Por: Laércio Becker, de Curitiba-PR  

            Que a paixão por um clube inspire músicas e outras manifestações artísticas, vá lá. Mas leis? É o caso da Associação Atlética Ponte Preta, de Campinas.

            Não que ela não tenha inspirado músicas. A começar pelos hinos: “Glória Ponte Preta”, de Diogo Teodoro Bratfisch, cantado em 1910; “Sou da Ponte Preta”, de 1929, “Hynno de Guerra dos Cestobolistas da A.A. Ponte Preta”, de 1930; “Avante Ponte Preta”, de Maria Aparecida Motta de Aguiar, vencedora do concurso de 1971; e “Raça de campeã”, de Renato Silva, que virou o hino oficial da Macaca em 1979.

            Além dos hinos, há outras músicas, como as que constam do CD Ponte Preta 100 anos de emoção: “Cem anos de Ponte Preta” (de Jorge Araújo), “Cem anos de amor” (de Renato Silva, autor do hino oficial), “Nação pontepretana” (de Cotinha e Júnior), “No grito da galera é o gol” (de Paulo D’Alamark, Marcos Vuko e Ednardo Nunes) e “Ponte Preta 100 anos de emoção” (de Tatiana Pessanha).

            Dez anos depois, foi lançado o CD AAPP 110 anos – o primeiro time do Brasil, com três versões do hino, mais: “Paixão e tradição” (Roberta Brandemburgo), “É o bicho!” (Nego Marx), “Sambinha da Nega” (Rui Junqueira), “O time do povão” (Juninho Fortaleza) e “O primeiro time do Brasil” (idem).

            Além desses dois CDs, a Rádio Educadora PRC-9 lançou, em 1969, pela gravadora Continental e com patrocínio da Casa Lord, um disco em homenagem ao título da segunda divisão conquistado naquele ano. Com narração de José Sidney e Pereira Neto, o lado A reúne gols e melhores momentos da fase de classificação, enquanto o labo B conta com os jogos da fase finalista, além da marchinha de carnaval “Macaca 69” e o samba “Torcendo para Ser Campeã”.

             (Claro que Flamengo e Corinthians inspiraram muito mais músicas, como se vê nas pesquisas de Beto Xavier e Assis Ângelo.)

            A Ponte também inspirou livros. Muitos são os que contam sua história. Há quem diga, inclusive, que é o clube com a mais completa história publicada do Brasil – há um certo exagero nisso; o Fluminense FC, p.ex., pelas minhas contas, rendeu mais de 17 títulos.

            A começar pela História da Associação Atlética Ponte Preta, publicada a partir de 1989, em 8 volumes. Os 7 primeiros foram escritos por Sério Rossi (ed. R. Vieira Gráfica) e o último por José Moraes dos Santos Neto (ed. Komedi), devido ao falecimento de Rossi. Trata-se de uma detalhada história do clube ano a ano, com dados técnicos de todos os jogos e outros extraídos das atas de reuniões. É obra tão completa que, de certo modo, conta a própria história do futebol paulista – evidentemente, sob a ótica da Ponte Preta. Na realidade, a história de nem um outro clube, tampouco do futebol em nem uma outra cidade ou estado foi tão minuciosamente contada. E nisso não há exagero. Os volumes cobrem os seguintes períodos:

            v. 1 – de 1900 a 1935

            v. 2 – de 1936 a 1955

            v. 3 – de 1956 a 1970

            v. 4 – de 1971 a 1977

            v. 5 – de 1978 a 1983

            v. 6 – de 1984 a 1993

            v. 7 – de 1994 a 2000

            v. 8 – de 2001 a 2004

            Além dessa gigante obra, a história da Ponte é explorada nos seguintes livros:

