas para sua realização. Caracterizando uma concepção antropocêntrica das Constituições modernas e contemporâneas, Häberle identifica nova estrutura de funções e competências estatais, que se encontram a serviço do ser humano.

Portanto, uma vez delimitado o conceito de dignidade da pessoa humana, ainda que impropriamente, caberá ao Estado atuar no sentido de sua concretização coletiva, mesmo que por um prisma principiológico, instrumentalizando o normatizado na Constituição Federal.

3. DAS DIMENSÕES DE DIREITOS FUNDAMENTAIS.

Em uma ótica inicial, pode-se ponderar, quanto à gênese dos direitos fundamentais; que suas principais fontes de inspiração originaram-se no pensamento cristão e na concepção dos direitos naturais.
Entretanto, como explica o professor José Afonso da Silva , a evolução histórica através das várias acepções doutrinárias tem relevante papel na concepção desses direitos, através de reivindicações e lutas sociais.
Traçado esse panorama inicial, conceitualmente, tem-se que os direitos fundamentais do homem constituem-se em situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo (Carta Constitucional), em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana.
De forma ainda mais clara, direitos fundamentais, nas palavras de José Afonso da Silva : "são aquelas prerrogativas e instituições que o Direito Positivo concretiza em garantias de uma convivência digna, livre e igual de todas as pessoas".
São direitos constitucionais, na medida em que se inserem no diploma constitucional.
De outra parte, tem-se que, de forma tradicional, os direitos fundamentais estão classificados em três grandes dimensões, ou gerações. Assim, a doutrina constitucional, majoritariamente, reconhece três níveis de direitos fundamentais.
Cada uma dessas corresponde aos ideais da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade.
Tal elaboração doutrinária advém da concepção do jurista Karel Vasak, que por ocasião da aula inaugural do Curso do Instituto Internacional dos Direitos do Homem, em Estraburgo, no ano de 1979, valeu-se, pioneiramente, da expressão "gerações de direitos do homem".
De antemão, há que se advertir que a referida teoria recebe críticas da doutrina.
Assim, por exemplo, explica George Marmelstein Lima que:

O professor e Juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Antônio Augusto Cançado TRINDADE, durante uma palestra que proferiu em Brasília, em 25 de maio de 2000, comentou que perguntou pessoalmente para Karel VASAK por que ele teria desenvolvido aquela teoria. A resposta do jurista tcheco foi bastante curiosa: "Ah, eu não tinha tempo de preparar uma exposição, então me ocorreu de fazer alguma reflexão, e eu me lembrei da bandeira francesa".
Portanto, segundo Cançado TRINDADE, nem o próprio VASAK levou muito a sério a sua tese.

No entanto, tal classificação doutrinária dos direitos fundamentais do homem fez escola, e vários juristas, encabeçados por Norberto Bobbio, valeram-se dela.
Desse modo, Norberto Bobbio ponderava, valendo-se da referida derivação proposta por Karel Vasak, o caráter histórico e circunstancial dos direitos fundamentais, concluindo pela sua não imediatividade e plenitude; mas sim, como resultado do progresso técnico da humanidade. Ou seja, o direitos "não nascem todos de uma vez. Nascem quando devem ou podem nascer".
E nesse sentido, o filósofo italiano explicava que:

Do ponto de vista teórico, sempre defendi ? e continuo a defender, fortalecido por novos argumentos ? que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos de certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de um vez e nem de uma vez por todas.
O problema ? sobre o qual, ao que parece, os filósofos são convocados a dar seu parecer - do fundamento, até mesmo do fundamento absoluto, irresistível, inquestionável, dos direitos do homem é um problema mal formulado: a liberdade religiosa é um efeito das guerras de religião; as liberdades civis, da luta dos parlamentares contra os soberanos absolutos; a liberdade política e as liberdades sociais, do nascimento, crescimento e amadurecimento do movimento dos trabalhadores assalariados, dos camponeses com pouca ou nenhuma terra, dos pobres que exigem dos poderes públicos não só o reconhecimento da liberdade pessoal e das liberdades negativas, mas também a proteção do trabalho contra o desemprego, os primeiros rudimentos de instrução contra o analfabetismo, depois a assistência para a invalidez e a velhice, todas elas carecimentos que os ricos proprietários podiam satisfazer por si mesmos. Ao lado dos direitos sociais, que foram chamados de direitos de segunda geração, emergiram hoje os chamados direitos de terceira geração, que constituem uma categoria para dizer a verdade, ainda excessivamente heterogênea e vaga, o que nos impede de compreender do que efetivamente se trata. O mais importante deles é o reivindicado pelos movimentos ecológicos: o direito de viver em um ambiente não poluído.

