RESUMO

O presente trabalho discorre sobre a natureza da obrigação do ortodontista, buscando compreender a responsabilidade do profissional quanto ao propósito a que se destina, se é obrigação de meio ou de resultado. No desenvolvimento desse trabalho, foi possível observar que o sucesso do serviço prestado pelo ortodontista não depende exclusivamente de seu empenho, conhecimento de normas, métodos e procedimentos da atividade profissional, e experiências inerentes à sua formação técnica ou científica, mas também a colaboração do paciente. BREVE HISTÓRICO DA ORTODONTIA Historicamente, não é possível definir quando o ser humano buscou inicialmente corrigir ou alinhar a dentição. Inaugurando o marco inicial da ortodontia. No entanto sabe-se que com a evolução da odontologia em meados do século XIX, que ela começa a se sobressair como objeto de pesquisa, de uma ciência de saber específico. Pode-se dizer que o alinhamento da dentição foi o objetivo preliminar dos tratamentos sugeridos. O modo de desenvolvimento da dentição e dos ossos maxilares é complexo e a perda dos elementos dentais pode causar apinhamento e maloclusão. As perdas dentais sempre foram frequentes, precoces ou não. Consequentemente ocasionavam alterações no posicionamento dos elementos dentais, pois, ainda não existia o conceito e a determinação do que seria uma oclusão ideal e sua relevância. A concepção do conceito de oclusão e sua importância começaram a ser construídas mediante as pesquisas de Edward H. Angle. A classificação de Angle conserva-se na atualidade. Ele é considerado o pai da ortodontia moderna. A importância da avaliação facial para o diagnóstico e programação do tratamento ortodôntico, o estudo da etiologia das maloclusões, os protocolos de tratamentos e aparatologia ortodôntica utilizada (inclusive extrabucal), foram introduzidos por sua obra. A classificação de Angle estendeu a seara da ortodontia. Doravante não apenas o alinhamento da dentição, mas também a determinação de uma oclusão funcional e harmônica se instituía como objeto da ortodontia. Angle reconhecia a influência da dentição sobre o perfil facial, porém considerava que o objetivo da terapia ortodôntica consoante aos seus parâmetros, deveria 5 destinar-se ao estabelecimento de uma oclusão ao perfil esquelético facial harmônico. Destarte a harmonização das relações dentofaciais foi relegada. A ortodontia prosperava no tempo, por volta da década de 1930, a comunidade ortodôntica concluiu que seguir o padrão de Angle, sem considerar o resultado facial obtido e a eventual necessidade de extrações dentárias, como alternativa terapêutica, não assegurava em todos os casos efeito satisfatório e estável. A descoberta dos raios-x, por Wilhelm Conrad Roentgen no ano de 1895, expandiu o âmbito das possibilidades para a seara das ciências da saúde, especialmente a odontologia. Broadbent, que havia estudado na Angle School, publicou em 1931 um artigo que inaugura a cefalometria radiográfica. Nesse trabalho, Broadbent promove um método que utiliza como parâmetro cientifico, radiografias de face para avaliar disfunções ortodônticas. A introdução da cefalometria radiográfica como parâmetro diagnóstico, extinguiu qualquer indagação sobre a influência no desenvolvimento, proporções e relações entre a mandíbula e a maxila no estabelecimento das maloclusões. Assim, ficou claro que a etiologia das maloclusões não era resultado apenas do posicionamento alterado dos elementos dentais e das arcadas dentais entre si, mas dependia também das bases ósseas. O reconhecimento da cefalometria radiográfica viabilizou a pesquisa e o desenvolvimento de terapias que buscavam influenciar o complexo maxilomandibular, estimulando, inibindo ou direcionando o seu crescimento. A finalidade da ortodontia se desenvolve e consagra os métodos e aparatologias terapêuticas, não se estringindo às corretivas, mas da mesma forma as interceptativas (como as extrabucais e funcionais). Atualmente a ortodontia não se restringe ao objetivo de buscar exclusivamente a oclusão ideal. O plano de tratamento abrange a harmonização dos aspectos dentais, faciais e dos tecidos moles, usualmente em uma abordagem interdisciplinar com outras especialidades da Odontologia (Odontopediatria, Periodontia, Radiologia Odontológica, Cirurgia Bucomaxilofacial, Tratamento das Desordens Temporomandibulares, Dentística, Prótese e Implantodontia), da Fonoaudiologia, da Psicologia (hábitos parafuncionais) e da Otorrinolaringologia. Esse novo objetivo aliado a evolução do paradigma inicialmente preconizado e a elevada incidência de problemas ortodônticos culminaram na propagação, maior demanda e acesso ao tratamento ortodôntico, dos quais os métodos de intervenção e terapias se desenvolvem continuamente. 