A POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS E A EMINÊNCIA DO BRASIL NO CENÁRIO ECONÔMICO MUNDIAL:

                            

José Orlando Soares Leite Neto

Samuel Jorge Arruda de Melo

Sumário: Introdução; 1 Os impactos socioambientais e sua correlação com os resíduos sólidos; 2 O desenvolvimento sustentável e a governança socioambiental; 3 A política nacional de resíduos sólidos: gestão de recursos sustentáveis; 4 Danos ambientais e resíduos sólidos: responsabilidade civil e penalizações; Considerações finais ; Referências.

 

RESUMO

O Brasil é, hoje, um país em ascensão no que diz respeito à Geopolítica mundial. Após uma sequência consecutiva de aumentos consideráveis em seu Produto Interno Bruto, o país se tornou refém do crescimento econômico desenfreado e da falta de planejamento para crescer com responsabilidade sustentável. Isto porque, ao passo em que se desenvolve economicamente de maneira impressionante, o Brasil perde grande área territorial, correspondente a vegetações diversas, por não ter aplicação efetiva da política de resíduos sólidos. Implica dizer, portanto, que a atual política de combate à má utilização de recursos do Brasil, no que diz respeito ao reaproveitamento adequado de matérias não biodegradáveis, não segue padrões essenciais para um crescimento organizado e prático. É fundamental, assim sendo, que haja a tomada de medidas governamentais, a fim de fomentar o desenvolvimento sustentável, a se realizar, sobretudo, com uma implantação e funcionamento efetivo de uma política nacional de resíduos sólidos.

 

Palavras-chave: Resíduos Sólidos. Crescimento econômico. Desenvolvimento Sustentável. Política nacional de resíduos sólidos. Medidas governamentais.

 

Introdução

É fundamental frisar, de início, que a Política Nacional de Resíduos Sólidos é regida pela Lei nº 12.305/10. Como já é sabido – e autoexplicativo-, essa política visa uma otimização do manejo do “lixo descartável. Ocorre que, no Brasil, o lixo que as pessoas produzem não é reutilizado, tampouco descartado da maneira. Isto porque a Lei que regulamenta o uso de resíduos sólidos ainda é bastante recente para que surta efeitos imediatos.

Há que se levar em consideração, para tanto, o fato de que o Brasil é um país cuja economia atingiu o seu ponto mais alto, se levados em contas os tempos pregressos. O Brasil não tem sabido crescer com responsabilidade sustentável. Isso implicaria medidas de preservação que abarcassem as maiores áreas verdes do país. Sendo assim, um dos principais fatores que levam o Brasil a um crescimento ecologicamente incorreto é manejo inadequado dos resíduos sólidos aqui produzidos.

A Lei de Resíduos Sólidos apresenta instrumentos importantes para permitir o avanço econômico sustentável.  A proposição inicial deste dispositivo é qualificar, de modo pratico, o que seria necessário ao país para que enfrente os principais problemas ambientais, sociais e econômicos decorrentes do manejo inadequado dos resíduos sólidos. A Lei visa, ainda, à diminuição na ‘produção’ de resíduos; na verdade, uma produção somente do que seja estritamente necessário.

É de extrema importância que se ressalte, como fator que corrobora o dito em epígrafe, que a referida legislação visa institucionalizar a Política de Resíduos Sólidos. É bem mais do que uma medida de conscientização – fosse conscientização, isolada, haveria muita abstração nos objetivos propostos. A Lei regula o conjunto de atribuições dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes. Regula, também, o papel dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana a fim de possibilitar o manejo adequado do lixo.

Quando se fala em crescimento econômico, é essencial que não haja impactos socioambientais grandes em demasia. A sociedade civil não poderá sofrer os custos da barganha que há entre crescer economicamente e preservar. Assim, a fim de garantir segurança jurídica tanto para a sociedade como para o meio ambiente, é fundamental que os eventuais danos sejam devidamente reparados e os culpados civilmente responsabilizados.

