A Ponte.

 

                                               O “Aurélio” nos ensina que ponte é uma “construção destinada a ligar margens opostas duma superfície líquida qualquer.” Em Soure, no Pará, um dos dezesseis municípios do arquipélago do Marajó não o é, ou pelo menos identifica outra construção, o porto, que, ainda para muitos nativos recebe outro nome, que não tem nada a ver: trapiche. Novamente o “pai dos burros” me socorre definindo trapiche como um “armazém onde se guardam mercadorias importadas ou para exportar”. É comum escutar de pessoas moradoras da cidade: “Vai ter festa na ponte.” “Fulano, vai me encontrar na ponte.” A “ponte”, portanto, é um local de atração e encontros.

Cerca de quatro a cinco décadas passadas, os únicos meios de transporte para se chegar ou sair de Soure  eram o barco ou o navio. Embora a cidade tenha um aeroporto, uma viagem aérea era e ainda é destinada quase exclusivamente para fazendeiros, políticos, empresários ou em caso de urgência e emergência pra acudir um enfermo. Assim, o porto da cidade era o lugar mais concorrido da cidade. Nos dias de partida ou chegada do navio da extinta ENASA, o Presidente Vargas, quase toda a cidade ia se despedir ou receber uma pessoa. E muito mais que isso, iam se inteirar de quem estava chegando e quem estava partindo...

Matutando com meus botões, ao ouvir frequentemente essas frases anteriormente exemplificadas, tentei uma explicação. Não admitia que as pessoas confundissem ponte com porto, duas construções bastante diferentes nas suas estruturas e funções. Dai veio a elaboração desta tese: Os nativos de Soure falam ponte para o porto, porque em um passado recente era essa edificação o mais importante, pra não dizer o único, ponto de ligação entre a cidade insular e o resto do mundo, à começar com a capital do estado, Belém. Os meios de comunicação eram precários. Não havia telefone nem tevê. Só o rádio AM. Este sim, comunicador de mensagens, as mais diversas, entre o município e a capital. Para poucos, havia o rádio amador. Celular, nem pensar!

Ainda hoje, o meio predominantemente utilizado para se chegar ou sair de Soure é o fluvial, através de barcos e “ferryboats”. Mas a “ponte” ou o porto da cidade perdeu a sua importância. Nele não mais atracam nem barcos, nem navios de passageiros. Os barcos ou navios partem do porto de Belém e os “ferryboats” da vila de Icoaraci, cerca de 15 quilômetros do centro de Belém. Atravessam a baia do Marajó e depois de cerca de três horas chegam ao porto de Camará, no município de Salvaterra,  já no arquipélago do Marajó. Daí até Soure, em ambos os casos, deverão ser vencidos mais cerca de trinta e cinco quilômetros de estrada e mais uma travessia de rabeta ou balsa, que levam de cinco a quinze minutos, respectivamente. Assim, uma viagem de Belém até Soure dura em média cerca de quatro e meia a cinco horas, embora em linha reta a distancia entre as duas cidades seja de cerca de 80 quilômetros.