6 INTRODUÇÂO Para se entender a natureza da obrigação do ortodontista, é necessário estabelecer qual o tipo de incumbência assumida pelo profissional na prestação de seus serviços. A obrigação, quanto ao proposito a que se destina, pode ser de meio, de resultado ou de garantia. A obrigação é de meio quando o devedor promete empenhar seus conhecimentos, meios e técnicas para atingir um determinado resultado, sem, todavia, responsabilizar-se por ele. É a hipótese dos advogados, que não se obrigam a vencer uma causa, mas a habilmente defender seus clientes; da mesma maneira os médicos que não se obrigam a curar, mas a tratar satisfatoriamente os enfermos, utilizando-se de seus conhecimentos científicos. Considerando que o advogado não se obriga a ganhar a causa para o seu cliente, se agir adequadamente, com zelo no gerenciamento da causa, merecerá os honorários advocatícios, que representam a contraprestação do serviço profissional, embora não tenha sido bem-sucedido. Do mesmo modo, o médico que se dedicou empregando recursos médicos acessíveis, no esforço de curar o enfermo, ainda que não tenha êxito, fará jus à remuneração devida pelos serviços prestados. Se a obrigação assumida por esses profissionais fosse de resultado, poderiam ser responsabilizados civilmente se a causa não fosse ganha ou se o paciente viesse a falecer. O devedor somente se exonera na obrigação de resultado, se o objetivo prometido for realizado. Não o sendo, será considerado inadimplente, e responderá pelos prejuízos derivados do insucesso. Um exemplo tradicional de obrigação dessa natureza é a assumida pelo transportador, que se responsabiliza tacitamente, ao vender o bilhete, conduzir o passageiro sem danos e livre de perigo ao seu destino. Também a obrigação assumida pelo cirurgião plástico, quando realiza procedimento de natureza estética ou cosmetológica. Não se eximirá de responsabilidade provando apena ausência de culpa. Incumbelhe o ônus de esclarecer que o episódio adverso sucedeu por força maior, e semelhante ao fortuito, culpa exclusiva da vítima ou caso ou fato exclusivo de terceiro. Prevalece na doutrina a afirmação de que, em regra, a obrigação do cirurgiãodentista é de resultado, fundamentado no argumento de que os procedimentos odontológicos são regulares e as condutas terapêuticas mais uniformes, possibilitando ao profissional responsabilizar-se com o resultado. Não obstante, o tratamento ortodôntico não abrange apenas o trabalho de natureza estética, pois compreende da mesma forma a reabilitação funcional da oclusão, como prevista na Resolução CFO-63/2005: Art.73. Ortodontia e a especialidade que tem como objetivo a prevenção, a supervisão e a orientação do desenvolvimento do aparelho mastigatório e a correção 7 das estruturas dentofaciais, incluindo as condições que requeiram movimentação dentaria, bem como harmonização da face no complexo maxilomandibular. Art.74. As áreas de competência para atuação do especialista em ortodontia incluem: a) Diagnóstico, prevenção, interceptação e prognostico das maloclusões e disfunções neuromusculares; b) Planejamento do tratamento e sua execução mediante indicação, aplicação e controle dos aparelhos mecanoterápicos e funcionais, para obter e manter relações oclusais normais em harmonia funcional, estética e fisiológica com as estruturas faciais; e, c) Inter-relacionamento com outras especialidades afins necessárias ao tratamento integral da face. A obrigação do ortodontista deve ser analisada individualmente, pois em alguns casos os tratamentos têm os resultados previsíveis, mas existem outros casos de tratamentos difíceis e de resultados imprevisíveis. [...]