A Pragmática.

Conceitos: Fundamentação e Aplicabilidade

Resumo: A “dependência do contexto” é um dos pontos centrais nas várias abordagens pragmáticas (o estudo da linguagem do ponto de vista de seus usuários). Mas, verifica-se que os requisitos básicos para se constituir uma noção de contexto não são absolutamente determináveis, embora afetem de forma relevante todas as formas de interações. É necessário, portanto, alterar a perspectiva em que a noção é tradicionalmente encarada. A pragmática está além da construção da frase, estudado na sintaxe, ou do seu significado, estudado pela semântica. A pragmática estuda essencialmente objetivosda comunicação. Ao analisar a Pragmática, deve-se fazer uma contextualização histórica, que permita compreende-la em toda a sua extensão.

Palavras chaves: pragmática, linguagem

Abstract: The "context dependence" is one of the central points in several pragmatic approaches (the study of language from the point of view of its users). But it turns out that the basic requirements to be a notion of context are not absolutely determinable, although materially affecting all forms of interactions. It is therefore necessary to change the perspective in which the notion is traditionally seen. Pragmatics is beyond the sentence construction, studied in the syntax, or its meaning, studied by semantics. The study essentially pragmatic objetivosda communication. Analyzing the Pragmatic, we do a historical context, allowing understand it in all its extension.

Keywords: pragmatic, language

Introdução:

Pragmática é o ramo da linguística que estuda a linguagem no contexto de seu uso na comunicação. As palavras, em sua significação comum, assumem muitas vezes outros significados distintos no uso da língua e, mais recentemente, o campo de estudo da pragmática passou a englobar o estudo da linguagem comum e o uso concreto da linguagem, enquanto a semântica e asintaxe constituem a construção teórica.  A pragmática, portanto, estuda os significados linguísticos determinados não exclusivamente pela semântica proposicional ou frásica, mas aqueles que se deduzem a partir de um contexto extra-linguístico: discursivo, situacional, etc.

A capacidade de compreender a intenção do locutor é chamada de competência pragmática. A pragmática está além da construção da frase, estudado na sintaxe, ou do seu significado, estudado pela semântica ela estuda essencialmente os objetivos da comunicação.

Desenvolvimento:

A Pragmática pode ser definida como uma disciplina capaz de sistematizar os aspectos mais importantes de um contexto para que os elementos indiciais pudessem ser interpretados semanticamente. Esta definição, embora mantenha a Pragmática como área de pesquisa ligada à Semântica, ou seja, sem autonomia, representa, pelo menos, uma disciplina linguística. Dentro das linhas transformacionalistas, havia uma tendência de identificar a Pragmática como uma teoria de performance, dedicada, exclusivamente, ao uso da linguagem, sem competência para tratar da estrutura linguística. Essa posição, embora tenha representantes qualificados, até hoje, não foi muito desenvolvida, tendo em vista apresentar dificuldades difíceis de serem superadas como, por exemplo, a determinação da fronteira entre gramática independente do contexto e interpretações dependentes de contexto.

Pelo contrário, os especialistas em fenômenos pragmáticos estão, especialmente, interessados na relação entre as estruturas linguísticas e os princípios do uso da linguagem.

Nesse sentido, uma definição ampliada daquela sugerida por Bar-Hillel (1954) poderia ser esta: “A Pragmática é o estudo daquelas relações entre linguagem e contexto que são gramaticalizadas, ou decodificadas na estrutura da linguagem.” (S.Levinson. Pragmatics, p.9)

Essa definição abre um pouco mais o espectro da Pragmática porque, através dela, não só os fenômenos dêiticos, mas a pressuposição e os atos de fala poderiam ser abordados. Quanto a isso, embora essa definição seja bastante razoável, ela excluiria do objeto da Pragmática os fenômenos conhecidos, depois de Grice (1967), como implicaturas, e que são, indiscutivelmente, interessantes na análise da significação lingüística. Além disso, muitos problemas decorrentes da necessidade de se distinguir uma simples correlação entre formas linguísticas e contexto dos casos em que os fatores contextuais são absorvidos, organicamente, na estrutura linguística. Isso sem contar o fato de que as línguas particulares podem codificar de forma diferente os elementos contextuais, o que exigiria uma Pragmática universal, distinta daquela, para línguas específicas.