1 Impactos socioambientais e sua relação com os resíduos sólidos

Desde a antiguidade o homem interage com o meio ambiente no intuito de satisfazer suas necessidades. Entretanto, essa “busca” pelos recursos naturais foi “incrementada” de forma extrema nos últimos séculos, por conta da industrialização, o que acabou por gerar um desgaste destes recursos (FLORES; VIEIRA, 2012).

Principalmente com o advento da globalização, do ideal capitalista, a relação de consumo agravou-se tanto que o desgaste ambiental tornou-se um dos mais graves problemas enfrentados pela população mundial. Sendo assim, fica claro que é necessária uma mudança de mentalidade dessa população para evitar que os recursos naturais venham a se esgotar (FLORES; VIEIRA, 2012).

O consumismo exacerbado enraizado na sociedade acaba então gerando um dos mais graves problemas concernentes a destruição ambiental, o despejo de resíduos sólidos, os quais tem trazidos graves problemas, no Brasil, por conta da dificuldade em gerir (como reutilizá-los ou dar uma destinação final) esses recursos (FLORES; VIEIRA, 2012).

Segundo Soares, Salgueiro e Gazineu (2007 apud FLORES; VIEIRA, 2012, p.933):

“Um dos maiores problemas do meio ambiente é a produção do lixo. Anualmente são produzidos milhões de toneladas de lixo, contendo vários materiais recicláveis como vidros, papéis, latas, dentre outros. Reaproveitando os resíduos antes de serem descartados, o acúmulo desses resíduos no meio ambiente diminui e com isso a poluição ambiental é minimizada, melhorando a qualidade de vida da população. Atualmente a destinação final do lixo produzido diariamente, principalmente pela população urbana, está vinculada diretamente à prevenção do meio ambiente. Os resíduos sólidos têm grande importância na degradação do solo. Devido a sua grande quantidade e composição, contaminam o solo chegando até mesmo a degradar os lençóis de água subterrânea. A valorização da limpeza pública e a educação ambiental contribuem para evitar a contaminação do solo e para a formação de uma consciência ecológica”

Logo, o que se pode aferir é de que a grande quantidade de resíduos sólidos descartada que não são reutilizados ou, pelo menos, possuem uma destinação final adequada, acabam acarretando problemas ambientais gravíssimos, no Brasil. Todo esse problema advindo desse crescimento econômico desenfreado, o qual não é pautado nos ideais do desenvolvimento sustentável. Fica claro que o meio ambiente é que “sofre” todos os danos decorrentes desse crescimento (FLORES; VIEIRA, 2012).

Goldenberg (apud Loschiavo, 2012, p. 14) afirma que a ideia de desenvolvimento sustentável  se tornou popular quando foi publicado um relatório preparado por comissão presidida pela então Primeira Ministra da Noruega, Gro Brundtland. Para Goldenberg, quando se fala em desenvolvimento sustentável, há que se falar em necessidades, sobretudo as básicas dos pobres do mundo (que devem receber máxima prioridade); e também em limitações.

As limitações nada mais são do que o seguinte questionamento: como implementar crescimento econômico e reduzir os impactos socioambientais? O ponto chave do presente artigo é este: a política nacional de resíduos sólidos como válvula de escape para o cresimento econômico, no entanto, sustentável (LOSCHIAVO, 2012).

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísitca (IBGE), são coletadas diariamente no Brasil cerca de cento e oitenta a duzentos e cinquenta toneladas de resíduos sólidos. Como agravante, há um dado ainda mais assustador: um brasileiro ‘produz’ cerca de um quilograma de lixo por dia. O pior, infelizmente, não é a quantidade de resíduos produzida. O que se lastima é a destinação que tais resíduos têm: esgotos a céu aberto; lixões, etc. (LOSCHIAVO, 2012).