Assim, os direitos de primeira geração correspondem aos direitos e garantias individuais e políticas clássicas, surgidos institucionalmente a partir da Magna Carta, de 1215, espraiando-se nos séculos posteriores, através de documentos históricos, como por exemplo, o documento que consagrou a Paz de Westfália, em 1648; o Habeas Corpus Act, de 1679; o Bill of Rights, de 1688 e as Declarações Americana, de 1776 e Francesa, de 1789.
Constituem-se em direitos de defesa frente ao Estado. Portanto, são direitos que surgem a partir da idéia de submissão do Estado a uma constituição.
Nasceram, historicamente, da necessidade de contenção do Estado frente à pessoa humana. Desse modo, tratam-se de direitos que representavam uma ideologia de afastamento do Estado das relações individuais e sociais.
Portanto, sob tal concepção, caberia ao Estado, tão somente, ser o guardião das liberdades, permanecendo longe de qualquer interferência no relacionamento social.
Por tais razões, os referidos direito são nominados de "liberdades públicas negativas" ou ainda, de "direitos negativos", já que, como mencionado, exigem, do Estado uma postura de abstenção.
Nesse sentido, manifesta-se Paulo Bonavides , nos seguintes termos:

Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
Se hoje esses direitos parecem já pacíficos na codificação política, em verdade se moveram em cada país constitucional num processo dinâmico e ascendente, entrecortado não raro de eventuais recuos, conforme a natureza do respectivo modelo de sociedade, mas permitindo visualizar a cada passo uma trajetória que parte com freqüência do mero reconhecimento formal para concretização parciais e progressivas, até ganhar a máxima amplitude nos quadros consensuais de efetivação democrática do poder.

Quanto aos direitos de segunda geração, os mesmos representam uma etapa de evolução na proteção da dignidade da pessoa humana.
Assim, uma vez conquistados os direitos de primeira geração, o homem passa a lutar pelos direitos de segunda geração; redundando no surgimento do denominado Estado Social.
São inspirados pela Revolução Industrial européia, a partir do século XIX, ante as péssimas condições de trabalho impostas aos operários. Porém, somente são institucionalizados no início do século XX, com o fim da 1ª Guerra Mundial.
Nesse sentido, pronuncia-se Celso de Mello nos seguintes termos:

(...) enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) ? que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais ? realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) ? que se identificam com as liberdades positivas, reais e concretas ? acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de um essencial inexauribilidade.

Tais direitos, portanto, têm, de uma maneira abrangente, como essência, a preocupação com as necessidades humanas. E nesse viés, buscam a satisfação das necessidades primordiais das pessoas, a fim de que se possam alcançar patamares mínimos de existência, desfraldando, em sua marcha, a bandeira da dignidade da pessoa humana, com intento de buscar uma significação maior à vida, que uma sucessão de misérias.
E, no presente contexto, ao Estado não é dado se abster. Ao revés, ante tal estofo axiológico, deverá agir, atuando no sentido de se buscar a superação das carências individuais e sociais, por princípio institucional.
Nesse sentido, Gilmar Ferreira Mendes explica que:

Vinculado à concepção de que ao Estado incumbe, além da não intervenção na esfera da liberdade pessoal dos indivíduos, garantida pelos direitos de defesa, a tarefa de colocar à disposição os meios matérias e implementar as condições fáticas que possibilitem efetivo exercício das liberdades fundamentais, os direitos fundamentais a prestações objetivam, em última análise, a garantia não apenas da liberdade-autonomia (liberdade perante o Estado), mas também da liberdade por intermédio do Estado, partindo da premissa de que o indivíduo, no que concerne à conquista e manutenção de sua liberdade, depende em muito de uma postura ativa dos poderes públicos.

Por tal razão, os direitos de segunda geração são denominados direitos positivos. Possuem, também, a denominação de "direitos de crença", na medida em que trazem em seu bojo, a esperança de uma participação ativa do Estado.
Com relação aos direitos fundamentais de segunda geração, Marisa Ferreira dos Santos explica que:

Os Direitos fundamentais de segunda geração exigem do Estado, ao contrário, um comportamento positivo, ou seja, de fornecimento de prestações destinadas ao cumprimento da igualdade e redução dos problemas sociais. São exemplos de direitos sociais os direitos relativos à Seguridade Social, à subsistência, ao trabalho. Sua presença, porém, tendo em vista a necessidade de meios e recursos, já que se exigem prestações positivas do Estado, esteve relegada, por muito tempo, a normas de caráter programático, situação que vem sendo modificada ao longo do tempo. Já há Constituições, inclusive a do Brasil de 1988, que deram aplicabilidade direta e imediata a certos direitos sociais, conferindo ao indivíduo direito subjetivo de exigir do Estado prestações positivas, como, exemplificativamente, a assistência á saúde (direito de todos e dever do Estado, conforme dispõe o art. 196).

