Ana Beatriz Viana Pinto                                                                   Érica Lisboa da Silva²
Yuri Frederico³

 

RESUMO

O presente trabalho busca analisar a real eficácia da revista íntima para a segurança das penitenciárias brasileiras. Este é um procedimento que consiste em revistar os órgãos sexuais dos visitantes dos presos para que não escondam em tais lugares objetos cujo regulamento das penitenciárias proíbe a entrada, como drogas, celulares e armas.Contudo, sabe-se que os visitantes não são os únicos que levam esses objetos para os detentos, eis que  o próprio sistema penitenciário brasileiro através de alguns funcionários corruptos facilita este acesso. Além disso, a revista íntima ocorre muitas vezes de maneira abusiva,obstruindo a integridade física dos visitantes e  ferindo a dignidade da pessoa humana, que a Constituição Federal prevê como direito de todos.

 

INTRODUÇÃO

O atual sistema penitenciário brasileiro busca estabelecer segurança, mas a sua tão importante aplicação penal nem sempre é imposta de maneira adequada, pois muito acontece de os direitos humanos dos detentos serem negligenciados, bem como os de suas famílias, que, com a falta de políticas públicas efetivas, são tratadas com estigma e descaso.

A função

O sistema penitenciário brasileiro como forma de estabelecer  segurança nos presídios, adotou a revista intima. Este procedimento objetiva impedir a entrada de objetos cujo regulamento da penitenciária proíbe a entrada. No entanto, além de não ter a eficácia desejada, faz com que os visitantes sintam sua integridade física violada, visto que muitas vezes ocorre de forma abusiva.

A própria corrupção dos funcionários dentro do sistema penitenciário brasileiro facilita a entrada de armas, drogas e celulares dentro dos presídios, enquanto os familiares de presos passam por uma situação vexatória, que fere a dignidade da pessoa humana, um dos pilares da Constituição da República Federativa do Brasil.                       

A revista corporal é, sem dúvida, um instrumento importante para que os agentes que compõe a segurança pública possam agir preventivamente, porém, diante dos avanços tecnológicos, acredita-se existir outras medidas que podem ser tomadas sem que os familiares dos presos sintam sua dignidade obstruída. Esta pesquisa busca fazer uma análise sobre a real eficácia da revista íntima, quais as suas implicações sociais e questionar que outras medidas podem ser tomadas em nome da segurança penitenciária.

1 Surgimento e o sistema de segurança das penitenciárias brasileiras

A Carta Régia do Brasil, em 1769 determinou a construção da primeira prisão brasileira, a Casa de Correção do Rio de Janeiro. Com a Constituição de 1824 as cadeias passaram a ter os réus separados por tipo de crime e penas e as cadeias foram adaptadas para que os detentos pudessem trabalhar.  Desde o início do século XIX começou a surgir um problema que hoje conhecemos muito bem nas cadeias: a superlotação. Já no início do século XX, a prisões brasileiras já apresentavam precariedade de condições, superlotação e o problema da não separação entre presos condenados e aqueles que eram mantidos sob custódia durante a instrução criminal.

 As prisões encontram-se abarrotadas, e a superlotação  “inevitável”  não fornece ao preso um mínimo de dignidade. Todos os esforços feitos  para a diminuição do problema, não chegaram a nenhum resultado positivo, pois a disparidade entre a capacidade instalada e o número atual de presos tem apenas piorado. Além da falta de novos estabelecimentos, muitos detentos se encontram já com penas cumpridas e são esquecidos.  A falta de capacitação dos agentes, a corrupção, a falta de higiene e assistência ao condenado também são fatores que contribuem para a falência. Em 2012, a regeneração dos presos ainda é uma utopia com o retorno para as prisões da grande maioria dos detentos que saíram delas, mostrando que, no Brasil, cadeia não regenera quase ninguém.

Não é novidade nenhuma que as condições de detenção e prisão no sistema carcerário brasileiro violam os direitos humanos, fomentando diversas situações de rebelião onde, na maioria das vezes, as autoridades agem com descaso, quando não com excesso de violência contra os presos. A Constituição Federal prevê, em seu artigo 5°, inciso XLIX, a salvaguarda da integridade física e moral dos presos, dispositivo raramente respeitado pelo nosso sistema carcerário.

As cadeias brasileiras se transformaram em “depósitos” de presos, onde a LEP – Lei de Execuções Penais ou não é cumprida ou é cumprida parcialmente. Se fosse efetivada integralmente, esta lei propiciaria a reeducação e ressocialização da população carcerária atual. No entanto, o que ocorre é que, assim como a maioria das leis existentes em nosso país,

a LEP permanece satisfatória apenas no plano teórico e formal, não tendo sido cumprida por nossas autoridades públicas.