É de se frisar que, além do dano ambiental que causa o mau uso dos resíduos sólidos, há, ainda, danos sociais. Os grandes lixões do Brasil produzem, dentre os diversos gazes tóxicos e fluidos maléficos à saúde, o chamado “chorume”. O chorume é produto da mistura de diversos tipos de resíduos e comumente contamina lençóis freáticos, prejudicando diretamente o abastecimento de água da população que mora próximo aos lixões, bem como as famílias que vivem da coleta e venda do lixo descartado pelas pessoas. O lixo também produz gás metano (FLORES; VIEIRA, 2012).

Uma vez exposta a toda imundície presente nos aterros sanitários e lixões, a população que mantém contato com tais resíduos perde imunidade fisiológica. Forma-se, portanto, um círculo vicioso. O Estado tendo se omitido de garantir a salubridade àquelas pessoas acaba por ver o retorno de sua omissão em forma de mais pacientes na rede pública hospitalar. Existem muitas pessoas que vivem da coleta e reciclagem do lixo e que realizam seu trabalho em condições insalubres, geralmente sem equipamentos de proteção (FERREIRA, 2001).

Como consequência, há alta probabilidade de adquirirem doenças. Alguns problemas relacionados ao trabalho de reciclagem incluem a exposição a metais e substâncias químicas, a agentes infecciosos como o vírus da hepatite B, doenças respiratórias, osteomusculares e lesões por acidentes (LOSCHIAVO, 2012).

Pode-se extrair dos dados acima expostos que a produção de resíduos sólidos no Brasil é tamanha, que é de extrema importância que estes recebam um tratamento adequado, o qual é responsabilidade tanto do poder público, quanto da sociedade. Além de ser necessário também a diminuição da enorme carga de resíduos sólidos geradas no país, pois essa produção já é ambientalmente insustentável, acarretando assim, nesses impactos socioambientais (FLORES; VIEIRA, 2012). E é aí que entra a Política Nacional de Resíduos Sólidos exposta nos próximos capítulos.

2 O desenvolvimento sustentável e a governança socioambiental

Segundo Capra (2003 apud FLORES; VIEIRA, 2012, p.917): (...) “a degradação ambiental tem deixado sua marca através do crescimento econômico a todo custo”. Logo, em virtude desse panorama de destruição ambiental existente, inúmeras conferências mundiais ocorreram (Conferência de Estocolmo, Rio em Meio Ambiente e Desenvolvimento Relatório, Rio + 20, entre outros), servindo de base para o surgimento do desenvolvimento sustentável e da governança democrática (FLORES; VIEIRA, 2012).

Outro ponto importante ponto advindo dessas conferencias foi a visão socioambiental, a qual segundo Guimarães (2001 apud FLORES; VIEIRA, 2012, p.919) é baseada na ideia de que as políticas públicas ambientais devem incluir e envolver as comunidades locais. Além disso, deve ser desenvolvida a sustentabilidade social, contribuindo assim para a diminuição da pobreza e das desigualdades sociais, promovendo a justiça social e a equidade.

Desenvolvimento sustentável é um modelo de desenvolvimento que “atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades” (BRUNDTLAND, 1987 apud MONTEIRO 2011).

Tendo por objetivos primordiais a máxima equitatividade possível e a satisfação das necessidades humanas. Esse modelo de desenvolvimento deve ainda perdurar por tempo indeterminado. Esse fato põe a natureza em enfoque, pois para que esse desenvolvimento possa durar por tempo indeterminado, é necessário que haja a preservação do meio ambiente para que possa ocorrer a renovação dos recursos renováveis, a diminuição do uso dos recursos não-renováveis e a diminuição da eliminação de resíduos sólidos (MONTEIRO, 2011).