Em síntese, portanto, podemos localizar os direitos de segunda geração nos direitos sociais, econômicos e culturais.
Nesse sentido, Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco explicam que:

Sob essa perspectiva, os direitos econômicos, sociais e culturais, genericamente rotulados como direitos sociais ou direitos de segunda geração, constituem especificações históricas dos direitos humanos tout court, os quais ? ensina mesmo Norberto Bobbio ? nasceram inicialmente como especulações filosóficas na cabeça de alguns homens iluminados; positivaram-se, a seguir, em documentos de âmbito exclusivamente nacional ? como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França, em 1789; e, mais tarde, lograram expandir-se em documentos de abrangência internacional, como a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Organização das Nações Unidades em 1948.

Em outra acepção evolutiva, encontramos os direitos fundamentais de terceira geração; os quais podem ser detectado na convergência de direitos voltados à essência do ser humano, no que tange a sua razão de existir e ao destino da humanidade, sob um viés transindividual.
Tais direitos consideram o ser humano enquanto gênero, não adstrito ao indivíduo ou mesmo a uma determinada coletividade. Estão fundados em um sentimento de solidariedade e fraternidade.
Tem como fundamento ser a pessoa humana correlacionada com o próximo, independentemente de fronteiras físicas ou econômicas. Figuram como mais uma conquista social, que contribuiu para a ampliação dos horizontes de proteção e emancipação da pessoa humana.
Assim, tais direitos são representados pela aspiração da paz mundial, do desenvolvimento econômico, da proteção ao meio ambiente, da proteção do patrimônio comum da humanidade e o direito à comunicação. Modernamente, a doutrina considera tais direitos agregados aos difusos e coletivos.
Modernamente, a doutrina considera tais direitos agregados aos difusos e coletivos.
Nesse sentido, manifesta-se Alexandre Sturion de Paula :

Evidencia-se que os direitos fundamentais de terceira dimensão não representam mais uma utopia, no entanto ainda não guardam a efetividade que se espera para que a solidariedade e a fraternidade, assim como de regra os próprios direito fundamentais não representam mera retórica. Apenas a título de exemplificação, constatamos que, ao passo que o terrorismo e guerras motivadas pelos tanques ianques afrontam os direitos fundamentais apresentados, fatos com a recente tragédia oriunda do maremoto e do tsunami, que causaram milhares de mortes e destruição em grande escala no sul asiático, demonstram que a solidariedade e fraternidade universal estão presentes no consciente das Nações, validando a concreta existência dos direitos fundamentais de terceira dimensão.

Ainda nesse pormenor, em uma temática mais afeta ao meio ambiente sustentável, Paulo Affonso Leme Machado explica que:

O meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo. O direito ao meio ambiente é de cada pessoa, mas não só dela, sendo ao mesmo tempo "transindividual". Por isso, o direito ao meio ambiente entra na categoria de interesse difuso, não se esgotando numa só pessoa, mas se espraiando para uma coletividade indeterminada. Enquadra-se o direito ao meio ambiente na "problemática dos novos direitos, sobretudo a sua característica de "direito de maior dimensão", que contém seja uma dimensão subjetiva como coletiva, que tem relação com um conjunto de atividades ? assevera o Prof. Domenico Amirante.

Em outra passagem, Paulo Affonso Lema Machado , de forma ainda mais enfática, preleciona que:

O caput do art. 225 é antroprocêntrico. "É um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a ?vida e a dignidade das pessoas? ? núcleo essencial dos direitos fundamentais, pois ninguém contesta que o quadro de destruição ambiental no mundo compromete a possibilidade de uma existência digna para a Humanidade e põe em risco a própria vida humana" ? assevera Álvaro L. V. Mirra.

Finalmente, há aqueles que admitem uma quarta geração de direitos oriundos da denominada globalização do Estado neoliberal.
E nesse diapasão, evidencia-se que tais direitos possuem foco na sociedade globalizada; objetivando ampliar os horizontes materiais e intelectuais de todo o ser humano.
Nesse sentido, manifesta-se Paulo Bonavides :

A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos da quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social.
São direitos de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência.

Tais direitos, portanto, propugnam pela necessária proteção de toda pessoa humana a fim de que não ocorra a dominação de um povo por outro, ante o inexorável processo de globalização, que redunda na relativização da Soberania Estatal, com seus consectários legais e axiológicos.
Nesse sentido, Said Maluf explica que:

Atualmente, as nações integram uma ordem constitucional, e, dentro dessa ordem superior, o poder de autodeterminação de cada uma limita-se pelos imperativos da preservação e da sobrevivência das demais soberanias.
Na ordem internacional, essas limitações decorrem das participações dos Estados em organizações internacionais, são justificadas pelas necessidades de coexistência pacífica, segurança e desenvolvimento e são alavancadas pela globalização (...).
A globalização, assim considerada, produz reflexos no conceito de soberania, na medida em que acaba por atingir cada país de forma desigual, na proporção da riqueza, poder, ou desenvolvimento social, econômico e tecnológico de cada um.