  Os principais problemas encontrados estão: Espaço físico inadequado; Atendimento médico, odontológico e psicológico insatisfatório; Incapacidade da Segurança Pública em manter a ordem e aplicar a lei com rigor sem desrespeitar os Direitos Humanos; Segurança Pública não consegue inibir as atividades do crime organizado; Tortura e maus-tratos, corrupção, negligência e outras ilegalidades praticadas pelos agentes públicos, além da conivência destes às movimentações que redundavam em fugas e rebeliões, inclusive com saldo em mortes de presos; Rebeliões e atentados frequentes nas prisões; Entrada de materiais proibidos que dão apoio ao crime dentro e fora da prisão, tais como aparelhos celulares e armas.

É nesse sistema falido de penitenciárias no Brasil que se busca a ressocialização dos reclusos, que com a falta de condições no mínimo dignas de vida dentro da prisão, ficam ainda mais revoltados, e ao invés de se ressocializar, na maioria das vezes, saem de lá ainda mais preparados para cometer novos crimes. Outro conhecido desrespeito à dignidade da pessoa humana que acontece nas penitenciárias é a revista íntima, procedimento realizado para impedir a entrada de objetos proibidos. Os familiares dos presos que vão os visitar, precisam ficar nus em cima de um espelho e agachar algumas vezes na frente de um agente penitenciário do mesmo sexo. Esse procedimento varia de penitenciária para penitenciária, algumas o realizam de forma mais “rigorosa” e portanto mais abusiva, fazendo com que o revistado sinta-se bastante constrangido e com a sua integridade ferida.                                       

2 Causas e consequências da revista íntima e o estigma atribuído ao preso e seus familiares 

A revista íntima, também conhecida como revista vexatória, consiste no desnudamento dos visitantes dos presos diante dos agentes penitenciários que são responsáveis por realizar esse procedimento.

 Os visitantes expõem suas partes íntimas, tendo que fazer agaixamentos encima de um espelho para comprovar que não carregam drogas, celulares ou armas nas mesmas. Nem sempre são chamados individualmente. Algumas vezes a revista ocorre com varias pessoas na salinha em que acontece. Nenhum dos visitantes escapa deste humilhante procedimento. Os idosos e as crianças também são submetidos a ele. Embora a lei estabeleça que a revista intima só possa ser aplicada para maiores de 12 anos, na maioria das penitenciárias brasileiras, as crianças também são revistadas, inclusive os bebezinhos, que tem as suas fraudas apalpadas.              

O Poder Público alega que a necessidade desta prática tão abusiva que é a revista íntima é para garantir a segurança dos estabelecimentos prisionais brasileiros, em que os detentos comandam crimes que acontecem fora das penitenciárias através de celulares, utilizam drogas e machucam-se e matam-se entre si, com armas a que eles conseguem ter acesso. Acontece que, ainda com a rigorosa revista corporal e íntima que acontece nesses estabelecimentos, eles continuam infestados do mesmo objetos que facilitam a continuidade  do crime. Os próprios agentes penitenciários ajudam o acesso destes objetos aos detentos, ganhando dinheiro em troca.

Os visitantes, sobretudo as mulheres, que são a maior parte na maioria dos presídios, falam sobre as humilhações a que tem que se submeter para visitar seus entes queridos. A revista íntima já é por si uma situação altamente constrangedora e desagradável, e piora com a rispidez dos  funcionários das penitenciárias, que as tratam de maneira grosseira e indelicada, muitas vezes fazendo com que o procedimento se torne ainda mais abusivo.

“Mesmo sendo proibido realizar uma espécie de exame de toque, alguns relatos escapam da boca das mulheres. “A gente tem que agachar três vezes de frente e três vezes de costas. Quando implicam com alguma pessoa é um constrangimento enorme. Daí elas querem que você abra bem as pernas, abrem com a mão, pois elas querem ver lá dentro mesmo”, conta Márcia, que entre términos e voltas com o namorado de 27 anos, enfrenta o final de semana em porta de cadeia há oito.”¹                  

 A autora Yuri Frederico, em sua obra “ Como se estivesse morrendo”, também relata sobre este mal tratamento dos agentes prisionais para com os familiares de detentos. Em sua pesquisa etnográfica realizada na penitenciária de Florianópolis – Santa Catarina,ela entrevista alguns desses familiares que caracterizam o tratamento dos agentes como “desumano” e então conclui:

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