A RELIGIÃO NO BRASIL

 “O brasileiro não crê em Deus, isso é coisa de europeus. Ele sente Deus na pele e por isso está sempre dizendo ‘vai com Deus, fica com Deus...’”

  Leonardo Boff

 “Se, para sermos justos, quiséssemos definir o espírito religioso de nosso povo, teriamos de confessar: religiosidade, muita, religião, muito menos do que parece”.

 Dom Augusto, arcebispo de Salvador (década de 30).

 

Segundo Ferreira (1992), os portugueses que chegaram ao Brasil não compreenderam os índios que aqui encontraram devido à enorme barreira cultural que havia entre eles: houve um diálogo de surdos-mudos desde o início, sendo um momento marcante deste desencontro foi a celebração da primeira missa. Vaz de Caminha narra o episódio ao rei de Portugal do seguinte modo:

 “Enquanto assistimos à missa e ao sermão, estaria na praia outra tanta gente [...] com seus arcos e setas, e andava folgando. E olhando-nos, sentaram-se. E depois de acaba a missa, quando nós sentados atendíamos à pregação, levantaram-se muitos deles e tangeram corno e buzina e começaram a saltar e a dançar um pedaço”.

 Os portugueses entenderam que os índios não tinham cultura e, portanto, também não tinham religião. Caminha chega a escrever ao rei dizendo que os índios poderiam ser convertidos a qualquer fé que se lhes ensinasse.

Outros descobridores também tiveram essas mesma idéia de Caminha: Cristóvão Colombo em sua Nota autobiográfica coloca que, entre os objetivos de sua viagem estaria o de converter os gentios descobertos à fé cristã. Inocência ou hipocrisia? Mais adiante, Colombo escreve: “A melhor coisa do mundo é o ouro; ele é capaz de enviar almas aos céus”.

Assim, também para Portugal, a dominação nas colônias, que era de cunho econômico, baseada na exploração e na dizimação dos nativos, revestia-se de caráter religioso. Instrumento principal desse projeto foi o jesuíta.

A catequização empreendida pelo jesuíta foi mais um elemento de descaracterização da cultura indígena e de destruição da sua identidade, o que se iniciou com a dissolução da unidade tribal.

 
 A ILUSÓRIA CATEQUIZAÇÃO DO AFRICANO

 Com o fracasso da tentativa de escravização do índio, os portugueses iniciam o tráfico de negros de suas colônias africanas.

Segundo Ferreira (1992), já havia miscigenação do português com o africano mesmo nas colônias da África. No Brasil, a mistura de raças (inclusive com prática de poligamia) foi incentivada pela coroa portuguesa como meio de povoar rapidamente a terra, garantindo assim o domínio de Portugal.

A respeito da religiosidade do português, Freyre (p.21) coloca: “Os portugueses viviam um cristianismo lírico, com muitas reminiscências fálicas e animistas das religiões pagãs”. Ferreira (1992), citando Koster sobre a catequização dos negros, coloca:

 “Os africanos importados de Angola são batizados em massa antes de saírem de sua terra e, chegando ao Brasil, ensinam-lhes os dogmas religiosos e os deveres de culto que vão seguir. [...] Os escravos que são importados de outras regiões da África chegam ao Brasil sem terem sido batizados e antes de proceder-se a cerimônia que os deve fazer cristãos é necessário ensinar-lhes certas orações, para o que se concede aos mestres o prazo de um ano, no fim do qual, são obrigados a apresentar os discípulos à igreja paroquial”.

 Isso justifica a expressão “ilusão de catequese” usada pelo autor: por fora os negros eram católicos, mas por dentro, continuavam com suas crenças animistas ou islamitas.

As principais etnias negras trazidas para o Brasil foram os bantus de Angola e sudaneses da Guiné. Esses grupos foram os que mais influenciaram na religiosidade que se veio a formar no Brasil, sobretudo os iorubá ou nagô, cujo culto original se desenvolveu no Brasil e originou o Candomblé e a Umbanda. São remanescentes dos cultos originais os Orixás, bem como as danças e comidas usadas nas religiões, sobretudo no Candomblé.