Assim, manifesta-se Marisa Ferreira dos Santos , nos seguintes termos: "Os direitos fundamentais constituem, por isso, limites do Estado em relação ao homem, dentro de seu território, e limites de ação dos demais membros do corpo social.".
Por conta desta natureza básica para a própria existência das pessoas, a partir da doutrina de José Afonso da Silva ; aos direitos fundamentais são reconhecidas as seguintes características: Historicidade; Inalienabilidade, Irrenunciabilidade, Imprescritibilidade e Relatividade ou Limitabilidade.
Buscando uma breve enunciação sobre os caracteres dos direitos fundamentais, pode-se argumentar o seguinte. Quanto a Historicidade, verifica-se que os direitos fundamentais, assim como qualquer outro direito, nascem, modificam-se e desaparecem. Como, aliás, já fora referido.
Portanto, os direitos fundamentais têm sua origem ligada a Revolução Burguesa, a partir de onde evoluíram e ampliaram-se.
Assim, tal característica afasta do espectro conceitual dos direitos fundamentais qualquer orientação no sentido de sua origem natural. Idéia fulcrada na essência da pessoa humana ou na natureza das coisas, derivada das concepções jusnaturalistas dos direitos fundamentais do homem.
De outra parte, no que pertine à Inalienabilidade, os direitos fundamentais são direitos intransferíveis e inegociáveis. Tal característica deriva do fato dos direitos fundamentais não possuírem conteúdo econômico-patrimonial.
Assim, uma vez concedidos pela ordem constitucional, seus titulares deles não podem desfazer-se, ante a sua indisponibilidade.
A Imprescritibilidade, por seu turno, caracteriza-se pelo fato do exercício de boa parte dos direitos fundamentais somente ocorrer pelo simples fato de existirem reconhecidos na ordem jurídica; não incidindo sobre eles, o instituto da prescrição.
Essa conclusão deriva do fato de tais direitos não terem conteúdo econômico-patrimonial, e a prescrição não ataca a exigibilidade de direitos personalíssimos.
Desse modo, tais direitos nunca deixam de ser exigíveis.
Assim, uma vez reconhecidos pela ordem jurídica, são sempre exigíveis e uma vez exercidos, não há intercorrência temporal de não exercício que fundamente a perda da exigibilidade pela prescrição.
Por sua vez, quanto a Irrenunciabilidade, os direitos fundamentais, assim como não podem ser alienados, também não podem ser renunciados.
Portanto, podem até não serem exercidos, mas não se admite a sua renúncia.
Finalmente, no que tange a Relatividade ou Limitabilidade dos direitos fundamentais, há que se ponderar considerando sua natureza histórica, a existência de mutabilidade em sua essência.
Portanto, a argumentação no sentido da existência de um caráter absoluto dos direitos fundamentais, não pode mais ser reconhecido.
Assim os direitos fundamentais são relativos ou limitados
Nesse sentido, José Afonso da Silva explicita que:

Quanto ao caráter absoluto que se reconhecia neles no sentido de imutabilidade, não pode mais ser aceito desde que se entenda que tenham caráter histórico. Pontes de Miranda, contudo, sustenta que há direitos fundamentais absolutos e relativos. Os primeiros são os que existem não conforme os cria ou regula a lei, mas a despeito das leis que os pretendam modificar ou conceituar (assim: a liberdade pessoal, a inviolabilidade de domicílio ou da correspondência), enquanto os relativos existem, mas valem conforme a lei (assim: os direitos de contrato de comércio e indústria e o direito de propriedade). É também inaceitável essa doutrina, posto que ela está fundamentada na conhecida opinião do autor sobre a existência de direitos fundamentais supra-estatais, o que não é muito diferente da posição jusnaturalista.

