Dificilmente não é a mesma que apedreja, assim afirmava o poeta brasileiro Augusto dos Anjos com toda certeza, em uma das suas lúgubres poesias.
Por estes dias temos tido notícias de um trágico acontecimento na Praia da Brisa, em Guaratiba, Rio de Janeiro, onde estava havendo mais uma costumeira realização de "pega", que nem é necessário explicar do que se trata, por ser assunto por demais conhecido neste país repleto de absurdos.
Cerca de quinze jovens ficaram feridos, inclusive o ensandecido motorista de um dos carros que participava da farra, e felizmente ninguém perdeu a vida, mas isso poderia ter acontecido. E sabe de uma coisa? Tenho pena não. O povo gosta mesmo é de alvoroço, de adrenalina agitando o sangue, mesmo que esse mesmo sangue venha a ser derramado em plena rua. Aí sim, o círculo se fecha em volta da tragédia, há revolta, há choro de irmãos e desmaios de mães e todo mundo começa a esbravejar, exigindo a crucificação do culpado.
Dois minutos antes do ocorrido e o cenário era outro, todo mundo estava lá assistindo e até brigavam pelos melhores lugares. Havia torcidas, palmas, vaias e gritaria.
- Pega! Corre seu babaca, enfia o pé! Comprou essa carteira aonde? E os motoristas mais afoitos, mais tresloucados, esses eram bravamente aplaudidos. Mas quando de repente um deles perdeu o controle do volante e atirou o veículo sobre a platéia, ah mermão, aí é que teve grito mesmo, e o "astro" antes aplaudido passou a ser vaiado e por pouco não foi linchado pelas mesmas mãos que antes o aplaudiram. Até parecia o tribunal de Pilatus, onde a mesma turba que seguia Cristo pelas estradas da Judéia passou a gritar: crucifica-o, crucifica-o!
Pergunto: ora, mas por que isso agora?
Deixa que o povo mesmo responde: porque o povo gosta é de circo, gosta de novidade, de nêgo sendo vaiado e empurrado aos ponta-pés pra dentro do camburão pra ter que pagar pelo que fez, isso sim. O povo gosta é de sensações, nem que sejam ambulâncias apitando e de rabecão levando algum morto pra no dia seguinte todo mundo ir pro cemitério acompanhar o defunto fresquinho até a sua última morada, e o buchico correndo solto, sentando o pau no culpado. E veja bem, defunto esse, que não tenham dúvida, se pudesse cair fora, com certeza estaria novamente se acotovelando entre a platéia do próximo "pega".
Então, proibir pra que? Se o povo gosta, que seja feita a vontade do povo. Se não gostasse dos "pegas", o povo mesmo colocaria pregos e cacos de vidro no chão pra furar os pneus, o povo mesmo faria lombadas e cavariam buracos atravancando a rua, pelo menos assim, creio que chamariam a atenção das autoridades, que infelizmente sabe-se que não ouvem nem enxergam lá tão bem, até que aconteça o pior.Tô certa ou tô errada?


Júnia - 2011