 AS REDUÇÕES JESUÍTICAS E SEUS OPOSITORES

 Com a chegada de colonos ao Brasil, houve a necessidade de os jesuítas reduzirem o espaço de ação dos índios. Foram então criadas as Reduções, para proteger os índios dos colonos e facilitar a sua catequese. A educação estava reservada aos filhos dos colonos. Os jesuítas instalaram um sistema de educação para formar uma elite dirigente capaz de difundir a fé cristã.

Serafim Leite, na sua História da Companhia de Jesus, Vol. VI, p. 525, coloca que o jesuíta naquele tempo “era um anjo para o índio e um diabo para o colono. Mas a história nos mostra que o jesuíta era um diabo para os dois, pois atrapalhava os planos dos colonos de explorar a terra e, ao mesmo tempo, com a intenção de proteger o índio, acabava por destruir a sua cultura”.

Além dos jesuítas, outras ordens religiosas se estabeleceram nos primeiros séculos do Brasil colônia: os Beneditinos, em 1581 na Bahia; os Franciscanos, em 1585 em Olinda; em 1612 chegaram os frades Capuchinhos. Em 1642 são fundados os primeiros conventos na Bahia: “[...] conventos destinados a moças brancas de famílias ricas e de prestígio. [...] Eram todas servidas por escravas” Ferreira (1992).

Já nesse tempo e nos séculos seguintes, é importante a figura do capelão nos engenhos de açúcar e das confrarias. Essas eram organizações de fiéis que se dedicavam ao culto de um santo em particular, sobretudo no interior, onde não havia sacerdotes. É nesse tempo que surgem as lendas e costumes das “rezas bravas” contra chuvas, pestes, e desgraças em geral.

Dizimado o índio, espezinhado o negro, a organização social e religiosa era organizada em redor da Igreja. Em Casa Grande e Senzala, Gilberto Freyre coloca que:

 “[...] As mulheres grávidas faziam promessas a Nossa Senhora do Parto, do Bom Sucesso, do Ó, da Conceição, das Dores, no sentido de um parto menos doloroso ou de um filho são e bonito. Atendido o pedido, [...] pagava-se a promessa, consistindo esta, muitas vezes, em tomar a criança o nome de Maria, donde as muitas Marias do Brasil [...]”.

 Nelson Omegna (A Cidade Colonial, p. 23) completa:

 “No coração das vilas [...] a igreja marca o ponto alto da vida comunal [...]. Em toda vila, a praça da matriz ficou sendo a área de maior prestígio urbanístico e, por isso, a tomam como expressão da vila toda, ao dizerem que ‘vão à praça’ em vez de dizer que vão à cidade”. [...] A igreja desempenhou um papel “em todos os setores da comunidade, presidindo e condicionando o comportamento, os hábitos, as ideias [...], forrando toda a psicologia dos indivíduos e dos grupos [...]”.

 A LUTA CONTRA AS HERESIAS NO BRASIL

 Ferreira (1992) fala sobre as lutas empreendidas pela Igreja contra as heresias. Por heresias, entendiam-se as várias correntes protestantes que se espalhavam pela Europa e que chegavam também ao Brasil: “Desde o século XVI a caça a heresias foi constante. Por toda parte surgiam suspeitas de eu se espalhava o ‘mal de Lutero’”.

Em 1557, com os franceses, chegam os calvinistas, e em 10 de março é celebrado o primeiro culto evangélico no Brasil. Os protestantes visitavam doentes, liam a Bíblia (o que os católicos não faziam) e pretendiam catequizar os índios. Muitos protestantes, contudo, devido às perseguições, tiveram de voltar para a Europa. Somente no século XIX chegariam ao Brasil novas levas de protestantes missionários para se estabelecerem definitivamente.

 OS JUDEUS NO BRASIL

 Os primeiros judeus chegaram ao Brasil já na expedição de Cabral. Assim como na Europa, houve aqui perseguição aos judeus: a Inquisição que chegou ao país caçava hereges como reformistas, agitadores e principalmente judeus ou quem praticasse o culto judaico. O Brasil, contudo, foi refugio para os judeus uma vez que estes, técnicos da usura, foram fundamentais para o progresso econômico dos portugueses.

 POMBAL E OS JESUITAS

 Em 1769 Pombal, inimigo dos jesuítas, consegue do Papa Clemente XIV a expulsão dos jesuítas e confisco de seus bens. Foi protetor dos judeus.

