A Poderosa

Sabe-se que um dos mais valiosos e relevantes legados que um grupo social ou um povo tem a sua disposição é a memória histórica. Através dessa memória recorremos ao passado para nos dar conta de quem fomos como povo ou sociedade, dos nossos acertos e dos nossos equívocos. Essa memória reverbera em nosso presente modelando nossa identidade nacional e social.

Preservar a memória histórica seja nos fatos históricos propriamente ditos, seja nas tradições culturais, seja nas construções arquitetônicas, é responsabilidade daqueles de fato comprometidos com o progresso sustentável, ou seja, com o desenvolvimento econômico e social pautado na ética do cuidado. Depositamos nossas esperanças no poder público para resguardar o nosso patrimônio memorial e identitário que os antigos construíram e deixaram para nós como legado.

No entanto, descansando de meu almoço, tive uma visão aterrorizadora – só posso classificá-la assim. No jornal RJTV 1ª edição da rede globo de televisão uma notícia me chocou. Ela versava sobre a oferta da Petrobras S/A em adquirir por R$ 336.000.000,00 (isso mesmo, trezentos e trintas e seis milhões de reais) o Quartel General da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro situado à Rua Evaristo da Veiga, 78 no Centro da cidade do Rio de Janeiro. Segundo a empresa o Quartel – de 200 anos – será derrubado para o aproveitamento do espaço para outras atividades ligadas as atividades da instituição.  

Não nego o fato de nos últimos anos a Petrobras S/A ter investido milhões na promoção da cultura, em projetos sociais, em pesquisas científicas e na construção e manutenção de laboratórios em algumas universidades brasileiras, por exemplo. O que de certa forma vem me incomodado é a amplitude que a instituição vem tomando em assuntos que diria respeito exclusivamente ao estado, ao poder público. A Petrobras S/A esta se tornando um poder paralelo ao estado na medida em que assume para si funções que destoam de sua atividade fim que é a geração de energia.

Além do episódio do Quartel Geral da Polícia Militar, em São Gonçalo uma escola municipal da rede de ensino foi derrubada para abrigar uma unidade operacional da empresa. A nova escola foi construída em outro espaço com recursos próprios da Prefeitura daquela cidade. Cada vez mais A Poderosa Petrobrás S/A vem aumentando seu raio de ação no território nacional. Será que minha rua corre algum risco? Meu bairro? A prefeitura? O que mais falta?

O progresso é algum muito bem vindo às sociedades contemporâneas, na medida em que pode promover a elevação da qualidade de vida das pessoas. O progresso a qualquer custo é que me parece ser o grande problema. Valores, histórias, identidades etc. podem estar em risco já que a busca desmedida pelo progresso pode levar a extinção elementos que forjaram e ainda nos forjam. Resistir aos avanços desmedidos do progresso é zelar por nosso passado, presente e o futuro vindouro. Assim, vamos resistir?