Uma praça boa perto de casa, para onde se pode ir a pé. Em volta da pracinha, estabelecimentos em geral dão vida e movimento ao lugar. Quitanda, açougue, botequinho, padaria, farmácia, etc. Na praça, lugar para crianças brincarem, bancos para descansar, ler um jornal, pintar uma aquarela, gramados, alguma coisa com água, tipo uma fonte, chafariz, um riozinho. Vem um pipoqueiro, tem uma barraquinha de cachorro quente, um carrinho de sorvete, um vendedor de balões. Pode ter cinema, teatro. Igreja, biblioteca. Escola, curso. Escritórios, lojinhas. Tem

3 configurações básicas, em U, em L e I.
Praças boas assim não existem em quantidade, podiam existir mais. Cada quadra podia ter uma. Nem precisa ser grande, desde que seja pública, tenha um bom acesso, e principalmente não tenha muito carro circulando nela. Nas cidades pequenas sempre tem uma praça assim.
Será que não se pode querer ter praças assim na cidade grande? Quem deveria fazer? Bem, em princípio, parece lógico pensar que seria o governo. Mas pode ser feito por iniciativa privada também. Ao ceder essa área livre ao público, a área em torno se valoriza. Afinal, todos querem ter qualidade de vida.

Imagine um velhinho, aposentado. Pode ficar em casa assistindo televisão o dia inteiro, porque não tem para onde ir. Se na frente da casa dele tiver uma pracinha com um banco, um joguinho de damas ou dominó, com certeza vai freqüentar. Vai ler um jornal, ver o movimento das pessoas, das crianças. A vizinhança pode ter mais contato, a praça propicia o encontro social, a paquera, o footing. Mas quem vai tomar conta disso?

Tinha de ser o governo, mas também pode ser uma associação comunitária. Tem tanta gente chutando lata por aí, por não ter um objetivo, talvez alguém se anime por isso, vai lá ajudar a conservar os canteiros, limpar, arrumar. Talvez os comerciantes paguem um condomínio para a manutenção, afinal, isso ajuda os negócios. Com boa vontade saem todos ganhando em qualidade de vida. São Paulo é grande, mas o grande movimento é apenas nas vias principais, as ruas secundárias ficam bastante tranqüilas. Tem muitas ruas onde o movimento é muito baixo.

Um exemplo, alguém tem uma casa velha. Demole. Compra as casas ao redor. Monta os negócios neles. Pronto. Está feito. Claro que não é fácil de se fazer isso. Mas é possível ser feito. Acredito que todos ganhariam, e não haveria perda financeira, pela valorização do ponto e dos imóveis ao redor. A praça boa é uma necessidade invisível. Como não tem, não se pode fazer nada, mas se tivesse, seria bem vinda.

Que tal uma praça na frente da sua casa? Compre a casa em frente, demole e constrói uma praça! Convença os vizinhos a abrirem estabelecimentos em volta, para animar a praça. Faça isso quem puder, tenho certeza de que haverá satisfação. E coloque lá o seu nome, ou de alguém ou algo que vc queira homenagear. As pessoas vão ter para onde ir, relaxar, se reunir, trocar idéias. Alguma praça pode ficar bem animada, outras mais tranqüilas. Se forem praças boas, a maioria vai ficar contente. Vai ter quem não fique contente, por causa do aumento do movimento. A gente tem visto que a falta de lugares agradáveis acabam por congestionar os poucos lugares que oferecem isso.

Mas se a oferta de lugares agradáveis crescer, o congestionamento pode diminuir, até atingir um balanço. Talvez algum milionário possa gostar da idéia, e generosamente alavancar esse processo. Bem, milionários provavelmente estão muito ocupados para pensar nessas coisas, afinal de contas, nada lhes falta, nem sentem que isso faz falta. Qualquer coisa é só ir a Paris, NY, ou algum lugar na Toscana.

Acho que quem podia fazer isso poderia ser algum líder comunitário, que possa aglutinar as forças de uma quadra ou bairro e organizar a realização desse empreendimento. Mas porque faria isso? Talvez tenha preocupações maiores, lutas mais produtivas, mais prementes, tipo saúde ou educação. É, não sei quem poderia realizar isso, mas seria legal se alguém se interessasse.

Por isso estou fazendo esse manifesto, a fim de apresentar a idéia, a quem interessar possa. O certo é que a megalópole certamente ficaria mais humanizada caso existissem mais praças boas. Fico imaginando rua numa quadra qualquer da cidade, uma longa fileira de casas. Vai até o fim, vira pra esquerda ou direita, não importa, mais uma fileira de edificações. Nenhum respiro, nenhum espaço público livre, gostoso, convidativo ao puro estar. A cidade tem muitas premências, de ordem prática. Educação, enchentes, segurança, congestionamentos, transporte público, habitação. Acho que a maioria é mais urgente e necessária do que fazer praças boas. Isso, se for depender do poder público. Mas quem sabe algum político veja na inauguração de uma praça uma realização mais visível e eleitoreira? Nesse nosso país em que os políticos fazem somente aquilo que rende votos, isso poderia ser uma plataforma razoável. Provavelmente custaria menos que grandes obras, e poderia render mais votos, ao menos na vizinhança, e na imagem saudável que isso possa passar ao público em geral.