Nos séculos XVIII e XIX, o Iluminismo europeu chega ao Brasil e muito influencia em sua vida social e religiosa. No início do século XIX, com a chegada da família real e a abertura dos portos, intensificam-se as viagens de estrangeiros e com eles chegam novos cultos acatólicos ao Brasil. Neste tempo também, chegam missionários protestantes e Bíblias ao país.

A Maçonaria é cada vez mais atuante, cumprindo um papel fundamental no cenário político e religioso da nação: organização não-sectária, a Maçonaria apoiou minorias perseguidas e lutou pela implantação de instrumentos jurídicos que favorecessem os não-católicos.

Data desse período o padroado, privilégio concedido pelo Vaticano a um rei. De acordo com esse acordo, o rei de Portugal tinha o controle dos negócios da Igreja na colônia.

Assim, o catolicismo no século XIX foi diferente daquele colonial: houve o desenvolvimento de uma religiosidade popular de um lado, e de um catolicismo de elite de outro. O padre Júlio Maria, historiador deste período, diz que o culto era feito de “cerimônias que não edificam, devoções que não apuram a espiritualidade, novenórias que não revelam fervor, procissões que apenas divertem, festas, enfim, que não aproveitam as almas nem dão glória a Deus [...]”. É uma religiosidade apenas exterior, mais propensa à festa do que ao culto da fé e à observância da doutrina. (Ferreira, 1992).

Euclides da Cunha resume bem a situação religiosa da época ao afirmar: “A religiosidade do sertanejo é como ele, mestiça”. Gilberto Freyre (Sobrados e Mocambos, p. 365) acrescenta: “O catolicismo, cremos ter sido um elemento poderoso de integração brasileira; mas um catolicismo que ao contato com as formas africanas de religião, como que se amorenou e amulatou os santos [...]. De modo que a porta de vidro dos santuários se abriu, no Brasil, [...] para deixar entrar orixás de cajá disfarçados de São Cosme e Damião [...]”.

Em 19 de fevereiro de 1810, Portugal e Inglaterra assinaram o Tratado do Comércio, com cláusulas referentes à liberdade de culto dos súditos ingleses em terras portuguesas. Com esse tratado, os protestantes tiveram livre acesso às colônias e puderam praticar suas religiões livremente. No Brasil, a primeira igreja protestante a chegar foi a Anglicana. Logo depois é a vez da Luterana, que em 1824 se instala em Nova Friburgo no Rio de Janeiro. Com a imigração alemã, essas e outras igrejas protestantes entram no Brasil e se instalam, sobretudo no sul primeiramente, e pouco a pouco se espalham pelo país.

 A BÍBLIA NO BRASIL

 A primeira versão oficial da Bíblia em português data de 1803, tradução feita a partir da Vulgata latina pelo padre Antônio Pereira de Figueiredo. Antes, só havia Bíblias em latim e estas estavam reservadas apenas aos clérigos. Desde os tempos coloniais, o contato do brasileiro com as histórias bíblicas era feito apenas através da arte sacra: imagens de santos, cenas bíblicas pintadas nas igrejas ou esculpidas por mestres como Aleijadinho. O analfabetismo generalizado e as missas rezadas em latim contribuíram para o alheamento do povo questões de doutrina e favoreceu o sincretismo religioso, o surgimento de superstições e lendas. Esse fato também é a causa histórica para o fato de o brasileiro (sobretudo os católicos) não ter o hábito de ler a Bíblia, exceção feita aos protestantes.

A Bíblia só entrou no Brasil graças aos esforços das sociedades bíblicas Britânica e Americana, de confissão protestante. As Bíblias chegavam ao país e eram distribuídas aos montes, havendo grande disputa por parte daqueles que sabiam ler. Junto com as Bíblias protestantes, infiltrou-se no povo uma crescente tolerância religiosa.

A reação da Igreja, porém não foi boa. Vários papas do período, como Leão XII, Pio VIII e Pio IX condenaram as Sociedades bíblicas:

 “Estas engenhosas sociedades bíblicas, que renovam o dolo antigo dos hereges, não cessam de distribuir Bíblias [...] a todos os homens, mesmo os iletrados; Bíblias que foram traduzidas contra as leis da Igreja, e que freqüentemente contêm falsas explicações do texto. Portanto, as divinas tradições, o ensino dos pais e a autoridade católica são rejeitadas, e cada um interpreta a seu modo as palavras do Senhor, e torce seu sentido, portanto caindo em terríveis erros” (Ferreira, p. 78).