E nesse diapasão, portanto, há que se ponderar que não há nenhuma hipótese de direito humano absoluto, eis que todos podem ser ponderados com os demais.
De outra parte, valendo-se mais uma vez dos ensinamentos de José Afonso da Silva ante o critério do conteúdo, os direitos fundamentais poderão classificar-se: a) direitos fundamentais do homem-individual; b) direitos fundamentais do homem-nacional; c) direitos fundamentais do homem-cidadão; d) direitos fundamentais do homem-social; e) direitos fundamentais do homem-membro de uma coletividade e f) direitos fundamentais do homem-solidário.
Inicialmente, os direitos fundamentais do homem-indivíduo são aqueles que reconhecem a autonomia aos particulares, garantindo iniciativa e independência aos indivíduos frente aos demais membros da sociedade política e mesmo do próprio Estado. Por essa razão são reconhecidos como direitos individuais, ante o teor do artigo 5º da Constituição Federal. São chamados também, de liberdades civis e liberdades-autonomia, correspondendo a liberdade, igualdade, segurança e propriedade.
Direitos fundamentais do homem-nacional são os que tem por conteúdo e objeto a definição de nacionalidade e suas faculdades.
Por sua vez, os direitos fundamentais do homem-cidadão correspondem aos chamados direitos políticos, previstos no artigo 14 da Constituição Federal. Correspondem, por exemplo, ao direito de se eleger e de ser eleito.
Direitos fundamentais do homem-social, por seu turno, constituem os direitos assegurados ao homem em suas relações sociais e culturais, conforme o teor do artigo 6º da Constituição Federal; ou seja, os direitos relativos a saúde, educação, seguridade social, etc.
Quanto aos direitos fundamentais do homem-membro de uma coletividade, tratam-se dos denominados, pela Constituição Federal, de direitos coletivos.
Finalmente, no que toca aos chamados direitos fundamentais do homem-solidário, tratam-se de uma nova classe de direitos fundamentais, chamados de terceira geração, correspondentes ao direito à paz, ao desenvolvimento, à comunicação, meio ambiente, patrimônio comum da humanidade.
Assim, a Constituição Federal, classificou os direitos fundamentais em cinco grupos; especificando, os direitos individuais no artigo 5º; os direitos a nacionalidade, no artigo 12; os direitos políticos nos artigos 14 a 17; os direitos sociais, nos artigos 6º e 193 e ss.; os direitos coletivos, novamente no artigo 5º e os direitos solidários nos artigos 3º e 225 da Constituição Federal.
Quanto à temática ambiental, como referido, a Constituição Federal , estabeleceu, em seu artigo 225, que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

Desse modo, o texto constitucional estabeleceu uma titularidade ampla dos direitos ambientais, de modo a não excluir qualquer pessoa. E nesse pormenor, por sua natureza difusa, aliás, factualmente, os direitos ambientais não se esgotam em uma única pessoa, mas se espraiam por toda a nação.
Nesse sentido, Paulo Affonso Leme Machado explica que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O direito ao meio ambiente equilibrado é de cada um, como pessoa humana, independente de sua nacionalidade, raça, sexo, idade, estado de saúde, profissão, renda ou residência.
O uso do pronome indefinido ? "todos" ? alarga a abrangência da norma jurídica, pois, não particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita que se exclua quem quer que seja.

Ao revés, determinou o dever estatal de defesa e preservação dos referidos direitos; característica própria dos direitos fundamentais, que para existir, prescindem de sua previsão legal, contendo-se na amplitude de sua concreção; daí a importância do agir Estatal, de modo a viabilizar a existência de um meio ambiente sadio.

4. DOS INTERESSES E DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS E SUA INSERÇÃO NA TEMÁTICA AMBIENTAL.

O surgimento da teoria dos interesses transindividuais advém da preocupação com a "questão social", decorrente do surgimento da "sociedade de massa", em que a maioria das relações econômicas e políticas é marcada pelo desaparecimento da individualidade do ser humano, diante da padronização dos comportamentos e das regras correspondentes.
Assim, como conseqüência dessa nova ordem de coisas, desaparece a concepção de que somente são dedutíveis juridicamente as relações entre dois sujeitos de direitos e obrigações claramente definidos.
Tal concepção clássica de relação jurídica passou a não mais corresponder ao anseio por justiça, uma vez que aquelas se transmudaram numa natureza massificada.
Nessa nova concepção social, portanto, as relações jurídicas passaram a constar, em um dos pólos, seres humanos agregados numa mesma categoria, grupo ou classe social, pouco importando os traços que distinguissem cada indivíduo. E, é justamente nesse ponto que decorre a inadequação da fórmula processual individualista, segundo a qual o sujeito de direitos é o titular da relação jurídica material.
Assim, ao final do século XX, o Direito deparou-se, de um lado, com essa nova problemática social caracterizada pela noção comum da coletivização dos conflitos e pela preocupação em proteger interesses pulverizados pela sociedade ou por parcelas sociais dela derivadas.
E, de outro, a evolução dos direitos humanos, privilegiando a sua indivisibilidade, interdependência e complementariedade; o que induziu à criação de novos direitos híbridos, originários da superação dessa distinção absoluta entre direitos civis e políticos e direitos econômicos, sociais e culturais.
Nesse sentido, é justamente nesse ponto que se verifica a gênese de novos direitos humanos tendentes a agasalhar a preocupação do homem com a qualidade de vida no planeta.
Surge, uma nova acepção ética, mais abrangente, fundada em uma justiça de caráter universal.
Dissertando nesse sentido, sob um enfoque dos direitos globais emergentes, Edna Cardozo Dias explica que:

O caminho da justiça social nos leva a uma ética ecológica. Esta é muito mais que a moral. A ética moralista se revelou insuficiente para conter a avalanche de tendências destrutíveis. Ela é criada pela pressão social, enquanto a ética ecológica é criada pela sabedoria indissociada da dimensão do amor e do serviço, pela liberdade de escolha e responsabilidade, pelos valores intrínsecos do certo-errado e pela lei natural. Por ela expressamos o comportamento justo e a maneira correta de o ser humano se relacionar com os outros seres vivos, com o planeta e com seus semelhantes.

Portanto, a sociedade, nessa quadra do desenvolvimento humano no planeta, passa a reivindicar o desenvolvimento sustentado e integrado da espécie humana com a preservação da natureza.
Inobstante, dentro da concepção individualista do Direito Clássico, apesar dos referidos interesses já existirem de há muito, até porque inerentes à natureza humana, os mesmos passavam despercebidos; justamente por se caracterizarem pela inviabilidade de apropriação individual. A título de exemplo: o interesse à pureza do ar atmosférico.
E dentro dessa concepção, chegou-se até a afirmar que se um interesse diz respeito a todos, não se vincula a ninguém, não podendo, por certo, ser objeto de tutela jurídica.
Inobstante, os interesses transindividuais vão se revelando. Mais e mais fazem aflorar temas que têm o homem como centro de referência. Evocam a vetusta noção de direito natural; como deflui, por exemplo, dos interesses advindos da qualidade de vida, da proteção ecológica, do respeito às etnias e minorias; visto que esses se revelam, em última análise, no respeito ao homem enquanto homem; evocando aquela antiga lição. E nesse sentido, KANT se expressa da seguinte forma: "o homem, e, duma maneira geral, todo o ser racional, existe como fim em si mesmo, não só como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade".
E por esse motivo, não é sem razão que José Marcelo Menezes Vigliar, citando MAURO CAPPELLETTI e BRYANT GARTH , assevera que:

Mauro Cappelletti e Bryant Garth, em sua obra ímpar e pioneira (ao menos do ponto de vista sistemático, que demonstra uma preocupação científica na delimitação do conceito dos interesses transindividuais) que discute os problemas do amplo e efetivo acesso à justiça, lembram que "interesses difusos" são interesses fragmentados ou coletivos, tais como o direito ao ambiente saudável, ou à proteção do consumidor. O problema básico que eles apresentam - a razão de sua natureza difusa ? é que ninguém tem o direito a corrigir a lesão a um interesse coletivo, ou o prêmio para qualquer indivíduo buscar essa correção é pequeno demais para induzi-lo a tentar uma ação. (...) Um exemplo simples pode mostrar por que essa situação cria especiais barreiras ao acesso. Suponhamos que o governo autorize a construção de uma represa que ameace de maneira séria e irreversível o ambiente natural. Muitas pessoas podem desfrutar da área ameaçada, mas poucas ? ou nenhuma ? terão qualquer interesse financeiro em jogo. Mesmo essas, além disso, provavelmente não terão interesse suficiente para enfrentar uma demanda judicial complicada. Presumindo-se que esses indivíduos tenham legitimação ativa (o que é freqüentemente um problema), eles estão em posição análoga à do autor de uma pequena causa, para quem a demanda judicial é anti-econômica. Um indivíduo, além disso, poderá receber apenas indenização de seus próprios prejuízos, porém não dos efetivamente causados pelo infrator à comunidade.

Desse modo, em verdade, existe um processo de tomada de consciência geral, no sentido de que os interesses transindividuais representam anseios profundos da comunidade, considerando que tais interesses pertinem aos mais altos valores humanos (como a qualidade de vida, o bem comum, etc.).
Nesse sentido, Rodolfo de Camargo Mancuso pondera, citando Caio Tácito, que:

Uma nova tendência começou a se desenhar, sobretudo, nas duas últimas décadas, no sentido de ampliar o âmbito dos direitos humanos de modo a abranger já não mais apenas os direitos pertinentes a uma ou mais pessoas determinadas, ou até mesmo direitos coletivos de categorias específicas, ligadas por uma relação jurídica básica (como por exemplo, os acionistas de uma sociedade anônima, ou os membros de um condomínio), mas para alcançar os interesses de grupos integrados por uma pluralidade de pessoas indeterminadas, embora vinculadas por um mesmo interesse comum. A vida moderna ressalta a importância de tais direitos que não têm titular certo, mas repercutem decisivamente sobre o bem-estar, ou mesmo a sobrevivência dos indivíduos nos vários segmentos sociais a que pertencem. Aos habitantes de uma determinada região são essenciais as condições do meio ambiente em que se integram (...). A tais valores sociais que são, a um mesmo tempo, peculiares a todo um grupo social e a cada qual de seus membros, consagrou-se o qualitativo de direitos difusos, que passam a merecer a proteção de lei.