Ainda tratando sobre o conceito de desenvolvimento sustentável, de acordo com Monteiro (2012) fica claro que o desenvolvimento sustentável é um conceito formado por dois imperativos éticos de justiça (dupla justiça). Tais justiças seriam a intrageracional (dentro dessa geração) e a  intergeracional (entre gerações).

Logo, segundo Monteiro (2012, p. 13):

“Para se atingir a justiça intrageracional é necessário um desenvolvimento distributivo, que corrija as severas desigualdades sociais existentes entre os países e dentro dos mesmos, a fim de que todas as pessoas do mundo, independentemente do país, classe, gênero, etc. em que nasceram, possam ter uma vida minimamente decente. Trata-se, portanto, da questão do acesso equitativo aos recursos naturais e culturais.”

E para se atingir a justiça intergeneracional, é necessário que o meio ambiente seja preservado, no intuito de que as gerações futuras possuam um ambiente com a mesma ou maior qualidade e diversidade que temos hoje (WEISS, 1989 apud MONTEIRO, 2012).

Servindo então de meio para aliar o crescimento econômico e os problemas que o acompanham (desigualdade, pobreza, degradação ambiental, entre outros) fazendo uso do meio ambiente, mas não de uma maneira devastadora, no intuito de preservar o mesmo (FLORES; VIEIRA, 2012).

Não só o desenvolvimento sustentável tem relevante importância para a solução dessa situação de desgaste natural que assola não só o Brasil, mas o mundo todo; como tem também a Governança Ambiental (FLORES; VIEIRA, 2012).

A “Governança Ambiental” é de acordo com Born (2007 apud FLORES; VIEIRA, 2012, p. 924), uma forma de governo, na qual a sociedade pode exercer o controle social, público e transparente das estruturas estatais e das políticas públicas, além das instituições do mercado. Abrangendo tanto mecanismos governamentais, quanto os não estatais, em busca de um objetivo comum.

Sendo assim, pode aferir-se que a governança ambiental é representada pela capacidade de governo do conjunto de atores sociais, públicos e privados. Relacionando então o desenvolvimento sustentável com este tipo de governança, deu-se devida importância para a participação da sociedade nos processos decisórios e de gestão ambiental. Marca da governança socioambiental (FLORES; VIEIRA, 2010).

No Brasil, este tipo de “democratização” começou a ser desenvolvido com a Constituiçao Federal de 1988, principalmente em seu artigo 225, o qual assegura o “direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”, determinando também que a sociedade e o poder público devem realizar a preservação do meio ambiente. Além disso, a partir dessa Constituição a sociedade começa a ter maior participação na reinvindicação de políticas públicas e na tomada de decisões (FLORES; VIEIRA, 2012).

Percebe-se assim a importância do desenvolvimento sustentável e da participação da sociedade no processo de tomada de decisões. Nesse sentido, é preciso que os sistemas de governança sejam voltados para colocar o desenvolvimento sustentável como objetivo da governança, aliada à democracia participativa-deliberativa, a qual seria, de acordo com Monteiro (2012, p.5):

“(...) um sistema democrático que possibilita uma constante e ampla participação deliberativa da população em outros espaços e momentos da vida política e social do país/região/município. Entendemos que se enquadram aqui, portanto, os princípios da abertura, da informação, da transparência e, propriamente, os princípios da participação popular e o da deliberação pública.”

 

3 A política nacional de resíduos sólidos: gestão de recursos sustentáveis

A política nacional de resíduos sólidos, recentemente aprovada no Brasil por meio da lei federal nº 12.305/2010, de acordo com Flores e Vieira (2012, p.936):

“(...) destaca a importância da proteção do meio ambiente e a participação comprometida e responsável de todos os setores. \Assim, de acordo com a nova lei, estão sujeitas à sua observância as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada de resíduos sólidos. Esta disposição implica uma maior participação social na gestão integrada de resíduos sólidos, e o envolvimento de diversos setores sociais.”