Stalnaker (1972) defendeu uma definição semelhante, então mais ampliada. Para ele o mais importante é fornecer uma lista de problemas que exigem a intervenção de uma teoria pragmática. Essa teoria seria, assim, o estudo da dêixis, da pressuposição, da implicatura, dos atos de fala e aspectos da estrutura do discurso. Para Stalnaker, a Sintaxe estuda as sentenças, a Semântica estuda as proposições e a Pragmática investiga o estudo dos atos linguísticos e dos contextos nos quais são executados. Seria necessário definir os tipos relevantes dos atos de fala como os ilocucionários, por exemplo, bem como caracterizar os traços do contexto, indispensáveis para determinar a proposição como, por exemplo, os indiciais. Stalnaker não pretende, no caso, dar autonomia à Pragmática, mas garantir-lhe um espaço teórico, mediante o levantamento de fenômenos linguísticos, inequivocamente dependentes de contexto.

Uma outra tendência bastante significativa e que permite ajustar a pragmática dentro de uma teoria da linguagem é defendida por linguistas como Van Dijk (1976). Assim como a Semântica se estabelece no estudo das condições de verdade, a Pragmática poderia ser definida em relação às condições de adequação.

Ela seria assim, o estudo da competência comunicativa, ou seja, da habilidade dos falantes em usar sentenças adequadas a um determinado contexto. Essa posição, porém, se defronta com vários problemas. Não permite a distinção clara entre Pragmática e Sociolinguística, contínua, como no modelo de Chomsky, na dependência de uma língua ideal ou teria que se desdobrar em diversos tipos para abranger cada dialeto. Além disso, finalmente, não seria capaz de explicar os fenômenos pragmáticos em que a quebra de regras conversacionais é, exatamente, a maneira intencional de informar algo mais.

Mais recentemente, uma definição tem sido bastante discutida nos meios linguísticos e filosóficos. Deve-se, em sua origem, a G. Gazdar (1979).

 Para ele, a Pragmática é igual ao significado menos as condições de verdade. Nesse trabalho, a posição de Gazdar, aparentemente simples, é uma das mais significativas dentro das reflexões contemporâneas sobre a definição do objeto da Pragmática. Na sua concepção, a Semântica das Condições de Verdade é, das teorias semânticas, a mais aceitável e, portanto, uma tentativa de esclarecer o campo da Pragmática. Deve considerar o significado como um complexo de fenômenos em que a questão da proposição e das condições de verdade se distingue dos outros aspectos significativos.

 A Semântica do tipo Tarski para a linguagem natural continuaria, como o que deseja Davidson (1970), em sua caminhada de poucas, mas rigorosas, conquistas teóricas, e a Pragmática ficaria encarregada dos outros aspectos que compõem o significado de um enunciado.

Dessa forma, considerando-se o enunciado como: “Até Tancredo gosta de Brizola”, observa-se que as condições de verdade são as mesmas para o enunciado, porém, parece dizer que, além de Tancredo, outras pessoas gostam de Brizola e que ele, Tancredo, não seria o mais provável a ser atribuído esse sentimento.

Caberia à Semântica, então, considerar as condições de verdade e deixar para uma teoria pragmática a descrição e a explicação do excesso de significado.

Gazdar(1979) entende, também, que é muito difícil tratar a Semântica de maneira autônoma. Ele demonstra que o mesmo enunciado pode apresentar proposições falsas ou verdadeiras, de acordo com as informações do contexto.

Esse tipo de abordagem também depende, obviamente, de uma conceituação clara de “contexto”. Trata-se, então, de caracterizá-lo, teoricamente,  nas suas propriedades, bem como nas propriedades que decorrem das relações dos interlocutores com ele.

Lewis (1969) e Shiffer (1972) identificam a noção de “contexto” com a de

“conhecimento mútuo”. Aqui, entretanto, ele não é visto, apenas, como conhecimento compartilhado em que o código linguístico é comum a A e B. Se fosse assim, estaríamos de volta ao modelo estrutural e à noção de “Langue” em Saussure. O conhecimento mútuo, enquanto contexto de um enunciado, diz respeito à intersecção de base linguística e pragmática que permite a A e B reconhecerem-se em estado de comunicação, ou seja, compreenderem-se reciprocamente no que é dito e no que é inferido.

Este conceito de conhecimento mútuo tem tido muitos defensores e também muitas críticas. Para Sperber e Wilson (1982), um dos primeiros problemas que surgem está na dificuldade de distinção entre o conhecimento mútuo e o que não é mútuo. Como se observa, na realidade, os interlocutores não podem, numa quantidade limitada de tempo, processar um conjunto infinito de informações, e uma teoria precisa de um modelo restrito que dê conta desse fenômeno, mediante procedimentos finitos. Além disso, não são raros os casos em que contexto e conhecimento comum não se identificam, conforme estes enunciados demonstram: “Eu vou votar no candidato socialista”, “Eu vou votar no candidato que está falando agora”. O enunciado não parece ser de difícil compreensão, embora o conhecimento mútuo seja mais difícil de estabelecer indutivamente.