  • O início de uma paixão: a fundação e os primeiros anos da Associação Atlética Ponte Preta, por José Moraes dos Santos Neto, ed. Komedi, 2000 – além de comprovar a data de fundação da Ponte, explora os longínquos anos iniciais de sua história;
  • O basquete nos 100 anos de vida da Associação Atlética Ponte Preta, por Walter Bellenzani, ed. R. Vieira Gráfica, 2000 – toda a história do basquete na AAPP, desde as primeiras partidas, em 1928, até a consagração com o título mundial de 1993;
  • Associação Atlética Ponte Preta – publicação do próprio clube no ano do centenário, em quatro idiomas, com textos de José Carlos Silva e Paulo Santana; uma divulgação dos dados do clube e da equipe da época para o público estrangeiro;
  • Sempre Ponte Preta: mística, torcida e a cidade de Campinas, por José Moraes dos Santos Neto, ed. Komedi, 2001 – contém desde estudos sobre certos aspectos históricos do clube até relatos de algumas curiosidades que reforçam o amor que a Macaca desperta em seus torcedores, começando por um ensaio sobre como se desenvolve a mística pontepretana;
  • Ponte Preta: a torcida que tem um time, por André Pécora e Stephan Campineiro, ed. Pontes, 2010 – excelente obra que explora vários aspectos da história da Ponte que normalmente despertam a curiosidade da torcida;
  • Ponte Preta: 110 anos 110 fatos, por José Moraes dos Santos Neto e Djota Carvalho, 2010 – obra publicada pelo clube, bem ilustrada, voltada à exposição de alguns fatos considerados chave na história da Macaca;
  • 100 anos: luta, obstinação e vitória, por José Bertazzoli, s/d – apostila feita no ano do centenário, com 270 páginas contendo basicamente fotografias, “causos” e curiosidades da Ponte.

            Cumpre lembrar que há pelo menos duas obras que, ao que me consta, aguardam publicação. Uma é Crônica da Macaca, de José Antonio Siqueira do Amaral, o Zeza Amaral. Trata-se de uma coletânea das colunas escritas pelo jornalista no Diário do Povo. Outra é Ponte Preta: cem anos de paixão, de Diogo Pinheiro e Eder Plates, noticiada por José Roberto Miccoli. De acordo com a Livraria Pontes, porém, parece que não chegou a ser publicada.

            A par dessas obras que esmiúçam sua história, a Ponte inspirou também duas obras literárias, ambas de Renato Pompeu. A primeira foi o romance A saída do primeiro tempo (ed. Alfa-Omega, 1978), que tem por personagem principal o “espectro da Ponte Preta”, um ente mágico que altera comportamentos, transforma as pessoas e muda a realidade dos campineiros. A segunda foi a epopéia Os Brasilíadas (ed. Botequim de Idéias, 2001), escrita aos “500 anos de Brasil, 2.000 anos de Cristo, 100 anos a A.A. Ponte Preta”, com algumas referências à Macaca, como esta (na p. 16):

            “A Ponte Preta vem a ser o quê, digam?

            É a ponte, a ponte do trem, que liga o Brasil

            Ao mundo inteiro onde o céu é de cor bem anil.

            Essa ponte leva de Campinas ao mar, ao mundo,

            A Ponte Preta é nacional e internacional,

            (...).”

            Isso sem contar alguns trabalhos acadêmicos que tratam da grande rivalidade campineira, a saber:

  • O Dérbi campineiro – Monografia redigida por Vitório L. Zago, apresentada ao Laboratório de Jornalismo e à Faculdade de Educação Física da Unicamp, em 1997;
  • A rivalidade entre torcidas de futebol em Campinas, SP – Relatório de Pesquisa de Iniciação Científica, de Mário Pereira Morato, apresentado na Faculdade de Educação Física da Unicamp, em 2002. Parte do trabalho foi publicada com o título “A dinâmica da rivalidade entre pontepretanos e bugrinos”, na obra coletiva Futebol, cultura e sociedade, organizada por Jocimar Daolio (ed. Autores Associados, 2005), p. 73-104. Sobre essa rivalidade, Luiz Henrique de Toledo traça um breve perfil em seu livro Torcidas organizadas de futebol (ed. Autores Associados, 1996), p. 27, 86-8.

            Para uma inserção da Ponte Preta na história dos primórdios do futebol no Brasil, recomenda-se a leitura de Visão do jogo, de José Moraes dos Santos Neto, ed. Cosac & Naify, 2002.

            Quem tiver interesse em saber mais sobre a participação da Ponte Preta na Associação dos Presidentes de Entidades Sociais e Esportivas de Campinas (Apesec), que congrega os clubes de Campinas e região, deve consultar a História da Apesec, escrita por Romeu Nucci (ed. Átomo & Alínea, s/d). O livro traz inclusive a história de várias edições da Olimpíada Inter-Clubes de Campinas (Olimpesec).