 Surgiu nesse tempo a polêmica a respeito de Bíblias falsificadas incitada pela Igreja.

 A QUESTÃO RELIGIOSA

 A Questão Religiosa foi uma disputa entre a Igreja e o governo imperial que teve como móvel a maçonaria. Na base dessa questão estava o padroado, uma troca de favores entre Igreja e Estado: no Brasil, esse acordo concedia ao imperador o direito de escolher bispos e padres para as paróquias, sendo que o governo pagava os eclesiásticos como funcionários públicos. O imperador podia intervir em qualquer questão da Igreja dentro do território brasileiro sem depender de aprovação do Vaticano.

A maçonaria, por seu lado, entrou no Brasil ainda em tempos coloniais, e muito influenciou as suas lutas políticas, reproduzindo aqui os seus ideais libertários. A maçonaria não era contra a Igreja em si, mas a Igreja era contra a maçonaria. Romero, em seu livro Heróis de Batina, p. 167 (apud Ferreira, 1992), comenta que:

 “Paradoxalmente, era do seio da Igreja, a maior inimiga da maçonaria, que saiam os mais ardorosos maçons. [...] Durante quase meio século, pelo menos de 1790 a 1889, a maçonaria fez proselitismo em todas as classes, mas com especialidade na clerical. [...] Era o clero a classe subversiva por excelência, enquanto a Igreja, comprometida com a coroa, defendia os privilégios da classe dominante. Ao mesmo tempo em que ela os defendia, padres e frades batiam-se contra esses privilégios, colocando a fraternidade, a caridade e a justiça social acima da disciplina eclesiástica. [...] Se a Igreja detestava a maçonaria, faziam-se eles, os padres, pedreiros-livres, levando a Loja para dentro da igreja. Se ela era pelo status quo, eles eram pela mudança, pela remoção de tudo aquilo que impedia o bem estar geral e a liberdade individual”.

 Percebemos o contraste entre a posição oficial da Igreja, representada pelos cardeais, bispos e arcebispos, que defendiam os privilégios da elite (como a escravidão dos negros, por exemplo), e os padres, que militavam junto ao povo, radicalmente contra esses privilégios a ponto de filiarem-se à maçonaria.

Guardadas as proporções e as épocas, seria esse fato a semente do que se constituiria, séculos depois, como a Teologia da Libertação.

Houve então grande querela entre Igreja e maçonaria, com interdição de padres maçons e tentativa de proibição das ideias maçônicas por meio da imprensa. Levados à justiça, muitos bispos acabaram presos por desrespeitar as ordens do imperador D. Pedro II e seu Conselho de Estado: embora católico, o imperador foi sempre favorável aos maçons, uma vez que não tolerava a intromissão da Igreja em assuntos de Estado. Mais tarde, concedeu anistia a todos os presos.

A questão religiosa só teve fim em 1889, com a Proclamação da República. O decreto de sete de janeiro de 1890 instituiu a liberdade de culto e a Constituição de 1891 declarou extinto o padroado e a separação definitiva entre Igreja e Estado.

Nesse tempo, a luta pela regulamentação do registro civil e pela obrigatoriedade do casamento civil antes do religioso, empreendida pala maçonaria, provocou mais uma vez a ira da Igreja: até então, os brasileiros tinham apenas os registros de batismo e casamento nas igrejas como documento e certidão de nascimento. Com o fim da monarquia, os maçons conseguiram, ainda, a aprovação pelo novo governo da obrigatoriedade dos registros em cartório civil, houve a laicização plena dos cemitérios, a inelegibilidade dos clérigos, a proibição do voto aos religiosos e a proibição do ensino religioso nas escolas públicas. O alto clero viu nisso mais uma restrição aos seus privilégios (Ferreira, pp. 91, 115-116).

  IGREJAS HISTÓRICAS DO PROTESTANTISMO

 As igrejas históricas protestantes se estabeleceram no Brasil a partir do século XIX. A Igreja Presbiteriana chega ao Brasil em 1859 com o reverendo Simonton.

