A qualidade necessária

Não podemos permanecer apenas nos reunindo e falando sobre os problemas. É necessário refletirmos sobre a nossa pratica de professores, que alguns chamam de educadores. É preciso analisar o que queremos com o nosso SER PROFESSOR. O que nos leva a ser o que somos? Ou não somos o que dizemos ser?

Primeiramente precisamos nos lembrar que não somos apenas profissionais de educação, mas colaboradores num processo de formação de homens e mulheres. Somos co-responsáveis pelo futuro de jovens que diariamente param à nossa frente para nos ouvir. Mas pecamos contra esse futuro quando queremos que apenas nos ouçam. Como professores, precisamos falar, pois professor é aquele que "pro-fere" (fala diante de). E se supõe que quem se propõe a falar diante de uma classe de alunos tenha algo que professar É inconcebível um professor que não tenha conhecimentos a serem partilhados. Assim sendo, se não tens o que dizer não se faça professor!

Por outro lado, e para podermos direcionar o nosso "professar" precisamos, também, saber ouvir o que dizem os alunos. Não é redundância lembrar que uma das acepções do vocábulo latino, aluno, significa "sem luz" e, portanto, receptivo à luz da fala daquele que se coloca à sua frente, o professor; o aluno é aquele que se coloca na posição de quem aprende. Isso implica dizer, também, que o próprio professor é um aprendiz, ou não é professor!

Daí vem o segundo ponto de reflexões, não menos importante que o primeiro. Como professores não somos senhores absolutos da verdade. Temos muito que ensinar – ou não seriamos professores. Mas com qual metodologia? Precisamos, portanto, rever nossa mentalidade, nossas posturas, para evitarmos o risco de nos considerarmos semi-deuses e subirmos em um pedestal de onde os alunos (os sem luz) virão nos adorar e beber da fonte do nosso saber. Reformular nossa maneira de pensar significa nos fazermos acessíveis aos nossos alunos. Acessíveis não só ao nível da linguagem (falar e explicar de forma clara), mas principalmente como amigos. O processo do ensino aprendizagem não é uma guerra em que vence o que tem maior poder de fogo, mas uma relação de complementaridade em que o professor se complementa no aluno (só é possível falar a alguém quando tem alguém para ouvir!) e o alunos se complementam no saber do professor (só pode ser aprendiz quem não sabe, pois aquele que já sabe já aprendeu!)

E assim chegarmos a um terceiro ponto de reflexão. Algo que é fundamental em nossa ação neste caminho de amizade. Não entramos em uma sala de aula APENAS pelo salário (Exigimos remuneração condigna, mas isso não é tudo!). Da mesma forma que um médico que trabalhasse apenas pelos seus honorários seria um assassino, o professor que assim procedesse seria mercenário. Da mesma forma que é inconcebível a prática de um médico que não queira, urgentemente, a cura de seu paciente, é impensável o professor que não deseje a aprendizagem de seu aluno. E justamente por isso é que precisamos ser exigentes. Exigir que nossos amigos (alunos) saiam da escola sabendo aquilo que ensinamos. Não podemos permitir que nossos alunos tornem-se profissionais medíocres porque fomos relapsos ao ensinar. Temos que ensinar, portanto, com a qualidade de exigir qualidade de aprendizado. Havendo aprendizagem acontece, conseqüentemente, aprovação.

Neste ponto reside a grande questão. Como professores, como amigos e como profissionais que prezamos nossa ação de ensino, não podemos consentir um sistema escolar que privilegia as estatísticas. Temos visto nosso país representando um feio papel diante dos organismos internacionais. A quê se deve isso? Às políticas das estatísticas: inconcebivelmente nós professores cedemos às políticas que desejam altos índices de aprovação, mas não cobram altíssimos índices de aprendizagem. Somos obrigados a ceder às pressões que nos fazem nos finais de bimestres, de semestres, de ano letivo, quando nos cobram índices de aprovação sem nos cobrar aprendizagem! Com aprendizagem há aprovação, mas a política dos índices de aprovação não está preocupada com a aprendizagem.

Prova isso o fato de que tempos atrás a "média" para aprovação era sete. A necessidade de altos índices de aprovação abaixou a média para seis.

Por esse motivo vemos alunos serem aprovados sem conhecimento. Chegam e saem das escolas, analfabetos. Não porque não haja trabalho do professor, mas porque existe um sistema malformado, mal intencionado. Levantem as mãos, os professores, sérios naquilo que fazem, que nunca tenham sido, de alguma forma pressionados para aumentar seu "índice de aprovação". Qual professor que nunca ouviu, depois de uma reunião de "conselho de classe", comentários como: "seus alunos estão com nota muito baixa, professor", ou "mas todos esses não alcançaram a média?". Evidenciando que existe preocupação em alcançar a média e não com a aprendizagem, pois, repetindo, quem aprende tem nota, até acima da média. Não podemos nos esquecer que a média é medíocre.

Podemos assim voltar à questão: o que queremos com nosso ser professor? Como anda nossa capacidade de ouvir as aspirações de nossos alunos? Estamos buscando novos conhecimentos, mantendo-nos atualizados? Ou nos acomodamos na aprovação mediana exigida pelo sistema que só quer estatísticas? Com que metodologia ensinamos? Para onde estamos conduzindo nossos alunos?

Não nos esqueçamos que a dimensão educativa da ação do professor depende do que se chama ensino-aprendizagem. É por meio dela é que atingiremos a qualidade necessária.

Neri de Paula Carneiro

Filósofo, Teólogo, Historiador