Portanto, o despertar para tais direitos representa o resgate de sua análise ontológica no que concerne à concretização da dignidade da pessoa humana, a partir da inserção de tais direitos na idéia de mínimo vital necessário à vida do homem.
Assim, a viabilização de tais direitos exige uma transformação efetiva na estrutura política do Estado.
Nesse sentido, é emblemática a observação de LÚCIA VALLE FIGUEIREDO , a qual aponta a opção da sociedade brasileira pela extensão da tutela constitucional de um plano eminentemente individual para o coletivo, a respaldar a opção político-ideológica de fundar um Estado que pudesse abarcar todas as modalidades de conflito.

5. INSERÇÃO DOS DIREITOS AMBIENTAIS COMO ELEMENTO INTEGRATIVO DO MÍNIMO EXISTENCIAL.

O que se tem visto na história jurídica do homem, se é que se pode emprestar tal denominação à história do direito e a evolução social, é um processo seqüencial e gradativo de institucionalização das aspirações humanas. Aspirações que vão sendo retiradas de um plexo puramente filosófico e vão sendo plasmadas em ordenamentos normativos, alcançado condições para uma concretude material.
E nesse sentido, ante o despertar para a presença dos direitos de natureza coletiva no cotidiano de nossas vidas, bem como. da sua primordial importância para garantia dos direitos fundamentais do homem, o legislador brasileiro deparou-se com a necessidade de trazer para o âmbito do Direito Objetivo os referidos gêneros de interesses transindividuais.
Justamente nessa temática é que se inserem os direitos a um meio ambiente sadio.
Como signo de nossa época, não é sem razão que Miguel Reale constatou que:

A civilização tem isto de terrível: o poder indiscriminado do homem abafando os valores da natureza. Se antes recorríamos a esta para dar uma base estável ao Direito (e, no fundo essa é a razão do Direito Natural), assistimos, hoje, a uma trágica inversão, sendo o homem obrigado a recorrer ao Direito para salvar a natureza que morre

Assim, vislumbrando a fase da degradação ambiental, em espiral cada vez mais densa, evidencia-se, como uma força crescente, os direitos ambientais nos diplomas normativas.
Claro se afigura, a nós, nesses dias, que o direito de viver em um ambiente apto a fornecer a qualidade de vida digna e propícia à sobrevivência de todas das espécies de seres vivos jamais poderia deixar de estar inserido no mundo jurídico.
Esta evolução dos direitos fundamentais do homem consagra uma necessidade latente de manutenção do equilíbrio dos ecossistemas para toda vida, conforme determina o figurino constitucional, a teor dos artigos 1º, III c.c. 6º e c.c. 225 da Constituição Federal.
Nesse sentido, Celso Antonio Pacheco Fiorillo explica que:

No regime constitucional brasileiro, o próprio caput do art. 225 da Constituição Federal impõe a conclusão de que o DA é um dos direitos humanos fundamentais. Assim é porque o MA é considerado um Bem de uso comum do provo e essencial à sadia qualidade de vida.
A concepção "essencial à sadia qualidade de vida" reporta-se aos destinatários da norma constitucional, que somos todos nós. Dessarte, a regra vinculada ao direito ambiental tem como objetivo a tutela do ser humano e, de forma imediata, outros valores que também venha a ser estabelecidos na Constituição Federal.
Por conta dessa visão, devemos compreender o que seja essencial, adotando um padrão mínimo de interpretação do art. 225 em face dos dizeres do art. 1º, combinado com o art. 6º da Constituição Federal,que fixa o piso vital mínimo.

Portanto, a Constituição Federal , no já referido artigo 225 da Constituição Federal, determina em seu teor que:

Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Por sua vez, o art. 5º, § 1º da Constituição Federal, revela em sua normatividade, uma imposição aos Poderes Públicos de alicerçar a eficácia máxima e imediata factível aos direitos fundamentais, uma vez que tal princípio busca assegurar a força dirigente e vinculante dos direitos e garantias fundamentais.
Nesse sentido, manifesta-se Ingo Wolfgang Sarlet , no seguinte teor:

Tal se justifica pelo fato de que, em nosso direito constitucional, o postulado da aplicabilidade imediata das normas de direitos fundamentais (art. 5. § 1º, da CF) pode ser compreendida como um mandado de otimização de sua eficácia, pelo menos no sentido de impor aos poderes públicos a aplicação imediata dos direitos fundamentais, outorgando-lhes, nos termo desta aplicabilidade, a maior eficácia possível.