Isso implica dizer que, essa política atribui responsabilidades e o gerenciamento integrado nas diferentes do processo de gestão desses resíduos. Além de basear-se na atuação conjunta do governo, sociedade e empresas (FLORES; VIEIRA, 2012).

Importante ressaltar ainda que nessa política, o conceito de resíduos foi diferido do conceito de rejeitos sólidos. O primeiro ainda tem condição de ser reaproveitado, já o segundo, não, ou seja, não podem voltar ao processo produtivo (FLORES; VIEIRA, 2012).

Outro fator de grande relevância trazido pela lei 12.305/2010 está contido no artigo 3º, XII: “Para os efeitos desta Lei, entende-se por: XII - logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.”

Essa nova lei é baseada em princípios que norteiam a gestão de resíduos sólidos. Alguns destes princípios serão aqui abordados. São estes: o princípio da prevenção, da informação, da participação, da proximidade, da planificação, o da responsabilidade, do desenvolvimento sustentável, do poluidor-pagador, da precaução e da solidariedade intergeracional (LEMOS, 2011).

O princípio da prevenção versa, conforme alude Silva (2002), sobre a possibilidade de evitar ou reduzir a quantidade de resíduos lançados no meio ambiente. Com isso, danos irreversíveis causados ao meio ambiente seriam evitados, trata-se portanto de um dos princípios fundamentais da gestão ambiental. É um dever de cuidado, afirma que os bens ambientais devem ser utilizados de maneira racional (LEMOS, 2011).

Já o princípio da informação (consagrado na declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992) trata sobre o direito à informação das pessoas no que concerne a matéria ambiental, pois com a informação, a sociedade seria capaz de participar de forma mais ampla no processo de preservação do meio ambiente (SILVA, 2002). O princípio da participação está intrinsecamente ligado ao princípio da informação, pois só a partir do acesso à informação, é que a população pode participar na tomada de decisões (LEMOS, 2011).

Estes princípios são instrumentos para o desenvolvimento de uma maior eficiência do sistema regulatório ambiental. Exemplo dessa participação da sociedade pode ser encontrado no momento da elaboração de planos nos âmbitos nacional, estadual e municipal de gestão de resíduos sólidos, por meio de audiências e consultas públicas (LEMOS, 2011).

O princípio da proximidade afirma que os resíduos devem ser eliminados em locais adequados próximos do local de sua produção. O princípio da planificação parte de um inventário feito dos resíduos sólidos que serão despejados para, depois, definir quais destes serão a prioridade no que concerne ao local em que serão despejados, servindo para a criação de instalações de redução e eliminação desses resíduos, alcançando assim a almejada proteção ao meio ambiente (SILVA, 2002).

O princípio da responsabilidade serve para definir que há responsabilidade civil servirá como último recurso para sancionar os danos causados ao meio ambiente. Além de prever a responsabilidade objetiva do produtor ou dos produtores por esses danos. O princípio do desenvolvimento sustentável significa desenvolvimento com preservação do meio ambiente. Com o controle da produção e do consumo, o meio ambiente pode ser protegido. Esse princípio defende a existência de uma relação entre o crescimento econômico e a proteção ambiental, no Brasil (LEMOS, 2011).

O princípio do poluidor-pagador é um dos mais importantes na tutela do meio ambiente. Define que o poluidor deve arcar com os custos da poluição que causou, ou seja, responde pelas despesas de prevenção, reparação e repressão da poluição. O princípio da precaução tem por objetivo orientar o desenvolvimento e a aplicação do direito ambiental nos casos de incerteza jurídica (tendo como exemplo os casos em que é necessário definir se o dano ocorrerá ou não), e, assim, alcançar o desenvolvimento sustentável por meio de medidas ambientais que antecipem, impeçam e ataquem as causas da degradação do meio ambiente (LEMOS, 2011).