Simonton teve missão curta, sendo sua obra continuada pelo ex-padre José Manuel da Conceição, convertido ao presbiterianismo pelo reverendo. Esse ex-padre e seu colega George Chamberlain fundaram a escola Americana, em São Paulo, que posteriormente se transformaria na universidade Mackenzie.

A Igreja Metodista se estabelece em 1867, primeiro no Rio de Janeiro e depois em São Paulo. Os primeiros missionários eram migrantes dos Estados Unidos que haviam deixado seu país após o fim da Guerra de Secessão. Esses missionários fundaram também um colégio em Piracicaba que depois se converteria na Universidade Metodista.

Em 1881, chega a Igreja Batista ao Brasil. No início, conta com a adesão de muitas pessoas, inclusive de ex-padres convertidos.

A Igreja Episcopal chegou em 1890 ao Rio Grande do Sul e aí também fundaram escolas.

 CORRENTES CARISMÁTICAS

 Em 1910 chegam dos EUA a Belém Daniel Berg e W. H. Durhan e fundam nessa cidade a Assembléia de Deus. Logo conseguem a adesão de batistas e de ex-católicos a suas convicções. Em poucos anos, o movimento se expande por todo o nordeste e, sobretudo após os anos 50, alcançam todo o país.

Em 1908 chega, também dos EUA, a Congregação Cristã, cuja primeira igreja foi construída em São Paulo. Em pouco tempo, se espalharia pelo Sul de Minas, Paraná e Mato Grosso. Segundo Ferreira (1992, p. 101), “é uma seita cheia de exigências e exclusivismo. Praticam jejum, [...] repelem o casamento misto, condenam a moda, as mulheres não cortam o cabelo e usam véu durante o culto [...]”.

Em 1950 é fundada em S. João da Boa Vista a Igreja do Evangelho Quadrangular, uma dissidência carismática da Igreja Presbiteriana. A Igreja do Evangelho Quadrangular ficou conhecida como tenda da cura divina, uma vez que prometia a cura por meio da unção de Deus. Cresceu rapidamente em todo o país.

Os movimentos carismáticos não ocorreram apenas nas Igrejas protestantes tradicionais. A Igreja católica iniciou uma renovação carismática caracterizada pela preocupação com a renovação interior e não com renovação social, uma vez que seus membros são da classe média e média-alta (Ferreira, 1992, p. 102).

Ao lado das Igrejas tradicionais e das Igrejas carismáticas, Ferreira (1992) cita ainda algumas “heresias cristãs” que compõem o cenário religioso nacional: Adventistas do Sétimo Dia, Testemunhas de Jeová, Mórmons, Ciência Cristã, Meninos de Deus, Rearmamento Moral, etc.

Mais recentemente, têm surgido novas igrejas consideradas como seitas que têm crescido rapidamente entre a população, sobretudo a de nível sócio-econômico-cultural mais baixo.

Houve no final do século XIX e início do XX tensões entre a Igreja católica e as protestantes por questões doutrinárias e por disputas por fiéis. Após o Concílio Vaticano II, as deliberações conciliares mudaram as relações da Igreja com os protestantes, agora entendidos como “irmãos separados” (Ferreira, p. 112).

 RELIGIÃO NO BRASIL DO SÉCULO XX

 Segundo Ferreira (1992), as mudanças sociais e políticas e o progresso das ciências no século XX ocasionou radical mudança de postura nos fiéis de todas as religiões, sobretudo das historicamente tradicionais, como a católica.

Relativismo, globalização e economia de mercado estão na base da secularização crescente da sociedade e da desvalorização da vida religiosa tradicional.

 O ESPIRITISMO NO BRASIL

 Fundado na França em 1857 por Kardec, o Espiritismo chegou ao Brasil em 1869. Várias publicações espíritas são fundadas em vários pontos do país, sobretudo no Rio, em São Paulo, em Minas e na Bahia. A propaganda espírita consegue, no fim do século XIX e primeiras décadas do XX, adeptos em todas as camadas sociais, mas, sobretudo no meio intelectual.

 Ferreira (1992, p. 122) comenta:

 “Pode-se dizer, pois, que no séc. XIX o Espiritismo já existia em nossa pátria, ainda que não aparecesse em estatísticas sobre religiosidade. Só em 1940 vem a aparecer a existência de quase meio milhão de espíritas suficientemente decididos a se inscreverem como tais no recenseamento. É sabido que há muitos socialmente católicos que se batizam e se casam na Igreja Católica, porém que aceitam ideias espíritas e suas atitudes tolerantes”.