            Voltando à Ponte, há também um documentário comemorativo ao seu aniversário de 107 anos, intitulado Uma história de raça, feito por encomenda do clube e distribuído em DVD. E um DVD comemorativo do acesso à primeira divisão do Brasileirão, em 2012.

            Mas e a tal “legislação pontepretana”?

            A primeira é a Lei municipal nº 10.295, de 26.10.1999, que oficializa e inclui no calendário de eventos do município de Campinas a “Semana Pontepretana”. De autoria dos vereadores Antonio Rafful e Sebastião Arcanjo e assinada pelo prefeito Francisco Amaral, ela fixou como “Semana Pontepretana” a do dia 11 de agosto e garantiu a consignação (e a suplementação, se necessário) dos recursos necessários na dotação orçamentária em vigor.

            Essa lei foi regulamentada pelo Decreto municipal nº 13.390, de 30.05.2000 (ano do centenário da Macaca). Ele atribuiu ao Departamento de Esportes da Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Turismo a competência para incluir as atividades a serem desenvolvidas na Semana Pontepretana no calendário oficial dos eventos desportivos municipais, bem como para nomear, anualmente, a comissão responsável pela organização e promoção dessas atividades.

            Do ano seguinte é a Resolução nº 34, de 26.04.2001, do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas (CONDEPACC), que declara tombada, a título de interesse arquitetônico, histórico e urbanístico, a ponte sobre a ferrovia, no bairro Ponte Preta, localizada entre a Av. Francisco Glicério e Rua Abolição, “que deu origem ao referido bairro e inspirou o nome da Associação Atlética Ponte Preta”. (Coincidentemente, há outra Ponte Preta tombada pelo patrimônio histórico, só que em Curitiba, sobre a rua João Negrão. Também preta e também ferroviária. Sobre o assunto, ver nosso artigo “A Ponte Preta de Curitiba”.)

            Falando nisso, no Diário Oficial do Município de Campinas de 22.06.2011, pág. 3, o CONDEPACC publicou o Edital de Notificação de Tombamento do Estádio Moisés Lucarelli. Não o estádio inteiro, mas somente a fachada entre as duas torres, o salão nobre e painel, a bilheteria e o jardim fronteiriço. Consta que esse tombamento parcial atende perfeitamente aos interesses da Ponte, que pretende construir uma nova arena, em troca do Majestoso. Se tudo fosse tombado, nenhum empreendedor teria interesse no negócio, pois não poderia realizar nada ali. Mas se nada fosse tombado, não haveria garantias – principalmente por parte da torcida – de que a memória do Majestoso seria preservada. Ademais, segundo o historiador oficial do clube, José Moraes dos Santos Neto, a parte realmente histórica é justamente a que foi tombada. O resto já havia sido objeto de alterações, não havendo necessidade de preservação, por falta de interesse histórico.

            Menos de um ano depois do tombamento da ponte ferroviária, foi promulgada a Lei estadual paulista nº 11.028, de 04.01.2002, que institui o “Dia dos Clubes de Futebol Profissional do Estado de São Paulo”. Ué, e qual é a inspiração pontepretana? Adivinhe qual foi a data escolhida para a efeméride: sim, a do aniversário da Ponte, 11 de agosto. Na justificativa de seu projeto de lei, o então deputado estadual Carlos Sampaio diz o seguinte:

            “A data proposta, 11 de agosto de cada ano, deve-se ao fato de que, neste dia, no ano de 1900, foi criada a Associação Atlética Ponte Preta – AAPP, que é o mais antigo clube de futebol profissional do Brasil. Aliás, fazemos consignar ainda que, neste ano, a Ponte Preta completará 100 (cem) anos de uma existência notadamente marcada dentro do cenário futebolístico nacional.”

            Durante a tramitação do projeto, o Relator Especial, deputado estadual Rodrigo Garcia, repetiu o argumento, para concluir pela sua aprovação pela Assembléia Legislativa:

            “Cabe lembrar, também, que a data escolhida para a pretendida homenagem prestigia a criação da Associação Atlética Ponte Preta – o mais antigo clube de futebol profissional do país.”

OBS.: No arquivo PDF em anexo, fotografias do clube, tiradas por mim em 2011.