A especulação imobiliária têm realizado condomínios com áreas de lazer internas como atrativo às vendas. E vendem como um bem do condomínio, privativo. Afinal, isso é bom mesmo. Famílias podem ficar tranqüilas com as crianças brincando lá embaixo, pois o condomínio está fechado, tem segurança. Isso é muito bom para todos que podem pagar por isso. Mas a socialização geral acaba por ficar restrita, limitada. A praça boa é pública. Com o acesso não restrito, os encontros são mais abertos. Seria bom ter um posto policial para garantir a segurança.

Voltando para aquela rua de edificações enfileiradas, sem respiro. De repente, no meio da quadra, uma clarão, alguns bancos pra ler um jornal, uma revista. Umas árvores sombra, talvez uns quiosques pra proteger da chuva. Uma banca de jornal, um sorveteiro. As crianças brincando no gramado. Alguns velhinhos tomando sol e vendo o movimento. Donas de casa fazendo compras na quitanda, na padaria. Pela cidade, conheço poucas praças assim. Uma das melhores é a Vilaboim.

Antigamente, onde hoje tem a praça dos Arcos, tinha um monte de barraquinhas, e muita gente ficava ali. Isso me lembrou minha amiga J. Quando acabaram com isso, a área morreu. O Riviera fechou. Uma praça boa tem de ter atrativos, e se tiver uma comidinha, é ótimo. Restaurantes e bares podem se beneficiar dessa qualidade que a praça oferece.

Imagina uma família básica, saindo pra comer fora. Se tiver umas pracinhas perto de casa, as opções de um lugar legal aumentam. Depois do almoço, relaxar um pouco na pracinha, soltar as crianças pra brincar no playground.

Os shopping centers oferecem algum espaço assim, mas é muito fechado. Bom para dias de chuva. Mas numa tarde de outono, temperatura agradável, que tal um passeio? Quando a gente decide isso, tem de pegar o carro, ir para longe. Mas se for na frente da sua casa, é só atravessar a rua, ou caminhar uma quadra, e pronto. As pessoas economizam gasolina, poluem menos o ar. E mais que tudo, economizam tempo também. As disponibilidades vão ficando maiores. Talvez isso ajude a reduzir o stress da vida urbana, quem sabe não diminuem os acidentes, ou menos gente morra de doenças cardíacas e pulmonares. Mais verde, menos poluição. Fico pensando no mapa da grande São Paulo, com uma praça em cada quadra. Umas grandes, outras bem pequenininhas. Talvez uns pensem, vai ser ocupado por pedintes, mendigos. Talvez algumas sejam, mas se houver muitas, não vai ter mendigo que chegue. E quem sabe? Pode ser que as praças criem mais empregos. A manutenção, os novos estabelecimentos, o movimento que isso cria, pode criar condições para a melhoria do nível social em geral.

Especialmente nas áreas hoje mais carentes, deveria haver mais praças boas. As condições são ótimas, pois investimento necessário seria menor, com o custo mais baixo do terreno. Suprindo a carência de lazer, pode ser que os níveis de violência urbana diminua, com o aumento da sociabilidade. Um ponto de encontro. A praça pode ser usada para eventos, shows, festas. Pode ser uma pequena quermesse do bairro. Pode ser um show de um músico iniciante. Um lugar para a garotada dançar. Ou jogar bolinha de gude. Preenchendo a lacuna de lazer saudável, talvez menos jovens sejam empurrados para o crime. Não estou dizendo que é fácil fazer praças boas.

Pelo contrário, acho que é muito difícil. Não que haja tantos interesses contrários. O que acho é que não há interesse direto, o que resulta em desinteresse. Mas tenho certeza de que uma vez feitas, poderão mudar bastante a cidade, não apenas espacialmente, mas principalmente, socialmente.

Existem muitos locais chamados de praças, que em geral ficam completamente vazios. São bonitos, arborizados. Mas como não tem quase ninguém, pouca gente se aventura a ficar lá sozinho, com medo de assalto, por que para os bandidos é muito mais fácil agir num local isolado. Mas se o local estiver sendo mais freqüentado, uma coisa vai puxando a outra. Somos gregários, gostamos de movimento. Quando a gente sai, e chega num lugar vazio, é um pouco triste. Mas se está bem cheio, a gente reclama que está cheio, mas não somente fica, como volta sempre.

É um fenômeno urbano, e quem decide morar numa cidade grande, está no mínimo consciente de que esse movimento, essa movida, faz parte da cidade. Nos fins de semana com tempo bom, áreas agradáveis, como os poucos grandes parques da cidade, Ibirapuera, Carmo, ficam lotados. A praça da República atrai pela feirinha de artes. Mas mesmo olhando todo o movimento, parece pouco comparado com a população da metrópole. Cadê todo mundo? Bem, estão nos shoppings. O shopping tem uma coisa boa, pois sempre oferecem a tal da praça de alimentação, bancos nos corredores, equipamentos de lazer. Mas a presença maciça de lojas e os ambiente fechados, ainda que elegantes e bem desenhados, não me passam o agradável de uma praça a céu aberto.