É possível observar que, na relação do conhecimento mútuo com o contexto, parece haver dois problemas fundamentais:

1 - O conhecimento mútuo não é condição suficiente para pertencer ao contexto.

2 - O conhecimento mútuo não é condição necessária para pertencer ao contexto.

Dizer que o conhecimento mútuo não é condição suficiente para ser pertencente ao contexto implica dizer que uma proposição pode ser mutuamente conhecida sem fazer parte do contexto. Uma sentença que possua uma expressão como “a casa” pode ser perfeitamente entendida, e a referência pode ser procurada no contexto, sem que o conhecimento mútuo que os interlocutores tenham sobre as referências de diversos casos intervenham. Isto quer dizer que o contexto real usado na compreensão de uma sentença pode ser bem menor que o conhecimento comum ou mútuo.

Além disso, uma proposição pode pertencer ao contexto sem ser mutuamente conhecida. Parece claro que a perfeita compreensão de um enunciado exige o conhecimento mútuo como condição necessária, mas a comunicação diária permite uma forma imperfeita que é entendida como suficiente para aquela situação.

Imagine um diálogo entre dois políticos, Fernando Henrique Cardoso (FHC) e Paulo Maluf, em que aquele, acreditando que este não tem um avião próprio, pergunta de qualquer maneira para incomodá-lo:

“ – Você tem viajado muito no seu avião particular?” e Maluf que, realmente, tem um avião próprio, responde: “– Só quando viajo por motivos oficiais.”

Fernando Henrique Cardoso, nesse momento, infere que estava enganado e que Maluf tem um avião. Nessa situação os interlocutores estão sendo levados a assumir algo como conhecimento mútuo, sem que isso tivesse sido condição necessária para o entendimento. Pelo contrário, foi o entendimento que gerou o conhecimento mútuo.

A partir de contra exemplos como esse, Sperber e Wilson (1982) propõem, então, um modelo pragmático próprio, ainda como teoria da compreensão.

Para eles, seria possível aproveitar algumas das sugestões de Grice (1975), para organizar um sistema mais simples e rígido de abordagem pragmática que o daquele filósofo, sistema esse em que o conceito de relevância é proposto como uma espécie de máxima geral e única, através da qual uma inferência quase dedutiva, pode ser calculada a partir da relação entre um enunciado e um contexto.

Esse tipo de inferência não trivial é denominado por Sperber e Wilson de

“Implicação Contextual”, já que se trata de um dos modelos mais recentes e interessantes de pragmática, cabe um exemplo ilustrativo de cálculo de uma implicação pragmática.

            Do ponto de vista comunicacional, o slogan político pode ser considerado, em primeiro lugar, quanto às propriedades linguísticas e comunicativas do slogan, depois, quanto à propriedade do político e, finalmente, quanto às possibilidades comunicativas do conjunto.

Conclusão

Pode-se perceber, que os problemas do significado em linguagem natural devem ser tratados a partir de duas disciplinas interdependentes: A Semântica das Condições de Verdade, como uma tentativa do modelo de Tarski para as questões da referência, e a Pragmática, como uma mescla de lógica não trivial, parcialmente dedutiva, para as questões do sentido, dito ou implicado. É preciso que se diga: fenômenos de significação em linguagem natural requer um tratamento rigoroso, mas não simplificatório, sob pena de um logicismo improdutivo. As inferências são multiformes e abordá-las requer modelos mais flexíveis e criativos.

Nessa perspectiva, pode-se assumir que a Pragmática não é, efetivamente, um paradigma de investigação formalizado, mas um candidato fortíssimo a provocar uma revolução teórica no sentido do sempre oportuno.

Referências Bibliográficas:

BAR-HILLEL, Y. Expressões Indiciais . In: Dascal, M. (org.) (1982). pp. 23-49.

GAZDAR, G. (1979). Pragmatics: Implicature, Presupposition and Logical Form. New York: Academic Press.

GRICE, H. P. (1957). Meaning. Philosophical Review, 67. Reprinted in

Steinberg Jakobovits (1971: 53-9) and in Strawson (1971: 39-48).

______. (1975). Logic and Conversation. In: Cole & Morgan (1975: 41-58). (part of Grice - 1967). (Trad. Port. Geraldi, J, W. 1982: 81-103) In: Dascal (ed.) 1982.

LEWIS, D. (1969). Convention. Cambridge, Mass.: Harvard University Press.

______. (1972). General Semantics. In: Davidson & Harman (1972: 169-218).

PINTO, J.P. Pragmática. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C. (orgs.) Introdução à Linguística. São Paulo: Cortez, 2004

VAN DIJZ, T. A. (1972). Some Aspects of Text-Grammars. The Hague: Mouton.