 Hoje, após o sucesso dos 412 livros de Chico Xavier e de outros tantos espíritas eminentes, os centros Kardecistas somam mais de 5000 em todo o Brasil. Segundo dados do último senso, são mais de 20 milhões os espíritas brasileiros hoje (ÉPOCA, 2003).

 AS RELIGIÕES AFRO NO BRASIL

 Das religiões afro no Brasil, podemos destacar o Candomblé, a Umbanda e a Quimbanda entre as mais significativas. Dentre elas, o Candomblé é a que mantém a maior parte das características culturais, lingüísticas e religiosas originais vindas da África com os escravos. Dentre esses elementos destacam-se o culto dos Orixás, suas festas, comidas e vestimentas. Existe uma população bastante grande de filhos de Santo no Brasil que, hoje, tem atraído a atenção de africanos que vêm ao país para conhecer e resgatar traços antigos de sua cultura já desaparecida em muitos lugares da África.

A maior concentração de terreiros de Candomblé está nos Estados do Rio, Bahia e Pernambuco (há cerca de 2000 terreiros de Candomblé só na cidade de Salvador).

A Umbanda é uma religião sincrética que mistura elementos de vários segmentos de religiosidade africana com elementos católicos, espíritas e residualmente indígenas. Estudiosos vêem o sincretismo de Umbanda como resultado da tentativa fracassada de descaracterização do negro pela ilusão de catequese católica no tempo da escravidão. Houve, com o tempo, a mistura das religiões negras com o catolicismo popular brasileiro (que também não coincidia com o de Roma) e, posteriormente com elementos espíritas, vindo a dar em diferentes formas de culto sincrético conhecidos genericamente como Umbanda. Outros países que receberam escravos como Cuba, Haiti e Estados Unidos também desenvolveram religiões sincréticas equivalentes à Umbanda brasileira.

O umbandista típico geralmente é de classe média ou média-baixa, não necessariamente negro, geralmente batizado na Igreja católica, sendo católico não praticante ou esporadicamente praticante, que tem sua formação religiosa constituídas principalmente de leituras kardecistas e de prática da ritualística de Umbanda, como religião, e de práticas católicas como atos sociais (batizados, casamentos, enterros). Como a maioria dos fiéis de Umbanda é de classe social mais baixa do que a dos espíritas kardecistas, a religião é preconceituosamente chamada de “baixo espiritismo”.

 OUTRAS CONFISSÕES RELIGIOSAS

 Com os migrantes do início do século XX, sobretudo turcos e japoneses, temos a entrada de religiões orientais no Brasil: o Islamismo, o Xintoísmo, o Budismo, o Confucionismo, o Hinduismo e o Taoísmo, praticados em menor escala nos grandes centros urbanos do país.

 Para concluir

 Segundo Cupertino (1976), falando sobre a religiosidade do brasileiro, uma dose de sincretismo religioso é comum num país de formação heterogênea como a brasileira. Se a religião católica, imposta desde o início, é vista como a religião “oficial” da maioria, essa mesma maioria não a sente como sua única. O brasileiro não tem a noção de pertinência religiosa como ocorre com o europeu. Sua formação doutrinária é vaga e difusa, incluindo elementos diversos e por vezes contraditórios. É comum encontrarmos pessoas que vão à igreja e que também visitam o centro espírita, o terreiro de Umbanda ou vão a um culto protestante ou evangélico, sem que isso provoque conflito doutrinário em sua cabeça. O brasileiro vive uma religiosidade independente de religiões.

 Benedito Fernando Pereira

Licenciado em Letras (Univás), Bacharel em Filosofia (FACAPA), graduando em História (Univás) e pós-graduando em Ensino de Filosofia (FACAPA).

 REFERÊNCIAS

 FERREIRA, Júlio Andrade. Religião no Brasil. Campinas: LPC Publicações, 1992.

 CUPERTINO, Fausto. As muitas religiões do brasileiro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1976.

 DAMATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

 VIEIRA, David Gueiros. O Protestantismo, a Maçonaria e a Questão Religiosa no Brasil. Brasília: UnB, 1980.