Já o princípio da função socioambiental da solidariedade intergeracional define que deve haver a responsabilidade de preservar o meio ambiente para que este possa chegar em condições adequadas ou até melhores do que as em que se encontra, atualmente, para as gerações futuras. Com isso, é de incumbência do ser humano resguardar a natureza, evitando, assim, efeitos catastróficos que podem vir a ocorrer por conta do desgaste do meio ambiente. Fica claro que há a necessidade da realização de uma educação ambiental, no intuito de mudar o comportamento e a visão de grande parte da sociedade ante o meio ambiente (LEMOS, 2011).

Após esta breve “introdução” sobre a política nacional de resíduos sólidos pode-se aferir que a sua implantação, no Brasil, é a demonstração de que o país está indo em direção à sustentabilidade ambiental e ao desenvolvimento sustentável. Mudando, assim, mesmo que à passos lentos, esse panorama de degradação ambiental não só em escala nacional, mas também mundial (FLORES; VIEIRA, 2012).

4 Danos ambientais e resíduos sólidos: responsabilidade civil e penalizações

Segundo Diniz (2006, p.40):

“A Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.”

Logo, pode-se entender que essa responsabilidade serviria como um meio de se fazer cumprir uma obrigação entre um sujeito ativo (credor) e um sujeito passivo (devedor), seja particular ou Estado. Isso porque não há como tratar sobre responsabilidade, desvencilhando-a da noção de obrigação, a qual pode decorrer da lei (obrigação extracontratual) ou da manifestação de vontade entre as partes, obrigação contratual (TONANI, 2011).

Essa responsabilidade, além de determinar que há uma obrigação que não fora cumprida, impõe o dever de ressarcir os danos causados, conseguindo assim equilibrar a relação jurídica (TONANI, 2011).

A relação existente entre esse tipo de responsabilidade e o meio ambiente é vista na responsabilidade civil ambiental, a qual versa sobre as condenações que podem ocorrer nesta “modalidade”: a condenação em obrigação de não-fazer (cessar a conduta danosa ao meio ambiente), em obrigação de fazer (restauração do que foi poluído e evitar a reincidência) e no pagamento de indenização pelos danos causados (TONANI, 2011).

Para que haja a caracterização da responsabilidade civil, é necessário que haja a ação (comissiva ou omissiva), o dano, o nexo de causalidade e, em alguns casos, a culpa ou dolo. A ação decorre do descumprimento da lei (obrigação extracontratual) ou de uma clausula contratual, no caso de obrigação contratual (TONANI, 2011).

De acordo com Gonçalves (2008 apud TONANI, 2011, p.86) à culpa é a violação de um direito por negligência, imperícia ou imprudência. Já, o dolo é a violação intencional de um direito (vontade de violar esse direito). No que tange ao nexo causal, este seria a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado.

Para Tonani (2011), a responsabilidade civil pode ser dividida em: contratual (origem da obrigação em um contrato), extracontratual (origem da obrigação em uma lei), objetiva (advém da existência de dano e nexo causal entre este e o ato do agente) e subjetiva (necessita da existência de conduta típica, que é a ação ou omissão, culposa ou dolosa; dano e da causalidade entre este e a conduta). Relacionando a responsabilidade civil, à questão dos resíduos sólidos pode-se determinar que esta será sempre extracontratual e objetiva (fundada na Teoria do Risco).

É objetiva, pois basta provar a ação, o dano e a relação de causalidade entre ambos para que se possa caracterizar essa responsabilização pelos danos causados ao meio ambiente (TONANI, 2011).

Maria Helena Diniz (2006) aduz ainda sobre o tema que na responsabilidade objetiva, a atividade causadora do dano é lícita, mas causa perigo a outrem, logo, o agente terá de ressarcir a vítima, necessitando esta provar apenas o nexo causal entre o dano e a conduta do agente.

