Ao meio dia do início da Primavera uma amiga, dessas que riem de modo a ouvir-se de longe,  teve uma agradável surpresa: uma passarinha, dessas coloridas e desavisadas, cansada de voar para lá e para cá, entrou pela janela de sua sala, mesmo sem ser convidada e viu no vaso de uma pequena “árvore da felicidade”, a possibilidade de por os seus ovos e procriar. Lá fez o seu ninho sorrateiramente e se estabeleceu. Ficou aí provado que não são apenas os seres humanos que invadem terrenos desocupados para criar um lar, também, os passarinhos voam a procura de um teto e às vezes o encontram em locais menos prováveis.  Talvez já esteja se formando um movimento dos pássaros sem teto, o MPST. Com tantos movimentos por aí, mais um não vai atrapalhar e eu já me candidato a sócio colaborador.

Os passarinhos sofrem muito com o desmatamento, pois as árvores estão se tornando cada vez mais raras em nosso meio ambiente. Além de raros, os ipês, oitis, cinamomos, quaresmeiras, manacás entre outros também sofrem com a poluição sonora e química com a combustão dos veículos que despejam sua fumaça sobre elas. O bicho homem está acabando com tudo deve ter pensado o bichinho de asas e mesmo receosa escolheu o lugar bem ao lado de uma estante de livros.  Lá estava o livro de poesias do Drummond e entre tantos versos um que diz: Era uma vez um czar naturalista que caçava homens/ mas quando lhe disseram que se caçam borboletas e passarinhos/ Achou uma barbaridade.

Feliz da vida a minha amiga e sua família mudaram os hábitos. Nada de ligar a televisão muito alto, nada de falar alto, arrastar móveis, usar aspirador de pó e outras tranqueiras domésticas. A passarinha precisava de paz e de tranquilidade para que seus rebentos pudessem se desenvolver e voar para o mundo. Comida e aconchego não faltaram para a bichinha que se sentiu a vontade naquele lar cheio de amor e carinho.

Ainda extasiada com a novidade, tratou logo de postar uma fotografia na rede social e participar para o mundo que uma passarinha, espontaneamente, escolheu seu apartamento como seu novo lar.  Até hoje, quase um mês depois ainda não se sabe ao certo o nome oficial do bichinho e por via das dúvidas ela a batizou de Primavera.

O encantamento da natureza com flores, pássaros e borboletas coloridos dá mesmo a sensação de que nem tudo está perdido apesar da poluição sonora e do ar. Assim, espero que esse início de Primavera perdure pela vida inteira de minha amiga.