De outra parte, claro se afigura que a amplitude das ações do Poder Público depende da existência de fontes de custeio. Diz-se, por isso, que os direitos ambientais estão sob os grilhões da chamada "reserva do possível".
No entanto, é necessário evidenciar até que ponto podem os entes públicos deixar de efetivar a concreção das normas constitucionais que disciplinam o direito fundamental a um meio ambiente sadio, sem que exista ofensa aos direitos subjetivos dos indivíduos protegidos, ante a inexistência de recursos públicos suficientes.
Nessa seara, Guilherme Amorim Campos da Silva é enfático, ao explicar que:
(...) O Estado Constitucional pretende que seus textos se façam realidade, que se cumpram ?socialmente?; ?reivindica? a realidade para si: sua normatividade deve converter-se em normalidade.

Assim, considerado como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro, a Constituição Federal, preconiza, em seu artigo 1º, o princípio dignidade da pessoa humana. E, para a efetivação desse preceito, o texto constitucional, em seu artigo 6º, elenca os direitos sociais, tais como: educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, além de assistência aos desamparados.
Tal construção é resultado de uma doutrina que tem como aporte a fase do Direito Constitucional da cidadania, que em seu bojo abarca as fases anteriores, que tiveram como objeto, de uma maneira evolutiva, os direitos civis, econômicos e sociais .
Essa linha de pensamento tem como núcleo a busca da efetividade da Constituição, de modo a que se tenha, em sua integralidade, a concretização dos princípios constitucionais, que agasalham os direitos fundamentais, fulcrados na dignidade da pessoa humana.
O sistema jurídico passa, então, a ser formado por finalidades e valores a serem perseguidos pelo Estado, na concretização da dignidade da pessoa humana.
E nesse pormenor, é necessário que se frise, o ponto caracterizador dos direitos fundamentais deriva, justamente, da intenção de explicitação do princípio da dignidade humana.
Inadmissível, portanto, a existência de normas constitucionais que careçam de efetividade e eficácia, notadamente no caso dos direitos do ambiente, os quais exigem, para sua concretização, uma atuação positiva por parte do Estado.

6. CONCLUSÃO

O princípio da dignidade da pessoa humana, portanto, integra toda a lógica dos direitos fundamentais; sendo que cada direito fundamental, em maior ou menor grau, objetiva a proteção da dignidade humana.
Por seu turno, o direito a um meio ambiente sadio configura-se como direito fundamental da pessoa humana, integrante de um catálogo de direitos que compõem o mínimo existencial necessário a uma vida digna.
Umbilicalmente ligado a essa temática, o Estado, visto como o provedor desses direitos, não pode se negar a concretizá-los, sob a alegação, por exemplo, de déficit orçamentário, escoimando no argumento da "reserva do possível". Ocorre que a base fundante de todo ordenamento jurídico e a razão de ser do Estado é a concretização da dignidade da pessoa humana.
Dessa forma, a efetivação dos direitos ao meio ambiente sadio depende de um padrão uniformizado de atuação dos poderes estatais.
A inércia do Poder Público ou a adoção de medidas parciais, não lograrão êxito em atingir o desiderato constitucional, quanto ao fornecimento de prestações de caráter universal.
Torna-se, portanto, temerário, simplesmente aplicar a Teoria "da Reserva do Possível" em uma conformação pura, ante a realidade social diversa da experimentada nos Países Europeus. Notadamente em um mundo globalizado que se pretende homogêneo, quando, em verdade, apresenta profundas desigualdades sociais e econômicas e geográficas.
Assim, o "Mínimo Existencial" deve ser garantido a todo cidadão a partir de políticas públicas definidas e condizentes com a noção de Estado Democrático de Direito; que prescindam a condicionamentos financeiros. Ao revés, ter-se-á a ineficácia absoluta dos direitos fundamentais, e a falência absoluta dos aparatos estatais.
Permeia a Constituição, como norte para sua implementação, o objetivo maior do bem-estar e da justiça social. Portanto, a exigência de uma maior atuação do Estado mostra-se como um direito subjetivo que não pode ceder passo ao despropósito dos governos; sob pena de comprometer o fim essencial do Estado, qual seja, a concretização da dignidade da pessoa humana de seus cidadãos; que somente poderá ser alcançada, na visão que defendemos nesse trabalho, a partir da salvaguarda de uma meio ambiente indene.

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