Servindo de “base” para fundamentar essa responsabilidade civil objetiva, têm-se a “teoria do risco integral”, a qual demonstra que o causador de um dano que cria risco a outrem, deve repará-lo. No caso do dano ambiental originado pela poluição por resíduos sólidos, o agente, independente de culpa, será responsabilizado, devendo, assim, reparar os prejuízos causados (TONANI, 2011).

Como exemplo da questão da responsabilidade por danos ambientais, a qual foi elevada ao plano constitucional (TONANI, 2011), têm-se o artigo 225, § 3º da Constituição Federal de 1988: As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Outro exemplo importante concernente a esse tipo de responsabilidade é o artigo 30 da Lei 12.305/2010:

“Art. 30. É instituída a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, a ser implementada de forma individualizada e encadeada, abrangendo os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, os consumidores e os titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, consoante as atribuições e procedimentos previstos nesta Seção.

Dando ênfase a este ultimo dispositivo legal, fica claro que o objetivo dessa responsabilidade compartilhada, segundo Tonani (2011, p.94): “(...) é compatibilizar interesses entre os agentes econômicos e sociais e os processos de gestão empresarial e metodológica com os de gestão ambiental, desenvolvendo estratégias sustentáveis”.

Ou seja, é necessário aproveitar os resíduos sólidos, direcionando-os para a cadeia produtiva, e diminuir a produção destes, por consequência, a poluição e os danos ambientais diminuiriam (TONANI, 2011).

Para que isso ocorra, é imprescindível a ação conjunta entre poder público e os geradores (fabricantes, exportadores, consumidores, comerciantes e distribuidores), desses resíduos, trata-se então de uma responsabilidade compartilhada. O consumidor deve efetuar a devolução dos produtos já usados (por exemplo: embalagens, sacos plásticos, entre outros), os comerciantes e distribuidores devem fazer a mesma coisa que o consumidor, já os fabricantes e os importadores devem fabricar seus produtos com materiais que facilitem a reciclagem e a reutilização do mesmo, além de dar uma destinação final a esses produtos, seguindo uma adequação aos dispositivos legais, conseguindo, assim, diminuir os impactos causados pelos resíduos sólidos ao meio ambiente (TONANI, 2011).

Por sua vez, o poder público será responsável por promover serviços públicos de limpeza urbana, adotar procedimentos de reciclagem e reutilização desses resíduos, estabelecer o sistema de coleta seletiva, entre outros. Grosso modo, o poder público deve dar disposição final ambientalmente adequada aos resíduos sólidos, por meio desses serviços públicos de limpeza (TONANI, 2011).

Nem todas as condutas que causam danos ao meio ambiente ensejam o ressarcimento. Existem então excludentes de responsabilidade. São elas: a culpa da vítima (inexistência da relação de causa e efeito entre conduta do agente e ato, nesse caso a vítima é responsável pelo dano), o fato de terceiro (mesma coisa da culpa da vítima, exceto que nesse caso um terceiro, que não é a vítima, é responsável pelo dano), caso fortuito ou força maior (fatos que ocorrem, cujos efeitos não poderiam ser evitados ou impedidos). É fundamental definir que essas excludentes existem, entretanto, como a teoria do risco integral é adotada na questão da responsabilização pela poluição por resíduos sólidos, essas causas excludentes não podem ser utilizadas (TONANI, 2011).

No que diz respeito à responsabilidade da pessoa jurídica de direito privado o artigo 1º, § 1º da lei 12.305/2010: (...) “Estão sujeitas à observância desta Lei as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos”. Além disso, não há distinção entre a pessoa física do proprietário e a pessoa jurídica propriamente dita (TONANI, 2011).

Já na responsabilidade da pessoa jurídica de direito público têm-se o artigo 37, § 6º:  (...) “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Sendo assim, relacionando este dispositivo legal à questão da proteção do meio ambiente tem-se que, o Poder Público tem por obrigação: realizar a proteção do meio ambiente, o uso sustentável dos recursos ambientais e a evitar o desenvolvimento desregrado (TONANI, 2011).

Após ter sido discutida a questão da responsabilidade civil pelos danos causados ao meio ambiente, é necessário agora abordar sobre como se dará a eficácia da aplicação das sanções a esses danos. O problema nessa situação é comprovar que houve o dano, pois a destinação dos resíduos sólidos, mesmo que irregular, perdura no tempo. Logo, além de ser difícil de mensurar o dano causado ao meio ambiente, este é causado por vários agentes, o que acaba por dificultar ainda mais a comprovação dos elementos necessários para caracterizar essa responsabilidade (TONANI, 2011).

Outras dificuldades concernentes à caracterização dessa responsabilidade são: a de que os danos são anônimos (não se sabe quem foi o responsável por despejar os resíduos sólidos), em sua grande maioria; e que para a sanção servir, é necessário que o poluidor possua recursos para pagar pelo dano e para recuperar o meio ambiente, além de realizar também um processo de educação tanto da sociedade, quanto do próprio autor, para que essa conduta delituosa não venha a se repetir (TONANI, 2011).

Mesmo com essas dificuldades fica claro que os órgãos executivo, legislativo e judiciário possuem meios que servem para minimizar essas dificuldades, como por exemplo: a possibilidade de cumulação de sanções, a inversão do ônus da prova e a ampliação do âmbito de discricionariedade do julgador. Os quais ajudaram na delimitação do nexo causal e do dano ambiental causado (TONANI, 2011).

Conclusão

Desde a antiguidade o homem interage com o meio ambiente no intuito de satisfazer suas necessidades. Entretanto, essa “busca” pelos recursos naturais foi “incrementada” de tal forma nos últimos séculos, por conta da industrialização, o que acabou por gerar um desgaste destes recursos. Sendo assim, os ideais da defesa do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável, tem sido cada vez mais difundido nas sociedades hodiernamente, visando resguardar a natureza da atuação desregrada dos seres humanos.

Nesse sentido, algumas políticas visando a proteção do meio ambiente são tomadas por vários países no mundo inteiro, dentre esses, se destaca a política nacional de resíduos sólidos, no Brasil, a qual destaca a importância da proteção do meio ambiente e a participação comprometida e responsável de todos os setores.

Assim, de acordo com a nova lei, estão sujeitas à sua observância as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada de resíduos sólidos.

Porém, mesmo com a existência de uma política como a supracitada, a forma como ela vem sendo efetivada, no Brasil, ainda se encontra muito distante do ideal, isso implica dizer que que a atual política de combate à má utilização de recursos do Brasil, no que diz respeito ao reaproveitamento adequado de matérias não biodegradáveis, não segue padrões essenciais para um crescimento organizado e prático. É fundamental, assim sendo, que haja a tomada de medidas governamentais, a fim de fomentar o desenvolvimento sustentável, a se realizar, sobretudo, com uma implantação e funcionamento efetivo de uma política nacional de resíduos sólidos, principalmente por meio de sanções aos descumpridores de tal política.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição Federal. Vade Mecum Saraiva. Ed. Saraiva, 2012.

BRASIL - Lei nº 12.305, 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências.  Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 02 ago. 2010.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2006.

FLORES, Guilherme; VIEIRA, Ricardo Stanziola. Expectativas da governança socioambiental na política brasileira de resíduos sólidos: reflexões sobre a sustentabilidade e as consequências da globalização na geração de resíduos. Disponível em: www.idb-fdul.com. Acesso em: 02, set.

______________. Gestão integrada de Resíduos Sólidos Urbanos à luz da lei 12.305/2010: Uma proposta para a solução da disposição final do lixo na Região Metropolitana da Foz do Rio Itajaí. Revista Eletrônica Direito e Política, v.5, p.346-370, 2010.

LEMOS, Patrícia Faga. Resíduos Sólidos e Responsabilidade Civil Pós-Consumo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

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